Até representantes da ONU se manifestaram contra um artigo da colunista Katie Hopkins no jornal The Sun que comparava imigrantes a baratas e dizia que as embarcações que os transportavam deveriam ser detidas com caças aéreos.
Na coluna desprovida de eufemismos, a personalidade de TV britânica – que ficou conhecida no país ao participar de reality shows como O Aprendiz – se declarou indiferente ao sofrimento de migrantes que arriscavam suas vidas cruzando o Mediterrâneo e chegou a dizer que não se importava nem quando lhe mostravam “fotos de caixões, de corpos flutuando na água e de pessoas magras com expressão triste”.
O artigo era uma reação ao naufrágio de um navio pesqueiro clandestino nas águas da costa da Líbia, que levava mais de 800 Imigrantes ilegais saídos do litoral norte-africano em direção à Itália. Estima-se que centenas de pessoas tenham morrido no acidente, ocasionado por uma colisão entre embarcações. A tragédia causou comoção mundial e uniu esforços de diversos líderes internacionais na tentativa de resgatar sobreviventes.
Comparada ao Nazismo
Zeid Ra’ad Al Hussein, alto comissário de direitos humanos da ONU, criticou o Sun por aprovar a publicação da coluna e comparou a linguagem utilizada por Katie àquela adotada pelos nazistas para se referir aos grupos étnicos que desejavam extinguir. Ele também comparou o teor do texto a antigas reportagens veiculadas pelo jornal Rwanda Kangura e pela Rádio Mille Collines sobre o genocídio ocorrido em 1994 em Ruanda. O comissário observou que ambas as organizações de mídia ruandesas foram condenadas por um tribunal internacional por estímulo à prática do genocídio.
Al Hussein também acusou a indústria britânica dos tabloides de atacar e difamar imigrantes constantemente. Com isso, a polêmica respingou no jornal Daily Express, que, segundo o próprio funcionário da ONU, durante 31 dias de 2003 chegou a publicar 22 notícias sobre refugiados e requerentes de asilo em sua capa – todas com abordagem negativa. “A história tem nos mostrado os perigos de demonizar os estrangeiros e minorias, e é extraordinário e profundamente vergonhoso ver que tais tipos de táticas sejam adotados em uma variedade de países simplesmente porque o racismo e a xenofobia são fáceis de despertar na hora de angariar votos ou vender jornais”, declarou.
Al Hussein frisou ser um defensor ferrenho da liberdade de expressão, porém disse que esta não pode ser absoluta no momento em que infringe ódio ou intolerância. Por fim, ele solicitou ao governo britânico, à imprensa e a órgãos reguladores que respeitassem as leis nacionais e internacionais na contenção de incitação ao ódio.
François Crépeau, relator especial da ONU sobre os direitos humanos dos migrantes, também atacou o texto de Katie e disse que pessoas como a colunista serviriam apenas para angariar votos para políticas anti-imigração. Ele também criticou a posição do governo por não apresentar uma punição exemplar a ela.
A Society of Black Lawyers – grupo de advogados que combate a discriminação entre raças – também solicitou que o Sun fosse investigado sob a Lei de Ordem Pública de 1986 que, dentre outras coisas, proíbe expressões de ódio racial.
Um porta-voz do Independent Press Standards Organisation (IPSO) – órgão regulador da mídia britânica – informou que a organização vai investigar se o texto viola o Código dos Editores e que publicará suas conclusões apenas num momento oportuno. É possível que o texto de Katie seja enquadrado na cláusula XII, que prevê punições para referências discriminatórias.
Internautas defendem demissão
O artigo de Katie Hopkins também causou fúria na internet.
Internautas criaram uma petição online pedindo ao Sun que demitisse a colunista (até o fechamento deste texto, o documento continha quase 300 mil assinaturas). O IPSO também confirmou o recebimento de mais de 300 queixas.
Esta não é a primeira vez que Katie causa estardalhaço com suas declarações. Em 2013, internautas também fizeram uma petição para que ela perdesse espaço como comentarista de TV depois de piadas sobre a Escócia no Twitter logo após um acidente com um helicóptero que matou oito pessoas no centro de Glasgow. À época, a petição alcançou perto de cem mil assinaturas.
Dias depois de publicar o texto polêmico, Katie participou de um programa de rádio da LBC e foi duramente atacada pelos ouvintes. Durante o programa, ela justificou que sua coluna foi amplamente “citada fora de contexto”.
Ela também escreveu um novo texto para o Sun, no qual pediu que os leitores aceitassem opiniões divergentes e defendeu que, em vez de canalizar seu ódio em petições online, as pessoas deveriam se indignar contra os regimes políticos que levavam seus cidadãos a fugirem de seus países.
O Sun, por sua vez, não comentou o caso.