TV PÚBLICA
TVs estatais consomem R$ 544 mi ao ano
‘Os orçamentos das 26 maiores televisões subvencionadas pelo setor público
somaram R$ 544,14 milhões no ano passado. Ao menos 80% desse valor foi custeado
com recursos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Nesta semana, o ministro Hélio Costa, das Comunicações, defendeu a criação de
uma nova TV estatal, com transmissão em rede nacional, ligada ao Executivo.
Costa anunciou que seriam destinados R$ 250 milhões ao projeto em quatro anos. A
proposta recebeu sinal verde do presidente Lula e será aprofundada pelo
Ministério das Comunicações.
Durante três semanas, a Folha ouviu dirigentes de emissoras públicas em todo
o país, para quantificar a presença estatal no setor. A conclusão é que nem os
órgãos do governo responsáveis pela radiodifusão -Anatel (Agência Nacional de
Telecomunicações) e Ministério das Comunicações- têm este mapeamento.
A partir dos anos 90, houve crescimento explosivo da presença estatal no
setor. Em 1995, foi aprovada a Lei da TV a Cabo, que obriga as concessionárias a
reservarem cinco canais para uso de Executivo, Legislativo e Judiciário, um
canal comunitário e um universitário.
Em 12 anos de vigência da lei, surgiram 58 canais de televisão legislativa,
mantidos com verba estatal, e 70 emissoras comunitárias, mantidas por ONGs e 52
canais universitários (privados e estatais).
No mesmo período, ocorreu um movimento de expansão das TVs educativas. Em
1994, havia 47 rádios e 20 TVs educativas, custeadas pelo Estado. Em 2002, o
número de rádios havia saltado para 286 e o de TVs, para 138. O número seguiu
crescendo durante o governo do PT. Em 2006, eram 367 rádios e 167 TVs
educativas.
Não se sabe quantas dessas emissoras recebem dinheiro público. Em Ponta
Grossa (PR) e São Carlos (SP), elas são subvencionadas pelas prefeituras. A
Prefeitura de Ponta Grossa informou ter investido R$ 1,16 milhão na instalação
da TV.
Descontrole
As TVs legislativas pressionam para sair do sistema de distribuição fechada e
se tornar emissoras abertas. O governo Lula já deu concessões de canal aberto às
Assembléias Legislativas do Ceará, do Piauí e de Mato Grosso. As demais casas
legislativas reivindicam o mesmo tratamento.
Um exemplo dessa expansão é a TV Senado, que começou como canal fechado,
virou TV aberta, em Brasília, e já tem canais para retransmitir em TV aberta em
15 capitais. Possui 12 concessões de rádio FM educativas, que ainda não
operam.
Há estimativas de que as 58 TVs legislativas custem R$ 100 milhões ao ano. A
despesa cresce com a proliferação de canais.
Parte das emissoras funciona como apêndices da estrutura administrativa de
Executivo e do Poder Legislativo e não tem contabilidade separada.
Era digital
A migração das TVs educativas estatais para o sistema digital custará cerca
de R$ 240 milhões. Sem verba de investimentos, elas temem que a digitalização
seja o fim das emissoras mais pobres.
O decreto da TV digital, aprovado por Lula no ano passado, prevê que o
sistema analógico seja desligado em 2016.
A Abepec (Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e
Culturais) propõe que a migração para o sistema digital seja financiada com
recursos a fundo perdido e com créditos do BNDES.
As TVs educativas propõem a construção de uma rede digital para uso
compartilhado da Radiobrás e das 20 emissoras afiliadas da Abepec. As televisões
legislativas também discutem a formação de uma rede para uso compartilhado.
Fórum
Os problemas e o futuro do setor serão discutidos, em abril, no 1º Fórum
Nacional da TV Pública, organizado pelo Ministério da Cultura. Os dirigentes das
TVs educativas, legislativas, comunitárias e universitárias -que integram o
grande bloco do chamado campo público- querem que o governo não tome decisão
sobre a nova TV estatal antes do fórum.
As TVs educativas já haviam recebido mal a resolução do PT pela criação de
uma rede nacional de TVs públicas e de uma rede nacional de rádios públicas, que
divulgada no mês passado. Elas avaliam que já existem emissoras públicas em
número suficiente. Também vêem com reserva a criação de quatro novos canais
públicos institucionais previstos no decreto da TV digital.
Para o presidente da Abepec (Associação Brasileira das Emissoras Públicas,
Educativas e Culturais), Jorge da Cunha Lima, o PT choveu no molhado ao propor a
criação de redes nacionais públicas de rádio e de televisão. ‘A rede já existe e
é formada pelo conjunto das televisões educativas estaduais e suas afiliadas e
retransmissoras’, afirma.
***
Emissoras estatais querem seguir o modelo europeu
‘As televisões estatais brasileiras têm como referência os modelos de gestão
das emissoras européias, mas admitem que o sistema de financiamento adotado lá
-em que o usuário paga para manter o serviço- não seria aceito no Brasil, onde a
população já é sobrecarregada de impostos.
O modelo britânico de TV pública é o mais alardeado entre nós. A BBC tem oito
canais nacionais em TV aberta, sendo seis digitais. Os dois canais principais
(BBC 1 e 2) são analógicos. A BBC ainda tem dez emissoras de rádio.
A estrutura da BBC, que tem 20 mil funcionários, é financiada por uma taxa
anual que toda residência britânica com televisor tem que pagar -corresponde a
R$ 1,50 por dia. Essa taxa gera uma receita anual da ordem de R$ 12 bilhões.
O diretor geral da BBC responde a um conselho curador, formado por
representantes da população. Os relatórios anuais de gestão da BBC são
examinados pelo Parlamento.
Nos Estados Unidos, a TV pública reúne 350 emissoras locais e canais
nacionais, que recebem recursos de doadores e de um fundo, o CPB (Corporation
for Public Broadcasting, corporação para radiodifusão pública), criado pelo
governo em 1967 e que recebe dotação governamental.
O CPB repassa recursos às emissoras públicas locais e nacionais e também a
produtores independentes de programação. A maior fonte de recursos das TVs são
as doações dos telespectadores. De três a quatro vezes por ano, as emissoras
fazem campanhas para levantamento de recursos.
Na Alemanha, os usuários pagam uma taxa equivalente a R$ 45 por mês aos
Correios, que financiam também a TV pública. A cada quatro ou cinco anos, as
emissoras têm que anunciar e justificar os aumentos de custos ou da necessidade
de recursos. Uma comissão examina o pedido e faz uma recomendação aos governos
dos Estados para que orientem os parlamentares na decisão.
Os Correios e as telecomunicações alemães são da competência da União. Porém,
os Estados têm soberania em questões relativas a escolas, informação, arte e
cultura.’
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Não faltam recursos a TV pública, diz Bucci
‘O presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci, diz que o problema da TV pública
no Brasil não está na falta de recursos financeiros ou de funcionários, mas na
má-gestão. Ele, que pode deixar o cargo na reforma ministerial atualmente em
curso, se declara um entusiasta da TV pública e diz que suas críticas são para
aprimorar o setor. ‘Nenhuma democracia prescinde da comunicação pública, porque
ela supre áreas que a comunicação comercial não pode atender.’ Leia a seguir sua
entrevista à Folha.
FOLHA – Qual a diferença entre TV pública e TV estatal?
EUGÊNIO BUCCI – Há vários níveis de distinção. Falar que a TV estatal defende
o governo e que a TV pública é independente é um argumento capcioso, porque
mesmo a TV inteiramente de propriedade do Estado não pode fazer proselitismo. O
dever da impessoalidade vale para todas. Sou um entusiasta da TV pública.
Nenhuma democracia prescinde da comunicação pública, porque ela supre áreas que
a comunicação comercial não pode atender. Nosso problema é de gestão e
formatação de marco regulatório.
FOLHA – A BBC é citada como referência de independência editorial e é
financiada por uma taxa anual paga pelos telespectadores. Qual deveria ser o
modelo de financiamento no Brasil?
BUCCI – É preciso ter recurso público ou garantido pela legislação. O cidadão
inglês paga uma taxa anual para manutenção da BBC porque é obrigado por lei. A
idéia de que televisão pública tem de dar lucro é imprópria. Ela sempre será
financiada por recursos públicos. Também é falsa a idéia de que a TV aberta no
Brasil é gratuita. O preço da TV aberta está embutido no preço dos produtos que
ela anuncia.
FOLHA – O problema da TV pública brasileira é de falta de recursos?
BUCCI – Não acho. O principal problema é de gestão e de projeto. Não é falta
de funcionários nem de orçamento. Os projetos que consomem recursos públicos
poderiam ser melhor geridos. O setor tem de enfrentar essa realidade. Por isso,
o Fórum Nacional de TVs Públicas, a ser realizado em abril, terá uma importância
histórica para o setor, porque vai debater os modelos de negócios.
FOLHA – E qual é hoje a situação da Radiobrás?
BUCCI – O problema da Radiobrás é que ela mescla comunicação institucional,
como o canal NBR, e comunicação pública, da Rádio Nacional e da TV Nacional.
Fizemos uma gestão marcada pela impessoalidade e pela autonomia, mas todos os
integrantes da diretoria são nomeados pelo governo e demissíveis a qualquer
momento.
Na prática, funcionou bem, mas qualquer diretor pode ser afastado. O
orçamento anual da Radiobrás é de R$ 105 milhões, e ela tem 1.148 funcionários,
na quase totalidade celetistas. A empresa produz 90 horas de programação semanal
para TV e está dentro de padrões razoáveis de produtividade. Não é algo que
apavore.’
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Parlamentares fazem uso eleitoreiro de canais do Legislativo, diz
pesquisadora
‘Nem a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), nem o Ministério das
Comunicações fazem acompanhamento das televisões legislativas. Segundo a
pesquisadora Márcia Jardim, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), que
defendeu tese de doutorado em Ciências Sociais sobre canais legislativos, como o
serviço não depende de outorga do governo, as assembléias tratam direto com as
operadoras de TV a cabo.
Ela constata o uso eleitoreiro pelos dirigentes das Câmaras Municipais e das
Assembléias, já que eles têm poder de nomear e de demitir os diretores das TVs.
Para Jardim, apesar da ingerência política, os canais legislativos contribuem
para a democracia e são mecanismos eficazes de controle da atuação dos
parlamentares. ‘Não se mata o boi para acabar com o carrapato’, diz ela,
referindo-se ao uso eleitoreiro das TVs.
A primeira TV Legislativa da América Latina foi inaugurada em 1996 com a TV
Senado. O segundo país a aderir foi o Chile, cinco anos depois. Hoje, segundo
Jardim, há canais legislativos também em Argentina, México, Peru e
Venezuela.
Os quatro países transmitem sessões plenárias ao vivo, mas Brasil, México e
Venezuela são os únicos com 24 horas de programação diária. A Argentina tem a
menor grade de programação, com média de oito horas diárias. Todos financiam as
TVs com dinheiro público.
Chile e México são os países que têm os modelos de gestão mais independentes,
com diretores nomeados ou votados pelo conselho editorial.
Segundo a pesquisadora, a televisão legislativa nos EUA é iniciativa das
empresas de TV a cabo, e não há verba pública envolvida. O sistema naquele país,
chamado C-SPAN, foi criado em 1979, quando as TVs cabo decidiram oferecer
gratuitamente a seus assinantes as transmissões, ao vivo, dos trabalhos do
Legislativo. Na França, a TV é custeada com recursos das casas
legislativas.’
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Assembléias e Câmaras de SP disputam espaço na programação das emissoras
‘A disputa por espaço na TV Legislativa abriu uma guerra entre a Assembléia e
as câmaras de vereadores do interior de São Paulo. A Alesp entrou com um
processo na Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) pedindo intervenção na
divisão do tempo de programação, uma vez que o canal é de uso compartilhado.
Os municípios, por sua vez, acionaram seus deputados federais para
defendê-los, em Brasília, para evitar que a Assembléia fique com a maior parte
da grade de programação.
A briga teria começado porque o presidente da Assembléia, Rodrigo Garcia
(PFL), de São José do Rio Preto, ficou insatisfeito porque não estava aparecendo
ao vivo em sua cidade e quis instalar um decodificador de sinais para controlar
a entrada no ar das TVs das câmaras municipais. A iniciativa provocou reação em
Bauru, Taubaté, entre outras.
Por ser o Estado mais rico da federação, São Paulo é também o que possui
maior número de canais de televisão vinculadas ao poder legislativo municipal.
Das 58 televisões de câmaras municipais existentes no país, 24 estão em São
Paulo.
Os canais legislativos foram criados pela Lei da TV a Cabo, de janeiro de
1995. A lei estabelece que as Assembléias Legislativas e as câmaras municipais
devem compartilhar o horário da programação. Como as TVs a cabo têm concessão de
âmbito municipal, a Alesp deve negociar a divisão do espaço com cada câmara
municipal. Em tese, cada uma das casas teria direito a 50% do espaço.
Ocorre que há coincidências nos horários das sessões que devem ser
transmitidas ao vivo, o que provocou o conflito entre as casas legislativas. Os
municípios dizem que a prioridade de transmissão ao vivo deve ser para as
sessões. Em junho de 2006, por causa do conflito, foi criada a Associação
Paulista das TVs Câmaras Municipais. O problema vai pipocar pelo país, à medida
que proliferarem canais municipais.’
Elvira Lobato e Mari Tortato
Canais estatais se tornam cabides de emprego pelo país
‘O governador de Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB), determinou
intervenção na TV e na rádio educativas do Estado. A transmissão dos sinais para
os 32 municípios foi suspensa, e os 169 empregados, postos em férias. Segundo o
governo, as duas emissoras têm orçamento anual de R$ 7,2 milhões e estão
inchadas, com 169 funcionários.
‘A TV é importante para a construção da identidade cultural do Estado, mas
não vamos permitir que sirva de cabide de empregos e de central de favores’,
declarou o secretário de Governo, Osmar Jerônimo.
Há emissoras sucateadas e outras em franco crescimento. O governo do Piauí
investiu R$ 4,7 milhões na Fundação Antares. A fundação tem 220 funcionários e
fará concurso para contratar mais 100. Segundo seu presidente, Rodrigo Ferraz,
ela não deixa a dever, em termos de recursos, à TV Meio Norte, afiliada da
Globo.
Já em Alagoas, o Instituto Zumbi dos Palmares, vinculado à Secretaria de
Educação e que administra a TV educativa e quatro emissoras de rádio, passa por
penúria financeira. Apenas 4% da produção exibida pela TV são produzidos
localmente, embora tenha 390 funcionários, que consomem 90% da folha de
pagamento. A situação é tão crítica que um dos itens da pauta de reivindicações
dos professores estaduais em greve é que a Secretaria de Educação deixe de
sustentar a TV.
No Pará, a presidente da Funtelpa (Fundação de Telecomunicações do Pará),
Regina Alves Lima, suspendeu o convênio assinado em 1997, na gestão do
ex-governador Almir Gabriel, que cedia à TV Liberal, afiliada da Globo, o uso da
rede de 78 retransmissores para o interior do Estado. A TV educativa só era
captada na capital.
Um dos problemas das emissoras educativas estatais é com funcionários
estatutários. A TVE do Espírito Santo, por exemplo, não tem programação ao vivo
à noite porque o expediente termina às 19h.
A TVE do Maranhão foi transferida para o âmbito do governo federal quando o
senador José Sarney (PMDB-AP) foi presidente da República (1985-90), para
garantir recursos para o programa de ensino à distância. Ela faz parte da TVE do
Rio, que é federal, o que não impediu que fosse abandonada.
Desde o início de seu mandato anterior, o governador Roberto Requião (PMDB)
investiu em pessoal, equipamentos e expansão da Fundação Rádio e Televisão
Educativa do Paraná. E alterou seu estatuto para despontar como personagem
freqüente da programação.
A hoje RTVE (Rádio e TV Paraná Educativa) acrescentou ao objetivo de produzir
e gerar programas culturais, educativos e o debate de ‘políticas públicas de
governo’. Aos adversários de Requião a RTVE reserva dossiês e ataques.
O líder do PSDB na Assembléia Legislativa, Valdir Rossoni, diz que a TV
pública do Paraná ‘é uma demonstração de truculência, culto à personalidade’.
Rossoni acusa Requião de ‘contagiar a emissora com sua síndrome chavista’.
Admirador do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, Requião fez com a Telesur, de
Caracas, uma parceria para compor a cadeia do telejornalismo da emissora, em
troca da reprodução de programas de seu governo.
A Folha tentou falar na quinta e sexta-feira com o presidente da RTVE, Marcos
Batista, mas ele não atendeu. O porta-voz de Requião, Benedito Pires e
assessores da Agência de Notícias do governo não responderam à reportagem.’
Daniel Castro
Poderes têm TVs cansativas e para iniciados
‘A programação dos canais legislativos e judiciário é uma mistura de boas
intenções com más realizações. São canais a serviço da cidadania, que dão
transparência a poderes públicos e até melhoram o desempenho de parlamentares.
Por outro lado, são quase sempre cansativos de se assistir, muitas vezes de
linguagem só inteligível para iniciados e eventualmente de qualidade técnica
sofrível. O resultado é a audiência pífia.
Só a TV Senado aparece num ranking de audiência de 64 canais distribuídos
pelas operadoras de TV paga de São Paulo e Rio (sem contar as redes abertas e as
TVs Cultura e TVE-Rio) no trimestre novembro/dezembro/janeiro. As TVs Câmara e
Justiça e os canais legislativos estaduais não estão na lista, o que significa
audiência zero.
A TV Senado foi a 45ª mais vista no período. Numa projeção para o país, teve
média de 2.800 espectadores por minuto entre as 19h e a 0h. Parece pouco, mas é
mais do que CNN, Eurochannel e Bandsports. É preciso considerar, no entanto, que
os canais são disponíveis para as cerca de 15 milhões de parabólicas do país,
quase quatro vezes maior que o número de domicílios com TV paga.
A audiência das educativas é um pouco melhor, por terem sinais abertos. Têm
uma média diária nacional de 0,7 ponto no Ibope, que representa 17,8 milhões de
domicílios e cerca de 55 milhões de espectadores. Traduzindo, foram sintonizadas
em média em 127,9 mil domicílios por minuto em fevereiro. Ao todo, atingiram 5,3
milhões de residências.
A prioridade dos canais legislativos é transmitir as sessões nos plenários. E
é justamente isso o que afugenta telespectadores, confirma Florestan Fernandes,
diretor de jornalismo da TV Assembléia de São Paulo.No caso da TV Alesp, há um
agravante: sua freqüência no cabo é compartilhada por 22 câmaras municipais.
A solução para atrair telespectadores e preencher a grade é exibir programas
culturais. A TV Câmara tem o ‘Talentos’, que abre microfones para bons músicos.
Na TV Alesp, há a série de biografias ‘RG Paulista’.’
***
Gestão da TV Cultura é eleita por conselho
‘A TV estatal brasileira que mais se assemelha ao modelo europeu é a TV
Cultura, da Fundação Padre Anchieta: os administradores são escolhidos pelo
conselho curador. O Estado tem minoria de votos. A fundação fechou 2006 com
orçamento bruto de R$ 160 milhões. Metade foi repassado pelo governo de SP e
outra metade veio, indiretamente, do Estado, em contratos de prestação de
serviços à TV Alesp, à TV Câmara de SP e ao STF.’
TELEVISÃO
Procuradoria investiga leilões na TV
‘O Ministério Público Federal em São Paulo abriu uma investigação para apurar
a legalidade do mais novo caça-níquel da televisão, os leilões reversos, que
começam a virar mania.
O negócio funciona da seguinte forma: o telespectador liga para um telefone
celular e faz um lance pelo produto anunciado na TV, a maioria motocicletas e
eletrodomésticos. Se, ao final da duração do leilão (que varia de um dia a até
mais de uma semana), seu lance for o menor e único, ele ganha o direito de
comprar o produto pelo valor que ofertou.
Por exemplo: um determinado programa anuncia o leilão de uma geladeira que
vale R$ 3.000; o telespectador liga e se propõe a pagar R$ 12,32 por ela; se
ninguém mais ofertar R$ 12,32 e se todos os lances inferiores a esse valor
tiverem, cada um, mais de um proponente, esse telespectador que deu lance de R$
12,32 será o vencedor.
O chamariz dos leilões é a ‘oportunidade’ de o telespectador adquirir um
produto caro por um valor simbólico. Está funcionando. A Band, pioneira nesses
leilões, registrou 200 mil usuários (telespectadores diferentes que fizeram
lances) em agosto do ano passado, primeiro mês de funcionamento do serviço. Em
janeiro, o leilão da emissora, que tem o nome de Lancemania, já acumulava 5
milhões de usuários diferentes.
Hoje, além da Band, já oferecem leilões reversos o SBT (Preço Mínimo do Baú),
a Rede TV! (Menor Preço Único) e a TV Gazeta (Paga Quanto?). A Record
interrompeu seu leilão, o Oferta Única, há duas semanas, oficialmente para se
diferenciar das outras TVs (ou ficar mais parecida com a Globo).
À exceção do SBT, todas as redes exploram o caça-níquel em programas
femininos.
O telespectador que participa dos leilões, mas não ganha, arca ‘apenas’ com
os telefonemas. O valor das ligações varia de acordo com o local de onde se
telefona. Cada leilão opera com um único número em todo o país. Logo, as
ligações são interurbanas para boa parte dos usuários. A Band usa um celular de
Belo Horizonte. Só o SBT opera um número de São Paulo.
O serviço também é oferecido na versão SMS pela Band e SBT. Nesse caso, em
vez de telefonar, o telespectador manda uma mensagem pelo celular. Essa
mensagem, que normalmente custa, sem os impostos, R$ 0,31 (é o quanto se paga
para, por exemplo, votar nos ‘paredões’ do ‘Big Brother’), sai por R$ 1 nos
leilões (mais até R$ 0,40 de tributos).
Encanto
O negócio tem um efeito encantador sobre os telespectadores. Segundo um dos
operadores desses leilões, cada usuário faz em média entre dois e três lances
por leilão. Trinta por cento dos vencedores fazem mais 15 telefonemas.
As empresas criaram limites para os usuários, mas eles são bem dilatados. Nos
leilões da Band e SBT, o usuário ‘só’ pode fazer cem ligações por mês. Se
assinar um termo de responsabilidade, esse limite cai.
Os leilões envolvem vários atores econômicos. Além das TVs e das operadoras
de telefonia, há duas ‘operadoras’ (a ResponsFabrikken e a CellCast), empresas
que administram as plataformas telefônicas, e os varejistas (Eletro Direto e
Americanas), que vendem e entregam as mercadorias.
Jogo de azar
O Ministério Público Federal quer saber se os leilões reversos não estão
lesando o consumidor e se não se configuram como um telejogo, como o 0900.
O órgão enviou ofício à Caixa Econômica Federal, a quem compete expedir
autorizações para sorteios e promoções comerciais, perguntando se os leilões não
se enquadram em uma dessas categorias. Nenhum leilão foi autorizado pela
CEF.
Os operadores não vêem problemas. Primeiro, porque leilões são atividades
legais. Segundo, porque vendem produtos -e não sorteiam. ‘Nós submetemos os
leilões à Caixa e recebemos um ‘de acordo’. Não é preciso autorização’, diz
Percival Palesel, diretor da CellCast.
As empresas admitem que parte da remuneração do negócio vem da participação
nas receitas das telefônicas (‘alguns poucos centavos’). Contam que o que
sustenta os leilões são os patrocinadores. ‘Os leilões atraem audiência, são uma
ótima mídia para as marcas. A Brastemp acaba pagando para ter seus produtos
leiloados’, afirma Michel Castaldelli, diretor-executivo da dinamarquesa
ResponsFabrikken.
As TVs dizem que vendem espaços, como merchandising, mas têm participação nos
resultados. Enfatizam que os serviços têm regulamentos publicados em sites e são
auditados.
A CEF informou que ainda não recebeu ofício do Ministério Público e nega ter
recebido consultas das operadoras.’
Laura Mattos
‘Cobrir o papa é uma questão de ibope’
‘Ex-católico, atual fiel da evangélica Igreja Universal do Reino de Deus,
Alexandre Raposo assumiu a presidência da Record com menos de 34 anos.
Dois anos e meio depois, comemora o segundo lugar no Ibope e planeja
ultrapassar a Globo em ‘não menos do que cinco anos e não mais do que dez’.
Convicto no projeto de descolar a imagem da Record da igreja evangélica,
Raposo diz que a emissora decidiu cobrir amplamente a visita do papa ao Brasil,
em maio, com o objetivo de não perder audiência.
Em entrevista à Folha, diz que trabalha para conseguir o futebol nacional,
hoje exibido pela Globo, fala sobre o novo canal Record News e os laços com a
Universal.
FOLHA – Qual é o projeto da Record para tirar o futebol da Globo?
ALEXANDRE RAPOSO – Estamos mostrando aos clubes que o futebol tem vida
própria fora da emissora líder. Quando o jogo é exibido às 20h30, como fazemos
com os campeonatos Catarinense e Baiano, chega a ganhar da Globo. Temos também
uma proposta para que os campeonatos sejam divididos entre as emissoras. Cada
uma fica com um número de jogos. Uma pode transmitir na quarta, outra na quinta.
Haverá uma exposição muito maior. A questão é ver quanto os dirigentes estão
preocupados com o futebol.
FOLHA – Mas a Record já ofereceu R$ 500 milhões pelo Campeonato Brasileiro de
2009 para ter exclusividade de todos os jogos e não para dividi-los com outra
rede, certo?
RAPOSO – A gente não sentou ainda para discutir um número. Estamos dizendo
que queremos comprar. Se a emissora líder não topa dividir os jogos, estamos
dispostos a pagar por tudo, até por ‘pay per view’.
FOLHA – O fato de a Record não ter canal pago prejudica a negociação?
RAPOSO – Se tivéssemos os direitos, poderíamos negociá-los com a Sky e até
com o SporTV [canal pago da Globo]. Não entendo qual é a dificuldade. Nós
oferecemos mais [do que a Globo] pelo Campeonato Paulista e não levamos. O que
está por trás dessa história?
FOLHA – Valores altos oferecidos pela Record, como à Olimpíada, talvez não
sejam pagos com o lucro que virá da publicidade do evento. O objetivo é ganhar
em imagem?
RAPOSO – Até 2012 dá para vender publicidade tranqüilamente. Mas, ainda que
isso não fosse possível, valeria pelo valor agregado à marca da Record, pela
visibilidade, quebra de paradigma. Hoje todo mundo diz que futebol é em tal
emissora, que Copa é em tal emissora.
FOLHA – A Record comprou a rede gaúcha Guaíba, com jornal, rádio e TV. Qual é
o objetivo da expansão?
RAPOSO – A consolidação da marca. Quando se tem uma estrutura de mídia muito
mais complexa do que só um canal de TV, há mais repercussão.
FOLHA – A Record enviou equipes para padronizar o jornalismo em outros
Estados. No Nordeste, onde a rede não tem canal próprio, só afiliadas, estão os
mais sensacionalistas.
RAPOSO – Temos conversados com os afiliados para que evitem o
sensacionalismo. Eu morei no Nordeste e lhe digo: às vezes lá uma reportagem um
pouco mais dura é natural para eles. Choca aqui e lá, não. Nem por isso, as
pessoas devem explorar a miséria dos outros. Estamos acompanhando e não temos
visto nenhuma aberração.
FOLHA – A cobertura da visita do papa ao Brasil, que a princípio seria
discreta, será ampla por determinação de Edir Macedo. Por quê?
RAPOSO – Não [risos], isso foi uma decisão nossa. Nós e o jornalismo
analisamos que seria interessante do ponto de vista de audiência. Já cobrimos o
papa outras vezes, isso é um mito.
FOLHA – Missas serão exibidas?
RAPOSO – O jornalismo deve transmitir, senão na íntegra, pelo menos os
principais trechos. O Douglas Tavolaro [diretor de jornalismo] me disse que
seria muito interessante a gente fazer o máximo de cobertura para manter a
audiência e atender a expectativa do público.
FOLHA – É uma mudança grande se pensarmos no chute na santa, não?
RAPOSO – Ah, mas ali não foi a Record. Foi uma pessoa num horário vendido
para a Igreja Universal. Foi um lance isolado num programa que dava traço
[audiência baixa], que só teve repercussão porque os nossos concorrentes tinham
interesse em repercutir a história e atribuí-la à Record.
FOLHA – A emissora quer deixar programas da igreja só nas madrugadas em
outros Estados, como fez em SP e Rio. Por que a tentativa de descolar a imagem
da TV da igreja?
RAPOSO – O objetivo não é descolar a imagem, é questão de benefício. Se o
horário é vendido à igreja por ‘x’, e posso produzir um programa que pode ser
comercializado por mais e ainda me trará audiência, por que não? A decisão é por
audiência e questão econômica.
FOLHA – O canal de notícias Record News será aberto, em UHF, ou veiculado em
televisão fechada, em uma parceria com a Telefônica/TVA?
RAPOSO – Ainda não está decidido. O certo é que estréia no segundo semestre
deste ano.
FOLHA – Dinheiro não é problema para vocês. Do faturamento de R$ 1 bi em
2006, quanto veio da igreja?
RAPOSO – Era bom que não fosse [risos]. Quanto vale vender a madrugada a um
mesmo cliente? Vendemos também chamadas ao longo do dia para eles.
FOLHA – Por que você fala ‘eles’? A Record é do bispo Edir Macedo.
RAPOSO – Porque são ‘eles’, que não têm a ver com a Record. O bispo é
fundador da igreja, mas não sei como funciona lá. Há hoje no mercado o
anunciante evangélico, que está na Band, Rede TV!, Gazeta.
FOLHA – É interessante o esforço de dizer que a Record não é da igreja…
RAPOSO – Mas ela não é.
FOLHA – Mas é do dono da igreja…
RAPOSO – Não sei, o bispo é dono da igreja? Ele fundou. Mas ainda que fosse
dono da igreja, não tem nada a ver uma coisa com a outra. A igreja é um cliente,
não banca a Record.’
***
Globo tenta ‘vacina’ contra a concorrente
‘Silvio Santos assustava vez ou outra com uma ‘Casa dos Artistas’ da vida,
mas seu plano nunca foi chegar à liderança.
Para a Globo, era só apagar um incêndio do Ratinho aqui, outro do ‘Show do
Milhão’ acolá. Com a Record em seu encalço, o jogo mudou. A Globo sabe que sua
nova concorrente tem convicção em um projeto de ser a primeira rede do país e
que conta com o financiamento do dízimo da Igreja Universal. E ninguém imagina
até onde essa verba pode chegar.
Reportagem da Folha de 2006 mostrou que, de R$ 1 bilhão do faturamento no
ano, ao menos R$ 240 milhões vinham dos evangélicos. A Record também foi a única
rede para a qual a publicidade do governo federal cresceu no ano passado,
ultrapassando R$ 60 milhões.
A Globo, com a nova novela das oito em crise de audiência, decidiu esticar o
‘Big Brother’ em uma semana. Sem o ‘reality’, único hoje a passar dos 40 de
média no Ibope, há o risco de ‘Paraíso Tropical’ perder ainda mais audiência
para ‘Bicho do Mato’, da Record, que está nos últimos capítulos.
Não é a primeira vez que a líder age na tentativa de aplacar o crescimento da
rival. Em 2006, o ‘Jornal Nacional’ carregou em reportagens policiais quando a
novela ‘Prova de Amor’, da Record, o ameaçou no Ibope.’
***
TV Cultura estréia hoje terceira série de documentários
‘As fotografias de Pierre Verger (1902-1996) poderiam estar perdidas para
sempre se não fosse o trabalho de edição de Arlete Soares. Responsável pelos
primeiros livros de imagens de Verger, Arlete se tornou bastante próxima dele
durante os anos em que o fotógrafo viveu em Salvador.
A relação entre os dois está documentada na produção baiana ‘Os Negativos’,
dirigida por Ángel Díez. O filme dá início hoje, às 23h, à terceira edição do
programa ‘DocTV’, na TV Cultura.
Usando o depoimento de Arlete como fio condutor, o vídeo apresenta parte da
história de Verger, que ela conheceu em Paris, em 1969. Dez anos depois, Arlete,
que também é fotógrafa, criou a editora Corrupio especialmente para produzir os
livros dele.
‘Os Negativos’ é o primeiro de 35 documentários, produzidos em todos os
Estados do país, a ser exibidos nesta terceira série do programa. Parceria entre
o ministério da Cultura, TVs públicas e instituições ligadas aos governos
estaduais, o ‘DocTV’ viabiliza a produção de documentários em todo o país e a
transmissão deles pela rede pública de TV.
Dentro do projeto, já foram realizados 114 filmes -selecionados por meio de
concursos estaduais- e 44 oficinas para mais de 1.300 documentaristas. Entre os
filmes que já passaram pelo ‘DocTV’, está uma primeira versão de ‘Acidente’, sob
direção de Cao Guimarães e Pablo Lobato, que rodou festivais internacionais como
Sundance e Locarno.
É Tudo Verdade
Para esta edição, foram selecionados filmes como o paulista ‘Handerson e as
Horas’, dirigido por Kiko Goifman, que passa em outubro na TV Cultura; e o
gaúcho ‘Lutzenberger: For Ever Gaia’, de Otto Guerra e Frank Coe, que está
previsto para 13 de maio.
Ambos integram a programação do Festival É Tudo Verdade, que começa na
próxima quinta-feira, em São Paulo, e sexta, no Rio.
Na semana que vem, a atração do ‘DocTV’ será o documentário ‘Uma Encruzilhada
Aprazível’, dirigido por Ruy Vasconcelos e rodado em um entroncamento rodoviário
no sertão do Ceará. DOCTV Quando: hoje, às 23h Onde: TV Cultura’
Bia Abramo
Pais e filhos diante da televisão
‘O Discovery Kids é aquele canal de desenhos e programas infantis
politicamente corretos, com produções que sempre têm preocupações educativas e
tentam estimular as habilidades cognitivas, afetivas e corporais das crianças.
Ainda assim, é TV e sua lógica se impõe de qualquer maneira, seja o conteúdo
melhor ou pior.
Meu filho, três anos e 11 meses, começou a dizer, diante das propagandas
sobre a nova atração: ‘Sabia que eles estão chegando?’ Eles eram os adolescentes
cantantes e dançantes de ‘Hi5’, programa que entrou na programação exatamente
nos horários em que ele costuma ver televisão. Bastaram dois episódios, quando
eles efetivamente ‘chegaram’, para ele ficar completamente ligado.
Mais: todos os dias, perto do horário, ele pergunta: ‘Já está na hora de
‘Hi5’?’
O programa, a princípio, causa um certo mal-estar para quem se acostumou a
detestar Xuxa e congêneres, já que há muita dança, música e coreografias. Sim, o
time é multiétnico, com uns dois loiros, uma negra, um asiático e uma latina, e,
não, ninguém fica exibindo partes carnudas do corpo, mas a própria idéia de
quase-adultos dançando enquanto crianças imitam gestos parece, por si só,
impositiva.
Mas a insistência das crianças é proverbial e, de tanto ver junto com ele
-dizem que é isso que os pais devem fazer-, essa impressão inicial se desfez. O
programa revela estar há anos-luz do tatibitate reiterativo sobre a alegria de
ser criança da rainha dos baixinhos. Os meninos contam e interpretam histórias
bacanérrimas, os quadros são criativos e há informação -sobre bichos, máquinas,
lugares do mundo, números, formas geométricas etc.- na quantidade e tom certos.
‘Backyardigans’, desenho animado em 3D que tem como personagens cinco
vizinhos que compartilham o mesmo quintal é outra atração que tem a música como
ponto central. As crianças são representadas como animais -uma hipopótama
amarela, um alce laranja, um pingüim azul, um canguru roxo e, bem, talvez o que
seja uma dinossauro fêmea rosa- e sempre partem do quintal para aventuras
imaginárias em lugares tão diferentes como o Havaí ou a Mongólia e em épocas
também diversas.
As aventuras têm roteiros divertidos, que atentam para uma certa fidelidade
geográfica e histórica, embora o peso informativo não amarre a fantasia. O ponto
alto sem dúvida são as músicas: a cada episódio há quatro músicas novas, com
ritmos de todos os lugares do mundo.’
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