DOMINGO ILEGAL
Carlos de Oliveira (*)
Por mais que a decisão da Justiça possa parecer censura, não estou totalmente convencido disso. Terreno difícil esse. Concordo que o melhor filtro para as baixarias dominicais (e não apenas dominicais) é o controle remoto ou algo equivalente.
O que incomoda é ver que, livres de qualquer controle de conteúdo pautado pelo bom senso, cidadãos espertos ganhem imensas fortunas explorando a ingenuidade (de quem não tem acesso à escola) e a falta de opção (de quem não tem acesso à televisão fechada) de imensas parcelas da população.
Em nome da audiência, dos pontos do Ibope (usados como precioso cacife na captação de anúncios), toda barbaridade vira atração. Entrevistas de falsos bandidos, suicídios, pegadinhas, DNA, mallandros, domingões, caldeirões… o diabo. Censura, não. Nossa experiência recente com o arbítrio já foi suficientemente traumática. Mas circo de horror também não.
O episódio Gugu, que de fato cheira a censura, mostrou um lado, a meu ver, positivo. A sociedade não estaria mais disposta a engolir tudo o que oportunistas da telinha lhe empurram goela abaixo. Não estaria mais disposta a encher seus (deles) bolsos de dinheiro. Li que Gugu (só ele) teria deixado de ganhar R$ 750 mil no domingo em que seu programa não foi ao ar.
Primeiro passo
Se essa informação for procedente trata-se de uma bofetada na cara do brasileiro comum, daquele brasileiro que nem amigo do governador é. A título de curiosidade, sem querer que o Gugu morra de fome e sem qualquer intenção de apelar para a demagogia, outra praga nacional, experimentem fazer uma conta: vejam quantos anos uma pessoa que recebe salário mínimo levaria para ganhar o que o Gugu parece ter perdido em algumas horas. O resultado será mais ou menos umas três vidas. Algo está muito errado neste país. Creio que aí está a discussão principal.
Quem viveu a censura nas redações sabe que o que houve com Gugu foi uma coisa diferente. Foi um outro bicho. Meio parecido, mas um outro bicho.
O Estadão, por exemplo, conviveu com censores da ditadura em suas oficinas. O Estadão não vendia sensação. Fazia-se (e faz-se) lá um jornalismo responsável, de conteúdo, combativo, por isso mesmo censurado. Muito diferente do que houve com Gugu.
Um primeiro passo foi dado. Pode até ter sido um tropeço, mas chega de oportunismos, de fortuna fácil, de vender mentiras e de fabricar ídolos. Respeito é bom e os brasileiros gostam.
(*) Jornalista
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