MÍDIA & SUBCULTURA
Marcelo Salles (*)
Além das manchetes, num olhar mais imediatista, têm-se apenas as matérias. Estas, em tese, deveriam explicar, detalhadamente, o que foi resumido na manchete. Com mais espaço, poderíamos imaginar, o jornalista seria capaz de desenvolver o tema de maneira a experimentá-lo além do factual, contextualizando-o dentro da realidade que o cerca.
Infelizmente, não é o que acontece.
Os jornalistas escrevem linhas e mais linhas, mas raramente conseguem ir além da manchete. Entre os que conseguem contam-se nos dedos os que têm seus textos, de fato, publicados.
A intenção dos donos da mídia grande é clara: "superficializar" ao máximo; "descontextualizar" sempre; e complicar, em vez de explicar. Apenas os incautos ainda acreditam que a mídia grande realmente tem interesse em esclarecer o povo. Enquanto os donos do poder gostam de dizer que ensinam e educam através de seus telecursos ? que são veiculados de madrugada, quando quem deveria estar aprendendo está dormindo ? as verbas governamentais para a educação pública são cada vez mais escassas.
Os verdadeiros "porquês" raramente aparecem nas matérias. Por exemplo, o motivo da falta de luz nos bairros pobres são os "gatos", e não o fato de a empresa distribuidora de energia ser estrangeira e existir uma lei estúpida que permite a ela remeter a seu país de origem quanto quiser, não estando obrigada a reinvestir a maior parte dos vultosos lucros obtidos aqui no Brasil ? que fique claro que em países sérios esse bacanal financeiro não é permitido ?, o que acaba gerando desemprego em cascata e péssimo atendimento ao público. O que parece já fazer parte dessa subcultura que nos empurraram goela abaixo.
Doses de cicuta
As redações evitam o questionamento, justamente o que deveria ser o sistema propulsor do jornalismo, e apenas reproduzem um modelo que agoniza, que está sufocado, mas que satisfaz aos donos do poder (totalmente embevecidos por vaidade doentia, típica dos que morrem como "grandes homens", e na verdade foram grandes inúteis).
Além das manchetes está a hipocrisia de uma gente que se esqueceu de sonhar, que deu a vida como perdida, que se desiludiu com o amor. Além das manchetes não encontramos mais a vontade de mudar; encontramos apenas sangue, vísceras expostas e a máscara de quem se traveste de jornalista e acredita que repetindo à exaustão um modelo jurássico está informando, quando, em verdade, está cometendo um crime. Porque a informação que vende está envenenada.
Além das manchetes encontramos pequenas doses de cicuta. Enquanto lemos é como se ela passeasse em nossa boca. Sei que tomar dessa bebida nem sempre é uma escolha, já que ela se apresenta de maneira extremamente sedutora. Mas quando você consegue resistir e encontrar outros caminhos para o conhecimento você pode dizer então, tranqüilamente, que saboreou a informação. Sem se transformar em vítima dela, que se esconde atrás das manchetes.
(*) Estudante de jornalismo da UFF