JORNAL DE NOTÍCIAS
"Quando a ?bola? também está do lado dos leitores do JN " copyright Jornal de Notícias, 24/1/04
"No momento em que o ?Jornal de Notícias?, depois de breve intervalo, volta a ter um provedor do leitor, começo por saudar, antes de mais, aqueles que são a razão de ser deste jornal: os seus leitores, cada um deles. Saúdo igualmente os jornalistas, sem os quais ? passe a verdade de La Palisse ? o jornal não existiria.
Volto a escrever no JN, após 15 anos de ausência, agora numa posição que não deixa de ser curiosa. Nos tempos em que trabalhei nesta Casa e onde, na verdade, aprendi a fazer jornalismo, fui-me dando conta de duas dificuldades que foram, para mim, até certo ponto, inesperadas. Uma é a rotina que se instala por detrás da agitação que implica produzir um jornal todos os dias, com o risco inerente de deixar amortecer a vigilância crítica, relativamente às regras básicas e ao próprio papel da profissão. A outra refere-se aos leitores e à tendência para deixar as coisas correrem, mesmo quando vêem que algo não está certo ou podia ser feito de modo mais adequado.
Tenho consciência que muitos leitores entendem que não vale a pena reagir. Para esses, os grandes meios de comunicação social, e os jornalistas em primeiro lugar, encontram-se por detrás de um muro que é difícil de transpor: definem as regras, escolhem os assuntos das notícias e decidem o modo de os apresentar. Ao leitor quase não restaria outra atitude senão resmungar para os seus botões ou para o círculo dos amigos e conhecidos. E alguém que se atreva a formular e apresentar uma crítica ainda corre o risco de sair chamuscado.
Existe, de facto, uma relação desigual entre os jornais e os seus leitores (e não falamos sequer das rádios e televisões). As cartas, telefonemas, e-mails e faxes permitem algum grau de intervenção, mas que é certamente muito limitado e reactivo. Quem tem poder bastante para montar máquinas de comunicação eficientes e profissionalizadas consegue influenciar mais a agenda dos media (ou, pelo menos, tenta-o). Para o cidadão comum, a margem de acção parece apertada e diminuta.
Tudo isto tem o seu lado de verdade, mas não é a verdade toda. Em definitivo, os media não sobrevivem sem os seus públicos. E uma atitude sistemática de arrogância, de não prestar contas, de não ouvir e valorizar as vozes de uma sociedade livre e plural pode, a prazo, custar caro. A credibilidade e o prestígio de uma publicação são um bem precioso que está sempre em risco: configuram uma luta permanente que se ganha ? ou se perde.
Por outro lado, foi fazendo o seu caminho a ideia de que o exercício activo da cidadania passa pela reivindicação dos direitos constitucionalmente reconhecidos, designadamente face aos media. Numa sociedade cada vez mais mediatizada, a qualidade da vida individual e da vida pública dependem, em grande medida, de uma informação completa, rigorosa e equilibrada. É isso que temos o direito e o dever de exigir como cidadãos.
Devo esclarecer que não tenho do jornalismo uma visão nem tenebrosa nem idílica: trata-se de uma profissão exigente, do ponto de vista cultural, cívico e ético-deontológico. É exercida em condições nem sempre as mais desejáveis, em ritmos que deixam frequentemente pouco espaço ao distanciamento crítico e em contextos empresariais marcados por lógicas de negócio que convivem mal com a noção de serviço público. Neste quadro, aquilo que é de estranhar não são propriamente os erros nas escolhas e ponderações do dia-a-dia, mas antes a falta de uma cultura de rigor, de autocrítica e avaliação permanentes, individual e colectivamente assumida.
O JN é um caso especial no panorama da imprensa portuguesa. Num país que lê pouco a imprensa que tem, este jornal alimenta, do ponto de vista informativo, um público que é transversal a todos os estratos sociais e encontra-se implantado em realidades sócio-geográficas muito diversas. O seu conteúdo ? na informação e na opinião ? procura expressar essa mesma diversidade. Estamos, assim, em diálogo com um público variado, o que constitui, a um tempo, uma riqueza e um desafio.
Enquanto provedor, gostaria que a iniciativa de comentar critica e esclarecidamente o jornal pelos seus actos e omissões, não fosse apenas um repto deixado a cada leitor individualmente. Gostaria que ele fosse analisado e comentado nas escolas de todos os níveis de ensino, comparado com outros jornais e que o resultado dessa apreciação me fosse enviado. Gostaria que algo de semelhante acontecesse nas associações culturais, nos movimentos e grupos cívicos, políticos e religiosos e mesmo nos grupos informais e nas tertúlias de café, quando o comentário for julgado pertinente.
Os leitores podem achar que isso não é muito importante ou que ninguém ligará muito ao que possam escrever. Não é bem assim. Pode não ser assim. Pela parte que me diz respeito, sabendo ? e querendo que os leitores saibam ? que não tenho responsabilidades executivas dentro da Redacção, analisarei com atenção os comentários recebidos e estabelecerei junto da Direcção e da Redacção os necessários contactos para que eles sejam objecto de apreciação e, desejavelmente, lhes seja dada sequência. Sempre que se justificar, darei conta destas trocas, nesta coluna dominical.
Ao designar um provedor, o JN torna patente a vontade de fazer um melhor jornalismo. Mas? com os seus leitores. A ?bola? está, assim, também desse lado. Do seu lado, leitor."
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"Continuar o caminho " copyright Jornal de Notícias, 24/1/04
"Neste início de funções, desejo salientar quão importante é, para mim, poder beneficiar da rica experiência já capitalizada pelo meu antecessor e primeiro titular da função, o jornalista Fernando Martins, a quem saúdo. Espero prosseguir esse trabalho e os objectivos que ele corporizou, mesmo que com um estilo ou um olhar necessariamente distintos. Desde logo pelo facto de exercer a função a partir de um ponto de observação situado fora da Redacção e continuando o meu trabalho académico como professor e investigador da Universidade do Minho.
Quero saudar igualmente os meus colegas provedores que presentemente exercem funções, no ?Público? (Joaquim Furtado), no ?Diário de Notícias? (Estrela Serrano) e no ?Record? (Rui Cartaxana), bem como aqueles que, desde 1987, em especial com Mário Mesquita, inauguraram esta forma de atenção ao modo como se faz jornalismo em Portugal."
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"Discurso do PR base de trabalho" copyright Jornal de Notícias, 24/1/04
"As idéias e sugestões do presidente da República, no discurso de abertura do ano judicial, constituem um excelente ponto de partida, para os debates necessários e urgentes em torno da relação entre os media e a justiça. Jorge Sampaio nunca questionou a eminência da liberdade da informação numa sociedade democrática. Mas não deixou de sublinhar que, tal como os agentes da Justiça, os jornalistas não podem estar ?acima da crítica?. Ninguém está acima da crítica."