Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Carolina Iskandarian e Roberta Pennafort

MARCINHO VP & MÍDIA

"Livro pode ter levado à morte de ?Marcinho VP?", copyright O Estado de S. Paulo, 30/07/03

"A revelação de segredos do tráfico contidos no livro Abusado, do jornalista Caco Barcellos, em que o traficante Marcio Amaro de Oliveira, o Marcinho VP, contou como funciona a facção criminosa Comando Vermelho, pode ter provocado a morte do bandido no presídio Bangu 3. A hipótese foi levantada pelo secretário de Administração Penitenciária, Astério Pereira dos Santos, e reforçada por amigos do criminoso.

Os presos do Comando Vermelho estariam insatisfeitos com o fato de Marcinho VP ter fornecido detalhes sobre o esquema da venda de drogas – quem são os traficantes, quais são as rotas que a droga percorre, que outros crimes a quadrilha praticava, como os inimigos eram mortos. O criminoso era descrito pelos outros criminosos como ?fanfarrão? por falar demais.

Santos disse que o serviço de inteligência descobriu um telegrama recebido pelo criminoso no fim de semana que dizia ?Cala a boca, senão você vai pra vala. Você tá querendo aparecer demais.? O secretário disse não ter visto o telegrama e desconhece a sua autoria.

No livro de Barcellos, Marcio Amaro de Oliveira é Juliano. A história conta como ele chegou à liderança da venda de drogas no Morro Dona Marta, em Botafogo, na zona sul. Outros traficantes são citados. ?Aquilo ali só é ficção para quem está de longe. A repercussão não foi boa entre os traficantes. Marcinho apareceu demais e isso não é bom. Foi uma morte anunciada?, disse um amigo do traficante, morador do Dona Marta, que pediu para que sua identidade não fosse revelada. O Estado tentou falar com o jornalista, que mora em Londres, mas ele não foi encontrado.

Há dois suspeitos do crime. Um é antigo comparsa do traficante, Ronaldo Pinto Lima e Silva, da Ladeira dos Tabajaras, detido no presídio Ary Franco.

O bandido, no livro, ganhou o nome de ?Claudinho?. Ele dividiu a liderança no Dona Marta com Marcinho VP. Outro suspeito é o traficante Marcio Nepomuceno, do Complexo do Alemão, também conhecido como Marcinho VP. Ele é um dos líderes do Comando Vermelho.

Investigação – Já deram depoimento 15 dos 57 presos que partilhavam a cela com Marcinho VP – encontrado numa lata de lixo na galeria A3, morto por estrangulamento. No laudo da necropsia, não havia marca de tiro ou faca. Todos negaram participação no crime.

Os três agentes de plantão disseram que não viram nada. Relataram que só saíram à procura do traficante a pedido do seu advogado, Ezequiel Costa, que estava no presídio. O secretário informou que Marcinho VP foi morto na hora do almoço, quando as celas são abertas.

Costa contou que seu cliente ?demonstrou preocupação? depois da publicação do livro de Barcellos. Ele temia pela segurança dos personagens. O advogado chegou a perguntar se o criminoso queria que ele entrasse na Justiça para pedir que a publicação fosse retirada de circulação. O traficante não quis. (Colaborou Clarissa Thomé)"

 

"Sua vida virou um livro aberto", copyright Folha de S. Paulo, 29/07/03

"Marcinho VP é morto na cadeia e a suspeita é de que tenha sido vingança por ter dado informações sobre facção em entrevistas

Condenado a 42 anos de prisão, o traficante Márcio Amaro de Oliveira, o Marcinho VP, 33 anos, foi encontrado morto por agentes penitenciários, dentro de uma lixeira, no presídio Bangu 3, onde cumpria a pena, no complexo penitenciário de Bangu, na tarde de ontem. O secretário de Administração Penitenciária, Astério Pereira dos Santos, suspeita que o crime esteja relacionado às informações que Marcinho VP forneceu em entrevistas para a publicação do livro Abusado, o Dono do Morro Dona Marta, do jornalista Caco Barcellos, lançado em maio. Marcinho VP foi um dos chefes do tráfico de drogas no Morro Dona Marta, em Botafogo, e era ligado à facção criminosa Comando Vermelho (CV).

?A publicação do livro é um indício para justificar o crime. Marcinho falou demais e deu muitos detalhes sobre a organização criminosa?, avaliou Astério. No livro, a preocupação de Marcinho VP com os chefões do CV foi relatada em cartas. Numa delas, ele escreveu a Isaías Costa Rodrigues, Isaías do Borel, a quem ele chama de ?presidente?, pedindo desculpas por ter cortado a comunicação com os chefões. O traficante Ronaldo Pinto Soares e Silva, conhecido como Ronaldo Tabajara, 35, é suspeito de estar envolvido no assassinato.

Marcinho VP foi morto por asfixia mecânica

Os agentes encontraram o corpo de Marcinho VP por volta das 16h. Segundo o secretário, ele foi assassinado entre 13h e 16h. Marcinho VP foi morto dentro da cela A-3, ocupada por outros 56 internos, e depois foi levado para a lixeira. A busca pelo traficante começou depois da chegada de seu advogado Ezequiel Costa. Sem vestígios de ter sofrido agressão, a polícia acredita que o traficante tenha sido morto por asfixia mecânica (sufocado ou estrangulado). De acordo com Astério, Marcinho VP não havia reclamado de estar sofrendo ameaças e nunca pediu ?seguro?, ou seja, isolamento para impedir que sofresse atentados.

A Secretaria de Segurança determinou a abertura de sindicância para apurar as circunstâncias do crime. Outro procedimento também foi aberto pela Secretaria de Administração Penitenciária, que investigará se houve participação de agentes no assassinato. Mas, para o presidente do Conselho da Comunidade, Marcelo Freixo, responsável pela fiscalização do sistema penitenciário, a morte de Marcinho VP é reflexo da falta de infra-estrutura nos presídios. ?É um total descaso do estado, pois há falta de agentes e de capacitação dos profissionais. Isso gera a freqüente violência nas unidades?, analisou Freixo. Só em Bangu 3 há 793 internos.

Marcinho terminaria sua pena dia 23 de abril de 2042. Ele foi condenado pela Justiça duas vezes. Uma por tráfico de drogas, a 17 anos de prisão, e outra por tráfico e associação para fins de tráfico, que acrescentou mais 25 anos a sua ficha criminal."