Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Carlos Heitor Cony

IMAGEM / LEGISLAÇÃO

“Direito de imagem”, copyright Folha de S. Paulo, 16/11/03

“Alguma coisa precisa ser feita, um movimento qualquer, por parte de editores, de autores, de jornalistas, de comunicadores em geral para disciplinar de forma sensata o direito de imagem, que, nascido na Constituição de 88, é interpretado aleatoriamente pelo Judiciário, criando uma ameaça que pode ser usada por qualquer um contra qualquer um.

O Código Penal, o nosso e o da maioria dos países, já estabelecera os crimes de calúnia, de difamação e de injúria, que, de alguma forma, impedem abusos e exageros. Há centenas, talvez milhares, de processos baseados nesse preceito legal; uns pelos outros, dão para o gasto. Como qualquer processo, requerem materialidade e abrem a porta para reparação. Já o direito de imagem, que pertence à Justiça civil, e não à penal, está criando uma indústria de indenizações que não se sabe onde e como vai parar.

Basta lembrar dois casos recentes: o da minissérie ?O Marajá?, que a extinta Rede Manchete chegou a gravar (35 capítulos), com os atos e fatos do processo que provocaria o impeachment do ex-presidente Collor e motivou sua renúncia; e o do livro sobre Garrincha, do Ruy Castro. A minissérie, que esgotou os recursos daquela emissora, foi proibida de ser exibida porque maculava a imagem de um cidadão que deixava a Presidência da República sob acusações de mau comportamento pessoal e público. O livro do Ruy limitou-se a registrar a decadência de um grande craque, na verdade, um ídolo, devido ao alcoolismo, que realmente o matou.

A prevalecerem os critérios de cada juiz, torna-se inviável a pesquisa histórica. Fernando Morais, por exemplo, não teria escrito a monumental biografia de Assis Chateaubriand nem a de Olga Prestes. Basta um descendente de terceiro ou de quarto grau se sentir injuriado pela biografia de um ancestral; as indenizações costumam chegar a milhões de reais, que nem as editoras nem os autores podem pagar.”

 

CAMPO IGNORADO

“A grande imprensa não conhece o Brasil, diz José Hamilton Ribeiro”, copyright AgroPauta <www.agropauta.com.br>, 12/11/03

?A imprensa deve acompanhar o avanço da soja no cerrado e na Amazônia como a cobra vigia seu ninho?. O conselho não vem de um ambientalista, mas de um dos mais premiados e qualificados repórteres da mídia rural no Brasil, José Hamilton Ribeiro, há quase 21 anos repórter do programa Globo Rural (TV Globo) e com quase 50 anos de profissão.

Ribeiro considera ufanista a cobertura que a mídia vem dando ao excelente momento vivido pela cultura da soja no país, ?sem perceber o custo ambiental provocado?. ?A expansão da soja se dá por uma invasão ansiosa, apressada e tumultuada em áreas ambientalmente sensíveis, como o cerrado e a Floresta Amazônica. O cerrado está sendo destruído sem que se conheça suas riquezas naturais.?

Para o jornalista, ?se a mídia não prestar atenção no que ocorre agora, vai ser tarde demais verificar os impactos no futuro?. Além da questão ambiental, preocupa Ribeiro a pouca quantidade de empregos gerados no cultivo da soja.

?A mídia demonstra um deslumbramento com os efeitos positivos das exportações de soja na balança comercial. Devia indagar, também, se a cultura está criando empregos na escala necessária para um país com alto nível de desemprego?, afirma, ao comentar o baixo patamar de geração de postos de trabalho na agricultura mecanizada de exportação.

Outro fator lembrado por Ribeiro como pouco abordado pela imprensa em sua cobertura sobre o agronegócio é o elevado volume de soja exportada como grão, produto menos valorizado no mercado internacional que seus derivados, como o farelo e o óleo. ?A imprensa prefere centrar sua cobertura em aspectos ufanistas como a disputa pela liderança na produção de soja entre Brasil e Estados Unidos?.

Desconhecimento

A grande imprensa, segundo Ribeiro, não conhece o Brasil, pois é voltada para suas sedes. ?A mídia do Rio de Janeiro olha em primeiro lugar a zona sul da capital carioca. Já a imprensa de São Paulo vê em primeiro plano os Jardins e a avenida Paulista?, ironiza o jornalista.

No caso da televisão, o problema foi atenuado por conta das redes de emissoras afiliadas espalhadas pelo território nacional. ?Apesar de suas deficiências, o Jornal Nacional, da Globo, e a Voz do Brasil, da Radiobrás, são os únicos noticiários com visão ampla do país.?

?Se a grande imprensa não conhece o Brasil, do interior rural então não sabe nada?, conta o repórter do Globo Rural. Ribeiro avalia que, apesar da ampliação da cobertura do setor rural nos últimos dois anos, os veículos da grande mídia situados nos grandes centros urbanos não compreendem características peculiares desse tipo de abordagem. A boa reportagem sobre assuntos do campo, observa o jornalista, exige viagens, tempo e paciência, elementos marginalizados pela grande imprensa urbana, especialmente no momento atual de grave crise financeira do setor.

Alguns aspectos da realidade rural chocam-se com a dinâmica frenética da mídia urbana, como os ciclos da natureza, vitais para a atividade agrícola. Ribeiro lembra de reportagem ?Os ninhais do Pantanal?, veiculada pelo Globo Rural em 1999. Ele demorou cinco anos para terminar o material, porque necessitou visitar os ninhais em diferentes fases, desde a formação dos casais de aves até o nascimento e crescimento dos filhotes. Pela reportagem, o jornalista ganhou em 2000 o prêmio Cláudio Abramo, promovido pela revista Jornal dos Jornais.

Ribeiro iniciou sua carreira nos final da década de 50 como repórter da Folha de S.Paulo. Nos anos 60, ingressou na Editora Abril, onde trabalhou nas revistas Quatro Rodas, Realidade e Veja. Deixou a Abril nos anos 70 para comandar a reformulação de jornais em Ribeirão Preto, São José do Rio Preto e Campinas. Contratado pela TV Globo para trabalhar no Globo Repórter, Ribeiro ingressou na equipe do Globo Rural em 1982, um ano depois do início do programa. Em 1985, acumulou o programa na TV com a função de editor-chefe da revista Globo Rural, lançada naquele ano. Por cerca de cinco anos, o jornalista atuou no programa e na revista.

Só na sua fase de jornalismo impresso, Ribeiro ganhou sete prêmios Esso. Uma de suas coberturas mais conhecidas foi a que fez para a revista Realidade sobre a Guerra do Vietnã. Ele próprio se tornou alvo dos bombardeios perdendo parte de sua perna esquerda.”