SEMINÁRIO DA ABRAJI
Luís Eblak (*)
Não estamos mais nos anos 60 e 70. Portanto não vigora o regime de exceção imposto por generais autoritários. A leitura de dois casos recentes ocorridos em nossa imprensa sugere, porém, que nossa época deva ser outra, não a democrática. Diferentes governos deste Brasil têm dificultado ? ou simplesmente negado ? o acesso de jornalistas a informações públicas. Como escrevi neste Observatório [em 2/9/03, remissão abaixo], vivemos um período de jornalismo controlado. Se ninguém gritar, pode virar moda.
Em agosto passado, a Folha de S. Paulo só conseguiu publicar uma reportagem mostrando suspeitas sobre os contratos de obras comandadas pelo ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho após recorrer à Justiça. A sucursal carioca do jornal pediu à administração estadual a documentação referente ao caso. Como não foi atendida, protocolou em órgão do governo, com base no direito de acesso a documentos públicos, previsto na Constituição, ofício em que reiterava o interesse de ler os contratos. Sem sucesso, a Folha recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio. Antes da decisão final de algum desembargador, a Secretaria Estadual de Segurança Pública forneceu os processos solicitados.
Resultado: entre outros fatos apresentados, a equipe de reportagem mostrou que o governo fluminense havia realizado uma obra ? o da Casa de Custódia Japeri, na Baixada Fluminense ? sem licitação. A administração pública alegou que era emergencial a situação carcerária da região. Só que a obra estava concluída desde maio e a casa de custódia continuava vazia em agosto, de acordo com o jornal.
Direito constitucional
Um outro caso envolve governos de partidos rivais. Antes de deixar o Palácio do Planalto, Fernando Henrique Cardoso editou o decreto 4.553, que ampliou os limites de todas as categorias de documentos sigilosos (reservado, confidencial, secreto e ultra-secreto), criando o prazo de 50 anos prorrogáveis até a eternidade. Ou seja, documentos relativos ao governo que se encaixem nessas categorias não poderão ser consultados por jornalistas ou por qualquer outra pessoa, caso o presidente assim deseje.
Apesar das pressões contrárias ao decreto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve o "sigilo eterno" a esses documentos, segundo relatou reportagem da Folha de S. Paulo em 20/4/02.
É exatamente nesse contexto que ocorrerá no dias 29 e 30 de setembro, em Brasília, um seminário sobre acesso a informações públicas. Será uma oportunidade para quem está preocupado com esse controle. Ali se discutirão formas de a imprensa evitar as restrições impostas ao seu trabalho.
"Não havia consciência entre os jornalistas de que isso [o acesso a informações públicas] é um direito constitucional. Ao contrário. Fomos criados (a minha geração, a dos anos 70, que começou a trabalhar na ditadura) com a idéia de que tínhamos de nos virar, que não podíamos ficar mendigando ?favores?", afirma Marcelo Beraba, diretor da sucursal da Folha de S.Paulo no Rio de Janeiro e presidente da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), organizadora do seminário.
Segundo Beraba, o objetivo do evento é levar a questão do acesso de informações públicas a entidades não-jornalísticas, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB ). Afinal o assunto é, diz ele, de interesse de toda a sociedade, não apenas de jornalistas.
(*) Jornalista