Se o uso das redes sociais é um fenômeno novo, que dizer do acompanhamento, compreensão e avaliação desse uso? Os tutoriais oferecidos em geral costumam apresentar o beabá a quem quer atuar nas redes enquanto profissional e não apenas usuário, mas essas orientações, costumam ser totalmente voltadas para marcas e produtos.
E quem quer ir além? Trabalhando com redes sociais em política desde 2012, me atualizo pela prática diária (tudo muda; todo tempo) e pelos referidos tutoriais, tendo, claro, que adaptar conselhos e modos de fazer a algo de caráter totalmente diferente. Para quem é novato no assunto pode ser muito fácil se perder em meio a termos de marketing e cases sobre venda ou atendimentos impensáveis quando se trata de política, um tema tão sensível e tão caro a todos nós.
A compreensão do uso das redes, da sua dinâmica e a necessidade de monitoramento quando se trata de política, no entanto, é fundamental. Afinal, boa parte do cotidiano das pessoas acontece também ou prioritariamente no mundo virtual. Ele passou a ser extensão do pensar e do fazer político de grupos antes pouco ou nada ouvidos quando se tratava dos seus direitos. Acompanhar o que se diz do governo e, principalmente, um governo que tenha condições de dar retorno ao que é dito e questionado sobre ele, é vital em tempos digitais tão efervescentes. Devido à própria natureza de representantes e representados, as demandas da sociedade são em número tal que responder a todas não é tarefa exatamente simples. Ainda assim, não pode ser o despreparo técnico a impedir que a sociedade seja ouvida pelo governo. É necessário, nesse aspecto, que o governo esteja constantemente comunicando seus atos à população e se valendo para tanto de todos os meios possíveis na imprensa tradicional e nas redes sociais; que essa mensagem seja completa e simples para que não haja lacunas de comunicação; e que, principalmente esse governo tenha condições de dar feedback às demandas despertadas por seus informes e ter conhecimento de queixas, dúvidas, elogios ou críticas feitas também em quaisquer meios.
Como o governo é avaliado nas redes
Como é possível que o governo tome conhecimento dessa comunicação dinâmica e com demandas imediatas? Fazendo acompanhamento do que é dito, como é dito e por quem é dito. O monitoramento de redes sociais bem como o treinamento de profissionais aptos a compreender as mensagens enviadas é o primeiro passo para o constante e necessário diálogo entre governo e sociedade. Nesse ponto não há tantos segredos. Quem tem condições de adaptar os modelos de marketing para a análise política, resolveu metade do problema. A outra está em se atualizar constantemente e acompanhar os noticiários do tema monitorado. Esse material se dirige a quem não está tão acostumado com os termos mercadológicos, mas, ainda assim, tem interesse em atuar no monitoramento de temas de governo.
A necessidade de acompanhar o noticiário e discussões políticas do Estado e da sociedade permanece. Entender esses noticiários é fundamental para identificar tendências de apoio, solicitação, questionamento e reprovação de medidas ou anúncios, formais e informais. Não é segredo que várias das discussões mais acaloradas de jornais atualmente nascem nas redes sociais e sofrem com sério descrédito de quem devia incentivar essa participação. Um erro na análise de redes quando se trata de política é não acompanhar todas as variáveis do seu tema de interesse. Se ao acompanhar a marca é tão importante quanto ela própria os concorrentes, o produto, seus clientes fiéis e aqueles que deixaram de consumi-la, o mesmo se dá quando se trata de governo.
Em um monitoramento do executivo, cada secretaria ou pasta tem tanta importância quanto o representante do poder. Além disso, é preciso identificar aquilo que é atribuído ao objeto de pesquisa sem estar de fato relacionado a ele e sanar falhas de comunicação. Resumidamente, ao monitorar governos é necessário saber o que a população fala sobre o governo, como ele é avaliado nas redes e como ações específicas são avaliadas. Temas sensíveis precisam de acompanhamento próximo, pois mesmo um governo bem avaliado pode encontrar barreiras de comunicação que dificultem a atuação.
Um governo desconhecido será questionado
Estar presente nas redes sociais apenas para jogar informações para o público pode ser mais mal avaliado do que não participar de nenhuma delas. Nas redes sociais, os usuários buscam não uma comunicação de mão única, mas diálogo constante e resposta a suas dúvidas e solicitações a qualquer hora. Se não é possível estar à disposição do público 24 horas, ele precisa ser informado disso. Lembrando que o atendimento permanente faz total sentido para a maioria dos serviços oferecidos pelo Estado. Se o hospital funciona 24 horas, as redes sociais desse hospital precisam ajudar o cidadão a chegar até ele 24 horas do dia. A maior parte das queixas nas redes sociais se refere ao atendimento. Um serviço de respostas completas a disposição é uma ótima forma de diminuir boa parte das queixas a um órgão de governo.
A análise de sentimento, muito comum em monitoramento de redes sociais, mas muito questionada por estrategistas de rede, é fundamental se feita da maneira correta. A análise automática para governos tem dinâmica diferente da feita para marcas e no geral erra muito devido ao uso de figuras de linguagem, sobretudo a ironia. Levando-se em consideração que boa parte das ferramentas é em inglês, a análise automática pós-tradução é ainda mais preocupante. Acompanhar, além de redes, a efetividade e o acesso do site é mais um passo para compreender em que mundo seu objeto de pesquisa está.
Em diversos pontos, a análise de marcas realmente mantém muitas semelhanças com a análise de governo. Diferem termos e a maior possibilidade e necessidade do governo de se fazer conhecido. Uma marca desconhecida não vende seu produto. Um governo desconhecido será constantemente questionado, terá seus métodos e propostas rechaçados sejam eles quais for. Além disso, é direito da população conhecer as propostas para que tenha plenas condições de saber como elas interferirão na sua vida. A apresentação de relatório deve ser sucinta. Tanto empresas quanto governos não dispõem de tempo para grandes peças analíticas. Um relatório é completo ao apresentar assuntos de destaque, sentimento desses assuntos, comparar temas favoráveis e contrários dentre aqueles que são sensíveis ou estão em pauta no dia/semana.
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Gessica Fernanda Daniel é jornalista, Brasília, DF