ASSESSORIAS DE IMPRENSA
Sandro Fuzatto (*) e Douglas Dantas (**)
Foi-se o tempo em que os assessores de imprensa tinham o papel de simplesmente intermediar e facilitar ? muitas vezes nem isso era feito ? o acesso dos jornalistas às informações e fontes da empresa ou órgão para o qual trabalham, e ao repórter propriamente dito cabia a checagem da informação, o aprofundamento do tema ouvindo outras fontes, a contextualização do assunto e, enfim, a produção final do texto jornalístico divulgado pela imprensa.
Atualmente, o que vemos com muita freqüência são repórteres copiando e colando (o computador facilita tudo) as informações de um release sem ao menos checá-las, sem acrescentar novos dados ou até mesmo sem ouvir o outro lado envolvido na situação. O que se vê com freqüência é o repórter cobrar a notícia já pronta do assessor. Recentemente, uma profissional de assessoria revelou que um repórter de um jornal da Grande Vitória cobrou dela que lesse um documento/relatório divulgado pelo órgão público para o qual presta assessoria e achasse o lead da notícia. Casos raros? Não, muito pelo contrário, isto está se tornando normal.
O problema, ao que tudo indica, está no enxugamento das redações. Com menos profissionais, os jornalistas acabam recebendo um número maior de pautas e ficam sobrecarregados. É comum um jornalista ter três, quatro, cinco pautas para cumprir em apenas uma tarde, ou uma manhã. Se cada pauta tiver no mínimo três entrevistados, o pobre coitado terá de entrevistar nove, doze, quinze pessoas. Será que dá tempo? Melhor, será que dá para fazer um trabalho bem-feito?
Resultado, sobrecarregado e compelido a cumprir as pautas (caso contrário será compelido a deixar o emprego), o jornalista acaba se apoiando em qualquer pessoa que possa lhe ajudar. Com isso, matérias produzidas em assessorias saem completas nas páginas dos jornais. Matéria de página inteira, com retranca, sub-retranca, tabela de serviços e tudo mais. Muitas vezes, os textos sequer são mexidos. Até os erros de português passam. Muda apenas a assinatura. Fez o jornalista da assessoria, assina o repórter da redação.
Todos perdem
Essas "economias" feitas pelas redações geram fatos no mínimo curiosos. Ao enviar um release sobre um evento que ocorreria na Grande Vitória, um assessor teve o número de seu celular divulgado no jornal como se ele fosse o organizador do evento. Talvez o release não informasse corretamente os contatos da organização do evento; erro do assessor. Mas, e o jornalista, que não checou a informação? Erro ainda maior.
Certamente que essa situação pode ser considerada como ponto positivo para as assessorias e, é claro, como ponto negativo para os jornais. Vejamos: a responsabilidade do assessor aumenta com essa situação. Sabendo que seu texto pode entrar completo no jornal, o assessor deve se preocupar mais com apuração, checar as informações e (mesmo sabendo que tem que defender seu cliente) tentar ser imparcial (será que isso é possível?). Para os jornais fica a pergunta: onde está a boa apuração, o aprofundamento das questões e, principalmente, a checagem dos fatos?
Aos assessores cabe não encarar a situação como uma mera oportunidade de emplacar as notas de seus assessorados, mas como uma nova tendência de mercado, na qual os textos mais completos, com mais informações, mais bem acabados e com melhor nível de revisão têm maiores chances de conquistar os editores e, assim, ser estampado nas páginas do dia seguinte.
Os jornalistas não querem um assessor para simplesmente passar as informações da empresa, mas sim agências de notícias, para fazer o trabalho de apuração. Caberia aos editores apenas selecionar e publicar os releases, agora notícias. Ou seja, não mais existiriam assessorias, mas agências de notícias.
Essa denominação de "agência de notícias" pode parecer engraçada, mas não é. Na verdade isso é uma tendência do mercado. Como os jornais querem materiais completos, pois seus jornalistas não têm tempo para a produção, as assessorias devem mesmo corresponder as expectativas produzindo-os, com todas as informações possíveis e entrevistando todas as fontes. Os jornais usam aquilo que julgarem necessário. Isso possibilita aos assessores mais condições de emplacar notícias de seus assessorados.
Numa visão imediatista, ganham o assessor (que pode desenvolver um trabalho mais apurado) e o assessorado (que pode aparecer no jornal com mais freqüência); perdem o jornalismo (que corre o risco de perder em imparcialidade) e os leitores (que correm o risco de consumirem matérias imparciais e sem a devida apuração).
A médio e longo prazo, todos perdem. Afinal, assessor e assessorado buscam nos jornais a credibilidade. Se os jornais perdem credibilidade, e certamente a perderão neste andar da carruagem, perde o sentido o trabalho da assessoria. Os leitores e o jornalismo são as vítimas imediatas. Assessor, assessorado (e no fim das contas, todo o sistema midiático) também vão acabar perdendo.
(*) Jornalista
(**) Estudante de jornalismo do Centro Universitário
Vila Velha