Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

‘Oportunista’, xingamento e elogio

Política é linguagem. Cada ação política é prevista, acompanhada e difundida pela linguagem. As palavras em jogo, em cumplicidade, em conflito. Para convencer, para deturpar, para esclarecer, para acusar, para responder, para prometer, os atores políticos escolhem palavras, repetem palavras, manipulam palavras.


O político ativa o verbo, joga as palavras ao vento, gerando a possibilidade de elas serem captadas e multiplicadas pela mídia. Palavras de efeito para que causem efeitos. A palavra ‘oportunista’, por exemplo.


Lula chama de oportunistas os candidatos que, Brasil afora, mesmo tendo sido e ainda serem oposição ao PT, elogiam o presidente popular: ‘Eles não têm lado porque são oportunistas e nós temos lado’ (Gazeta Mercantil, 22/9/2008). E os oposicionistas rebatem, afirmando que oportunista é Lula, xingamento que o hoje líder da nação (gostemos ou não) já recebeu inúmeras vezes, e não só nos textos de Diogo Mainardi e Reinaldo Azevedo, ou nos discursos da ex-senadora Heloísa Helena.


O candidato a prefeito de São Paulo Geraldo Alckmin tem chamado Gilberto Kassab de oportunista. Em sua defesa vem seu secretário Clóvis Carvalho, ex-chefe da Casa Civil do governo FHC, e diz que oportunista é Alckmin. Aí aparece o deputado federal José Aníbal dizendo que Clóvis Carvalho, seu colega de partido (PSDB), é que é oportunista e, além disso, insignificante.


No lugar certo, na hora certa


Por que gostam tanto da palavra ‘oportunista’?


No final do ano passado, Dilma Rousseff chamava de oportunista quem era contra a prorrogação da CPMF (Jornal Cidade, 01/12/2007).


Depois de criticar a facilidade com que instituições de ensino superior têm sido aprovadas pelo próprio MEC, o autor da crítica, o ministro Fernando Haddad, foi por sua vez criticado pelo deputado federal Paulo Renato Souza: ‘Acho que o ministro foi deselegante, descuidado e oportunista.’ (Folha de S. Paulo, 09/8/2008).


José Simão, atento às armadilhas verbais, descobre que na cartilha do lulês o verbete ‘oportunista’ vem a ser o ‘companheiro que trabalha no Opportunity’ (Folha de S. Paulo, 25/7/2008).


O curioso é que, saindo do terreno político para o campo de futebol, o adjetivo perde o caráter negativo e se torna elogio. O jogador oportunista está no lugar certo e na hora certa. Simplesmente aproveita a oportunidade. Declaração de um zagueiro que fez papel de atacante: ‘Consegui ser oportunista e fazer o gol da vitória’ (Globoesporte.com, 20/9/2008).


Talvez o oportunismo político não seja tão diferente do futebolístico…

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Doutor em Educação pela USP e escritor – www.perisse.com.br