Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Paulo Chueiri

MERCADO PUBLICITÁRIO

“A gangorra dos veículos”, copyright Meio e Mensagem, 26/01/04

“Você, publicitário ou profissional de marketing, sabe que a comunicação no Brasil é das melhores e mais avançadas do mundo. A nossa televisão, os nossos jornais, as nossas revistas, as nossas rádios, a mídia exterior, os cinemas, os nossos portais, enfim, todos os meios, não somente a chamada mídia principal, não devem nada aos países mais desenvolvidos. Neste setor o Brasil faz parte do primeiro mundo.

Não obstante, essa magnitude não encontra reciprocidade no volume de negócios de mídia. Estamos falando de pouco mais de US$ 3 bilhões sendo disputados por milhares de veículos. Cobertor curto para muita gente.

Com a estagnação que nos tem sido apresentada nos últimos dois anos, os veículos que detêm os primeiros lugares em audiência, circulação, penetração, que normalmente têm maior participação no bolo, tendem a ser logicamente preservados, ou são menos prejudicados. Em momentos de retração ou de estagnação econômica a sua participação tende a aumentar, ainda que sem crescimento real, em detrimento dos demais veículos, que passam a sofrer uma queda real nos negócios e na participação. É lógico que com pouco dinheiro se busque mais segurança nos resultados, se ouse menos, se deixe o anunciante mais à vontade com recomendações de soluções que não ofereçam risco e tenham maior garantia de entrega dos números.

Tudo isso é coerente, mas é importante frisar que em boa parte dos casos os veículos prejudicados neste contexto não estão se valendo em suas abordagens comerciais do que há de mais importante no tratamento mercadológico das marcas às quais pretendem se vender, que é ter foco nas necessidades das marcas. Muitas das propostas colocadas no mercado são geradas pelas próprias necessidades de atingir as metas de faturamento, sem a preocupação maior de propor soluções de mídia que contribuam para melhorar a eficiência da comunicação das marcas. Dessa maneira, há pouca chance de superar os momentos difíceis.

Ganhar esse jogo – ou mesmo empatar – não é fácil, mas é tecnicamente possível. Basta rever alguns conceitos e mudar algumas atitudes e procedimentos.

Vender espaços deixou de ser negócio. É uma postura inadequada e unilateral. Bom negócio é vender soluções de mídia que agreguem valor à comunicação das marcas, e se colocar ao lado da agência e do cliente para juntos chegarem à melhor alternativa. É imperativo buscar informações e traduzir as necessidades e metas de marketing e comunicação do cliente para que seja possível identificar problemas e apresentar projetos que ofereçam o melhor aproveitamento possível do público exposto ao veículo e do seu comportamento diante do mesmo e da marca em foco.

Enfim, é importante dar uma repassada nos objetivos de comunicação e da campanha, na atuação da concorrência, nos objetivos de mídia, na estratégia criativa, nos hábitos de consumo do público-alvo e suas reações à categoria do produto a ser anunciado. Verificar em que estágio do ciclo de compras do consumidor a comunicação estará atuando, e outras informações que devam ser avaliadas frente a frente com o público do veículo, seus hábitos, costumes e comportamento de consumo de produtos, de serviços e de mídia. Não menos importante é avaliar o valor do meio ou do veículo como moldura da comunicação comercial, a afinidade e adequação da mensagem comercial com o ambiente e o conteúdo editorial.

Por outro lado, temos notado algumas falhas de ?leitura? e de interpretação dos seus próprios dados de pesquisas por parte de alguns veículos. Estes insistem em salientar, por exemplo, a sua qualificação nas classes A e B, em que não são líderes, desprezando diferenciais importantes que lhes garantem vantagens competitivas em outros segmentos. Ou seja, deixam de enaltecer os seus pontos fortes para tentar comparar-se ao líder, e são perdedores.

Todo veículo tem o seu público cativo e a sua própria força de comunicação. Portanto, toda e qualquer opção de mídia deve merecer a mesma atenção por parte dos profissionais de mídia e marketing envolvidos nas tomadas de decisão. Propostas pertinentes, com foco na solução de problemas de comunicação da marca, são atraentes e podem contribuir para maior eficácia do plano de mídia, independentemente do tamanho da audiência.

Não há como opor resistência a propostas legítimas de soluções para a comunicação de marcas. Ao contrário, elas são muito bem-vindas, em qualquer tempo.”

 

PUBLICIDADE & LIBERDADE

“A força da liberdade de expressão”, copyright Meio e Mensagem, 26/01/04

“Este ano se inicia com uma nova orientação para a publicidade de bebidas alcoólicas, especialmente a de cervejas. Fruto de um trabalho que começou em 2001, este processo foi o principal flanco de atuação do Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (Conar) no ano passado. Envolveu a comunidade dos setores interessados na questão e representou algumas perdas. O saldo, no entanto, foi a geração de uma nova auto-regulamentação da propaganda de bebidas alcoólicas, evitando, ao menos por enquanto, que os vários projetos de lei em discussão no Congresso restringindo a comunicação do setor acabassem se tornando a referência. Gilberto Leifert, presidente do Conar, foi o condutor desse processo e um incansável negociador com as partes envolvidas para que se chegasse a um texto resultante de consenso. Também intensificou suas idas à Brasília no sentido de mostrar aos parlamentares que a auto-regulamentação é o caminho para a sociedade impor seus limites, evitando assim a intervenção do Estado. Nesta entrevista, Leifert comenta também sobre o fato de alguns anunciantes recorrerem à Justiça comum em litígios relacionados à propaganda comparativa, sobre o banimento da propaganda de cigarro e sobre os projetos do Conar para 2004.

Leifert: 2003 apresentou o maior número de processos da história do Conar 368, um crescimento de 25% em relação ao ano anterior

Meio & Mensagem – Talvez em função da crise do mercado nos últimos anos, a propaganda parece estar se ressentindo de grandes idéias, o que levou recentemente ao aumento de campanhas comparativas. Algumas delas terminaram em litígio, como nos setores de telefonia (Oi e Vivo) e depois de cervejas (Ambev e Schincariol). Nos dois casos, a discussão acabou sendo levada à Justiça comum. Como o senhor avalia esse movimento? Isso pode ser fruto de uma lentidão do Conar em tratar determinadas questões?

Gilberto Leifert – Eu respondo em tese. Não gostaria de fazer apreciação a respeito de casos decididos porque decididos estão. O Conar apoia a propaganda comparativa desde que dela resulte informação objetiva, que capacite o consumidor a tomar decisões. Existe no senso comum uma percepção de que a propaganda comparativa deveria ser proibida. Mas ela é permitida e se mostra muito boa quando esclarece, informa, exalta qualidades e diferenciais de um produto versus o seu concorrente. Então, em primeiro lugar, propaganda comparativa é boa. Quanto ao direito do anunciante de trazer a controvérsia para a apreciação do Conar ou recorrer à Justiça comum seria uma arrogância o Conselho entender que as questões atinentes à publicidade estivessem excluídas da apreciação do poder judiciário. Estamos num estado de direito. O anunciante sempre poderá recorrer à Justiça e o Conar não tem poder de polícia. Ele não prende, não manda soltar, nem manda trocar mercadorias quando o consumidor se sente enganado, e nem manda devolver o dinheiro, e tampouco proporciona indenizações. Muitas vezes, quando o anunciante recorre à Justiça comum é porque ele deseja também obter uma indenização de um outro anunciante. Sobre a questão de haver lentidão por nossa parte, esse não é o meu sentimento.

M&M – Tem se tornado cada vez mais comum o expediente de determinados anunciantes de colocar no ar comerciais polêmicos, nos quais já se prevê uma possível ação no Conar. Caso ele seja suspenso, já existe outro pronto para substitui-lo, sendo que, em algumas ocasiões, a segunda versão também é passível de ação. Nesses casos, por mais ágil que seja o Conar, a troca pode ocorrer em questão de horas, o que torna impossível qualquer tipo de controle. Como avalia este procedimento, que envolve a postura ética por parte desses anunciantes e suas agências?

Leifert – O anunciante e a agência dizem respeitar o Conar e a Justiça. Se houver liminar, eles tiram o filme do ar. Mas há uma molecagem em ter outro filme já pronto. Ou seja, independentemente de o filme ser ou não ético, a proposta é duvidosa. Temos a sensação de que essa é uma prática que está ficando mais recorrente no mercado. Eu reconheço que a ética é duvidosa nesses casos, mas acho que isso não é o melhor para o negócio, para a atividade. Esse expediente proporciona um resultado de fim de semana ou um escândalo momentâneo, notoriedade sem mérito. Porém, não é utilizado pela maioria dos anunciantes que são nossos associados. Já houve decisões do conselho de ética de advertir e reprovar essa prática. Quando é demonstrado que houve esse tipo de expediente, com objetivo de alcançar um resultado de curto prazo e frustrar o que a outra parte poderia obter através do Conar, já houve a reprovação. Então, os anunciantes que forem pegos nessa situação receberão reprovação do conselho de ética.

M&M – Ainda sobre esse tema, já existe há alguns anos o ranking da baixaria na TV. Não tem poder de polícia e nem decreta o que deve ou não ser exibido. O que o ranking faz é gerar o debate em torno da qualidade na programação da TV. Uma iniciativa semelhante não poderia ser feita no tocante à propaganda, destacando as agências e anunciantes que mais ferem as normas do Conar?

Leifert – Todas as informações sobre as reprovações a empresas estão disponíveis para o público em nosso site e são atualizadas diariamente. Além disso, eu tenho dúvida quanto ao uso que alguém pudesse fazer do ranking dos anunciantes e agências que tivessem sido reprovadas. Os critérios de escolha das agências não poderiam ficar limitados à maior ou menor incidência de casos no Conar porque muitas vezes o erro é involuntário e acontece. Auto-regulamentação pressupõe, como no evangelho, que cada um leia e interprete o que está escrito. Muitas vezes, os casos apresentados aqui trazem também a confissão de alguém que interpretou errado e que consegue salvar o anúncio mediante uma correção. O ranking da baixaria na TV não usa uma metodologia científica estatística para sua elaboração e tem uma dose de humor e também de denúncia. O interesse do Conar é o de corrigir eventuais disfunções éticas encontradas na publicidade. Então não é o volume de queixas que vai determinar se o anúncio vai para o topo do ranking por problemas éticos de sua agência ou anunciante. Eu gostaria de pensar um pouco mais a respeito disso, mas tudo que tender ao escândalo, à exposição injusta de um anunciante, de uma agência, me repugna, porque acho que o trabalho que se faz aqui representa o esforço de uma comunidade em melhorar a qualidade ética da sua atividade.

M&M – Neste contexto, que grau de maturidade o senhor acredita que a propaganda brasileira alcança hoje e qual o papel do Conar nesse processo?

Leifert – Eu sou um entusiasta do modelo e do sucesso do Conar. Sempre gosto de recordar uma frase do Otto Lara Resende, que, com bom humor, dizia que as leis são como vacinas, umas pegam outras não. Imagine que em um país onde há leis que não pegam nós temos um código de auto- regulamentação voluntário, que está em prática há 23 anos. Existe acatamento da norma do Conar. Eu diria que o modelo é muito eficaz, que existe respaldo das entidades que fundaram o Conar e dos associados de respeitá-lo e de fazer cumprir a auto-regulamentação. É muito prodigioso que isso ocorra. No Brasil existe uma crença de que o Estado, os agentes públicos são os únicos que podem apontar os caminhos do bem comum, do que está certo e do que é bom para o cidadão. Sem querer concorrer com o Congresso, com o Poder Executivo, com o Judiciário, achamos que a atividade tem condição – pela sua influência, pela sua significação econômica, pela sua maturidade – de contribuir para que o País faça melhor algumas de suas coisas. Uma delas é a propaganda de alta qualidade e dessa forma servir melhor o consumidor. Nós sempre acompanhamos com a Comissão de Defesa do Consumidor, com o Congresso Nacional e com os Procons, o volume de reclamações contra a publicidade. Em relação à quantidade de propaganda que se veicula no Brasil, esse volume é muito pouco significativo. E ainda se confunde muito produto, consumo e publicidade. Muitas das reclamações dirigidas aos órgãos de defesa do consumidor, ou mesmo o que se costuma ler em reclamações de consumidores em jornais, atingem a propaganda, porque ela é a face visível do processo. Mas deficiente é o produto, o serviço. A propaganda é que traz o nome do fabricante, enfim, desperta o interesse, a identidade do responsável pelo produto. A fábrica é um elemento abstrato. Então a propaganda acaba sendo o alvo da indignação, da frustração do consumidor.

M&M – Com relação aos processos instaurados, qual foi o balanço de 2003?

Leifert – Tivemos o maior número de processos da nossa história, em um total de 368, um crescimento de 25% em relação ao ano anterior. O maior volume de processos é provocado pelo Conar, com iniciativas da própria entidade em 64% dos casos. As disputas entre anunciantes respondem por 26% dos processos.

M&M – Esse volume cresceu mais nos processos iniciados pelo próprio Conar ou nos litígios do mercado?

Leifert – Nos criados pelo próprio Conar, porque aqui também estão incluídos os consumidores. O consumidor é tutelado pela instituição. É o diretor executivo que o representa nas reclamações.

M&M – Existe alguma explicação para esse aumento?

Leifert – A campanha criada pela Talent e o debate em torno da questão das bebidas alcoólicas trouxeram mais visibilidade para a atuação da instituição. Houve uma resposta maior do consumidor.

M&M – Na sua avaliação, esse crescimento é bom ou ruim? É bom na medida em que a sociedade participa mais, mas o aumento exagerado do número de processos não mostra uma realidade negativa da propaganda?

Leifert – Os números maiores significam que os casos entraram, mas não que houve mais condenações. As reclamações muitas vezes refletem intolerância, alergia de um indivíduo em relação a uma campanha. Essas reclamações são tratadas com a mesma consideração e respeito aqui. Elas geram estatísticas, mas isso não significa uma pior qualidade da ética na atividade.

M&M – Há setores econômicos nos quais é crítico o quadro de desrespeito à auto-regulamentação?

Leifert – Acho que há alguns setores que merecem atenção especial, como é o caso da propaganda com impacto na saúde. Para medicamentos e tratamentos, o Conar dá atenção especial. Nós aqui consideramos que o problema da ética a respeito desse anúncio é secundária. A primeira consideração está relacionada à saúde da população. Então, por exemplo, existe sim a incidência da publicidade de produtos sem registro sanitário. Para medicamentos que estão sendo oferecidos é indispensável esse registro. Sem ele, o produto não poderá ser anunciado como medicamento ou como tratamento a saúde. Isso é levado muito a sério aqui dentro.

M&M – Outro setor que fez muito barulho foi o de telefonia. A guerra de tarifas tem consumido muito tempo do Conar?

Leifert – Tem sim. Esse é um dos setores que trouxe um grande número de casos para exame em 2002 e 2003. Mas um mercado desenhado para ser competitivo vai acarretar problemas, questionamentos. Com o passar do tempo, por outro lado, a tendência é de que ficarão mais bem delimitadas as promessas que são verdadeiras e aceitáveis. E também isso vai desenvolver anticorpos no consumidor. Eu acredito que, depois de assistir a tantas batalhas no ar, o consumidor – esse que muitas vezes é considerado incapaz de fazer as coisas – sabe discernir. O Conar tende a apoiar o consumidor nesses casos para que os anúncios sejam corrigidos. Eles vêm sendo corrigidos sistematicamente.

M&M – Qual a avaliação que o senhor faz do esforço do Conar em gerar uma nova auto-regulamentação da propaganda de bebidas alcoólicas, evitando, ao menos até o momento, que os vários projetos de lei em discussão no Congresso, restringindo a comunicação deste setor, acabassem se tornando a referência?

Leifert – A última palavra, a palavra final a respeito de como deve ser a propaganda comercial de bebidas alcoólicas no Brasil, é do Congresso Nacional. O que o Conar faz como uma entidade da sociedade civil, num País em que se tem um sistema misto de legislação e auto-regulamentação, é propor que, em lugar de se adotar uma legislação que vai restringir a liberdade de expressão comercial, o que eventualmente pode alcançar liberdades públicas, se adotem caminhos que tornem desnecessária a intervenção do Estado. O ideal privatista que inspira a auto-regulamentação é que a sociedade deve estabelecer os seus limites, procurar os seus caminhos, evitando a intervenção do Estado. Na propaganda de bebidas alcoólicas pretende-se que o esforço de comunicação seja dirigido ao público adulto, já que o produto é destinado a adultos. A auto-regulamentação propõe que o modelo publicitário deva ser maior de 25 anos e que deva ter aparência de maior de 25 anos. Ser e parecer maior de 25 anos.

M&M – Algo como a mulher de César ser e parecer honesta?

Leifert – A lei não dirá nunca isso, ser e parecer. Nenhum juiz poderá julgar isso. Já o diretor de filmes que escala o casting sabe exatamente procurar a pessoa certa, que tenha aparência de maior de 25 anos. Não haverá nenhuma dificuldade. E quem vem julgar aqui numa câmara de ética sabe perfeitamente se aquele modelo é ou não adequado àquela participação no comercial. A auto-regulamentação consegue propor caminhos alternativos. Restrição de horário, de conteúdo, de veículo.

M&M – Qual foi a repercussão percebida pelo Conar em relação aos fabricantes e agências nesse processo?

Leifert – Essa nova regulamentação foi escrita com a participação da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e TV Aberta (Abert), da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA), da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), da Associação Nacional de Jornais (ANJ), da Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner) e da Central de Outdoor. Participaram as agências que atendem contas de bebidas alcoólicas. Elas foram envolvidas ao longo dos dois anos de debates. Foram realizadas verdadeiras audiências públicas em que esse assunto foi discutido. Os anunciantes e suas associações também foram ouvidos. Então, posso garantir que isso é resultado de um esforço da comunidade dos setores envolvidos e que corresponde a uma aspiração do mercado de mudar a face de um segmento. A verdade é que foi um processo muito doloroso, e por isso foi demorado. Porque, usando uma linguagem figurada, não houve barganhas, houve perdas. Houve entrega de espaços de liberdade de criação, de liberdade de produção e de veiculação. Então, quando ele é colocado em prática, é porque houve convergência dos operadores da publicidade de que aquele texto corresponde ao que é possível fazer.

M&M – O componente político em torno desse tema é fortíssimo. Quais foram os pontos mais difíceis de negociar com os anunciantes nesse setor?

Leifert – Acho que foi o fator tempo. Havia diferentes percepções em relação à questão da oportunidade. Todo mundo gostaria de ter mais tempo para poder conversar a respeito disso. O esforço do Conar foi o de abreviar, porque o assunto estava em pauta há dois anos. O trabalho foi para produzir um texto. Nós não tínhamos uma agenda predeterminada que estabelecia como objetivo alcançar determinado veículo, determinada forma de anunciar um produto. O empenho do Conar foi o de fazer com que os prazos fossem respeitados.

M&M – E como foi essa negociação no Congresso?

Leifert – Importantes líderes do Congresso acreditam que a auto-regulamentação é um caminho fantástico e deve ser encorajado. Existe no Congresso Nacional a percepção em relação a projetos que, embora apresentáveis, não têm condição jurídica, técnica, de aprovação. Alguns desses projetos – quem está dizendo agora sou eu mesmo – proporcionam visibilidade para o parlamentar, sobretudo no início das legislaturas. Eles visam mesmo colocar o nome obscuro do parlamentar no noticiário. Apareceu na sua revista, por exemplo, ele nem trabalha mais por aquele projeto. É muito comum isso. O projeto é largado à própria sorte, arquivado no fim da legislatura porque o interessado não se movimentou. Mas esses projetos nos assustam e nos ameaçam de verdade. Porque a ameaça de restrição, de proibição de um determinado segmento anunciar , tem um reflexo econômico muito importante sobre a atividade. O País veria os veículos sufocados, a liberdade de imprensa cerceada pela dificuldade de repor setores que têm relevância como sustentação da liberdade de expressão, da diversidade de veículos. Então a democracia deve se preocupar, sim, com o risco da proibição. Gostaria de ver por exemplo uma campanha do Conar mostrando o mico-leão-dourado, a arara-azul, que tanto emocionam a população em geral, falando de setores que estão banidos ou em extinção na propaganda.

M&M – Por que foi tão diferente o desfecho da questão da bebida alcoólica em relação à do cigarro? Que variáveis pesaram aí para que, no caso do tabaco, fosse implementada uma lei que sepultou a propaganda do setor?

Leifert – Em primeiro lugar, havia um protagonista, o então ministro da Saúde José Serra, que se empenhou de corpo e alma. E há méritos nos resultados alcançados. A posição do Conar é ideológica. O Conselho defende o direito de expressão comercial, a liberdade de anunciar de todos os produtos de curso legal. Tudo o que é fabricado no País, sob as leis vigentes, paga impostos, é distribuído, comercializado, consumido ostensivamente. Portanto, de uma forma não clandestina, pode ser anunciado. Nós entendemos que a Constituição Federal admita que sejam estabelecidas restrições. Proibições, não. E o projeto de lei que resultou na proibição, no virtual banimento da publicidade de cigarros, cometeu excessos. Então nós temos que ressaltar o que é diferente nos dois momentos. O protagonista e também a resignação da indústria. Ora, houve um banimento e as companhias que ficaram impedidas de anunciar poderiam ter ido à Justiça. No esforço que foi desenvolvido pelo Conar não houve a participação dos anunciantes desse setor. O Conar atuou amparado ou encorajado pela sua filosofia. Vamos proteger o cigarro como devemos proteger o catchup ou a fábrica de guarda-chuvas. A ideologia é de garantir a liberdade de expressão comercial a todos os segmentos. O que existe de diferente é que nós temos um trauma: o de um setor ter sido banido da propaganda brasileira. Países que têm leis severas e cuidados com a saúde e que vão muito além daquelas que nós adotamos aqui, encontraram ou praticam formas que evitam o banimento, a proibição absoluta. Seja como for, gostaria de deixar registrado que esse é um assunto que foi resolvido pela instância competente, que é o Congresso Nacional. Não foi possível através de auto-regulamentação e o Conar é cumpridor das leis em vigor, e não se insurge contra essa legislação.

M&M – De qualquer forma, qual foi a estratégia de abordagem do Conar com o poder público nesse caso?

Leifert – O que o Conar insistiu na época é que havia alguns flancos além da publicidade. A publicidade é a fase visível e, por isso, vulnerável. Ela é mais facilmente alvo de projetos destrutivos, medidas exacerbadas. Então, no caso do tabaco, no Brasil não se proibia a venda de cigarros a menores de idade. O Estatuto da Criança e do Adolescente menciona loterias, fogos de artifício e bebidas alcoólicas, mas silenciou-se em relação ao tabaco. O Conar dizia: antes de proibir a propaganda, nós vamos obter efeitos de grande alcance social e sanitário proibindo a venda de cigarros a menores de idade. Isso foi atingido em 2003. Já existe agora essa proibição. O Conar trabalhou muito nessa direção e conseguiu. Nós podemos nos congratular com o Congresso, porque o Conar foi uma das vozes que pleiteou isso lá.

M&M – Diante dos resultados apresentados no ano passado, quais são os projetos prioritários do Conar para 2004?

Leifert – O conselho de ética, formado por voluntários, tem se desdobrado. O volume de trabalho é muito impressionante. Não que seja um objetivo para 2004, mas vem sendo feito um esforço de oferecer condições adequadas de trabalho a essas pessoas. Diante da necessidade de defender a liberdade de expressão comercial e tornar mais acessíveis as referências existentes na doutrina, como os julgamentos realizados em outros países, o Conar possui, sim, um projeto para 2004. Nós teremos uma biblioteca que será virtual e física, com acervo a respeito de liberdade de expressão em geral, para atender a consultas, a interesses de jornalistas, publicitários, advogados e estudiosos. Faremos um programa de aquisição de literaturas, de doutrinas relacionadas a isso. E através do site, o consulente poderá saber se a obra está disponível fisicamente aqui, numa outra biblioteca, ou se terá referências quanto ao assunto. A casa tem a obrigação de contribuir para que mais pessoas pensem nesse tema no Brasil. A doutrina americana é muito rica no assunto. Se nós pudermos traduzir boa parte desse trabalho, já será uma contribuição para as escolas brasileiras. Acho que vamos ajudar a formar um pensamento a respeito da liberdade de expressão.”

 

WEBJORNALISMO

“O Jornalismo sem jornalista”, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 21/01/04

“Outro dia comentei aqui as novas críticas de usabilidade feitas por Jakob Nielsen – o guru desse tema – no final do ano passado. Uma delas diz respeito ao fato de ainda existirem inúmeros veículos com artigos sem a data de publicação. Isso mesmo, um erro fatal do ponto de vista de qualquer comunicador – ou pelo menos deveria ser.

A Internet, ó toda poderosa, definida por Daniel Azulay como (não lembro as palavras exatas) uma grande biblioteca onde todos os livros estão caídos no chão (ou seja, a informação está lá, basta procurar), infelizmente está longe de deixar de ser um antro de desordem. No campo do jornalismo online, ainda vemos, por exemplo, muitas publicações sendo tocadas sem a presença de um jornalista. Os grandes vilões para mim são os sites de saúde. Dificilmente você esbarra com um veículo da área médica no qual seu conteúdo está arquivado e/ou datado. Já ajudei estudantes de medicina e fisioterapia a pesquisarem informações para monografias e, como é sabido, a data dos artigos usados como fonte é um dado fundamental. Resumindo, conteúdo de boa qualidade (científica, tirando os erros gramaticais), sem poder ser utilizado.

Não quero brigar com sites de saúde, imagina, os veículos brasileiros dessa área são de ótima qualidade, com conteúdo realmente bom. O lance é que qualquer veículo online (não importando seu formato) que se prontifique a produzir/fornecer notícias, não importando o segmento (finanças, saúde, entretenimento, cidadania, negócios, etc), poderia ter ao menos um jornalista responsável, que não necessariamente precisaria ser o produtor do conteúdo. Mas uma supervisão/revisão seria de bom tamanho.

Confesso que é difícil lidar com essa questão, pois mesmo entre os jornalistas existem aqueles que levantam a bandeira de que notícia só deve ser produzida por jornalistas, e aqueles que defendem o fato de que qualquer um pode publicar informação. Pelo menos para dar credibilidade ao veículo, uma supervisão de um jornalista cairía bem. Mas, digo novamente, é difícil lidar com essa questão. Talvez seja utopia, pois vemos por aí péssimos jornalistas e, em contrapartida, publicações que, mesmo sem um jornalista responsável, atingiram o patamar da credibilidade, como o tecnológico Slashdot.com.

É, talvez seja utopia mesmo. Afinal, as coisas evoluem. O que vocês acham? No final das contas, se os veículos se prontificarem a colocar datas e devidas citações de fontes nos artigos já está de bom tamanho. Até a próxima! ;-)”

"Aposta no jornal digital", copyright Gazeta Mercantil, 27/1/2004

"A empresa holandesa de eletrônica Philips Electronics anunciou ontem, em Amsterdã, que está preparando a produção em massa de uma tela fina, de 5 polegadas, do tamanho de um livro, dobrável, que pode ser enrolada, para a exibição de jornais e revistas. Essas telas foram desenvolvidas com o uso de circuitos eletrônicos feitos de plástico, que eletrificam a tela monocrômica construída com tecnologia da empresa E Ink, com sede em Cambridge, Massachusetts (EUA).

A tela pode ser enrolada e ficar como uma caneta. Uma linha de produção piloto poderá estar pronta em 2005, para fabricar um milhão de telas por ano. Ainda este ano, a Philips deve colocar à venda um protótipo de uma tela da E Ink feita de vidro, como as usadas atualmente em computadores de mão. O preço, ainda não estipulado pelo fabricante, deverá ser de uma dezena de dólares."