GUGU FORA DO AR
“Em depoimento, Gugu responsabiliza o SBT”, copyright Folha de S. Paulo, 26/09/03
“A polícia informou ontem que o apresentador de TV Gugu Liberato disse, em depoimento, que é apenas funcionário do SBT e que a responsabilidade sobre o conteúdo veiculado no programa é da emissora.
Gugu foi o último a ser ouvido no inquérito do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), encerrado ontem, que concluiu que foi uma farsa a entrevista veiculada no programa ?Domingo Legal?, onde dois supostos integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital) aparecem ameaçando autoridades e artistas.
Segundo o delegado Alberto Pereira Matheus, Gugu admitiu que pedira à produção do programa a realização de uma reportagem sobre ameaças do PCC ao padre Marcelo. Mas negou ter visto a gravação antes da exibição.
Segundo o promotor Márcio Christino, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), Gugu chegou a dizer que não concordaria com a veiculação se tivesse visto a reportagem, que classificou como um ?absurdo?.
?Quem monta o programa é a emissora. Gugu apenas apresenta?, reforçou o advogado do apresentador, Adriano Salles Vanni. O advogado, no entanto, afirmou que Gugu não culpou o SBT nem sua equipe. ?Ele disse que sua equipe é muito competente e que só pode acreditar que ela tenha sido enganada.?
Gugu foi o único envolvido a não ser indiciado pela polícia. Uma liminar concedida pela Justiça impediu que ele fosse responsabilizado formalmente nessa fase da investigação.
O repórter Wagner Maffezzoli e o produtor Rogério Casagrande, do ?Domingo Legal?, porém, foram indiciados pela polícia no artigo 16 da Lei de Imprensa -publicar ou divulgar notícias falsas ou fatos verdadeiros truncados ou deturpados.
Hamilton Tadeu dos Santos, o Barney, contratado para produzir a reportagem, e os atores Wagner Faustino, o Alfa, e Antonio Rodrigues da Silva, o Beta -que aparecem encapuzados dizendo-se integrantes do PCC- foram indiciados por apologia ao crime.
Para o promotor, as declarações de Gugu, mesmo que sejam verdadeiras, não o redimem da responsabilidade de ter veiculado a reportagem. ?A conduta criminosa [prevista no artigo 16] é exibir. Gugu comandava o programa, portanto, também é responsável?, disse o promotor.
O apresentador não deve nem responder processo na Justiça. O caso dele se enquadra na lei 9.099 -o acusado primário que cometer crime leve terá o processo extinto se concordar em pagar uma sanção, que pode ser valor ou serviço à comunidade. O caso irá para Osasco, por ser a sede do SBT.
Gugu evitou a imprensa. Entrou por uma porta lateral do Deic.
O SBT informou que não iria se pronunciar sobre o caso.”
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“Polícia alerta sobre represália do PCC”, copyright Folha de S. Paulo, 26/09/03
“Todos os envolvidos na falsa entrevista veiculada no programa ?Domingo Legal?, inclusive o apresentador Gugu Liberato, foram alertados pela polícia, durante os depoimentos, de que podem sofrer represálias do PCC.
Segundo o delegado Alberto Pereira Matheus, grampos telefônicos mostraram que membros da cúpula da facção ficaram descontentes a exposição do PCC no caso e prometem represálias.
Na entrevista, um dos fatos que mais revoltou a facção foi a ameaça, atribuída ao PCC, ao vice-prefeito de São Paulo, Hélio Bicudo. Liderança no movimento de direitos humanos, Bicudo é respeitado pelos presos e pela facção.
Barney
A polícia também informou ontem que iria pedir a prisão preventiva do produtor Hamilton Tadeu dos Santos, o Barney, por supostamente ter ameaçado uma das testemunhas da investigação.
Segundo a polícia, Barney fez ameaças de morte, por telefone, ao ator Carlos Borges, para que ele não testemunhasse no inquérito que apurou o caso. Borges, que trabalha em pegadinhas, disse à polícia que foi convidado a participar da farsa pelo próprio Barney, mas recusou.
Barney já tem passagem por porte ilegal de arma e lesão corporal, segundo Matheus. Ele e os atores Wagner Faustino da Silva, com passagem por roubo e tráfico de drogas, e Antônio Rodrigues da Silva, por receptação de material roubado, não vão poder se beneficiar da lei 9.099, segundo o Ministério Público, pois não são réus primários.
O produtor disse à polícia que a direção do programa sabia da fraude e negou ter ameaçado a testemunha.”
“Repórter e produtor também são indiciados”, copyright Folha de S. Paulo, 25/09/03
“O repórter Wagner Maffezoli e o produtor Rogério Casagrande, do programa ?Domingo Legal?, foram indiciados ontem pela polícia no artigo 16 da Lei de Imprensa. O artigo prevê punição para quem publicar ou divulgar notícias falsas ou fatos verdadeiros truncados ou deturpados.
Segundo o promotor Márcio Chistino, que acompanha o caso, se condenados, eles podem pegar até um ano de prisão.
Maffezoli e Casagrande prestaram depoimento ontem e, segundo a polícia, disseram que não sabiam que a matéria era uma farsa.
Os dois disseram que contrataram o produtor Hamilton Tadeu dos Santos, o Barney, para produzir a matéria. Barney e os atores Wagner Faustino da Silva, o Alfa, e Antônio Rodrigues da Silva, o Beta -que aparecem encapuzados na entrevista e disseram ser do PCC- foram indiciados apor apologia ao crime.
O advogado Adriano Salles Vanni, que defende Gugu Liberato, conseguiu ontem evitar que o apresentador fosse indiciado em inquérito policial antes de depor. Gugu será ouvido hoje no Deic.
O apresentador foi beneficiado por uma liminar. No entanto, a decisão não garante que ele não seja indiciado posteriormente.
O advogado disse que Gugu pode ter sido negligente por não conhecer o conteúdo da matéria.
?Pode ter sido um erro, pode ter sido uma negligência dele não ter visto antes de ir ao ar. Agora ele tem uma equipe, ele tem que ver tudo? A rigor, teria. Então pode ser uma negligência, pode ter acontecido uma falha.?”
“?Domingo Legal? já vinha sendo advertido por ONG”, copyright O Estado de S. Paulo, 25/09/03
“A psicanalista infantil Ana Cristina Olmos, presidente da ONG Tver e membro da Comissão de Acompanhamento da Programação de Rádio e Televisão da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, acha que a deslizada monumental de Gugu Liberato no Domingo Legal foi conseqüência da falta de limites com que a TV tem sido premiada. Ela apóia a punição sofrida pelo programa por dar voz a bandidos (farsantes ou não) e considera a campanha ?contra a censura a Gugu? uma estratégia das redes para atrapalhar qualquer tentativa de instituir um código de ética.
Estado – O ?Domingo Legal? tornou-se caso de polícia depois da entrevista com falsos elementos do PCC. A senhora acha que o programa mereceu a punição?
Ana Cristina Olmos – Claro que mereceu. Nós, da Tver, tentamos de tudo para conversar com a direção do SBT sobre o conteúdo da programação e, em especial, sobre o Domingo Legal. O pessoal da produção nos pediu uma trégua e fizemos um acordo. Eles se comprometeram a alterar o programa e nós, a tirar o foco do site www.eticanatv.org.br de cima do Gugu, que liderava o ranking da baixaria. Assim o site passou a citar os primeiros lugares, que também inclui João Kleber e Márcia Goldschmidt. Continuamos analisando os programas. Notamos que houve uma tentativa de mudança, mas foi uma mudança plástica. Entregamos essa análise ao SBT e marcamos um almoço com a direção em agosto, mas foi desmarcado.
Estado – Mesmo assim, o programa exagerou…
Ana Olmos – Como não existe um código de ética, o programa passou de qualquer limite. Essa punição veio atrasada.
Estado – Discutiu-se muito se Gugu sabia ou não da armação. Isso importa?
Ana Olmos – A questão da farsa é secundária. O grave é que, em plena tarde de domingo, crianças e adolescentes foram expostos à voz e à força da criminalidade. Deu-se vez ao ponto de vista do criminoso. Para o jovem e a criança, esse exemplo funciona de duas maneiras: ou ele se identifica com o agressor ou com o agredido. No primeiro caso, ele toma para si o modelo que dissemina a lei do mais forte e o poder da arma. O que se identifica com o agredido morre de medo porque constata que não há lei. A ?farsa? ganhou destaque porque deu audiência para programas que têm a mesma linha, que exploram a miséria humana.
Estado – Como a senhora avalia a repercussão do caso em outros programas da TV?
Ana Olmos – Os membros da Tver acompanharam todos esses programas. Semana passada, o Marcelo Rezende (Rede TV!) entrevistou por celular um integrante dessa organização criminosa para repercutir a farsa do Gugu. Como é que um programa fala com um preso pelo celular?
Estado – Qual a motivação para a montagem desses shows de horror?
Ana Olmos – A ganância das emissoras fez com que se perdesse qualquer respeito pela concessão pública, TV virou um negócio comercial e os telespectadores, meros consumidores. A diferença é que ele não tem qualquer proteção da lei.
Estado – A punição significa a volta da censura?
Ana Olmos – De jeito algum. Punição não é censura e nem cerceamento à liberdade de expressão. Gugu responde por um ato de afronta que cometeu contra os espectadores. A violência existe, o problema é que ela foi apresentada a jovens e crianças especialmente como uma coisa vencedora, acima da lei. Os ?criminosos? mereceram todo respeito do entrevistador. Essa história de levantar bandeira contra a censura é mais uma estratégia das emissoras para não haver um código de ética. A juíza agiu certo ao suspender o programa, porque a única maneira de punir é colocar a mão no bolso da emissora. Fora do ar, o anunciante não paga a conta.”
“Decisão de juíza abre discussão sobre lei”, copyright O Estado de S. Paulo, 25/09/03
“A decisão da juíza Leila Paiva, da 10.? Vara Cível Federal, de suspender o programa do SBT Domingo Legal, de Gugu Liberato, no último fim de semana, despertou uma discussão: trata-se ou não de censura? A juíza, que determinou a suspensão do programa e multa de R$ 100 mil em caso de desobediência do SBT, justificou a decisão com base no artigo 221 da Constituição, que prevê que a produção e a programação das emissoras de rádio e TV devem dar preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, bem como respeitar valores éticos e sociais.
Em nenhum momento a Justiça ou o Ministério Público cogitaram fazer uma avaliação prévia da pauta do Domingo Legal. A decisão foi uma punição à edição que já tinha ido ao ar. ?Houve delito, o programa infringiu dispositivos constitucionais e foi punido. De maneira nenhuma podemos caracterizar a decisão como censura?, diz o professor da Universidade de São Paulo (USP) Laurindo Leal Filho, integrante da Comissão de Acompanhamento da Programação de TV, que faz parte da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara Federal.
Leal destaca que concessionários de emissoras têm liberdade de colocar no ar o que querem, mas têm também a responsabilidade pública e obrigação de respeitar as leis e a ética. ?O programa rompeu com normas legais e éticas, por isso foi punido?, acredita. ?Essa discussão de censura não passa de manobra para desviar o assunto de seu foco principal e tirar a responsabilidade social da TV.?
Para o coordenador da Comissão de Direitos Humanos na Câmara, Orlando Fantazzini (PT-SP), faltam ao Brasil regras para disciplinar a programação da TV, como já existe em países da Europa.”