Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Uma história antiga

SOCORRO OFICIAL

Depoimento de Alzira Alves de Abreu, historiadora da Fundação Getúlio Vargas do Rio e pesquisadora do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea (CPDOC), à repórter Emília Ferraz


Como as empresas de comunicação ficaram dependentes do Estado ao longo da história?

Alzira Alves de Abreu ? Podemos pensar a política de financiamento dos meios de comunicação, o que está sendo discutido muito hoje, fazendo um breve paralelo como os períodos históricos anteriores. Isso ajuda muito a repensar o período atual, principalmente nos períodos anteriores onde houve problemas de avanços e, ao mesmo tempo, de crises no setor de comunicação.

Se quisermos recuar no tempo, eu lembraria do período do Campo Sales, que é um momento muito importante na história brasileira, o momento da consolidação da República, um período muito importante para a imprensa porque é o momento que a imprensa deixa de ser artesanal e passa a ser industrial. Ela passa a ser uma empresa, não importa se pequena ou grande, mas já tem uma estrutura comercial de divulgação.

Nesse momento ? e isso é que é importante lembrar ?, a imprensa passa a ter um papel fundamental na opinião política do país, e Campos Sales entendeu isso perfeitamente. Ele inicia nesse momento uma subvenção aos jornais. Por quê? O objetivo dele era muito claro: calar a oposição, impedir as críticas à política financeira que ele estava realizando ? o que ele chamava da salvação financeira do país ?, desenvolvida pelo seu ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho.

Mas se quisermos ainda continuar esse passeio na história, eu lembraria também que nos anos 1930, quando se dá a transição da sociedade agro-exportadora para a sociedade urbano-industrial, o Estado tem um papel fundamental nessa passagem. O Estado é visto como moderno, aquele que levou o desenvolvimento industrial do país. Ele ultrapassava o partido político, porque concentrava o poder de orientar o desenvolvimento brasileiro.

Essa situação só vai mudar muito recentemente. Nos anos 1980, o papel do Estado intervencionista é visto como atraso. Hoje, o importante é o mercado, a livre iniciativa, a internacionalização.

Como entram os meios de comunicação nesse período? A forte intervenção do Estado nos meios de comunicação varia um pouco. Em momentos de autoritarismo, o Estado interfere mais, depois acontecem modificações. Mas a nossa tradição é de permanente intervenção do Estado nos meios de comunicação. Eu lembraria que a publicidade oficial e, no caso da imprensa, a facilitação do financiamento para a compra de papel. Até o período Jânio Quadros, o papel tinha grande subsídio cambial ? chegava a ser 70% mais barato a importação do papel para jornal. Esse é um momento de grande crise para a imprensa brasileira.

A partir do final dos anos 1960, início dos 1970, numerosos jornais são extintos. Outros fatores vão interferir nisso ? como o problema da censura e da má gestão. É o momento de grandes mudanças na imprensa, mas o subsídio ao papel do jornal é muito importante neste momento.

Então eu vejo essa discussão sobre a participação ou não do Estado para resolver a crise que está hoje enfrentando a imprensa, me parece que isso deve ser discutido de uma forma um pouco mais isenta, vendo o que é que está em jogo nisso. Ou você fica a favor, ou você fica contra? Isso não pode acontecer…

Quando eu vejo os outros períodos da história, percebo que houve momentos em que a imprensa fechou, muitos jornais fecharam. É muito importante pensar nisso. A imprensa, os meios de comunicação, a televisão, hoje são fundamentais para a democracia. Um país precisa dos meios de comunicação para inclusive exercer melhor o seu papel democrático.