Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Nelson de Sá

GOVERNO LULA

“Positiva, mas pequena”, copyright Folha de S. Paulo, 19/06/03

“Mais do que o corte de meio ponto na taxa de juros, importou à televisão a recepção ao corte.

Do Paraguai, feliz da vida, o presidente Lula saiu falando ao Jornal Nacional que ?os juros começam a cair? e vem aí ?investimento?.

A recepção por aqui foi bem menos empolgada, para não dizer mais confusa. Era como se alguns, a começar da própria televisão, não soubessem se deviam elogiar ou criticar. Talvez aquela que resuma a opinião geral seja a da Fiesp, descrita na Globo News:

– Vai na direção correta, mas é insuficiente.

Foi também o enunciado que abriu o Jornal da Record, de Boris Casoy:

– Acham a queda positiva, mas pequena.

Curiosamente, os elogios mais consistentes foram de empresários da indústria e do comércio, que mais vinham pressionando pelo corte.

Foram os casos da federação do comércio e da Associação Comercial de São Paulo, que elogiaram com poucas restrições. A federação das indústrias do Rio nem fez restrição. A reação da federação de São Paulo, como se viu, foi mais favorável do que prometia.

Também curiosamente, as críticas mais acerbas vieram do campo governista.

Não dos demais partidos, mas do próprio PT -ainda que não de seus líderes. O peemedebista Amir Lando, por exemplo, louvou o corte.

Já o petista Paulo Paim falou em ?insignificante? e fez ameaças. Heloísa Helena falou em ?inconsequente?.

A CUT foi mais contida e falou em ?insuficiente?. Para a Força Sindical, também inesperadamente contida, foi ?muito pouco?.

Provavelmente antevendo a frustração com meio ponto de corte, Antônio Palocci saiu distribuindo expressões como ?queda consistente? -além de cobrar dos bancos, agora, um corte da parte deles.

Alexandre Garcia já se decidiu. Ele não gostou dos ataques de FHC:

– Fernando Henrique parece não ter suportado o sucesso de Lula, que contrariou as expectativas tucanas de caos… Pensando bem, foi até bom FHC ter provocado Lula. O presidente disse coisas que precisavam ser ouvidas.

Franklin Martins também não escondeu certa simpatia pela reação presidencial:

– Lembrou o João Ferrador dos tempos do sindicato dos metalúrgicos.

Lula ainda tem muito fascínio para queimar.”

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“O desenrolar da história”, copyright Folha de S. Paulo, 20/06/03

“Começou no JN de anteontem, que fechou com a nota chocante:

– Ladrões roubaram um dos filhos do presidente. Os seguranças foram baleados.

Começou ?o desenrolar da história?, no dizer do Cidade Alerta. Por volta do meio-dia, novo choque. Do SPTV:

– Morreu o militar que fazia a segurança.

Seguiram-se horas da parafernália espetacular da TV. Retrato falado, ?dramatizações? do crime, reportagens ?em tempo real? etc. Sem contar as recriminações, o esforço de apontar culpa em toda parte.

Ouviu-se das TVs e rádios -que mal escondiam a excitação- que um suspeito fora reconhecido. E o ministro da Justiça saiu dizendo à Jovem Pan que as impressões digitais no local eram ?99% semelhantes? às do suspeito.

Ao chegarem à delegacia, dois suspeitos de rosto coberto e seus parentes em desespero foram cercados. A mulher de um deles chorava ao dizer, ao Brasil Urgente e Cidade Alerta:

– Ele estava trabalhando. Ele não tem nada a ver.

O amigo do outro declarou:

– Ele ficou até as dez comigo.

E a repórter:

– E por que ele foi acusado?

Resposta irritada:

– Ah, não sei. Isso é uma palhaçada de vocês.

Falava da TV, não da polícia.

As coisas ainda pioraram na cobertura, que tomou os suspeitos por culpados e passou a louvar a polícia pela ?investigação precisa? que ?esclareceu com muita rapidez?.

A afoiteza acabou punida quando outra testemunha, segundo a Pan, não reconheceu o suspeito. E surgiu um delegado, ao vivo:

– A vítima disse que está confusa (no reconhecimento). Não vamos pedir prisão temporária. Serão liberados.

Até o fechamento, ainda não haviam sido liberados. Só julgados, pela TV.

Quanto às recriminações indiscriminadas, uma foi para o filho do presidente:

– Ele vive uma vida normal. Esse comportamento tem que ser alterado, já que o pai chegou a presidente.

Outra foi para o privilégio dado ao caso:

– Todo cidadão merece o mesmo tratamento, o empenho da polícia. Não é só o filho do presidente!

Outra foi contra, é claro, ?os direitos humanos?:

– Quem é que vai aparecer para defender o segurança? Quando bandido mata aparece um monte de gente.

E não parou aí. É isso a TV brasileira.”

“Governo extrapola o próprio limite de patrocínio”, copyright Folha de S. Paulo, 19/06/03

“Quando o governo federal estabeleceu por decreto (4.474), anteontem, teto de R$ 24,5 milhões para patrocínio através de leis de renúncia fiscal ao cinema em 2003, as autorizações de captação emitidas pelo próprio governo já haviam ultrapassado esse limite.

No último dia 16, os certificados de investimento audiovisual registrados na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) atingiram R$ 25,2 milhões. Os certificados concretizam a liberação para captar patrocínio com benefício das leis. A autorização de captação é emitida pelo Ministério da Cultura e pela Ancine (Agência Nacional de Cinema), responsáveis pela análise e aprovação dos projetos que demandam patrocínio pelas leis de renúncia fiscal.

?Se o valor [registrado na CVM] for esse mesmo, teremos de suspender as aprovações de novos projetos, até que o decreto seja alterado?, disse Luiz Fernando Noel, superintendente de desenvolvimento industrial da Ancine.

O valor de R$ 25,2 milhões se refere, de acordo com dados publicados na página da CVM na internet, a 22 projetos registrados a partir de janeiro deste ano.

Entre eles estão propostas de produção de filmes, como ?O Dono do Mar?, de Odorico Mendes, baseado em livro do senador José Sarney (PMDB-AP) e ?1,99 -O Império da Nebulosa?, de Marcelo Masagão, e também de distribuição de filmes, caso de ?Celeste e Estrela?, de Betse de Paula.

Em nota, o secretário-executivo do Ministério da Cultura, Juca Ferreira, afirmou: ?O Ministério da Cultura tranquiliza os produtores audiovisuais, informando que está atento às necessidades do setor, bem como dos outros segmentos da área cultural, e em tratativas com os órgãos competentes da área econômica do governo, para garantir a manutenção dos padrões históricos de renúncia fiscal?.

A assessoria do ministro Palocci Filho (Fazenda) disse que ele só poderia comentar o tema depois do retorno do Paraguai, previsto para a tarde de ontem.

O MinC estima que em 2002 foram captados R$ 54 milhões para a produção audiovisual. Em 2001, esse valor foi de R$ 87,4 milhões e, em 2000, de R$ 55,3 milhões.

?Essa limitação [de R$ 24,5 milhões] ocorre justo no ano em que o cinema brasileiro está conquistando 15% do mercado, o que não acontecia há duas décadas?, diz o produtor Leonardo Monteiro de Barros, da Conspiração Filmes.

Em maio passado, produtores e cineastas protestaram contra as regras de patrocínio das estatais estabelecidas no governo Lula, sob orientação da Secretaria de Gestão Estratégica e Comunicação do Governo (Luiz Gushiken).

O produtor Luiz Carlos Barreto e o cineasta Cacá Diegues classificaram de ?dirigismo cultural? as regras divulgadas por Eletrobrás e Furnas, que estabeleciam prioridade à cultura popular, sintonia dos projetos aprovados com programas de governo e exigência de contrapartida social nas propostas beneficiadas.

A polêmica fez com que o ministro Gushiken cancelasse as regras e entregasse a Gilberto Gil (Cultura) a formulação da política de patrocínio cultural a ser seguida pelas estatais.

?[O teto de R$ 24,5 milhões] Deve ser um equívoco, porque não condiz com nada das vontades políticas existentes?, diz Barreto. ?Retaliação não é o estilo do governo Lula, que vem demonstrando uma disposição de negociação quase inédita neste país?, afirma.

A assessoria do ministro Gushiken disse que a Secom não se manifesta sobre questões de política cultural, que cabem ao Ministério da Cultura.”

“Espetáculo da Retórica”, Editorial, copyright Folha de S. Paulo, 20/06/03

“Enquanto não se abrem as cortinas do prometido e aguardado ?espetáculo do crescimento?, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai brindando o país com o espetáculo de sua retórica. Lula tem privilegiado compromissos da agenda presidencial como púlpito para comunicar-se com a sociedade. Nessas ocasiões exercita, de forma aparentemente improvisada, sua verve carismática. Habituado a falar a platéias populares, o presidente é abundante no uso de imagens domésticas e do cotidiano. Ora é o ?companheiro que pára para tomar uma cervejinha? e depois é criticado, ora é o dissidente comparado ?à família que pensa diferente da gente?, ora é alguém que ?bate os braços? e pode ?morrer afogado desnecessariamente?, em referência aos que pedem mais rapidez na queda dos juros.

No início da semana, ao participar de um evento na cidade de Pelotas (RS), Lula, de novo, discursou. Sob vaias de alguns manifestantes contrários à reforma da Previdência, o presidente assumiu tom acalorado e respondeu a críticas endereçadas ao governo por seu antecessor -que chamou, num ato falho, de ?sucessor?. Disse que sua administração recebeu um Brasil ?quebrado? e voltou a pedir paciência: o governo não deveria se comportar como um jogador de futebol que ?pega a bola, não olha para o lado, dá uma bicuda e não marca o gol?.

Independentemente de julgamentos sobre o estilo dos discursos presidenciais, chama a atenção não apenas a frequência com que acontecem mas o fato de que comecem a contrariar frontalmente a realidade. Foi o caso em Pelotas, quando Lula garantiu que seu governo daria um basta no vaivém de políticos que trocam de partido como ?trocam de camisa?. Sabe-se que, desde a posse, a base governista aumentou, num processo que registrou inúmeras migrações entre legendas.

Corre-se o risco de que o vazio de resultados mais consistentes vá sendo preenchido por uma oratória cada vez mais propensa a lançar mão de mistificações populistas.”

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“Jornal elogia política econômica”, copyright Folha de S. Paulo, 20/06/03

“Sob o título ?Abordagem pragmática de Lula ajuda Brasil a encontrar equilíbrio?, o jornal americano ?The Washington Post? publicou ontem artigo no qual destaca que a receita econômica adotada pelo governo do presidente Luiz Inacio Lula da Silva está convencendo os críticos externos ao mesmo tempo em que garante bons índices de popularidade interna.

O artigo menciona as dúvidas que existiam entre investidores internacionais sobre o governo Lula, e diz com uma receita de corte de gastos, pagamento do serviço (juros) da dívida em dia e propostas de diminuir pensões e aposentadorias ?generosas?, Lula conquistou a confiança desses investidores e do FMI.”