Já houve um tempo em que as atividades humanas nasciam, eram praticadas e se desenvolviam tendo por base somente o conhecimento empírico. Foi assim com a Medicina, quando ervas eram usadas intuitivamente, crânios eram perfurados sem anestesia a fim de aliviar a dor e aplicavam-se ventosas para extrair o sangue ‘ruim’. Algumas dessas experiências davam certo e eram incorporadas às práticas de curandeirismos. Também o Direito já esteve associado apenas à prática da retórica, numa época em que a defesa não podia escapar da cultura mágico-religiosa. Não se realizavam perícias e nem se submetiam os elementos e as provas do julgamento aos testes estatísticos, tudo isso porque as dimensões sociais e os saberes epistemológicos da época estavam confinados nos limites daqueles momentos históricos.
Como tal, assim também nasceu o jornalismo. Era um mundo ainda dominado pela cultura do copista, da concentração do saber e do poder. A informação, por mais precária que fosse, tinha sua importância e foi por meio de práticas artesanais e de tentativas tecnologicamente arcaicas que a atividade da informação se desenvolveu.
Mas tudo foi ficando para trás. O mundo foi se transformando e os saberes e atividades humanas começaram a ser enquadradas em métodos porque as sociedades foram percebendo que as ações humanas medidas, quantificadas e submetidas a experiências davam mais resultados. As receitas do curandeirismo aos poucos foram cedendo espaço para recomendações guiadas por um saber que se localizava além da intuição. As defesas do Direito passaram a comportar normas e a demonstrar fatos localizados na vida real. Os números começaram a ser utilizados. Versões de testemunhas passaram a ser submetidas à lógica e os debates se ampliaram para argumentações mais rigorosas que o meramente prolixo. O entendimento de comunicação evoluiu. A atividade de informar foi absorvendo novas tecnologias e os efeitos da informação começaram a ser compreendidos a partir de medidas focadas na precisão e eficiência.
Condicionantes intangíveis, mas mensuráveis
Todo o conjunto de alterações ocorrido no nível do saber precisou ser ordenado por áreas de conhecimento a fim de que não prevalecesse o caos. O ordenamento do saber ganhou status científico e seus temas passaram a ser reconhecidos como ciência pelo fato de que não mais navegava somente pela esfera da intuição. O saber científico é cumulativo, compartilhado e aperfeiçoado, sempre. Seus pressupostos se inserem nas possibilidades de formulações epistemológicas e isso leva ao caminho da qualificação profissional.
A Medicina, lembra-se dela? Aquela mesma que nos seus primórdios, guiada pela intuição, mutilara milhares de indivíduos? Pois é, ela foi parar no quadro das Ciências da Saúde. O Direito? Aquele que vivia ancorado apenas pela retórica e sob manto do divino? Ele agora faz parte das Ciências Sociais Aplicadas. Junto com ele, encontram-se outras áreas do conhecimento, tais como a Economia, a Administração e até uma outra chamada de Comunicação Social, que alguns insistem em classificar como confeitaria, outros como culinária, mas que, no fundo, bem lá no fundo, também se encontra submetida às mesmas aplicações científicas, cujas variáveis humanas a afetam tanto quanto o velho direito que também manipula uma série de condicionantes intangíveis, mas mensuráveis.
Por tudo isso, pede o bom senso que não se misture farinha de trigo ou qualquer outro ingrediente da culinária que não seja em sua área específica: a de Nutrição, que tão bem sabe compartilhar seu espaço com a Medicina.
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Jornalista, professor de Teorias da Comunicação e autor de Comunicação: conceitos, fundamentos e história, entre outros, Pereira Barreto, SP