REDE ANDI
Fausto Rego (*)
[Publicado originalmente na Revista do Terceiro Setor <
http://rets.rits.org.br/> em 17/10/03]
"Un chico atacó a tiros a su familia: mató al padre y a un hermano". Este foi o título de uma reportagem publicada por um dos principais jornais argentinos. A manchete é representativa do espaço habitualmente dedicado a crianças e adolescentes pela mídia latino-americana: o das notícias policiais ou sensacionalistas. Esta constatação foi um dos fatores que motivou a criação da Rede Andi América Latina, iniciativa que pretende estimular o respeito aos direitos da infância e da adolescência, sob a perspectiva do desenvolvimento humano e social.
Integram a rede, já neste início de trabalho, nove organizações: Periodismo Social (Argentina), Agência de Notícias dos Direitos da Infância ? Andi (Brasil), Fundación para um Nuevo Periodismo Iberoamericano (Colômbia), Servicio de Noticias de la Mujer (Costa Rica), Asociación Doses (Guatemala), Dos Generaciones (Nicarágua), Global Infancia (Paraguai), Cecodap (Venezuela) e Centro de Promoción de los Derechos de la Niñez y la Adolescencia (Bolívia). Mais adiante deverão se juntar novos parceiros ? organizações do Chile, de El Salvador, do Equador, do México, do Panamá, do Peru, da República Dominicana e do Uruguai.
Durante a primeira reunião do Comitê Gestor do projeto, realizada em Brasília (DF), de 28 a 30 de setembro, a Andi foi escolhida para exercer a coordenação geral por um mandato de três anos, função que está sendo desempenhada por Regina Festa, coordenadora de Relações Internacionais e Acadêmicas da entidade.
A idéia de criar uma rede latino-americana vinha ganhando forma há pelo menos dois anos e tomou impulso com o Encontro Latino-Americano de Experiências em Comunicação e Infância, também realizado em Brasília, em outubro do ano passado. "Já recebíamos solicitação de ajuda de vários países", conta Regina. "Além disso, instituições como a Save the Children, o Unicef e a Fundação Avina sugeriam a expansão das atividades que desempenhávamos no Brasil, pois diziam que a situação da criança e do adolescente na mídia latino-americana era crítica".
A primeira etapa para a consolidação desse projeto foi de muita conversa ? com instituições, jornalistas e governos de toda a região. As parcerias para composição dessa aliança foram formalizadas obedecendo a alguns critérios: "São instituições confiáveis e com credibilidade, organizações não-governamentais que têm um trabalho com jornalistas ou são formadas por jornalistas", explica a coordenadora.
Situação delicada
As tarefas a serem desenvolvidas pela Rede Andi na América Latina compreendem o acompanhamento dos meios de comunicação em sua abordagem dos temas relacionados à juventude, a qualificação de jornalistas e fontes de informação, além de cursos de jornalismo. O objetivo é criar uma cultura de comunicação que priorize a defesa dos direitos de crianças e adolescentes. Até fevereiro do próximo ano as organizações parceiras estarão participando de atividades de capacitação, para que em março se iniciem as ações estratégicas ? que incluem contatos com jornalistas, empresas de comunicação e fontes de informação. O trabalho da rede será executado em três níveis, com ações locais em cada país, ações conjuntas da aliança e tarefas a serem desempenhadas pela coordenação.
"Em janeiro teremos uma reunião com todas as instituições, em Brasília. Quem vai gerenciar o projeto são jornalistas profissionais que deverão ser pessoas de credibilidade, com trâmite nos governos e na mídia. Vamos capacitá-los com a metodologia da Andi e será uma semana de trabalho duro", afirma Regina.
Nesta primeira fase, a experiência da Andi no Brasil será bastante valiosa para a própria rede. Criada em março de 2000, a entidade vem cumprindo um papel importante na formação de um jornalismo mais comprometido com o universo infanto-juvenil. "A situação na América Latina, de uma maneira geral, é igual à que havia no Brasil quando a Andi começou, com o tema ocupando espaço principalmente no setor de polícia ou nas manchetes sensacionalistas", constata Regina Festa. "A mídia brasileira até demonstrou mais responsabilidade no trato dessa questão, mas isso não se percebe em outros países, especialmente nos mais pobres."
A coordenadora identifica ainda outros dois problemas sérios: a participação cada vez maior do capital externo nos veículos de comunicação e a crise financeira que tem afetado as empresas de mídia em toda a região. Cria-se, então, uma situação delicada: a criança não é bem tratada, o jornalista não conhece os direitos da infância e da adolescência e, ao mesmo tempo, acaba sendo muito pressionado pela situação das próprias empresas.
Desde já, um dos principais projetos a serem desenvolvidos é um mapeamento permanente das dificuldades enfrentadas pelas corporações de mídia, de modo a monitorar o comportamento desses veículos. Para Regina, as perspectivas são animadoras. "A Rede Andi tem um grande trabalho a ser desenvolvido na América Latina e uma contribuição muito importante a dar."
(*) Da redação da RETS ? Revista do Terceiro Setor