Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Idéias e salários engessados

RORAIMA

Francisco Espiridião (*)

Muitos são os envolvimentos que engessam a atuação do jornalista, colocando-o numa camisa de força no exercício de sua missão de arauto da sociedade. Em princípio, tal conceito pode até parecer meio boçal. Mas só parece. No frigir dos ovos, é recheado de sentido: duas vezes por ano a Universidade Federal de Roraima despeja no mercado um número considerável de novéis profissionais com canudo de bacharel em Comunicação Social, Habilitação em Jornalismo, debaixo do braço.

A esses "foquinhas" (referência carinhosa e nada pejorativa, entenda-se) há de se somar um pelotão de iguais que migram de outros estados para Roraima, porque ouviram falar que o Eldorado dos tempos ultramodernos está acima do Equador.

Todo esse contingente chega voraz, em busca de uma vaga num mercado de trabalha que, pela globalização crescente, jamais esteve tão depauperado como agora. Nesse quadro caótico, nada mais natural que haja um engessamento ? das idéias e da carreira.

O axioma "o pequeno é quem sempre se dá mal" é a mais crua realidade na área do jornalismo informativo. Nem sempre o que se vê publicado no jornal do dia seguinte é o que realmente aconteceu. Apesar de divulgarem simultaneamente os mesmos fatos, os variados veículos dão à notícia maior ou menor ênfase, dependendo da ideologia de seus donos. Isso obriga o leitor a navegar pelas páginas dos diversos jornais para, a partir daí, tirar suas próprias conclusões. Não dá para acreditar na primeira versão que lhe chega às mãos.

Ao bel-prazer desse emaranhado de interesses, tal como o marisco entre o mar e o rochedo, navega indefeso o jornalista, este ser híbrido e ao mesmo tempo inteligente, que se adapta com facilidade às boas veias do patrão. Se para conseguir colocação numa redação ele precisa brigar, não vale a pena arriscar tudo numa posição ideologicamente firme. É mais conveniente submeter-se a dar a versão dos fatos que mais interessar ao patrão.

Salário-padrão

Mas todo esse imbróglio ainda não é o principal. Ainda há a parte crucial da questão: o salário pago a esse contingente de "manés" (e eu sou um deles). A revista Veja da semana retrasada trouxe levantamento das 17 profissões mais procuradas pelos jovens que prestam vestibular no país. O jornalismo estava nesse bojo.

A pesquisa da Veja mostrou, como média salarial do jornalista brasileiro, 7 mil reais. Um salário mais do que razoável. Afinal, não é toda profissão que paga entre 7 mil e 8 mil reais de salário mensal, ainda que exija 10 anos de experiência. Mas o bicho pega mesmo é quanto à operacionalização desses valores.

Pelo menos no que me é dado a conhecer nestes quase 20 anos de profissão, nenhum jornalista em Roraima consegue um contracheque desse volume. Fato mais do que normal, considerando-se que o mercado local é incipiente. Mesmo assim, não quero aqui afirmar que ninguém o receba. Só que, para chegar a esse nível de vencimentos, o jornalista roraimense precisa dar uma de equilibrista e esquecer o emprego formal (muitas vezes, até a ética e a vergonha na cara).

Precisa correr para formalizar seu próprio salário, com venda de publicidade para os órgãos em que trabalha ou outros meios que o valham. E aí já não é mais salário: pode-se chamar de dividendos, bonificações, comissões, até mesmo "jabá". Jamais salário.

Aliás, salário de jornalista por estas bandas, na mais lídima acepção da palavra, é curtíssimo. A esperança é que um dia ainda tenhamos em Roraima um sindicato que brigue pelos interesses de seus associados.

Salvo melhor juízo, a última vez que o Sinjoper se reuniu para falar de salários (acordo coletivo) já faz mais de cinco anos. Parece que nós só somos competentes para alardear o que está errado na área dos outros. Cobrimos todas as greves que surgem. Somos até aguerridos na defesa dos mais fracos. Mas não sabemos fazer uma ? por pequena que seja ? em nosso próprio benefício.

Chega de vias transversais. A imprensa e a sociedade roraimenses estão há muito merecendo que os jornalistas e o Sinjoper de Roraima façam alguma coisa para estabelecer no estado um salário-padrão que, se não chegar aos oito mil reais mensais, pelo menos permita uma vida tranqüila ao profissional e a sua família.

(*) Jornalista