CENA ABERTA
"Pouco tempo e muita eficácia", copyright Jornal do Brasil, 20/11/2003
"Cena aberta, que estreou anteontem e vai ocupar as próximas quatro noites de terça-feira (horário de 22h45) na Globo, é mais um bem-vindo sopro de novidade na televisão. No desalentador panorama da TV aberta, qualquer atração mais criativa já saltaria aos olhos. Mas mesmo que o ambiente TV estivesse hoje em um nível mais alto, Cena aberta ainda sobressairia por propor um formato inédito.
O projeto desenvolvido por Guel Arraes, Jorge Furtado e Regina Casé mistura elementos que, até isolados renderiam três bons programas. Ainda mais nas mãos desse trio, que já provou talento um punhado de vezes, juntos ou separados. Poderia ser uma adaptação literária, uma atração sobre como são os bastidores de um programa ou ainda um minidocumentário sobre imigrantes nordestinos. Cena aberta é os três simultaneamente, em doses mínimas de tempo e quase máximas de eficácia.
Quando mostra a vida das sete candidatas ao papel da sofrida Macabéa de A hora da estrela, que guardam algumas semelhanças com a personagem de Clarice Lispector, Cena aberta consegue alternar bem demais humor e emoção. Dá para rir. Dá para chorar também. Ainda mais com o empurrãozinho da atriz Ana Paula Bouzas, quando ela fala que para interpretar Macabéa vai copiar o olhar de uma das candidatas não-profissionais e acaba chorando. Esse é um dos trechos que mais funcionaram na parte em que o programa se propõe a fazer o making-of de si mesmo.
Mas faltou muito para dar uma boa idéia dos bastidores de uma gravação. Ali só se mostrou a escolha de elenco e do figurino, e um tantinho de direção de cena. Podia haver mais situações típicas, como um grito de ?gravando!? e técnicos e operadores correndo por trás das câmeras. No entanto, sabe-se que o tempo é curto e as etapas escolhidas funcionaram bem.
Cena aberta conseguiu soar interessante até na hora de contar em poucas cenas a história escrita por Clarice Lispector, entremeando rápidos e impressionantes trechos de entrevistas da autora. No início, podia parecer um erro entregar logo de bandeja para o público o fim da trama. Mas eis que o programa dá um golpe de mestre quando inventa um outro desfecho para os personagens. Na verdade, não ?outro? desfecho, mas um desfecho adicional, levando os personagens a mais uma dimensão de existência. Ao mesmo tempo respeita a decisão de Clarice e não deixa o telespectador ir para a cama triste com a história. Nem triste com a televisão brasileira."
"?Cena? se perde no labirinto da metalinguagem", copyright Folha de S. Paulo, 20/11/2003
"Dizer que os diretores Guel Arraes e Jorge Furtado não são competentes é dizer besteira. Falaremos dos vícios, não das pessoas, como recomendam os beneditinos. Os rapazes são engenhosos, têm repertório e representam, de algum modo, um ideal do que se acostumou chamar de ?produto de qualidade? da recente safra de TV.
A atriz Regina Casé inaugurou, tempos atrás, com suposta carga etnográfica, mas ainda sem a devida bênção do gênio Câmara Cascudo, o filão que desembocaria em uma certa ?brasilidade? praticada pela Globo. Algo que funcionou bem como uma purgação de culpa da emissora, historicamente acusada por adornianos e ignorantes panfletários como este cronista, de pisotear a língua ?baiana? e os costumes regionais.
Arraes, Furtado e Casé comandam o ?Cena Aberta?, programa que estreou na última terça na Globo. O tema é a metalinguagem. Aquela coisa de discutir a coisa, a coisa em si, a própria coisa sobre a mesma coisa, o espelho, o seu duplo… Televisão sobre televisão, a partir de narrativas da literatura brasileira.
Na sua primeira e pretensa lição de alteridade, o programa convocou as Macabéas, essas moças que guardam suas dores ?paraíbas? em quartos de pensão ou cubículos de empregada. Qualquer uma, entre as escolhidas pela produção, poderia representar, sem maquiagem ou cuidado, a personagem de ?A Hora da Estrela?, da ucraniana Clarice Lispector (1920-1977).
O personagem começou a ser definido, por Casé, com a seguinte pergunta: ?Quem aqui tem cara de nordestina??. A atriz fez graça e disse que ela mesma era uma típica representante.
Passou a discutir, então, a verossimilhança a partir do figurino das candidatas a Macabéa. O vestidinho brejeiro é cearense, a calça jeans cortada no meio da canela é carioca. Um rápido debate à toa, como se houvesse diferença nos tabuleiros e araras de camelôs e C&A?s da vida. Mas aí viria a ótima surpresa do ?Cena Aberta?, Clarice Lispector em carne e osso, ali na tela, em imagens de arquivo, a derreter a maquiagem como uma legítima Macabéa.
Doía-se toda, como a personagem. Coisa que as nordestinas convidadas até ensaiaram, mas não deram conta. Não por falta de dores universais -Tolstói mora nas veias de todo mundo-, mas pelo excesso de metalinguagem e enxerimento da narradora Casé. Até na hora de atravessar na contramão, ouviu-se um ?chama o dublê? -gracinha que não ornou com os mistérios de Clarice.
Distanciamento brechtiano fora de hora e lugar."
DUBLÊS
"Aventure-se: O trabalho que é um perigo", copyright Jornal do Brasil, 20/11/2003
"Você já se surpreendeu com as cenas de acidentes de carro, de moto ou de afogamento em filmes e novelas? Já se perguntou como os atores têm coragem de gravar em determinadas situações? Geralmente, quando o risco é muito grande, quem entra em ação é uma família que fez dessas aventuras seu estilo de vida. A equipe de dublês Só Ação sente na pele a adrenalina de quem não consegue viver longe do perigo.
Jorge Só, o pai e pioneiro da turma na atividade, começou por acaso. Foi convidado para ser dublê em um episódio de um seriado na TV, em 1981, porque era campeão de canoagem em onda. A experiência deu certo e ele passou a gravar todas as cenas perigosas do programa. Mais tarde, convenceu a esposa, Denise, a também mergulhar nessa loucura.
– Era um episódio de guerra, em que precisávamos de um soldado para cair sobre um tanque. Eu disse para ela vestir uma roupa de soldado, colocar um capacete, prender o cabelo e mergulhar fundo – lembra ele.
Denise não só aceitou a sugestão de Jorge, como o acompanha até hoje. Ela é a coordenadora da agência Só Ação, que os dois montaram há cerca de 20 anos. O envolvimento com o risco não parou por aí. Os filhos do casal, Yan (18 anos) e Yuri (20 anos), seguem os passos dos pais e mostram que essa paixão também corre em suas veias.
– Enquanto na maioria das famílias as pessoas brigam para ver quem vai pagar as contas, lá em casa a gente briga pra decidir quem vai fazer a capotagem – brinca Yuri.
Mas isso não é tanto motivo de orgulho para a mãe coruja, que se preocupa quando os filhos estão em cena.
– Com eles é diferente. São meus filhinhos pequenos, que nunca vão crescer pra mim. Ainda hoje, fico apavorada – admite Denise.
Mas segurança é questão primordial durante as gravações. Em todos os trabalhos, uma UTI móvel os acompanha, com médicos e especialistas a postos para possíveis emergências. Além disso, eles fazem um programa específico de exercícios, em uma academia do Rio, para trabalhar o corpo em função das cenas que serão gravadas. Assim, fica mais fácil agüentar o tranco.
– Eu já capotei em 63 carros. Mas ainda hoje tomo os mesmos cuidados e precauções que tomei na primeira vez. Não dá para descuidar, afinal, não deixa de ser um acidente – diz Jorge.
Mesmo com tanta preparação, a família garante ainda ter um certo medo. Mas a confiança na técnica e a experiência adquirida ao longo dos anos são combustível suficiente para não deixá-los parar.
Conheça mais sobre a família Só Ação e confira cenas de perigo gravadas por eles no programa Opção: Esporte, que vai ao ar hoje, às 15h37, no SporTV."