Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Ricardo Noblat

ASSESSORIA & RP

"Assim é, se lhe parece", copyright Comunicação
Empresarial nº 47 (Aberje) (www.aberje.com.br),
2º trimestre de 2003

“O que é o que é? Formado em jornalismo, vive entre
jornalistas, entrevista pessoas, apura, escreve e publica notícias,
mas não é jornalista? É o assessor de imprensa.
Durmo com um – ou melhor, com uma – há 26 anos. Sempre que
digo que um assessor de imprensa faz tudo menos jornalismo, ela
fecha a cara, sai de perto de mim e leva algum tempo para se reconciliar
comigo. Há muito que ele desistiu de bater boca em torno
do assunto. Nem a convenci do que penso, nem ela de que estou errado.

Antes que seja esfolado vivo, digo que respeito o assessor de imprensa,
como respeito todo tipo de profissional sério, digno e que
sua a camisa para sobreviver. Se não fossem as assessorias
de imprensa haveria um número muito maior de jornalistas
desempregados no país da mídia falida, dos juros estratosféricos
e do presidente que ganhou pela esquerda e que por ora governa pela
direita. Reconheço também que assessores de imprensa
muitas vezes facilitam o trabalho dos jornalistas. E até
evitam que eles cometam mais erros do que seria habitual.

Mas que assessores de imprensa fazem jornalismo, não fazem
não. Sinto dizer. Pelo menos o que entendo por jornalismo.
Ou melhor: o que é definido como jornalismo em qualquer conversa
de botequim e nos salões acadêmicos mais vetustos.
Para que seja considerado como tal, o jornalismo tem que ser livre,
crítico e, se necessário, impiedoso. O escritor Millor
Fernandes acha que jornalismo de verdade tem de ser de oposição
– o resto é armazém de secos e molhados.

Quem paga o salário

O jornalismo supostamente praticado nas assessorias de imprensa
pode ser livre? Pode ser crítico? E impiedoso, pode ser?
Se for qualquer uma dessas coisas, ou todas ao mesmo tempo, não
será um jornalismo de assessoria de imprensa. Porque não
haverá assessoria de imprensa que sobreviva com um jornalismo
desses. Ela simplesmente não terá clientes – nem de
esquerda, nem de direita, nem de centro.

Mesmo que a verdade não seja algo claramente identificável,
e mesmo se admitindo que não exista uma única verdade,
o dever número um do jornalista é persegui-la à
exaustão. O dever número um do assessor de imprensa
é oferecer para divulgação a verdade que melhor
sirva ao seu assessorado. E, se preciso, ocultar a verdade quando
ela lhe for nociva. O dever número dois do jornalista é
com o jornalismo independente.

O do assessor de imprensa é com o jornalismo que depende
dos objetivos do seu assessorado. O dever número três
do jornalismo é com os cidadãos. Não se deve
ter vergonha de tomar partido deles. O do assessor de imprensa passa
pelos cidadãos desde que seja para que seu assessorado fique
de bem com eles. Ou desde que os cidadãos não atrapalhem
a vida do assessorado. O quarto dever do jornalista é com
sua própria consciência. Vá lá: o do
assessor de imprensa é também com sua própria
consciência.

Em última instância, quem paga o salário do
jornalista é o público que consome o que ele apura
e divulga. Quem paga o salário do assessor de imprensa é
a empresa, entidade, governo ou figura pública que o contratou.
No dia em que um assessor de imprensa for capaz de distribuir notícias
contra seus clientes, estará fazendo jornalismo – e deixará
de ser assessor de imprensa. O que ele faz tem mais a ver com relações
públicas e propaganda do que com jornalismo. (Noblat é
consultor do jornal A Tarde, de Salvador, e autor do livro ?A Arte
de Fazer um Jornal Diário?.)”

“Repensando assessorias”, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br),
23/06/03

“Um coleguinha que me acompanha há anos – é até
membro do Conselho de Sábios – enviou emeio em meados da
semana passada para relatar seu espanto com o fato de jornalistas,
e mesmo agências de assessorias de imprensa organizadas, terem
aceitado trabalhar para alguns advogados envolvidos no escândalo
do propinoduto e para o secretário Chiquinho da Mangueira,
este acusado de ter ligações com o tráfico
de drogas. O meu amigo pedia ainda o início de uma discussão
séria sobre os limites deontológicos das assessorias.

Bem, sei por experiência própria que este é
um assunto difícil. Durante muito tempo, defendi que os jornalistas
ao trabalhar em assessorias faziam um trabalho jornalístico
semelhante ao de um jornalista de redação. Defendia
esta tese porque, durante este tempo todo, me parecia, naquele momento,
que as atividades não diferiam muito. Havia apenas um mudança
de perspectiva.

Como denotam os verbos no passado, já não penso assim.
Afinal, como já disse Lula, a vida muda, e o tipo de trabalho
de comunicação também mudou nestes últimos
anos, como, aliás, já notaram pessoas mais abalizadas
que eu, como o meu vizinho de portal Eduardo Ribeiro. Atualmente,
a assessoria de imprensa propriamente dita é apenas uma parte
– e nem a maior – de um trabalho integrado de comunicação
competente, no qual as relações públicas são
a mola-mestra, com suas ações de responsabilidade
social, comunicação interna, gerenciamento de crise,
posicionamento estratégico e outras. Creio, no entanto, que
a discussão apenas começa aqui. Há, em minha
opinião, uma série de questões a serem respondidas
– e mesmo algumas ainda a serem levantadas, antes que se chegue
a alguma conclusão, por mais provisória que seja.

Tenho certeza, porém, de que qualquer discussão séria
– ou seja, uma que não descambe para aqueles vexatórios
bate-bocas em que normalmente se transformam as discussões
entre jornalistas – deve partir de uma premissa: ninguém
é melhor do que ninguém. Este lembrete vai, claro,
para os coleguinhas de redação, que, como já
disse outras vezes, se comportam como se fossem os paladinos da
justiça, os tribunos do povo, os indomáveis cavaleiros
da verdade, e outras coisas ainda mais ridículas.

A bem da verdade, a maior parte dos que defendem essas idéias
toscas fazem parte das chefias das redações e, por
isso, suspeito que não acreditam nelas, só as externando
porque tentam pobremente mascarar que jornalista em redação
não tem apenas o leitor como cliente: antes dele tem o dono
do jornal, que é muito mais decisivo para manter o emprego
do coleguinha do que uma dona de casa carioca ou um microempresário
paulista. Afinal, se o dono de um jornal está interessado…digamos…na
Companhia Energética do Maranhão (Cemar) – cujos donos
americanos literalmente se evadiram para Pensilvânia – as
matérias dos coleguinhas que falam sobre o assunto tenderão
a enfocar um ou outro ângulo da questão conforme a
evolução do negócio, não é? Negar
esse fato, e defender a isenção e a imparcialidade
total, em todos os casos, de uma empresa de comunicação
é um insulto à inteligência de qualquer pessoa
que tenha mais de cinco anos de idade.

Assim sendo, partindo daquela definição básica,
podemos começar discutir o que faz um assessor de imprensa,
qual a sua responsabilidade na sociedade, qual o comportamento que
ele deve ter em relação ao cliente e ao colega de
redação. Discussão longa como se vê.
Por isso, vamos deixar para continuar na semana que vem (se nada
muito palpitante acontecer, é claro…)

Esclarecimento – Recebi este emeio comentando uma parte da coluna
da semana passada:

Olá. Li seu texto ?Este mundo é uma ervilha!? em
varios lugares pela internet.

Destaco o começo:

?Se você acessa a Rede há muito tempo, quase certamente
já recebeu aquela corrente sobre ?Os seis graus de Kevin
Bacon?. Nela o gaiato do autor ?prova? que todos os atores do cinema,
da década de 20 para cá, trabalharam com alguém,
que trabalhou com alguém, que trabalhou com alguém,
que trabalhou com alguém, que trabalhou com alguém,
que trabalhou com Kevin Bacon.?

Isso não é (somente) uma corrente, o autor não
é gaiato e nem prova com aspas. Existe uma teoria chamada
?Six Degrees of Separation?, formulada pelo psicólogo americano
Stanley Milgram, na década de 60. Muito resumidamente, é
uma teoria que diz que entre você e qualquer outra pessoa
no planeta existem no máximo seis links de conhecimento,
ou seja, eu conheço fulano que conhece um fulano que mora
na Austrália que conhece o primeiro-ministro de lá
e tal. Então entre eu e o primeiro-ministro da Austrália
existe 1 grau de separação.

Bem, baseado nessa teoria, existe um jogo muito comum em universidades
americanas, que é o ?Six Degrees of Kevin Bacon?, que visa
linkar qualquer ator a Kevin Bacon no menor número possível
de links. Existe um site da Universidade de Virginia que sistematizou
isso, www.oracleofbacon.org.

Vai lá e testa com todos os atores que você conhece,
pode ser Marília Pêra, Antônio Fagundes, qualquer
um. Funciona.

Não espero que você publique uma nova coluna informando
seus leitores desses fatos, mas isso seria bom.

Propague a felicidade.

David?

Como se vê, o David pode até conhecer uma pessoa que
conheça o primeiro-ministro da Austrália, mas certamente
não me conhece…Ah! Já tinha visto o livro do gringo
em alguma livraria.”

 

FOLHA ANABOLIZADA

“Venda em banca cresce 30% no domingo com ?O Nome da Rosa?”, copyright
Folha de S. Paulo, 19/06/03

“?O Nome da Rosa?, de Umberto Eco, o segundo título da Biblioteca
Folha, aumentou em 30% a venda em banca da Folha no último
domingo.

O número de exemplares vendidos subiu de 100 mil, a média
do mês anterior, para 130 mil. A circulação
total do jornal foi de 413 mil exemplares, dos quais 283 mil foram
para assinantes que recebem o jornal aos domingos.

Esses números são parciais. Os dados definitivos
só devem ser conhecidos no final da semana devido à
complexidade de se totalizar números vindos de bancas espalhadas
por todo o país.

Na estréia da Biblioteca Folha, no dia 8 de junho, a distribuição
gratuita de ?Lolita? para os compradores do jornal aumentou em cerca
de 140% a venda em bancas.

As vendas atingiram perto de 240 mil exemplares. O livro de Vladimir
Nabokov também foi distribuído para os 310 mil assinantes
do jornal. Com isso, ?Lolita? atingiu a circulação
inédita de 550 mil exemplares.

No próximo domingo, circula o terceiro título da
coleção, ?O Amante?, de Marguerite Duras. O livro
poderá ser comprado por preços que vão de R$
11,50 a 13,50, dependendo do Estado.

Os livros da Biblioteca Folha não circulam em bancas nos
Estados do Rio e do Espírito Santo, na Grande Belo Horizonte
e algumas cidades de Minas (saiba quais são elas no Serviço
de Atendimento, pelo telefone 0800-7038080).

Nesses locais, os mesmos títulos da coleção,
numa ordem de lançamento diferente da adotada pela Folha,
são distribuídos com o jornal ?O Globo?.

Nos demais Estados e no Distrito Federal, os livros circulam com
a Folha.

Pelo acordo feito entre os dois jornais, ?O Globo? ficou com as
áreas onde o seu volume de venda em banca é, em média,
maior do que o da Folha.

Os leitores do Rio, Espírito Santo e Minas, porém,
podem adquirir os livros da Biblioteca Folha pelo telefone do Serviço
de Atendimento, desde que haja estoque. ?Lolita? custará
R$ 3,50 e os demais títulos, R$ 15,00. Em ambos os casos,
o leitor pagará o frete.”

 

FOLHA CONTESTADA

“Chamas”, copyright Folha de S. Paulo, 20/06/03

“?Estou curioso. Qual seria o motivo para o jornal colocar em sua
Primeira Página um homem desesperado correndo com o seu corpo
em chamas? Por que a Folha nos expõe a uma violência
dessas? Não há lógica. A não ser por
motivos financeiros ou por algo do gênero. Porque não
duvido da inteligência dos que comandam esse jornal, de que
têm consciência de que essa foto não passa de
uma exposição fútil da violência. A imagem
não nos mostra a vida como ela é, pois a vida como
ela é tem seus lados ruins e seus lados bons. Qual a razão
de mostrar o ato de um fundamentalista radical (radical porque só
com uma lavagem cerebral ideológica muito forte se consegue
fazer com que um homem ameace a sua integridade e a sua vida)? Espero
que a Folha, um jornal que leio faz um bom tempo, não se
renda ao ?ibope? e mantenha a sua integridade.? Daniel Severo (Taubaté,
SP)

Terror e resistência

?Sou um físico francês em visita ao Instituto de Física
da Universidade de São Paulo por algumas semanas. Tenho lido
a Folha quase todos os dias e surpreendi-me na semana passada ao
ver que os recentes ataques contra as forças israelenses
na Palestina são chamados de ?ataques terroristas?. ?Ataques
terroristas? é realmente uma expressão apropriada
quando os alvos são civis. Mas, se fôssemos seguir
o mesmo uso que a Folha faz, também teríamos de chamar
de ?terroristas? os atos da Resistência Francesa durante a
Segunda Guerra Mundial. Creio que o jornal não gostaria que
isso acontecesse.? Cirano De Dominicis (São Paulo, SP)”