Saturday, 21 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Veja


MAINARDI vs. FRANKLIN
Diogo Mainardi


Minha pastinha implacável


‘Lula ofereceu um cargo a Franklin Martins. Lembra dele? Eu tenho uma
pastinha para cada um dos meus processos. A pastinha de Franklin Martins é uma
das mais espessas, porque ele me processou duas vezes. Na semana passada, quando
Lula o convidou para integrar o ministério, com a tarefa de cuidar da imprensa e
da propaganda do governo, abri a pastinha e comecei a recapitular meu caso com
ele.


O primeiro confronto ocorreu em 7 de dezembro de 2005. A data é importante.
Àquela altura, já sabíamos que Lula conseguiria abafar as denúncias contra o
governo. Para isso, ele podia contar com oposicionistas, magistrados, policiais,
artistas, publicitários, banqueiros e doleiros. Ele podia contar também com a
cumplicidade de um monte de jornalistas. Fiz uma coluna identificando aqueles
que me pareciam ser os maiores acobertadores do lulismo na imprensa. Um deles
era Franklin Martins, que defini como ‘José Dirceu até a morte’.


Retomei o assunto algum tempo depois, em 19 de abril de 2006, em meio ao caso
Francenildo. Franklin Martins era comentarista do Jornal Nacional. Mais ainda:
ele era diretor da sucursal brasiliense da Rede Globo, responsável pela
cobertura política da maior emissora do país. Na ocasião, acusei-o de
promiscuidade com o poder, argumentando que seu irmão fora indicado diretamente
por Lula para uma diretoria da Agência Nacional do Petróleo (ANP).


Em sua resposta, publicada na internet, Franklin Martins me acusou de ser um
‘difamador travestido de jornalista’. Ele negou ter pedido votos aos senadores
em favor de seu irmão. Negou também que sua mulher, Ivanisa Teitelroit,
trabalhasse para o governo em cargo comissionado, outro ponto citado no meu
artigo.


Mas Franklin Martins se estrepou. Eu tinha uma cópia do Boletim
Administrativo do Pessoal, que ainda guardo em minha pastinha:


RESOLVE nomear, na forma do disposto no Inciso II do artigo 9º da Lei nº
8.112, de 1990, IVANISA MARIA TEITELROIT DE SOUZA MARTINS para exercer o cargo,
em comissão, de Assistente Parlamentar, AP-1, do Quadro de Pessoal do Senado
Federal, com lotação e exercício no Gabinete da Liderança do Governo.


O documento o desmentia integralmente. Em primeiro lugar, sua mulher foi
contratada, em cargo comissionado, para o gabinete do líder do governo no
Senado. Em segundo lugar, se Franklin Martins nunca tratou da ANP com os
senadores, sua mulher tratou, porque naquele período ela já era assessora de
Aloizio Mercadante. Alguns dias depois de ser nomeada assistente parlamentar,
ela foi promovida a secretária parlamentar, com um ligeiro incremento salarial.
Permaneceu no cargo durante a CPI dos Correios, ajudando Lula a enterrar a
crise.


A Globo demitiu Franklin Martins. José Dirceu se declarou ‘estarrecido’ e me
chamou de ‘pistoleiro sem credibilidade’. Franklin Martins ficou esquecido até a
semana passada, quando Lula premiou sua lealdade oferecendo-lhe o cargo de
ministro. Sua pasta poderá reunir a secretaria de imprensa e a Secom, que
controla a verba de propaganda do governo. Até hoje, as duas áreas sempre foram
prudentemente separadas. Se tudo se confirmar, Franklin Martins terá o poder
inédito em nossa história de fornecer a notícia e de pagar por ela. Isso dá uma
idéia do grau de verdade, de confiabilidade e de rigor moral que Lula pretende
conferir ao segundo mandato. Agora já posso fechar minha pastinha.’




INTERNET
Rosana Zakabi


O difícil é separar fato de ficção


‘A enciclopédia on-line Wikipedia é uma prova eloqüente do impacto da
internet na divulgação de conhecimento no mundo atual. Com versões em 250
idiomas, ela é construída pouco a pouco pelo próprio público que a utiliza.
Verbetes podem ser criados ou modificados por qualquer pessoa diante de um
computador. O resultado é que, em seis anos de vida, a Wikipedia já conta com 6
milhões de verbetes – contra 120.000 da tradicional Enciclopédia Britânica. O
ponto forte da Wikipedia, o fato de ser criada coletivamente por milhares de
especialistas, também produz o seu ponto fraco. Nunca se pode garantir a
veracidade das informações divulgadas. Há duas semanas, revelou-se uma fraude
que expôs as falhas da Wikipedia no que diz respeito à credibilidade. A
enciclopédia tem um time extenso de editores, também anônimos, que monitoram as
informações enviadas pelo público e selecionam as mais relevantes, traduzem
artigos, corrigem erros e cuidam para que não haja vandalismo verbal no site.
Descobriu-se que um desses editores, que se apresentava como professor de
religião de uma universidade particular, era na verdade um jovem de 24 anos que
nem diploma universitário tem. Na semana passada, Jimmy Wales, fundador da
Wikipedia, prometeu maior rigor na seleção dos editores, que se apresentam
apenas com pseudônimos.


O anonimato dos colaboradores da Wikipedia cria uma democratização ilusória,
que na verdade coloca peritos e impostores lado a lado. Em geral, se há
informações contraditórias sobre determinado tema, o site publica ambas e avisa
que há controvérsia sobre o assunto. A rigor, muitos dos verbetes de qualquer
enciclopédia convencional suscitam polêmica. A criação dos verbetes é sempre
entregue a especialistas nas respectivas áreas, mas outros acadêmicos podem
defender teses completamente diferentes. Nesses casos, a Enciclopédia Britânica
adota o procedimento de indicar obras que discordam de seu conteúdo. Na
Wikipedia, a origem dos verbetes e das idéias que eles apresentam é
desconhecida. De qualquer maneira, ela é uma ferramenta útil para iniciar
pesquisas e descobrir que caminhos seguir. Com o acesso freqüente ao site, é
possível identificar os verbetes duvidosos, em geral mal escritos, e os que têm
por trás um ou mais especialistas.


Outras enciclopédias on-line prometem aperfeiçoar a idéia da Wikipedia. A
Conservapedia, lançada em novembro, copia a concorrente, mas exige a citação das
fontes utilizadas para a pesquisa. A Citizendium, que deve entrar em operação
nos próximos meses, será uma espécie de Wikipedia sem anonimato. Com as
enciclopédias on-line, a antiga utopia de reunir todo o conhecimento humano numa
única fonte, que teve sua maior representante na enciclopédia francesa criada no
século XVIII pelo filósofo e escritor iluminista Denis Diderot, ganha contornos
ainda mais espetaculares. Agora, é preciso encontrar meios de tornar mais
confiáveis suas equivalentes do século XXI.’




TV PÚBLICA
Marcelo Marthe


Com a faca e o queijo


‘A anunciada criação de um Ministério da Comunicação Social e de uma rede
nacional de televisão estatal dedicada a fazer propaganda do Executivo sinaliza
uma visão de mundo equivocada e, potencialmente, perigosa. A iniciativa do
governo Lula tem defeitos graves. O principal é subverter a ordem posta de pé
pela democracia grega sobre o papel da liberdade de expressão nas sociedades
abertas. O governo pretende fazer políticas e, ao mesmo tempo, se auto-elogiar
através de sua imprensa estatal. Os gregos já ensinavam que não se pode colocar
a faca e o queijo nas mãos dos governantes. Um governo legítimo tem o poder de
fazer guerras, usinas nucleares, pontes, programas sociais, nomear ministros,
definir o comércio exterior, determinar o que as escolas devem ensinar e muito
mais. Perfeito. A imprensa tem total liberdade para criticá-lo. Ponto.


Em Atenas, no século de Péricles, o quinto antes de Cristo, esse princípio
foi enunciado por diversos dos muitos sábios daquele período áureo. Ele pode ser
resumido na frase: ‘Algumas poucas pessoas atingem o poder de fazer políticas
públicas. Todos podem criticá-las’. Os gregos desconheciam, por elitistas, a
parte vital dessa equação: a opinião pública. Hoje em dia, nas grandes
democracias, o princípio grego teria uma formulação diferente: ‘O governo faz, a
imprensa avalia e o público julga’. É cegueira acreditar que o governo possa
fazer, avaliar e julgar os próprios atos. É mistificação vender a idéia de que o
governo fará e o público julgará – sem os olhos e os ouvidos da imprensa.


Com seu ministério do jornalismo e sua rede estatal de televisão, o Executivo
brasileiro segue o rastro de governos que se deram muito mal, acabaram em
tragédia, bancarrota, humilhação pela história ou simplesmente no anacronismo e
na irrelevância. Os exemplos são os de sempre. São ditadores que inflaram suas
máquinas de propaganda governamental ao tempo em que reprimiam, inviabilizavam
ou simplesmente destruíam a imprensa livre. Eles foram Adolf Hitler, Josef
Stalin e Mao Tsé-tung. Exemplares liberticidas prosperam nos trópicos. Casos de
Fidel Castro e de Hugo Chávez.


França e Itália têm redes de rádio e televisão estatais não-educativas. Elas
competem com as redes privadas e oferecem uma programação eclética, com shows,
eventos esportivos e notícias. Na Itália, elas são loteadas pelos partidos, mais
ou menos como na partilha dos ministérios. Seguem levemente a linha partidária.
Nenhuma obedece caninamente ao governo.


Na França funcionam mais como cabides de emprego para jornalistas. A
Inglaterra é exceção. Tem a British Broadcasting Corporation (BBC), emissora
estatal mas não do governo. Ela tem seu próprio orçamento (pago direta e
voluntariamente pelos cidadãos ingleses). A BBC é subordinada a uma agência
composta de doze pessoas indicadas pelo governo com a aprovação do Parlamento. A
cada ano, duas delas saem e entram outras duas, de modo que um determinado
governante precisaria de seis anos para colocar apenas indicados seus na agência
que manda na BBC. Os membros dessa agência – que não podem ser demitidos pelo
governo – nomeiam o diretor da BBC. Isso garante liberdade de ação.


No passado, a BBC fazia apenas propaganda das políticas do governo. Até o
grande Winston Churchill foi censurado pela BBC no começo dos anos 30, quando,
fora do governo e do Parlamento, pregava a guerra contra Hitler. O governo
inglês ainda preferia a política do apaziguamento. Em 1934, depois de quase dois
anos de censura, Churchill conseguiu furar o bloqueio. Ele se vingou dizendo no
ar que imaginava como o diretor da BBC devia estar suando frio, com as mãos nos
interruptores, com medo de que ele dissesse ‘alguma coisa desagradável contra
Hitler’. Arrematou com humor: ‘Fosse pelo governo e sua BBC, São Jorge (santo
padroeiro da Inglaterra) não teria matado o dragão, mas o convidado para uma
conferência de paz’.


Com todos os amplos recursos informativos que já possui, como a Radiobrás, o
governo brasileiro precisa de uma estrutura nova de 250 milhões de reais para
fazer propaganda de si mesmo? Luiz Dulci, ministro-chefe da Secretaria-Geral da
Presidência, incentivador da idéia, acha que sim. ‘O presidente decidiu que
vamos ter uma rede. Para mim, está claro que será uma rede pública, que tratará
com destaque questões que canais privados não tratam, como fazem as principais
TVs públicas do mundo, da RAI à BBC’, diz Dulci.


Jorge da Cunha Lima, presidente da Associação Brasileira das Emissoras
Públicas, Educativas e Culturais (Abepec), discorda: ‘É mais uma tentativa de
aparelhamento do estado bem de acordo com as idéias da ala radical do governo
petista’. Bons são os governos que garantem o bom funcionamento da sociedade, e
não aqueles que querem substituí-la – seja na economia, seja na imprensa. O
exemplo a evitar existe e é clássico – 1984, de George Orwell. Está lá, todo
pimpão, o Ministro da Verdade, encarregado de fazer com que tudo que não esteja
de acordo com o governo seja suprimido como mentira.’




CELEBRIDADES & MÍDIA
Veja


O golpe paparazzi


‘Os paparazzi, fotógrafos que caçam celebridades, costumam cobrar caro por
seus flagrantes publicados na imprensa. Na Itália, um grupo de paparazzi decidiu
passar para o lado do crime e ganhar dinheiro de outra forma: cobrando para não
divulgar as fotos que produz. Na semana passada, promotores italianos
descobriram uma máfia da fotografia que chantageava celebridades exigindo
milhares de euros para que imagens suas em situações comprometedoras não
aparecessem na imprensa. Entre as vítimas da quadrilha estão atletas, políticos
e empresários. A filha do ex-primeiro ministro Silvio Berlusconi, Barbara, fez o
pai desembolsar 20.000 euros para evitar a divulgação de uma foto em que
aparecia bêbada ao lado de um desconhecido na saída de uma boate. O jogador de
futebol Francesco Totti, capitão do Roma, pagou 50.000 euros para impedir a
circulação de imagens suas com uma apresentadora de TV. Na época, sua mulher
estava grávida. Até o atacante brasileiro Adriano, do Inter de Milão, foi alvo
do golpe. O jogador não cedeu aos chantagistas e um jornal sueco reproduziu as
imagens em que ele aparece numa festinha íntima com amigas desinibidas. Outra
vítima da máfia das lentes foi Silvio Sircana, porta-voz do primeiro-ministro
Romano Prodi, flagrado conversando com um travesti. A quadrilha foi descoberta
durante uma investigação sobre uma rede de prostituição e drogas.


O paparazzo – termo que surgiu com o personagem homônimo do filme A Doce
Vida, de Federico Fellini, de 1960 – é um personagem típico da era do culto às
celebridades. Seu trabalho é fotografar pessoas famosas de surpresa, de
preferência em situações nas quais elas não gostariam de ser fotografadas.
Quanto mais constrangedora for a imagem, mais atraente ela se torna aos olhos de
um público ávido por escarafunchar a vida dos ídolos do cinema, da TV ou da
música. E também das celebridades que nem profissão têm e, como definiu o
escritor americano Daniel Boorstin, ‘são famosas por ser famosas’. Os paparazzi
freqüentemente são alvo da ira de seus personagens, mas a verdade é que há entre
as duas partes uma relação de dependência. Quando algum artista, atleta,
socialite ou político de destaque deixa de atrair fotógrafos xeretas, é sinal de
que sua carreira de celebridade está decadente. Não é à toa que muitos artistas
e políticos mantêm a imprensa informada de seus compromissos sociais, tentando
garantir a presença de fotógrafos nos eventos.


A questão que se coloca na ação dos paparazzi é até que ponto eles têm o
direito de invadir a privacidade alheia. É perfeitamente compreensível que as
pessoas famosas queiram proteger sua vida particular, expondo-se apenas nas
ocasiões que lhes interessam. Cada vez mais, essa justa aspiração se choca com
os cânones da era das celebridades, hoje turbinada por tecnologias que favorecem
a bisbilhotice, como os celulares com câmera e os sites YouTube e Orkut. Para
fazer parte do jogo da fama, é preciso se conformar com o fato de que basta sair
à rua para ficar exposto aos cliques de um paparazzo. Na Itália, é preciso
também torcer para que ele não seja um chantagista.’




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