A SEMANA
Victor Gentilli
Quatro fatos isolados:
1. A página do Ministério da Fazenda na internet divulga em destaque um documento intitulado "O gasto social no Brasil" [veja remissão abaixo].
2. As colunas de notas e mexericos políticos informam que vem aí um endurecimento para os centros universitários.
3. O ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu anuncia uma ampla reforma universitária. Junto com o anúncio a frase, atenuada no dia seguinte: "o pau vai comer".
4. O ministro da Educação Cristovam Buarque surpreende e rejeita a proposta da comissão nomeada por ele para avaliar a avaliação das universidades e informa que o provão muda, mas continua.
Que este observador tenha visto, não houve quem juntasse os quatro fatos como um movimento único do governo, finalmente decidido a enfrentar e tomar posição com relação à crise do ensino superior, em especial o público. Uma colunista de destaque abordou, em três colunas diferentes, três dos quatro fatos. Mas cada um foi tratado isoladamente e o aperto nos centros universitários foi esquecido.
A necessidade de anotar e observar relação entre os quatro fatos parece evidente. Mas não foi feito. Entender e explicar os movimentos do governo é, claro, muito mais difícil. A luta de gigantes entre os maiores empresários do ramo de educação (educaçccedil;ão é ramo de negócios?) parece ter sido ganha pelo maior de todos, o dono da Unip, João Carlos Di Gênio, hoje aliado do todo-poderoso comandante José Dirceu.
A raposa e o galinheiro
O documento divulgado pela Fazenda, é claro, explica as bases conceituais que sustentam o argumento governamental para propor a reforma universitária. Sabe-se ainda pouco, mas pelo que diz tanto o chefe da Casa Civil como o ministro da Educação, não se irá mexer na gratuidade do ensino superior público. Que as universidades públicas brasileiras, especialmente as federais, continuam praticamente como estavam há décadas não é novidade. As vagas não aumentam; o ensino noturno não se implanta, o anacronismo se cristaliza na burocracia.
"O pau vai comer." A frase de José Dirceu remete diretamente à reforma da Previdência. Os professores e servidores de universidades federais, que se sentiram prejudicados e não foram ouvidos quando das mudanças previdenciárias, vão tomar, parece, uma segunda pancada agora. Se antes se aposentavam cedo, se é possível entender o pensamento do governo, agora, além de trabalhar, vão ter que aprender a correr atrás de dinheiro.
O ministro Cristovam anunciou, com poucos detalhes, a reviravolta de sua posição em relação ao provão. As coisas, analisadas com atenção, não ficam muito diferentes. As ênfases é que mudam.
De toda forma, ninguém desmentiu a discussão dos custos do provão, argumento para torná-lo trienal e por amostragem. O governo diz que apenas alguns cursos são avaliados pelo provão e esquece que o custo maior do exame é por aluno. Ainda falta incorporar outros cursos, é verdade. Mas ninguém fez as contas e viu que cerca de 80% dos estudantes de ensino superior já foram avaliados.
O governo não enfrentou nenhum dos grandes argumentos que o próprio governo usava para combater o provão. O ranqueamento, por exemplo, sempre criticado, vai continuar. Em vez de "A, B ou C", os cursos serão "satisfatórios", "insatisfatórios" ou estarão no meio do caminho.
Nenhum jornal deu voz aos educadores que observaram que a amostragem é complexa e difícil de fazer. Quem fará a amostragem? O MEC? Com que critérios? As próprias escolas avaliadas? Não parece aquela história da raposa e do galinheiro?
As coisas estão apenas começando. Seria interessante se os jornais, as revistas, os telejornais e as emissoras de rádio contassem como elas andam.
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