TV E SOCIEDADE
Fábio Davidson (*)
Há duas semanas estamos com problemas para sintonizar um canal na televisão. Confesso que fiquei feliz! Não corro o risco de “sem querer” acabar assistindo domingos (i)legais, “chavecos” furados, “garapas” apaixonadas ou “bebe amargo”. Aliás, confesso também que, quando tudo ia bem, acabava assistindo a um pouco (?) desses programas. Creio que eles têm alguma propriedade magnética, subliminar, ou será algum artifício daquele gringo hipnotizador (meu xará, por acaso) que, após cinco segundos à frente da TV, neste canal, não conseguimos mais mudar?
Claro que não é propriedade exclusiva a má qualidade do “segundo lugar no Ibope”. Há ainda muita coisa bem pior. E não tem horário… Antes, sabíamos (ou achávamos?) que o pior da programação vinha depois das 9 ou 10 da noite. Mas basta passar uma tarde em casa durante a semana que descobrimos que a baixaria, o sensacionalismo barato, a exposição pública sem limites, enfim, tudo o que pode haver de pior começa bem mais cedo a invadir a telinha. Nada contra os “joões”, “márcias”, “wagneres” e aqueles que acreditam que a cidade só vai ficar alerta, o Brasil, urgente ou o repórter tornar-se cidadão assistindo a seus programas, alguns até chamados de “telejornalismo”!
Senso crítico
Parabéns àqueles que conseguem receber mensalmente em torno de R$ 100 mil… Se esses (salário, fama e afins) forem a principal motivação de suas vidas creio que alcançaram o ápice. Mas não quero entrar no mérito da questão. Aliás, gostaria de lembrar um nome da televisão, Jacinto Figueira Júnior, que ficou conhecido como o “homem do sapato branco”, hoje (sobre)vivendo no ostracismo, com seus mais de 70 anos. Diz artigo de Rodrigo Dionísio para o Observatório da Imprensa (1?/1/2002): “Jacinto vive de uma aposentadoria de R$ 700 e diz não ter mais esperanças de voltar à TV. Vítima de um derrame no início deste ano, tem problemas de locomoção e ouve com dificuldade”. (<http://www.teste.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/asp0101200291.htm>)
Falar que faltam programas de qualidade na televisão é “chover no molhado”. Aliás, a comercialização da notícia e mesmo do entretenimento é visível em diversos meios de comunicação, talvez também devido à unificação destes. Estou lendo um livro interessante, intitulado Os elementos do jornalismo ? O que os jornalistas devem saber e o público exigir“, de Bill Kovach & Tom Rosenstiel. O livro é fruto de um movimento iniciado com 25 dos mais influentes jornalistas americanos, que se reuniram no final da década de noventa para analisar a profissão “jornalista” desde o evento do Watergate, que derrubou o presidente americano Nixon, até a atualidade.
Já no prefácio da edição brasileira, feito com muita propriedade pelo jornalista Fernando Rodrigues, somos colocados frente a frente com a constatação de que empresas de entretenimento (como a Disney) cada vez mais adquirem empresas de comunicação (como a Fox). Não há o que falar sobre entretenimento, afinal cada um se diverte da forma como deseja (acredito até que alguém deva comprar os DVDs com as “melhores pegadinhas”, anunciado num canal destes…). Porém, quanto ao aspecto jornalístico, muito há o que se preocupar. Eventos como o acontecido no programa Domingo Legal do SBT ou, mais para trás na história, como o triste episódio da Escola Base, são pontuais para a sociedade passar a não ser apenas receptora de informações, mas aguçar seu senso crítico.
Ação ou paralisação
O tema é polêmico e longo. Esta semana estamos sendo metralhados com uma campanha em favor da redução da maioridade penal. Mas em poucos momentos há uma mobilização da imprensa na divulgação de movimentos que prezam pelo resgate da dignidade dos menores (e maiores) infratores. Repete-se ano após ano que a Febem é fábrica de criminosos, mas nada se faz para mudar esta realidade. Há, claro, entidades que com muito custo prestam seus serviços nas unidades da Febem, levando aos internos uma palavra de incentivo, tentativas de profissionalização, projetos nas áreas de artes, música, rádio etc. Mas são trabalhos que não contam com divulgação tão grande quanto a que houve em São Paulo para a passeata contra a violência na tarde do sábado 22/11.
Não quero minimizar a dor das famílias envolvidas nas tristes e trágicas mortes dos estudantes, que mobilizaram a imprensa e emocionaram a sociedade. Não vejo entretanto movimentações como estas (que não deixam de ser necessárias) incentivando a população a trabalhar com ONGs, entidades religiosas e voluntários solitários que sim, de maneira lenta e gradual, produzem diferença nas “panelas de pressão” que são as unidades da Febem.
A sorte está lançada. O efeito da nossa ação ou paralisação se reflete não só na sociedade, mas em nós mesmos. O medo de andar na rua, a pé, no transporte público ou em nossos veículos atinge a todos. A preocupação com nossos filhos e amigos não é privilégio de ricos ou pobres. Algo urgente deve ser feito. Vamos ocupar nossos espaços? Não é preciso esperar dar interferência na antena da sua TV para você se “antenar” no que é bom!
(*) Estudante do 1? ano de Jornalismo