KENNEDY vs. JANIO
"Leviandade na imprensa", copyright Folha Online (www.folha.com.br/Pensata), 22/08/03
"Com o perdão dos leitores e até por respeito a eles, não pode ficar sem resposta um artigo que o sr. Janio de Freitas publicou hoje (sexta-feira 22/08) na página A-5 da Folha. Com a habitual mescla de desinformação e leviandade, atacou os jornalistas que tomaram café da manhã com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quarta-feira. Este repórter estava no grupo e repele com indignação e veemência a acusação de que o encontro tenha sido um ?avanço sobre atribuições implícitas na liberdade de imprensa?.
O sr. Freitas questionou a qualificação dos entrevistadores, com ressalvas para fingir que não generalizou. Disse que a Presidência escolheu jornalistas a dedo, desconsiderando ?critérios de chefes de reportagem, de editores e de diretores?. Não teve coragem de fazê-lo diretamente, mas insinuou que jornalistas foram chamados para facilitar a vida de Lula e comparou a entrevista a um ?encontro social?.
Este jornalista não possui procuração para defender os demais entrevistadores, mas toma a liberdade de dizer que nenhum deles teve comportamento diferente de um profissional que procura fazer seu trabalho de forma honesta. Tampouco Lula se comportou como um político disposto a enganar jornalistas. O presidente não fugiu dos principais questionamentos.
O sr. Freitas, porém, fez insinuações e acusações covardes, que chegaram ao cúmulo de criticar o fato de a entrevista não ter sido gravada, como se isso ferisse a ética ou a liberdade de imprensa.
Desde o início do ano, a direção da Folha sabe do pedido deste jornalista para conversar com o presidente. Na semana passada, a direção foi informada do convite da Presidência. Não houve óbice nem questionamento à qualificação do repórter para comparecer à entrevista. Não será o sr. Freitas, que costuma enxovalhar a honra alheia para posar de juiz do jornalismo e da ética, que irá fazê-lo.
Este repórter tem uma modesta carreira que lhe permite andar de cabeça erguida e olhar os filhos e entes queridos nos olhos. Em 13 anos de profissão e com orgulho, trabalha na Folha pela terceira vez. No último período, que já completa oito anos, foi repórter de polícia, editor de uma coluna de bastidores de política e enviado especial a duas guerras (Kosovo e Afeganistão). Desde setembro de 2000, é repórter especial em Brasília.
Este jornalista foi assessor de imprensa de Luiz Inácio Lula da Silva na campanha eleitoral de 1994 e no primeiro semestre de 1995, fatos registrados na Carteira de Trabalho e do quais se orgulha, entre outros motivos, pela convivência com pessoas sérias."
"A terceira reforma", copyright Folha de S. Paulo, 22/08/03
"Enquanto não lhe ocorrem mudanças mais próximas dos compromissos de seus dirigentes com o eleitorado, nem por isso o governo fica imóvel. Já avançada a desreforma previdenciária e encaminhada a anti-reforma tributária, a Presidência deu mais um passo para reformar os históricos e universais métodos do jornalismo.
Há uns dois meses, diante das críticas à recusa de Luiz Inácio Lula da Silva a dirigir a palavra aos repórteres brasileiros, seu braço direito (em outros tempos era o esquerdo) Luiz Gushiken fez a concessão de admitir que era conveniente algum contato presidencial direto. Veio, então, o primeiro passo da reforma: foi inventada a entrevista sem perguntas, que estavam proibidas. O presidente fez aos repórteres uma espécie de show exclusivo, com uma peroração em tudo igual às de todos os dias, onde lhe seja oferecida oportunidade. Ou a oportunidade de criar uma oportunidade para mais um evento típico de candidato.
Por algum motivo indefinido, mas presumivelmente ligado a desejos de retribuição, no final de semana passado apareciam duas entrevistas de Lula, uma à TV Globo e outra a ?Veja?. As duas exclusividades, propostas pela própria Presidência, pegaram mal nos numerosos jornais, TVs, rádios e revistas ostensivamente repelidos. Assim, a título de reparo, surgiu a ocasião para um duplo avanço mudancista.
Repórteres de variadas Redações estiveram à mesa para um misto de café da manhã e entrevista com o presidente. Dois jornalistas de cada Redação convidada. Mas não escalados, como sempre, segundo critérios de chefes de reportagem, editores ou diretores. Se não em todos, e tudo indica que sim, houve casos em que a própria Presidência se atribuiu aquela responsabilidade, designando quem deveria estar presente. Não há o que ressalvar a respeito de escolhas. Trata-se de observar o importante avanço. Avanço sobre atribuições implícitas na liberdade de imprensa. Uma atividade jornalística não se confunde com um encontro social.
O segundo passo não foi menos interessante: proibido o uso de gravador. E, diante de cada jornalista, a conveniente profusão de pratos, copos, xícaras e talheres, entre os quais alguns insistiram em alojar seu bloco de anotações.
Bush, imagina-se, ficaria muito surpreso se, no meio de uma de suas entrevistas diárias, fosse informado de que mesmo ele tem uma liçãozinha de comportamento democrático a dar a alguém."