MÍDIA & GOVERNO
Chico Bruno (*)
Domingo, cinco da madrugada, o dia já clareando, micro ligado e tem inicio a leitura dos jornais. Por ser o mais antigo do país, o primeiro a ser acessado é o Correio Braziliense. Na editoria de política, lá está uma matéria sobre o aparelhamento do Estado pelo PT e seus aliados, causando mal-estar aos servidores públicos. É um assunto novo, a demissão conjunta de renomados cientistas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O problema é muito parecido com o do Instituto Nacional do Câncer, na semana retrasada. Incompatibilidade com novos dirigentes indicados pelo governo Lula.
Terminada a leitura do Correio, o acesso seguinte é a Folha de S.Paulo. O matutino dos Frias também trata do assunto da moda, com direito a manchete na capa: o loteamento político dos cargos de confiança. O noticiário é reforçado por artigos do Janio de Freitas, Elio Gaspari e Josias de Souza sobre o assunto.
Próxima parada, O Globo. No jornal carioca, embrião das Organizações Globo, o assunto merece grande destaque: é a manchetona da primeira página. A matéria, que ocupa mais de uma página, tem até infográfico sobre a repartição de cargos de confiança nos estados de algumas repartições públicas federais entre o PT e seus aliados antigos e recentes. O Globo traça paralelos entre o hábito nacional e outros países, como Argentina, Estados Unidos e Inglaterra.
A leitura seguinte, o Estadão, também traz volumoso material sobre o loteamento dos cargos pelo governo Lula da Silva. A matéria produz a manchete de primeira página da edição de domingo. A editoria de política do jornal dos Mesquita se esmerou nas pautas: buscou detalhes que os concorrentes deixaram passar. Em seguida, o JB. O assunto é tratado apenas por Augusto Nunes em sua coluna domingueira.
Do Oiapoque ao Chuí, o assunto do loteamento político dos cargos de confiança está em pauta. Em alguns com maior ênfase, em outros em menor escala. Mas em todos está presente.
Capacidade
O aparelhamento da máquina burocrática por quem está no poder não é uma novidade. Existe desde que o Brasil foi descoberto. Aliás, não é privilégio brasileiro, existe em todo o mundo. Pelo simples fato de que quem chega ao poder vai governar com seus quadros técnicos ? e não com os dos adversários. Será que queriam que o PT governasse com quadros técnicos do PFL ou do PSDB? Imaginem Bush governando com democratas, Blair com os conservadores ingleses, Berlusconi com socialistas e comunistas italianos ou Durão Barroso tocando Portugal com assessores socialistas… Seria um verdadeiro samba do crioulo doido. Mas o assunto rende pautas e mais pautas sempre que há troca de comando no poder. A oposição ao vencedor sempre se encarrega de municiar a imprensa com dados sobre o assunto. O PT o fazia quando era oposição, hoje o fornecedor de dados é o PFL, o PSDB e o PT histórico.
Hoje, a imprensa tenta justificar essas pautas utilizando como mote, justamente, o fato de o PT ter sido um critico dessa prática quando na oposição. Mas a justificativa não é plausível, pois a imprensa sabe, de cor e salteado, que as administrações petistas, estaduais e municipais, que antecederam a vitória de Lula sempre nomearam seus militantes e os dos aliados para governar com quadros de sua estrita confiança, como convém aos que assumem o poder. Portanto, não há novidade nessas pautas.
O que acontece é que a mídia brasileira tem pauta fixa em toda troca de guarda. O correto seria tratar o assunto sob o ponto de vista técnico. Ou melhor, explicar se os nomeados têm ou não capacidade para ocupar tais cargos. Esse é o tratamento correto que o assunto requer, e que infelizmente mereceu pouca atenção.
(*) Jornalista