Por décadas, políticos e fabricantes de armas lucraram com a rixa entre os vizinhos Grécia e Turquia. Agora, produtores de TV também tiram proveito da inimizade, noticia Sibel Utku Bila [AFP, 30/10/06]. O reality show Survivor: Turkey vs. Greece, transmitido em ambos os países desde setembro, oferece US$ 315 mil para o participante que ‘sobreviver’ ao conflito entre um time grego e um turco brigando entre si em condições primitivas em uma ilha nos arredores do Panamá. O programa ironiza uma recente onda de iniciativas de aproximar os dois países depois de eles quase terem iniciado um conflito em 1995 por uma ilha não-habitada no mar Egeu.
Opiniões divergentes
Alguns críticos que aprovaram o reality show sugerem que a produção de um programa de entretenimento com este tema pode ser um sinal, embora irônico, do nível de reaproximação que os dois países atingiram.
Já os contrários ao programa, incluindo o primeiro-ministro turco Recep Tayyip Erdogan, afirmam que política não é piada. A Associação Turca de Direitos Humanos emitiu um apelo para ‘o fim de programas racistas’. A colunista Popi Diamantakou, do diário grego Ta Nea, disse que o programa ‘trata o ódio nacional em relação aos nossos vizinhos como um produto comercial’.
Discurso nacionalista
Os dois times, que começaram com 10 pessoas cada, têm alguns componentes mais nacionalistas, mas o tom do discurso já ficou menos extremista do que era no início. ‘Não me importo se um grego morrer aqui’, teria dito em um dos primeiros episódios um participante turco, rebatendo a afirmação de outro que dizia que os gregos já estavam ganhando por um a zero – em referência à guerra que os turcos venceram ao invadir o Exército grego em 1923, sob a liderança do herói Mustafá Kemal Ataturk, fundador da Turquia moderna. ‘Se um turco ganhar, ele vai se tornar o segundo Ataturk. Se um grego perder, ele não irá para casa de tanta vergonha’, afirmou um participante da equipe turca.
De acordo com o crítico de TV turco Yuksel Aytug, tal extremismo não é saudável. ‘A transformação dos sentimentos nacionalistas em índices de TV e lucro com publicidade é perigosa’, avalia. ‘Seria muito otimismo acreditar que as pessoas vão ver o programa simplesmente como uma caricatura da inimizade turca e grega. O programa pode diminuir esforços de construir amizade e confiança entre os dois países’.
Para o produtor do reality show, o turco Acun Ilicali, ele reflete os sentimentos genuínos das duas nações e demonstra que a tão esperada aproximação entre gregos e turcos é apenas ‘um conto de fadas’. ‘Este é o reality show mais real que já fizemos’, afirma. Ilicali defende que o programa ajuda a diminuir os preconceitos, na medida em que os rivais passam a conhecer melhor uns aos outros. E talvez se conheçam tão bem que, até dezembro, quando o programa terminar, os telespectadores possam vir a testemunhar um romance entre um participante grego e outro turco, sugere o produtor.