Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Em pânico a realeza

Edição: Beatriz Singer (com Dennis Barbosa)

INGLATERRA

Sebastião Jorge (*)

Ser rei, rainha ou príncipe, aliás, manter o cetro e a coroa ou usufruir as mordomias de membro da realeza na Inglaterra, é dispor de um exercício permanente de tolerância, uma capacidade ilimitada de perdoar ao expor-se a todo tipo de sujeira jogada sobre suas vidas, pelos jornais sensacionalistas.

As provocações são periódicas. É muito barulho para que possam dormir em paz.

O terrorismo, não vem das armas que explodem e destroem prédios e matam, mas das palavras, bem urdidas, selecionadas com tempero venenoso e enriquecidas com o sal da mentira para jogar sobre as feridas abertas, ingredientes capazes de deixar qualquer um no mais total desespero.

Essas “bombas” que aparentam ser suportáveis, às vezes matam. Têm semelhança com as bombas que o terrorista Osama bin Laden espalha pelo mundo, para assassinar inocentes e pecadores e desafiar o cinturão de balas do cowboy George W. Bush, o homem mais poderoso do planeta.

Diana, pobre e infeliz princesa, foi uma dessas vítimas. Ao ser perseguida numa corrida louca de automóveis pelos paparazzi que queriam, a todo custo, uma fotografia dela ao lado do namorado. A ventura terminou num acidente brutal de carro, ceifando a vida da triste e desiludida princesa Diana, que sofreu pelos desencontros no amor. Tudo pela imprudência e ambição de uma foto que vale no mercado internacional alguns milhares de dólares.

Na última semana a realeza britânica voltou a ser notícia. A gravidade dos fatos chocou a gregos e troianos. Deixou dúvidas para uns, certeza para outros e confusão no seio da família da rainha Elizabeth. Os tablóides londrinos são implacáveis. Fazem de tudo para xeretar a vida das celebridades e depois transformar num escândalo que se resume em lucro para os cofres da empresa.

Cada tablóide desses, como News of the Star, Daily Mirror, The Sun (de maior circulação, com 4 milhões), vende diariamente em média mais de 3 milhões de exemplares. É pouco? No Brasil não conseguimos, com jornais de boa qualidade ou aqueles que exploram o sensacionalismo, uma tiragem que se aproxime de um milhão (provavelmente uns 500 mil), mesmo aos domingos, com toda parafernália de brindes e brincos.

Esses pequenos periódicos (metade do tamanho de um jornal stand, grande) são terríveis. Quando escolhem e miram a vítima o estrago é total. São capazes de derrubar ministros, e desfazer reputações, e humilhar as mais poderosa autoridades do país. Os ingleses são vidrados nesse tipo de jornalismo, conhecido como de “talão de cheque” (os jornais pagam para extrair notícias que choquem a opinião pública) ou contratam alguém para se transformar num falso espião, (às vezes os próprios mordomos da casa), para que revelem segredos de alcova ou fatos picantes.

Quem conseguiu essa façanha, concorrendo a um emprego, usando a malícia, no Palácio de Buckingham, foi o repórter Ryan Parry, do Daily Mirror. Abusou dessa mordomia por dois meses. Com o crachá na lapela e a farda de serviçal, bisbilhotou o que quis. Tirou fotografias do que considerou interessante, como os cachorros da rainha, tornando-se amigo desses animais de sangue azul.

No Castelo de Windsor, residência de fim de semana de Elizabeth II, foi aceito, sem desconfiança. Eis uma desmoralização à segurança da realeza e uma vergonha para a Scotland Yard, considerada a polícia mais eficiente do planeta, pelo menos nos livros de Conan Doyle.

O Mirror não deixou por menos, saiu com uma edição que dedicava 15 páginas às aventuras de Ryan Parry, que só não serviu café para Condoleezza Rice, assessora de Segurança dos EUA e ao secretário de Estado, Colin Powell, que se achavam em visita à Grã-Bretanha, por haver pedido as contas antes. Igualmente poderia servir à suíte onde se hospedou o presidente Bush e a esposa. Caso Ryan pertencesse ao bando de bin Laden e quisesse envenená-los, não seria difícil.

Como a não bastar esse inferno astral na vida da família real, o ex-camareiro George Smith, que esteve a serviço de Charles, príncipe de Gales, filho da rainha Elizabeth II e candidato a rei, num reinado que dura mil anos, afirmou ter flagrando o ex-consorte de Diana em situação constrangedora com o mordomo de confiança Michael Fawcett. O tablóide deixou no ar a masculinidade do príncipe, ficando as especulações aos leitores: é ou não gay? Essa é mais uma obra do diabólico tablóide Daily Mirror, irrecuperável da caça às vítimas de preferência a família real.

Pertencer à realeza com tais perseguições é pior, muito pior que ser plebeu em qualquer parte do mundo… Mas há quem goste. Aos que adoram aparecer nas páginas dos jornais, seria o paraíso. Para estes recomendo usarem os mesmos recursos do repórter Ryan Parry. Tudo estará resolvido.

(*) Sebastião Jorge é professor universitário, jornalista e advogado. E-mail: sjorge@uol.com.br