Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Pesquisadores em Jornalismo fundam Sociedade Científica

SBPJOR

Victor Gentilli

Nos dias 28 e 29 de novembro, mais de cem pesquisadores reuniram-se no campus da UnB em Brasília, para apresentar suas pesquisas e fundar a Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo, a SBPJor. A criação da SBPJor é um momento marcante na história da pesquisa em Jornalismo. Nesta entrevista, o primeiro presidente da SBPJor, professor Elias Machado, da UFBA, com doutorado na Universidade Autônoma de Barcelona, apresenta a entidade, seus planos, suas propostas e como vê a pesquisa em Jornalismo no Brasil.

Por que uma sociedade científica neste momento?

Elias Machado – A SBPJor nasce como resultado de um crescimento tanto qualitativo quanto quantitativo na pesquisa em jornalismo e do número de pesquisadores interessados neste objeto. Depois de vencida uma primeira etapa, de formação de pesquisadores capacitados para a prática da pesquisa sobre o jornalismo, necessitávamos agora de uma entidade que pudesse se encarregar da formulação de políticas para a institucionalização da pesquisa em todo o país, que estimulasse o desenvolvimento de novas metodologias de investigação e definisse parâmetros de qualidade para a pesquisa. A diretoria da SBPJor parte do pressuposto de que o ensino do jornalismo depende da compreensão do jornalismo como uma das práticas sociais essenciais para o fortalecimento das sociedades complexas e que somente a pesquisa regular e sistemática pode garantir a formação adequada para os futuros profissionais da área.

Há outras circunstâncias conjunturais que estimularam a criação da SBPJor?

EM – Sim. Com a consolidação do sistema de pós-graduação no país, cada vez fica mais difícil ter acesso às fontes de financiamento sem inserção em redes nacionais ou internacionais de pesquisa. Sem a tradição das demais áreas das Ciências Sociais Aplicadas e isolado em instituições, na maioria dos casos sem programas de pós-graduação, o pesquisador de jornalismo teria muitas dificuldades para se inserir no sistema nacional de pesquisa ou mesmo obter financiamento para seus projetos. A SBPJor pretende democratizar o acesso aos órgão de fomento com a criação de redes de pesquisa envolvendo instituições de diferentes portes e perfis.

Há quanto tempo o comitê fundador se reúne e discute a proposta?

EM – O núcleo central do comitê fundador da SBPJor conversava de maneira informal sobre a criação de uma sociedade científica há pelo menos uma década, desde que começamos a nos reunir, no começo dos anos 90, no GT de Jornalismo da Intercom. Data de 1993, o lançamento da Pauta Geral, uma revista especializada em jornalismo e que tinha como um de seus objetivos articular uma rede nacional de pesquisadores. O sonho de constituição da sociedade esbarrava somente na falta de uma disseminação nacional de pesquisadores, muitos então em estágio de formação nas pós-graduações do centro do país ou no exterior. No começo deste ano, durante o I Encontro Luso-Brasileiro de Estudos do Jornalismo, no Porto, voltamos a conversar sobre a viabilidade do projeto. Menos de quatro meses depois, aproveitamos o Congresso da Compós, no Recife, para definir um Comitê Científico que tivesse a missão de lançar o manifesto para os pesquisadores e realizasse o I Encontro Nacional, marcado para a UnB. A acolhida imediata da proposta pelos colegas revela que nossa avaliação estava correta.

Como vê o estágio da pesquisa em Jornalismo no Brasil de hoje?

EM – Podemos dizer que a pesquisa em jornalismo no Brasil está em um estágio intermediário devido a um processo tardio de institucionalização. Há em nosso país uma tradição de, ao menos 70 anos de pesquisa neste campo, mas, lamentavelmente, durante os primeiros 50 anos, a pesquisa dependia de profissionais talentosos e estava desvinculada de programas formais de pós-graduação. A criação dos cursos de pós-graduação em comunicação contribuiu para aumentar o número de pesquisas, mas ainda falta um aumento na quantidade das investigações, na diversidade das temáticas e no rigor metodológico.

OI– Comparativamente com às pesquisas feitas no exterior, como vê a pesquisa brasileira?

É difícil generalizar porque lidamos com realidades muito diversificadas. Se raciocinarmos tendo como parâmetro os centros de excelência existentes no Brasil, poderíamos afirmar, sem medo de errar, que o nível de nossas pesquisas nada deixa a desejar quando comparadas com a de nossos colegas estrangeiros. No caso do meu objeto de estudo ? o jornalismo digital ? mantemos contatos e intercâmbio permanente com alguns dos melhores centros de pesquisa na Europa, na América Latina ou nos Estados Unidos com quem dialogamos de igual para igual. Nosso problema consiste no fato de que vivemos em um país imenso, com disparidades regionais acentuadas e que a realidade dos centros de excelência dista muito das regiões aonde a pesquisa inexiste ou continua incipiente.

Dá para fazer comparações mais nítidas com a pesquisa latino-americana, a norte-americana e a européia?

EM – Na América Latina, com a exceção do México, os demais países têm um tradição muito recente de estudos pós-graduados. Evidente que, neste caso, a pesquisa brasileira no campo do jornalismo revela mais consistência, regularidade e sistematização. No caso europeu, com exceção da Espanha, os estudos sistemáticos em jornalismo são muito mais recentes que os brasileiros. Em Portugal data do final dos anos 70, na Inglaterra dos 80 e na Itália dos anos 90. Nestes países, sem uma longa tradição no ensino do jornalismo, a pesquisa estava atrelada aos cursos de sociologia ou de estudos culturais. Quando comparada com a realidade dos Estados Unidos nenhuma dúvida que temos muito caminho pela frente. Ao contrário do Brasil, nos Estados Unidos, as temáticas são muito mais variadas, os modelos metodológicos mais consistentes e a institucionalização muito mais homogênea em todo o país. Talvez uma das vantagens que tenhamos venha exatamente das nossas mais brilhantes exceções. A despeito da falta de institucionalização e da pequena divulgação internacional, pode-se dizer hoje que a obra de autores como Luiz Beltrão, Barbosa Lima Sobrinho, Danton Jobim, Alberto Dines, José Marques de Melo, Nilson Lage, Cremilda Medina, Ciro Marcondes Filho, Muniz Sodré e Adelmo Genro Filho, entre outros, representa uma original contribuição brasileira aos estudos do jornalismo.

Quais as principais propostas da SBPJor?

EM – A SBPJor tem seis propostas básicas: 1) Institucionalizar a sociedade e a pesquisa em jornalismo a nível nacional, promovendo congressos para facilitar o intercâmbio entre os pesquisadores; 2) Reestruturação do sítio web da SBPJor para que o pesquisador em jornalismo tenha um espaço de referência aonde possa buscar informações para o desempenho de suas atividades. 3) Estimular a divulgação internacional das pesquisas sobre jornalismo desenvolvidas no país, através do lançamento da Brazilian Journalism Review, uma publicação científica em inglês; 4) Criar um banco de dados on-line com as dissertações, teses e artigos sobre jornalismo escritos no país; 5) Fomentar a articulação de redes regionais, nacionais e internacionais de pesquisa para agregar os pesquisadores lotados em instituições de diferentes portes e perfis e 6) Definir parâmetros nacionais de qualidade, capazes de assegurar que a pesquisa em jornalismo brasileira esteja no mesmo patamar da produzida nos melhores centros internacionais.

Destas, quais as mais imediatas?

EM – A primeira delas será a institucionalização formal e legal da SBPJor para que possamos estabelecer um contato formal com as demais entidades congêneres e com as instituições governamentais, privadas ou agências de fomento. A segunda a reestruturação do sítio web ? por enquanto estamos com um sítio provisório hospedado no curso de jornalismo da UFSC (ver remissão abaixo). A terceira, a preparação do nosso segundo encontro anual, previsto para novembro de 2004, em Salvador. E a quarta, o lançamento da primeira edição da Brazilian Journalism Review, que esperamos coincida com o encontro de Salvador.

Como a SBPJor pretende se relacionar com entidades similares, mas do campo da comunicação, como a Intercom e a Compós?

EM – Nascemos com o firme propósito de atuar de forma conjunta com todas as demais entidades do campo da comunicação. Todos nossos diretores têm vinculação direta com estas entidades. Muitos deles foram diretores, coordenadores de GT ou são sócios da Intercom ou da Compós. Não deve caber nenhuma dúvida que estaremos sempre dispostos a estabelecer um diálogo fraterno com todas nossas co-irmãs. Quando da fundação oficial, além dos diretores das agências de fomento e dos coordenadores da área de comunicação na Capes e no CNPq, convidamos representantes de todas as entidades do campo e, felizmente, contamos com a presença do presidente da Capes e de representantes da SBPC e do Fórum Nacional de Professores de Jornalismo. A Intercom compareceu com seu presidente de honra, professor José Marques de Melo, aliás, convidado a ser o primeiro a assinar a lista da assembléia de fundação. Será, portanto, o sócio número um da SBPJor. A Compós justificou a ausência dos membros de sua diretoria, mas a entidade estava representada porque, entre nós, contávamos com a presença da colega Zélia Adghirni, da UnB, coordenadora do GT de Jornalismo e que pertence ao nosso Conselho Científico.

Nas questões que não são estritamente de pesquisa, como a SBPJor pretende se relacionar com o Fórum Nacional de Professores de Jornalismo e com a Abecom (Associação Brasileira das Escolas de Comunicação).

EM – Como frisamos antes, a SBPJor pretende manter uma relação estreita com as associações co-irmãs. Sempre que chamados estaremos abertos ao diálogo. E sempre que julgarmos necessário não hesitaremos em convidar as demais entidades para ações conjuntas de interesse do campo do jornalismo. No nosso ponto de vista, o ensino de jornalismo deveria estar, cada vez mais, vinculado à pesquisa. Neste sentido, pretendemos atuar de forma conjunta seja com o Fórum Nacional de Professores de Jornalismo, entidade que conta com a participação de vários de nossos diretores, seja com a Abecom, para garantir que a pesquisa esteja presente em todos os cursos de jornalismo no país. A presença do coordenador Nacional do Fórum, professor e jornalista Gerson Luiz Martins, revela o nível deste entrosamento e a SBPJor está convidada a participar do próximo congresso do Fórum que trata justamente do ensino de jornalismo, em abril de 2004, em Florianópolis. E, claro, não podemos esquecer nossas melhores relações com a Federação Nacional dos Jornalistas, a Fenaj. A diretora para assuntos de formação, professora e jornalista Valci Zucoloto acompanha há anos nossas discussões, e estava em nosso encontro representando formalmente a entidade.

 

Brasília, 29 de novembro de 2003

Os participantes do 1? Encontro Nacional dos Pesquisadores em Jornalismo, realizado nos dias 28 e 29 de novembro na Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB) decidem fundar, nesta data, a Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor).

Depois de mais de 30 anos da defesa da primeira tese de doutorado no país, a pesquisa em jornalismo no Brasil tem ganhado legitimidade em número, qualidade e alcance dos trabalhos. O nascimento da SBPJor insere-se em um movimento de afirmação, desenvolvimento e institucionalização da produção científica em jornalismo no país, pressuposto fundamental para ampliar a qualidade não só das faculdades e universidades, mas também para a compreensão do fenômeno do jornalismo, sua reflexão e seu aprimoramento.

A SBPJor nasce para:

Congregar todos aqueles que se dedicam à pesquisa em jornalismo, não fazendo distinção de região ou vínculo institucional, para o intercâmbio e criação de redes de pesquisa regionais, nacionais e internacionais.

Incentivar a reflexão pluralista sobre questões emergentes do campo do jornalismo, desenvolvendo modelos de análise e metodologias de ensino e extensão, além de estimular a pesquisa aplicada, contribuindo para o aperfeiçoamento e revitalização intelectual e profissional da área.

Por meio de suas atividades de ampliação e aprofundamento das pesquisas no campo, contribuir para o avanço do saber e para uma reflexão sobre o jornalismo enquanto uma atividade imprescindível para a sociedade.

Ampliar a publicação científica de qualidade, seja criando veículos próprios, seja estimulando entre os pesquisadores a publicação em periódicos especializados, nacionais e internacionais, garantindo o mapeamento e a sistematização da produção na área;

A SBPJor nasce em um momento ímpar, marcado, por um lado, pelo amadurecimento das pesquisas na área e, por outro, por desafios colocados tanto para a pesquisa e o ensino em geral, quanto para o exercício profissional do jornalismo. A Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo, inserida nesse contexto, buscará ampliar, defender e cobrar os espaços de pesquisa de qualidade em nossas instituições, aprofundar a relação pesquisa/ensino/extensão no jornalismo e fundamentar a reflexão que permita a defesa do jornalismo enquanto atividade específica essencial na sociedade.