Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Costábile Nicoletta

VALOR À VENDA

“Mendonça de Barros confirma interesse no Valor”, copyright MMonline (www.mmonline.com.br), 25/09/03

“Ex-ministro das Comunicações afirma em entrevista a Meio & Mensagem que encabeça grupo de investidores que estuda a compra do jornal

O ex-ministro das Comunicações Luiz Carlos Mendonça de Barros, sócio do site e da revista Primeira Leitura, admitiu em entrevista que será publicada na próxima edição impressa de Meio & Mensagem que encabeça um grupo de investidores interessados em comprar o jornal Valor Econômico.

Segundo Mendonça de Barros, o banco contratado por esse grupo de investidores para avaliar a situação financeira do Valor entregou os relatórios na semana passada. ?Estamos avaliando a possibilidade de aquisição do jornal?, afirmou Mendonça de Barros.

?Prefiro que esse tipo de assunto seja comentado pelos acionistas da empresa?, disse o diretor-presidente do Valor, Nicolino Spina. O executivo confirmou que houve um corte ?ao redor de 20%? na redação do jornal nesta quinta-feira, dia 25. Com isso, o diário econômico passou a ter 105 jornalistas. Também estão previstas substituições de níveis gerenciais na área comercial.

O objetivo do corte, segundo Spina, é melhorar o resultado econômico do jornal, a fim de buscar níveis de rentabilidade que satisfaçam os acionistas. O controle acionário do Valor é dividido entre os grupos Folha e Globo.”

 

“Mendonça de Barros quer comprar Valor”, copyright Meio e Mensagem in Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 26/09/03

“O ex-ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, sócio do site e da revista Primeira Leitura, revelou, em uma entrevista, que lidera um grupo de investidores interessados em comprar o jornal Valor Econômico.

O grupo de investidores já teria recebido, inclusive, os relatórios do banco contratado por ele para avaliar a situação financeira do veículo.

O diretor-presidente do Valor Econômico, Nicolino Spina, preferiu não comentar o interesse do ex-ministro. Na última quinta-feira (25/09), houve um corte de 25% na folha de salários da redação. Substituições gerenciais na área comercial também estão previstas. As demissões, segundo Spina, servirão para melhorar os níveis de rentabilidade da empresa. Atualmente, os grupos Globo e Folha dividem o controle acionário do Valor.”

 

“Site não é seita”, copyright MM Online (www.mmonline.com.br), 29/09/03

No começo de 1999, logo após sair do governo Fernando Henrique Cardoso, em que foi presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros foi procurado por um grupo de jornalistas interessado em montar um jornal de economia e negócios. A conversa não evoluiu porque Mendonça de Barros se entusiasmara com o potencial da Web e os jornalistas ainda preferiam imprimir suas notícias em papel. O projeto de Internet do ex-ministro transformou-se no site Primeira Leitura e depois em uma revista homônima; o dos jornalistas, no Valor Econômico. Recentemente, o destino de Mendonça de Barros e daqueles profissionais se cruzou novamente. Ele foi procurado por alguns investidores que tinham interesse em comprar o diário e o queriam como sócio e executivo do jornal. “O banco de investimento incumbido de apresentar os relatórios financeiros do Valor os entregou há pouco mais de uma semana. Estamos avaliando a possibilidade de aquisição do jornal”, afirma Mendonça de Barros. O ex-ministro comenta nesta entrevista o que acha do capital estrangeiro na mídia, opina sobre o setor de telecomunicações e faz uma avaliação do governo Lula.

Meio & Mensagem – Como nasceu o Primeira Leitura?

Luiz Carlos Mendonça de Barros – A idéia do Primeira Leitura nasceu em 1999. Saí do governo de uma forma traumática, vivendo um momento complicado. Estava em casa, sem exercer nenhuma atividade profissional, e fui procurado por um grupo de jornalistas que tinha o projeto de criar um jornal econômico, que depois transformou-se no Valor. Eles estavam em busca de um empresário com estrutura de capital para desenvolver a idéia, e me procuraram num momento em que eu estava começando a me inteirar da Internet, desse novo universo. Fiquei muito entusiasmado com o potencial da Web em relação à opinião pública. Viajei muito para vender a Telebrás, e tomei conhecimento da Internet quando era ministro das Comunicações, antes do processo de privatização. Naquele período, conheci pessoas totalmente mergulhadas na questão. Logo após minha saída do governo, passei a estudar o assunto e fiquei interessado em saber quais seriam as novas fronteiras da imprensa quando a Internet passasse a ser um sistema de comunicação dominante na sociedade. Foi a conjugação de um fato externo, quando esses jornalistas me procuraram, com o meu interesse profissional em desenvolver um trabalho voltado para a Web. Lembro-me de quando disse a eles que era uma loucura começar um projeto de um jornal de economia e política em modelos tradicionais em meio a todas aquelas transformações, mas, se estivessem dispostos a adaptar a idéia original para um jornal na Internet, aí sim eu estaria disposto a discutir. Conversei também com o André Lara Rezende que, como eu, estava exilado do BNDES. Houve uma certa decepção quando condicionei meu interesse à adaptação do projeto para a Internet, e a partir daí começamos a trabalhar em cima do que seria um site de economia e política. Posteriormente, juntou-se ao grupo o Sidnei Basile (atualmente diretor da revista Exame), que na época trabalhava numa consultoria, e o primeiro desenho do site foi feito por ele, André e eu. Felipe D’Avila (hoje diretor da Editora Abril) foi convidado pelo André e também veio para o nosso grupo, juntamente com Reinaldo Azevedo, que era editor-chefe da revista Bravo.

M&M – Esse também era o projeto inicial da revista República?

Barros – Não, era a criação do site Primeira Leitura. Depois o Sidnei foi trabalhar na Exame e os jornalistas que tinham o projeto do Valor encontraram na Folha e no Globo interesse em desenvolver o jornal. Aquele grupo inicial, que tinha sido montado com base em uma série de motivações, se desfez, ficando o Felipe, o André, o Reinaldo e eu. Levamos uns sete meses para colocar no ar a primeira edição pública,em agosto de 2001.

M&M – Houve má interpretação por parte dos leitores de que o site seria um instrumento político, dada a sua ligação com o PSDB?

Barros – Desde o início o trabalho foi confundido com um site tucano, embora sempre tenhamos dito que éramos favoráveis ao jornalismo independente, mas com opinião. Como tínhamos uma linha política de análise, tanto econômica como política, próxima ao PSDB, a opinião pública vinculou o site ao partido. Estávamos cientes dessa limitação desde o começo, mas o único jeito era seguir em frente com a maior independência possível, e em 2002, com a candidatura de José Serra à Presidência da República, a tentativa de colocar o símbolo tucano no site ganhou um contorno ainda mais radical. Continuamos a fazer o nosso trabalho porque acreditávamos que, quando viesse o resultado das eleições, teríamos a chance de mostrar que o que vinham falando não era verdade. O Serra perdeu as eleições e o site permaneceu. Este ano de 2003 está sendo muito importante para nós por vários motivos. Talvez o principal seja a desmistificação desse rótulo, mostrando que pretendemos ter um espaço independente dentro da sociedade. Em paralelo, pensávamos em ter uma revista que aprofundasse algumas das matérias do site. Foi nesse momento que usamos a revista República para testar a idéia e saber se tínhamos condições de fazer a página e a revista simultaneamente. A idéia foi bem-aceita e, desde janeiro deste ano, transformamos a República na Primeira Leitura. A publicação contém matérias mais profundas e é possível carregá-la na pasta, um prazer que o computador ainda não conseguiu substituir. Conseguimos, enfim, desmistificar o site, que era tido como uma seita.

M&M – Que vantagens o jornalismo na Internet tem em relação aos meios tradicionais?

Barros – Por ser um instrumento eletrônico, a Internet tem uma capacidade incrível de recuperação de fatos passados e a integração com gráficos e outras combinações. Veja por exemplo a diferença entre a Bloomberg e outras agências de notícia como a Reuters. A Bloomberg domina totalmente esse mercado, porque criou um sistema de informação muito mais rico que as demais. Quando se assiste à Bloomberg, pode-se conjugar informações de três níveis e combiná-las com os mais variados gráficos. Daqui a pouco tempo teremos no Brasil o celular de terceira geração, e as pessoas ficarão informadas dos acontecimentos ao longo do dia. Evidente que uma fatia da população não estará inserida nesse universo online, mas o formador de opinião estará e aí reside uma armadilha para o jornal tradicional: como ele sobreviverá nesse novo cenário? O jornal tradicional certamente não poderá mais reproduzir o mesmo conceito dos últimos 50, 100 anos. O segredo estará em como fazer um jornal de papel para esse novo público. Veja o exemplo do Times, tradicional diário inglês voltado para a elite econômica. Devido à incapacidade de competir com o noticiário econômico online, o Times se tornou um jornal popular. Essa mudança já está ocorrendo em alguns países. Será necessário criar uma nova forma de chegar ao leitor desconectado, seja por meio do noticiário de esporte, seja do caderno de fim de semana. Minha geração acordava às 5 da manhã e corria para a banca para ler as manchetes do dia. Sabíamos que, dependendo do teor da notícia, aquilo afetava a abertura do mercado financeiro.

M&M – O senhor teve interesse na aquisição do Valor Econômico?

Barros – São duas coisas distintas. Fui procurado há algum tempo por um grupo de investidores que queria comprar o Valor. Se desse certo, eu seria um executivo do jornal e participaria da sociedade, mas desde o início ficou claro que Primeira Leitura e Valor não podiam se confundir, porque são projetos totalmente distintos. O Valor acabou sendo uma dessas oportunidades que estudamos, e em nome desses investidores andei buscando algumas alternativas.

M&M – Então essa questão continua em aberto?

Barros – O banco de investimento incumbido de apresentar os relatórios financeiros do Valor os entregou há pouco mais de uma semana. Estamos avaliando a possibilidade de aquisição do jornal.

M&M – O senhor pode revelar quem são esses investidores?

Barros – Prefiro não dizer.

M&M – Como o senhor avalia a entrada de capital estrangeiro nas empresas de comunicação?

Barros – Este é um assunto delicado. A tendência normal é considerar que o capital estrangeiro é indevido no País porque acaba com a independência e isso é exatamente o que a esquerda acredita. Outros acham que é sempre bem-vindo, porque são mais recursos e, conseqüentemente, mais poupança. Não acredito que questões dessa natureza possam ser simplificadas dessa maneira. A cada momento histórico – e dependendo da situação – o tratamento ao capital estrangeiro requer uma análise, caso a caso. Existe uma diferença significativa entre o capital que entra na Vale do Rio Doce, na Petrobras ou no setor de telecomunicação daquele destinado a um grupo de comunicação. Em se tratando do imaginário da sociedade, é muito mais fácil de moldar. E aí estamos mexendo com um organismo um pouco mais frágil. Se tivermos regras estabelecidas, fica mais fácil lidar com os investimentos, o interesse nacional e o consumidor. No caso de questões de mercado, não tenho restrição alguma. O capital estrangeiro não é melhor ou pior que o nacional. Porém, o fato de a imprensa lidar com o imaginário da sociedade torna praticamente impossível estabelecer um marco regulatório que evite problemas no futuro.

M&M – Quais seriam os riscos?

Barros – Na minha opinião, existem dois riscos. O primeiro trata da interferência no imaginário para atingir os objetivos que estão fora da sociedade. Existe a possibilidade de manipular a opinião do brasileiro para que ele seja favorável a uma guerra no Iraque, por exemplo. Isso é um perigo. O outro perigo é exatamente o contrário. É controlar o imaginário ao não colocar as questões polêmicas em discussão. A discussão atualmente gira em torno da linha editorial neutra que grandes grupos internacionais adotam em relação aos acontecimentos políticos e sociais de cada país. Isso é tão ruim quanto tentar manipular a opinião pública para obter algum resultado.

M&M – Seria possível ter um marco regulatório para a comunicação?

Barros – Sou favorável ao que nós temos atualmente no Brasil, ou seja, o controle e a responsabilidade social das empresas de comunicação nas mãos de brasileiros. Não vejo vantagem alguma para a sociedade que a nossa imprensa esteja ligada a um conceito global de outros países. Acho que a imprensa é um valor político, social e nacional.

M&M – Desse aspecto o senhor não abre mão?

Barros – Não. A não ser que se crie ou que se tenha experiência de um marco regulatório de sucesso que possa prever essas suscetibilidades. O imaginário e a opinião pública, para mim, são valores que precisam ser administrados com muito cuidado. Pegue o exemplo da questão do capital: estatização versus privatização. Na questão da Telebrás, o ministro Sérgio Motta era contra a privatização. Porém, quando ele se deu conta do tamanho do investimento que o governo precisaria fazer para democratizar o acesso à telefonia, percebeu que não haveria capacidade de realizá-lo. E ele decidiu, acertadamente, condicionar o capital privado ao atendimento de algumas cláusulas sociais. Existem duas cláusulas importantes a observar, a econômica e a social. O mercado é o melhor definidor da cláusula econômica. Não conheço nada que substitua o mercado na busca de alocar capital, investimento e tecnologia de uma forma mais eficiente que o setor privado. Isso se dá por conta de um único objetivo, o da maximização do lucro. E aí reside uma curiosidade: se deixar muito por conta do mercado, depois não adianta reclamar do desequilíbrio social que poderá ocorrer. O investidor vai buscar a rentabilidade onde quer que ela esteja e é aí que entra o Estado para definir e estabelecer as regras na alocação dos recursos e as obrigações sociais a serem atendidas, que é o caso da telefonia com a cláusula de universalização de serviços. Acho que é esse o desenho. A sabedoria está em dosar essas duas coisas. Para fazer isso, tem que se partir do pressuposto de que não existe nenhum sistema perfeito – nem o Estado como único responsável pelo funcionamento da economia, nem o mercado como tal.

M&M – Então o senhor é a favor da imprensa oficial?

Barros – Nunca defendi a imprensa oficial, porque todos os exemplos históricos de que temos conhecimento foram um verdadeiro desastre político. Procuro sempre uma abordagem intermediária, isto é, quero pluralidade e, portanto, os órgãos de imprensa deverão ser do setor privado, mas com limites. Enquanto o dono é uma empresa ou uma figura brasileira que vive aqui, que mora aqui, o governo tem muito mais poder e a sociedade pode exercer uma fiscalização de forma bem mais efetiva, em vez de termos o poder completamente fora do País. Acho que a decisão do governo Fernando Henrique nesse aspecto foi certa, pois ele possibilitou uma flexibilização do capital estrangeiro na imprensa para permitir essas ligações com órgãos da imprensa de outros países, mas ao mesmo tempo condicionou o controle da imprensa e da opinião pública a ficar nas mãos de brasileiros. Tem problemas? Óbvio que sim, e nós conhecemos vários, mas olhando para o resto do mundo e para a história, este foi o sistema que menos crise teve do ponto de vista de manipulação da opinião pública. É só olhar para a imprensa americana. Talvez ela seja a mais livre do mundo, e agora eles estão vivendo um dilema. O governo Bush permitiu uma liberalização maior e há uma resistência muito grande da sociedade em relação a isso.

M&M – Existe uma grande ociosidade de telefones fixos no Brasil. Estima-se em 11 milhões de linhas, por questões de falta de mercado. Qual a sua opinião sobre a atual situação das telecomunicações no Brasil, já que o senhor foi o ministro das Comunicações do governo Fernando Henrique?

Barros – Primeiro, é preciso entender que essa ociosidade se deu porque o crescimento da renda não teve o caminho que se esperava. Quando as projeções foram feitas, por volta de 1996/1997, a perspectiva era de que a renda média do brasileiro cresceria 4% ao ano em termos reais, e não foi isso que aconteceu. Segundo algumas pesquisas, está inferior ao que era em 1996. Foi um problema de gestão macroeconômica que levou o País a viver nove anos de crescimento muito baixo. Ao se olhar as empresas que fizeram investimentos no Brasil, percebe-se que o problema não foi só aqui, mas no mundo todo. Superestimou-se a capacidade de geração de lucro dessas companhias no setor fixo e também no celular. Como o preço fixado pelo leilão – tanto das licenças como da própria Telebrás – era apenas o valor presente de uma estimativa de lucro, se aquela estimativa estivesse errada o valor presente também estaria. Pagou-se mais caro porque a avaliação foi errada.

M&M – Esse erro de avaliação também ocorreu no mercado internacional?

Barros – Houve erro de duas naturezas. Uma porque a renda no Brasil não cresceu como se esperava e outra de ordem mundial, porque se agregou valor principalmente à telefonia celular, que à época ainda não tinha acontecido. Tanto é verdade que as empresas que compraram a licença de terceira geração na Europa perderam uma fortuna. Quando se olha para as companhias que estão operando no Brasil hoje, considerando o valor do investimento menos as licenças ou o ágio que foi pago no leilão, nós estamos muito bem. A geração de resultados, apesar das dificuldades, tem sido boa. O ebtida (índice de geração de caixa) das empresas de telecomunicações não deixa a desejar, mas ainda é incompatível com o preço original que foi pago. Esse prejuízo já foi assumido pelo investidor. Na minha avaliação, do ponto de vista de funcionamento, dou nota 8 para esse trabalho até aqui. Nós temos um problema de competição na telefonia fixa que precisa ser resolvido, mas existe hoje uma base institucional e física no setor de telecomunicação que não existia antes da privatização. O que se vê é que ainda há energia suficiente, tanto que a Telmex (gigante de telecomunicações mexicana) está vindo investir aqui. Tem muito jogo ainda, e qualquer recuperação da economia nesses próximos anos – e não tem por que duvidar que possa acontecer – colocará todas essas coisas no lugar.

M&M – Que balanço o senhor faz do governo Lula e da atuação do ministro das Comunicações, Miro Teixeira?

Barros – O governo Lula e o ministro Miro Teixeira foram uma grande surpresa para todos nós. Olhando para trás – principalmente no caso do PT, que tem mais de 20 anos de história -, é necessário avaliar o que foi defendido pelo partido durante esse período; quais eram seus valores, suas propostas, antes, durante e depois da campanha eleitoral. De repente, nos damos conta de que estamos há nove meses com esse governo e constatamos que nada de novo aconteceu. O PT passou por uma mudança de entendimento e de propostas ao longo desse tempo que eu nunca vi. Sempre cito o exemplo do Partido Trabalhista inglês ou do Partido Socialista espanhol, que também fizeram essa marcha da esquerda para o centro. A diferença é que eles realizaram essas mudanças antes de se apresentar como alternativa de poder, e foi uma leitura correta nos dois casos. Com o Partido Socialista português ocorreu a mesma coisa. Mudaram antes de chegar ao governo e alcançaram o poder com essas novas propostas. Não foi o que o PT fez.

M&M – Isso foi bom ou ruim?

Barros – Acho que foi bom para o Brasil. O programa do PT que conhecíamos teria levado o País a uma situação de muita dificuldade. Pelo menos eles tiveram uma leitura correta, mas mudaram de forma pouco clara. Os outros partidos socialistas primeiro mudaram, depois se apresentaram com uma nova cara. O PT não fez isso. Agora, do ponto de vista de poder no Brasil, o que estamos vendo hoje é que eles assumiram praticamente a mesma agenda do governo Fernando Henrique. Isso também aconteceu no setor de telecomunicações. No último debate sobre o tema na Exame, em que estava presente o ministro Miro Teixeira, o discurso dele foi completamente diferente. Chegou até a dizer que a Lei Geral de Telecomunicações é uma obra-prima. Outra mudança se deu em relação às agências reguladoras. Nas próprias palavras de Lula, estavam terceirizando o Estado. O discurso dele demonizava a Aneel, a Anatel, e as classificava como antipopulares. É evidente que as agências são um fato novo e precisam ser aperfeiçoadas. Mais uma alteração significativa é o fato de o Ministério da Fazenda dar continuidade às privatizações dos bancos estaduais. Esse foi um dos pontos centrais que o PT sempre criticou e num tom muito radical, qual seja, a postura do Banco Central na época de Fernando Henrique. O fato a observar é que o PT que governa é diferente do PT que foi oposição desde a sua fundação. É diferente do PT que se apresentou ao eleitor no ano passado. Do ponto de vista da sociedade, acho que foi uma boa mudança. Por quê? Porque abraçaram uma agenda muito mais adequada para as demandas da sociedade e, nesse aspecto, temos de parabenizar o partido. Mas como foi uma mudança radical em relação ao que o PT acredita, penso que isso tende a criar problemas. Quais problemas? Nós temos que esperar, mas que vão acontecer, vão.

M&M – Vamos assistir ao “espetáculo do crescimento” a partir de 2004?

Barros – Esse é o grande desafio do governo Lula. Fazer com que uma política econômica que nos últimos nove anos não conduziu ao crescimento o produza daqui para a frente. Essa é uma característica do Antônio Palocci (ministro da Fazenda) que eu acho muito importante. Ele é menos dogmático que o Pedro Malan (ministro da Fazenda no governo FHC), embora os dois tenham hoje uma visão muito parecida sobre política econômica. A grande diferença é que Palocci enxerga os problemas e os corrige, essa é a vantagem. Certamente eles não vão ficar quatro anos com uma taxa de câmbio fixa como ficou o governo FHC.”

 

IMPRENSA & DIREITO

“No Recife, juízes e jornalistas debatem o fim do ?juridiquês?”, copyright O Estado de S. Paulo, 25/09/03

“O Simpósio Nacional Direito Imprensa quer acabar com o ?juridiquês?. Organizado pela desembargadora Margarida Cantarelli, presidente do Tribunal Regional Federal da 5.? Região, em Pernambuco, o evento começa a discutir, a partir de hoje, a importância de se trocar jargões incompreensíveis por uma nova forma de comunicação do Judiciário com a sociedade.

Professora de Direito Internacional na Faculdade de Direito de Recife, Margarida é uma das maiores defensoras de mudanças na linguagem jurídica. ?A proposta vem de uma experiência pessoal, mais como professora do que como magistrada. Temos de falar de maneira clara aos alunos?, explicou. ?O problema é ainda maior no direito internacional. Traduzir um texto rebuscado e escrito, às vezes, num português quase arcaico pode criar confusões.?

Problemas de compreensão em um parecer enviado, por exemplo, à Organização Mundial do Comércio (OMC) podem ter como conseqüência graves prejuízos, observou Margarida. ?Se você coloca muito enfeite, em vez de uma coisa objetiva, clara, torna-se difícil o trabalho do tradutor. Nem sempre a compreensão dos outros povos é igual a nossa?, disse.

A desembargadora também destacou a confusão na divulgação de informações jurídicas. ?Muitas vezes, advogados, servidores da Justiça, réus, jornalistas e outros personagens acabam sem entender a mensagem transmitida pelas peças jurídicas. Isso pode provocar problemas, especialmente quando algumas decisões são publicadas nos veículos de comunicação de massa com erros de interpretação.?

Participam do evento, além do ministro Edson Vidigal, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e jornalista profissional, desembargadores, juízes federais, operadores do direito, assessores de imprensa do Judiciário e jornalistas.”

 

ÍNDIOS & MÍDIA

“Seminário discute acesso dos índios à informação”, copyright Agência Câmara de Notícias (www.camara.gov.br), 25/09/03

“A Câmara sediou nesta manhã o seminário ?A inclusão dos povos indígenas na sociedade de informação?, promovido pela Comissão de Educação e Cultura com a participação das comissões da Amazônia e de Ciência e Tecnologia; da Ouvidoria Parlamentar; e da Frente Parlamentar de Apoio às Comunidades Indígenas.

Durante os debates, o representante do Fórum Permanente para Assuntos Indígenas da ONU, Marcos Terena, relatou a situação de acesso dos índios brasileiros à comunicação. Segundo ele, já existem índios com páginas na Internet e que estudam por telecursos; além disso, estão sendo instaladas rádios comunitárias em algumas aldeias.

Terena informou que os índios já ocupam 12% do território brasileiro; que existem 230 sociedades distintas e 180 línguas diferentes. Entre os principais objetivos dessas comunidades, ele citou a criação de uma universidade autônoma dos povos indígenas, com um centro de comunicação e informação que registre sua língua e sua história. ?Os índios sonham com um centro de pesquisa e biotecnologia que possa compatibilizar o conhecimento dos pajés com o dos cientistas para preservar a biodiversidade?, afirmou.

INSERÇÃO UNIVERSITÁRIA

O reitor da Universidade Federal do Mato Grosso, Paulo Speller, propôs a elaboração de um projeto de inserção da cultura indígena em todas as universidades públicas do País. Ele disse que vai levar a idéia à reunião das universidades da Amazônia, que em dezembro reunirá os sete países da região em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia.

Segundo Speller, o governo do Canadá está promovendo a conectividade de todo o país por meio de uma rede de informação dirigida sobretudo às áreas indígenas. Uma equipe de professores e técnicos da universidade de Mato Grosso vai àquele país no próximo sábado para conhecer o programa e trazer a experiência para o Brasil.

SEM CONFLITOS

O coordenador do seminário, deputado Carlos Abicalil (PT-MT), defendeu a universidade autônoma dos indígenas, com o objetivo de dirimir conflitos como o que ocorre entre as técnicas de tratamento dos médicos ou parteiras da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e os pajés, com sua cultura de medicamentos naturais.

Para o assessor internacional do Ministério das Comunicações, Luis Fernando Serra, os índios precisam usar a tecnologia da informação para perpetuar sua cultura. Um dos encarregados de preparar a posição do Brasil na Conferência da ONU sobre o assunto, o embaixador teme que a insistente defesa da propriedade intelectual sobre a tecnologia das redes de informação termine por aumentar a dependência dos países menos desenvolvidos no setor.

JORNAL INDÍGENA

Representante da Grumin/Rede de Comunicações Indígena, a potiguá Eliane Lima dos Santos informou que o primeiro jornal indígena, editado em língua portuguesa de 1990 a 1996, no Rio de Janeiro, contava com o apoio da Associação Brasileira da Imprensa (ABI) e do Programa de Combate ao Racismo – o mesmo que ajudou Nelson Mandela na África do Sul.

O periódico tinha uma tiragem de 10 mil exemplares mensais e era distribuído para todo o Brasil. As matérias divulgavam os debates dos fóruns internacionais sobre a questão, inclusive a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, ocorrida no Rio de Janeiro em 1992. Também eram detalhados os dispositivos da Declaração Universal dos Direitos Indígenas.

Eliane Santos mantém duas páginas na Internet: uma rede de comunicações indígenas, no endereço www.grumin.hpg.com.br ; e outra sobre literatura indígena, no endereço www.groups.yahoo.com/group/literaturaindigena.

RÁDIOS COMUNITÁRIAS

Durante os debates do seminário, a índia Miriam Terena pediu a reativação de duas rádios comunitárias. A primeira, situada na aldeia Bororó, na reserva indígena de Dourados (MT), transmitia em língua guarani e foi interditada pela prefeitura da cidade. A outra, na aldeia urbana Marçal de Souza, em Campo Grande (MS), fazia um trabalho de prevenção de doenças.

Em resposta à reivindicação de Miriam Terena, o reitor Paulo Speller informou que a USP já coordena um projeto de rádio comunitária para difusão da cultura indígena no estado de São Paulo. Ele sugeriu também que a Universidade Federal de Mato Grosso Sul desenvolva um programa semelhante ao adotado pela USP.

O deputado Vieira Reis (PMDB-RJ) sugeriu a criação de uma rádio aberta pública voltada às comunidades indígenas e transmitida em sua língua.

JOGOS INDÍGENAS

A estudante Carolina Oliveira, da Universidade Católica de Brasília, apresentou um projeto de cobertura jornalística dos VI Jogos Indígenas, que vão ocorrer de 1? a 8 de novembro em Palmas (TO). Do evento, vão participar 1.200 índios de 47 etnias diferentes, em 18 modalidades esportivas. Além das atividades convencionais, serão disputados esportes tipicamente indígenas como corridas de tora, cabo-de-guerra, katulaia e zarabatana.

O seminário é preparatório para a Conferência das Nações Unidas sobre Sociedade de Informação, que será realizada nos dias 11 e 12 de dezembro, em Genebra. Também servirá de subsídio para o encontro indígena preparatório à convenção da ONU, que ocorrerá em Brasília de 8 a 10 de outubro.”