NOTAS DE UM LEITOR
Luiz Weis
"Minha passagem pelo Brasil foi polêmica porque não
havia futebol naquela semana e os jornais não tinham outra
coisa sobre o que escrever", disse em Buenos Aires, pretendendo
ser sarcástico, o subsecretário do Comércio
dos Estados Unidos, Peter Allgeier, que divide com o diplomata brasileiro
Adhemar Bahadian a presidência do processo de negociações
para a criação da Área de Livre Comércio
das Américas (Alca).
Allgeier havia dito, em Brasília, que a Alca sairá
com ou sem a participação do Brasil. (Os americanos
vivem dizendo isso.)
"Falta de futebol criou polêmica, diz Allgeier",
foi o burocrático título que a frase rendeu na Folha
de S.Paulo de 25/10. Burocrático porque, lido isoladamente,
dá a impressão de que toma ao pé da letra a
maldade do gringo.
Já O Estado de S.Paulo foi às vias de fato.
Escreveu, com tinta verde e amarela, "Allgeier retoma provocações
contra o Brasil".
O que há de engraçado nessa história é
o contraste entre a insossa objetividade do primeiro título,
em um jornal que tende a simpatizar com as posições
do Itamaraty em relação à Alca, e os brios
patrióticos do segundo, que estariam melhor se encabeçassem
um comentário ou um editorial, em um diário que vive
acusando o Itamaraty ? em particular o secretário-geral
Samuel Pinheiro Guimarães ? de buscar um enfrentamento com
os Estados Unidos, por motivos ideológicos.
Aliás, sem citar o Estado nem a Veja, que
tem a mesma linha,
o embaixador Bahadian acusou "a imprensa brasileira" de
ter
escrito "uma página triste – o linchamento que houve
contra
um funcionário de alto nível que teve a dignidade
de revelar
a sua posição".