O Prêmio para a Melhor Investigação Jornalística de um caso de Corrupção é
concedido anualmente às publicações da América Latina pela organização
Transparency International, organização sem fins lucrativos destinada a combater
a corrupção através de seus colaboradores na América Latina e no Caribe (TILAC),
e pelo Instituto Prensa y Sociedad (IPYS), organização de jornalistas
independentes latino-americanos. A premiação é patrocinada pela Open Society
Institute, fundação privada com sede em Nova York.
Em sua quarta edição, 139 jornalistas de 17 países da América Latina
concorreram ao prêmio. O júri foi formado por Marcelo Beraba, ombudsman da
Folha de S. Paulo; Gustavo Gorriti, colunista da revista peruana
Caretas; Michael Reid, editor da Economist na América Latina;
Gerardo Reyes, do El Nuevo Herald; e Tina Rosemberg, editorialista do
New York Times.
Este ano, duas jornalistas venezuelanas ganharam o primeiro lugar. Tamoa
Calzadilla e Laura Weffer dividiram o prêmio no valor de US$ 25 mil por terem
escrito, nos jornais Últimas Notícias e El Nacional,
respectivamente, sobre a atuação do Ministério Público na resolução do
assassinato do fiscal venezuelano Danilo Ánderson. Ánderson morreu devido a uma
explosão em seu carro em 2004; ele era encarregado de identificar os
responsáveis de uma tentativa de golpe de Estado contra o presidente Hugo
Chávez. As duas repórteres encontraram fatos desconhecidos da conduta do fiscal,
com base em testemunhas que logo foram ignoradas no processo de investigação, e
outras informações sobre a falta de idoneidade da principal testemunha de
acusação dos supostos participantes de uma conspiração política para assassinar
o fiscal.
Reconhecimentos especiais
Em investigações especialmente meritórias, dois reconhecimentos especiais
receberam US$ 5 mil dólares cada um. Um dos agraciados foi o jornal El
Imparcial, publicado em Hermosillo, capital do estado mexicano de Sonora. Os
jornalistas Jorge Morales e Sergio Fimbres obtiveram documentos e testemunhos
comprovando corrupção por parte de deputados do Congresso de Sonora. Os outros
premiados foram Giannina Segnini, Ernesto Rivera e Mauricio Herrera, do La
Nación, de Costa Rica, que denunciaram o pagamento de suborno ao prefeito de
San José por parte de uma empresa canadense para obter a operação de obras
sanitárias na cidade.
Menção honrosa
Diversas reportagens receberam menção especial. No Brasil, os jurados
escolheram duas matérias que, segundo eles, foram importantes para desencadear
as investigações de corrupção nos poderes Executivo e Legislativo. Uma delas, de
autoria de Policarpo Junior, da Veja, denunciava subornos por parte do
ex-diretor dos Correios Maurício Marinho; a outra foi a entrevista de Renata Lo
Prete, da Folha de S.Paulo, com Roberto Jefferson, sobre a denúncia do
mensalão. O jornalista Eduardo Faustini, da Rede Globo, também foi mencionado
por uma reportagem sobre corrupção em Rondônia.
Na Argentina, a equipe do Telenoche Investiga, do Canal 13, comprovou
pelo segundo ano consecutivo a manipulação e chantagem que os dirigentes
políticos exercem sobre os índios na província de Formosa para obter votos em
eleições.
No Equador, os repórteres Arturo Torres e Dimitri Barreto, do El Comercio
de Quito, revelaram a compra ilegal de armas do Chile e Argentina por parte
do exército equatoriano durante a Guerra do Cenepa, em 1995.
O jornalista de El Salvador Rafael García, do jornal La Prensa
Gráfica, denunciou a participação ilegal de uma empresa de Luis Cardenal,
ministro do Turismo, em uma licitação do governo.
O repórter paraguaio Jorge Torres, do Última Hora, investigou o uso de
recursos da hidroelétrica Itaipu para a reeleição do presidente Nicanor
Duarte.
Na mídia colombiana, a menção foi para uma matéria sobre o controle de um
jogo de azar popular no país por grupos paramilitares. Mas a história por trás
da reportagem era ainda mais reveladora sobre o poder dos paramilitares. Na
maior parte das investigações, os repórteres guardam suas informações a quatro
chaves e competem para ser o primeiro a dar o furo. No caso colombiano, a
apuração foi feita em conjunto por repórteres e editores de 19 revistas e
jornais da Colômbia. Todos os veículos publicaram a matéria no mesmo dia, sem
nenhum nome creditado. A idéia era não expor nomes que pudessem se tornar alvos
de retaliação. Com informações da IPYS [20/6/06].
Profissionais enfrentam pressões e ameaças
Em muitos países da América Latina, os jornalistas têm de conviver com leis
que tornam difamação uma ofensa criminal e, geralmente, as definições para
calúnia são amplas. A Venezuela, por exemplo, considera crime usar expressões
desrespeitosas contra autoridades públicas, mesmo se as acusações forem
verdadeiras.
Sob pressão, a maior parte dos editores e publishers da América Latina
precisa de poucos motivos para desistir do jornalismo investigativo – ainda mais
porque este tipo de jornalismo requer dinheiro e tempo da equipe. Para
desestimular ainda mais as reportagens investigativas, os governos aprenderam
que subornos podem ser mais efetivos que ameaças. Na Argentina, a administração
do presidente Carlos Menem costumava processar por difamação os repórteres
investigativos. Mas, depois que uma decisão judicial da Corte Interamericana de
Direitos Humanos pôs fim a esta prática, o novo presidente Néstor Kirchner
dobrou os gastos do governo em anúncios na mídia. Resultado: uma imprensa de
olhos fechados para casos de corrupção. Em algumas cidades do interior, 75% dos
lucros com publicidade vêm dos anúncios do governo.
É comum que jornalistas latino-americanos que investigam corrupção, tráfico
de drogas e outros crimes sofram ameaças ou sejam assassinados. Mabel Rehnfeldt,
diretora da unidade investigativa da ABC Color, em Assunção, no Paraguai, foi
perseguida por homens armados, recebeu diversas ameaças de morte e ainda por
cima foi processada. Depois que ela publicou uma série de matérias sobre abuso
sexual e fraude na Igreja Católica, homens não identificados tentaram seqüestrar
sua filha.
Apesar de todos estes obstáculos, há boas reportagens investigativas na
América Latina, até mesmo nos jornais regionais, como informa Tina Rosenberg, em
artigo no New York Times [2/7/06]. Tina foi uma das juradas deste ano
para o Prêmio para a Melhor Investigação Jornalística de um caso de Corrupção.
Infelizmente, ela revela que, apesar dos casos exemplares homenageados pelo júri
do prêmio, alguns países que costumavam publicar reportagens investigativas não
o fazem mais. ‘Houve um notável declínio em reportagem investigativa na
Argentina, Colômbia e Peru, todos lugares com forte tradição investigativa’, diz
a editorialista.