Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O Brasil olímpico

É hilário ver o telejornalismo descrever nossos fracassos em Pequim como se fôssemos um país olímpico. Se pudessem assistir à cobertura nacional das Olimpíadas de Pequim, os deuses gregos morreriam de rir.

Desde sempre, há uma clara distinção entre o Brasil dos que estão no topo e os Brasis da esmagadora maioria da população, que disputa as migalhas da renda nacional (vide os dados do Ipea sobre a concentração de renda).

Os que estão no topo sonham com um Brasil grande, potência esportiva, civilizado e herdeiro da cultura greco-romana. Alguns até dizem que somos… europeus.

Os que olham para este Brasil tão distante e fora de alcance só conseguem mesmo pensar no que comer amanhã. Não dá para fazer muito pela humanidade quando a grande preocupação que temos é se e o que comeremos amanhã. O Brasil do topo nunca vai realizar seu sonho de ser uma potência filosófica/esportiva enquanto os Brasis da base continuarem a contar migalhas.

Patriotada jornalística

Em matéria de Olimpíadas, por exemplo, as únicas provas em que os brasileiros poderiam trazer medalhas de bacia para o país seriam as seguintes:

** cem metros rasos para pegar a latinha de alumínio;

** duzentos metros com barreira para pegar a garrafa pet;

** marcha de vários quilômetros porque não se tem dinheiro para pagar o ônibus;

** tiro ao traficante;

** tiro ao policial;

** bala perdida que acha um civil descuidado;

** esgrima com peixeira por causa de dinheiro pouco;

** carregamento de tijolo;

** arremesso de saco de cimento;

** luta livre de arquibancada durante corintia x parmeira, fogão x mengo etc…

** natação na inundação;

** corrida com bicicleta roubada;

** salto de muro de prisão/unidade da fundação casa durante rebelião.

Existem várias outras provas muito brasileiras, mas não vou me dar ao trabalho de continuar. Antes de desejar que o Brasil realize uma Olimpíada, o leitor pode e deve meditar por si no legado do Pan do Rio. Dezenas de cadáveres produzidos pela polícia nas favelas antes dos jogos, centenas de mortos após os jogos em razão da epidemia de dengue (porque o mesmo Estado que gastou bilhões com o Pan não tinha alguns míseros milhões para combater o mosquito campeão) e os ginásios que foram abandonados às moscas.

Toca em frente que vem mais patriotada jornalística aí, gente.

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Advogado, Osasco, SP