NOTAS DE UM LEITOR
A discussão ausente
Luiz Weis
Os jornais de São Paulo mostraram tudo menos o essencial na abordagem de um assunto com o qual os paulistanos terão de conviver pelos próximos 11 meses ? se não daí para mais: as duas passagens subterrâneas que a Prefeitura está começando a construir na zona sudoeste (no cruzamento da avenida Faria Lima com a Rebouças, de um lado, e com a Cidade Jardim, de outro).
Folha e Estado se saíram bem no quesito prestação de serviços (as estratégias para o motorista enfrentar os efeitos das obras sobre a circulação) e no relato dos prejuízos sofridos pelo comércio das vias interditadas e das dores de cabeça que esperam os moradores da ruas residenciais para onde os veículos foram desviados.
O que não se fez foi abrir avenidas jornalísticas para dar passagem a um debate, sob a forma de reportagens, de preferência, a respeito da serventia desse transtorno todo. Claro que o eventual aspecto "eleitoreiro" dos polêmicos projetos entrou em matérias e editoriais, com as acusações e os desmentidos previsíveis.
Mas o debate cada vez mais essencial que faltou é outro: será que adianta, aqui ou em qualquer lugar, gastar uma dinheirama ? R$ 149 mi, no caso ? e infernizar a vida de milhões com obras para, como se diz, "aliviar o trânsito"? O que as metrópoles brasileiras têm a aprender, no gênero, com o que aconteceu, digamos, em Nova York, Londres, Tóquio? Não faltariam histórias para contar, nem números para exibir.
Além disso, São Paulo pode ser um horror urbanístico e ter uma circulação infernal, mas conta com urbanistas e especialistas em tráfego da melhor qualidade para analisar esse que sem dúvida é o maior dilema de toda grande cidade do mundo.
Do que este leitor viu, apenas a Folha deu um sinal de vida inteligente nesse deserto de fatos e idéias. Primeiro, com o editorial "Na contramão", de terça-feira, 6, cujo lide vai ao nervo do problema: "Um trânsito como o de São Paulo já está muito além do alcance de qualquer obra viária". Com uma frota que cresce à razão de 400 ou 500 veículos por dia, apesar da estagnação da economia, "a imagem que cabe", compara o jornal, "é a de alguém munido de um pedaço de pano tentando enxugar um iceberg".
Depois, no domingo, com a coluna de Gilberto Dimenstein "O futuro de uma cidade está escrito nas calçadas" (que sugere que colunista e editorialista sejam a mesma pessoa). "A cidade não pára de fazer obras para evitar congestionamentos", escreve, "mas o trânsito está cada vez pior." Dimenstein cita quem ele considera, com razão, "um dos mais importantes especialistas em engenharia de trânsito", Roberto Scaringela: "Estamos condenados à paralisia".
A saída, ou "o que de mais parecido existe com uma solução", segundo o editorial, não tem nada de novo: a subordinação do transporte individual a sistemas coletivos como ônibus e metrô, com a implantação de pedágios urbanos, ampliação do rodízio de veículos e, investimentos, muitos investimentos, no transporte subterrâneo.
Se, tomando como gancho as obras car-friendly da prefeita Marta Suplicy,
os jornais paulistanos tivessem mergulhado nessa pauta, teriam prestado um serviço
público muito mais importante do que ensinar os motoristas como ir do
ponto A ao ponto B em 2004 pelo caminho menos ruim possível.
Ao repórter Elder Ogliari, do Estado, em Porto Alegre, pela série de matérias sobre Adriano Vicente da Silva, matador confesso de 12 crianças no Rio Grande do Sul, preso afinal na terça-feira, depois de ter sido detido e solto três vezes pela polícia gaúcha no ano passado.
Às repórteres Sandra Balbi e Adriana Mattos, da Local da Folha,
pelas matérias publicadas domingo sobre as suspeitas de trapaças
da Parmalat no Brasil e do seu principal executivo durante 11 anos, Gianni Grisendi,
proibido, por outras razões, de sair do país, desde novembro passado.