JORNALISTAS ENGAJADOS
“Jornalismo e ética”, copyright Direto da Redação in Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 8/09/03
“Pode ser ético para um jornalista brasileiro aceitar um emprego ?engajado?, ou como dizem os nossos irmãos do Norte, ?embedded?? A expressão americana popularizada no recente caso da invasão do Iraque, neste caso, se adaptaria ao ?encaixe? do jornalista não dentro de uma tropa em missão bélica, mas ao seu ?encaixe? dentro de um partido político. O que acontece com a liberdade de expressão e com a credibilidade de um jornalista – um ?asset? que não pode, jamais, ser abandonado – quando ele/ela aceita, por exemplo, atuar como jornalista em propagandas de um partido político específico?
A questão se torna ainda mais relevante depois que notícias dão conta de uma enormidade de dinheiro público gasto com matérias pagas publicadas em jornais no Paraná do Governo Lerner, aparentemente sem o devido ?disclaimer? por parte das publicações envolvidas. É preciso deixar claro que a matéria paga é um recurso jornalístico antigo e perfeitamente válido. Mas é igualmente antiga a prática – ética – de a publicação anunciar, bem explicitamente para o leitor, que determinado texto é uma matéria paga e não faz parte do material apurado por seus jornalistas, ainda que o seu visual possa assumir um formato que lembre uma notícia de jornal.
Voltando à vaca fria… É profissional para um jornalista aceitar 5 mil reais – ou 10 mil, 20 ou 50 mil, não importa – para colocar seu rosto no vídeo e fazer programas de TV para, digamos, o PT – num enorme esquema de marketing montado por Duda Mendonça, que acabou de arrebatar em concorrência pública a fatia do leão da publicidade governamental? Estaria ele/ela, ainda assim, demonstrando coerência, mantendo sua inestimável independência de opinião em suas colunas de jornal e internet? Será que o leitor/telespectador, em sua poltrona, vai saber diferenciar e administrar o conflito existente a partir do que ele leu no jornal ou na revista e está vendo na TV (ou ouvindo no rádio), quando as duas posturas claramente conflitantes podem estar partindo de um único profissional?
Eu, pessoalmente, acho impossível separar o joio do trigo, nesse caso. Acho que o jornalista perde a sua coerência. Imagine o leitor se um Elio Gaspari, por exemplo, com sua atitude notadamente independente (e muitas vezes acidamente crítica) em relação ao governo FHC, explicitada em inúmeros artigos, em diversos jornais, aceitasse um convite do marketeiro do mesmo FHC para fazer matérias para a TV – e pagas pelo governo, como propaganda – exaltando as realizações daquele mesmo governo que ele tanto criticava. Como acreditar em sua coluna, chamando FHC de FFHH, se você acabou de vê-lo na televisão bancando o garoto propaganda para o mesmo governo – ou, pior ainda, se fica sabendo que ele atua nos bastidores, redigindo textos para o governo que ele tanto critica? A credibilidade dele, sem dúvida, iria para o lixo num átimo.
É possível que o dinheiro acabe falando mais alto para alguns jornalistas, que deixam empregos estabelecidos em jornais e emissoras para se dedicar a uma determinada campanha política, e depois voltam a suas atividades originais. Desde que não haja o acúmulo de funções redação/campanha ou redação/propaganda, tudo bem, apesar de o profissional em questão estar revelando publicamente sua preferência política – o que, no fim das contas, pode deixá-lo rotulado disso ou daquilo, num processo de queimação lento, mas inexorável.
Tudo isso aí me leva a outra questão ética, que precisa ser refletida igualmente por jornalistas, políticos e seus partidos, e respondida com cuidado por cada um dos potencialmente envolvidos: se o partido político não consegue um profissional de peso do Jornalismo para atuar no vídeo ?fazendo escada? para seus líderes, e validando suas posturas partidárias – justamente porque um profissional sério não aceitaria perder sua condição de independência e coerência – seria eticamente justificável contratar algum estagiário de jornalismo, ou algum ator desconhecido que faça as vezes de um repórter para, com sua atuação, emporcalhar, de certa forma, toda a classe jornalística ao apresentar à opinião pública um ?profissional? que não respeita os preceitos basilares da profissão? Não existiria outro formato televisivo que não envolvesse (tão pejorativamente, a meu ver) a figura do jornalista, neste caso?
Pensar, marketeiros, pensar…
(*) Âncora, repórter e editor. Trabalhou na Rede Globo, Radiobrás, Voz da América, Rede Manchete, Radio JB e CBS Brasil. Foi correspondente na Casa Branca durante vários anos. Vive e trabalha atualmente em Brasília. É colunista do site Direto da Redação.”
“Paisagem desoladora”, copyright No Mínimo (http://nominimo.ibest.com.br), 7/09/03
“O jornalista inglês Paul Johnson conseguiu seus dez minutos de notoriedade na imprensa brasileira, dez anos atrás, por ter resolvido estabelecer o que deve e o que não deve virar notícia. ?Libere-se aquilo que é do interesse público e evite-se aquilo que é apenas do interesse do público?, decretou Johnson. Desde Gutemberg, milhares de profissionais da imprensa consumiram montanhas de neurônios na tentativa de localizar a fronteira que Johnson pretende ter demarcado com uma singela preposição. Interesse público seria uma coisa. Interesse do público seria outra, bem diferente. E estamos conversados.
A frase produzida por Johnson, autor de um ensaio destinado a apontar os sete pecados capitais do jornalismo, de vez em quando volta a ser recitada. Mas não passa de um bom jogo de palavras. É também uma perfeita cretinice. Como saber com nitidez o que é de interesse público e o que é apenas do interesse do público? Nosso inventivo inglês não explica de que modo definir isto ou aquilo, esperteza que torna a frase tão inteligível quanto um samba-enredo de escola do Grupo II.
Tome-se como exemplo a extraordinária conversa telefônica entre o príncipe Charles e sua amante Camilla Parker-Bowles, durante a qual foi revelado um desconcertante projeto de vida: em vez de herdeiro do trono da Inglaterra, o fogoso Charles gostaria de ser um Tampax. Ao divulgar apimentados trechos do diálogo, a imprensa iluminou uma face insuspeitada do príncipe. Mostrou, digamos, que o futuro rei estava nu (embora vestisse pijamas enquanto se derramava ao telefone). E os leitores passaram a conhecer melhor o homem que um dia poderá influenciar fortemente os rumos da nação.
A reprodução da conversa entre Charles e Camilla seria assunto de interesse público ou apenas de interesse do público? Deixemos de lado tanto a preposição de Johnson quanto o farisaísmo que costuma irromper quando se discute como a imprensa deve tratar episódios do gênero. Conhecer a vida privada de um homem público é freqüentemente a única forma de compreender seus gestos e adivinhar-lhe os passos seguintes. Se o Brasil tivesse conhecido a tempo certas preferências de Fernando Collor, por exemplo, acabaria poupado de um feio capítulo da história republicana.
Sobram jornalistas profissionais, mas não será difícil fazer o recenseamento dos efetivamente brilhantes. Sobretudo se tratarmos de identificá-los pelo critério exclusivo da forma: poucos tratam a língua portuguesa com o merecido carinho. A maioria escreve espantosamente mal. Ressalve-se que os salários oferecidos pelas redações não tão generosos, circunstância que ajuda a desviar para profissões mais sedutoras gente que sabe lidar com palavras. Admitamos que a destruição do sistema de ensino básico, concluída com disciplina militar pelo período ditatorial, reduziu o ensino brasileiro a uma linha de produção de semi-alfabetizados. Sempre será necessário acrescentar, a esse quadro de horrores, a negligência corporativista dos profissionais de imprensa, cujos efeitos perversos se manifestam em quase todas as redações. Temos sido cúmplices indesculpáveis da incompetência.
Os jornalistas brasileiros deste fim de século, por exemplo, lêem pouco (e lêem mal). Como quem não sabe ler jamais saberá escrever, jornais e revistas costumam despejar sobre os leitores textos lastimavelmente toscos, às vezes desprovidos de raciocínio lógico. E seguimos ouvindo, em defesa dos responsáveis por pequenos e grandes assassinatos do idioma, um argumento tão farisaico quanto a ?legítima defesa da honra? invocada no julgamento de crimes passionais: ?Ele não sabe escrever, mas apura bem?. Não seria má idéia transferi-los todos para a polícia, que anda carente de bons detetives.
Jornalistas devem contemplar qualquer fato, qualquer tema, qualquer versão com olhar sempre crítico, virtude que não se pode confundir com o pecado do ressentimento. Nas redações do Primeiro Mundo, tal observação soaria dispensável, quase acaciana. No Brasil, lastimavelmente, ainda é necessário repeti-la à exaustão, com recomendações a jovens repórteres para que tratem de decorá-la.
Talvez não fosse má idéia recomendar-lhes, também, que copiem 20, 30, 40 vezes uma sensata advertência produzida há poucos anos pelo ombudsman da Folha de S. Paulo: ser independente não significa ser contra todo mundo. Sim, a paisagem brasileira parece convidar os jornalistas a transformar-se em profissionais da denúncia, em caçadores de bandalheiras, em correios de más notícias. Em qualquer país e em qualquer tempo, contudo, sempre haverá homens decentes, episódios positivamente exemplares e boas novas. Até no Brasil.”
TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO
“Países de língua portuguesa criam portal na internet”, copyright O Estado de S. Paulo, 6/09/03
“Brasil, Portugal, Moçambique, Cabo Verde, Angola e Timor criaram um portal de internet para compartilhar dados, estudos, artigos e documentos sobre tecnologias de informação nos países de língua portuguesa. O Observatório da Sociedade da Informação (http://osi.unesco.org.br), desenvolvido pela Unesco no Brasil e lançado anteontem, tem a tarefa de estimular debates sobre o acesso universal às novas tecnologias, que podem reduzir diferenças sociais. ?Estamos tratando da democratização mundial?, definiu o embaixador português Antonio Canastreiro Franco.
O portal dos seis países permitirá articular propostas conjuntas para a 1.? Cúpula Mundial da Sociedade da Informação, marcada para dezembro, em Genebra (Suíça). ?Pela primeira vez, estamos garantindo conteúdo em português para estimular o debate entre países?, disse Jorge Werthein, representante da Unesco no Brasil. ?Com o Observatório, faremos mais pessoas participarem dessas discussões e não apenas os pequenos grupos que cada país cria para essas cúpulas?, ressaltou Maria Inês Bastos, coordenadora de Comunicação e Informação da entidade.
O portal, estruturado com software de código aberto, foi desenvolvido entre março e julho. O Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) vai bancar o custo para a manutenção da base de dados. A Unesco cobriu o restante do valor direto de criação do portal (US$ 7.500). O lançamento do portal foi transmitido com exclusividade, via web, para o Grupo Estado.”