Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Por que não abrir o jogo?

Está na capa da edição corrente da revista The Economist (27/9) exatamente nestes termos: ‘Celulares e câncer’. Nas páginas internas, o texto intitulado ‘Loucura móvel’ descreve a confusão em torno de um estudo multinacional que demorou seis anos para ser completado e custou 30 milhões de dólares.


Erros metodológicos atrasaram a montagem das conclusões e persiste a controvérsia. Aqueles que não acreditam nos efeitos perniciosos das irradiações eletromagnéticas já prepararam uma manchete: ‘Celulares não produzem tumor cerebral’. O grupo adversário vai contra-atacar: ‘Uso intenso de celular aumenta o risco de tumores benignos’.


Enquanto a controvérsia não é esclarecida, uma publicação responsável como a Economist não se omite e sente-se no dever de alertar o distinto público para a possibilidade de uma grave ameaça à saúde.


No verão setentrional, outro semanário – o francês L´Express – foi mais candente e mais longe em reportagem com 12 páginas e enorme chamada na capa: ‘Enquete sobre os verdadeiros perigos dos [telefones] portáteis’ (17-23 de julho, 2008).


Quantas matérias têm sido publicadas no Brasil sobre o assunto?


Papel impresso


A resposta pode ser obtida por via indireta através de outra pergunta: ‘Qual é o produto eletrônico mais anunciado na mídia?’. A indústria jornalística brasileira, como sempre, adota a tática do avestruz: omite-se e enfia a cabeça na areia. Prefere suprimir o debate, na esperança de que os malefícios causados pelo celular sejam desmentidos, do que oferecer às suas audiências um mínimo de informações.


Mesmo embargada pela mídia, a polêmica sobre a eventual periculosidade dos celulares corre solta nas reuniões de condomínio dos edifícios mais altos dos grandes centros urbanos. As operadoras de telefonia móvel, empenhadíssimas em ampliar o número de antenas, oferecem um bom retorno em troca de um pequeno espaço nos terraços para instalá-las.


De olho no equilíbrio das contas, os síndicos são os primeiros a abraçar a idéia. Convocadas a opinar pelas assembléias de moradores, as empresas que assessoram os condomínios não têm outra alternativa senão oferecer algum tipo de subsídio informativo a respeito da suposta periculosidade dos celulares. Estes subsídios vêm da internet, geralmente em língua estrangeira. Ou de moradores – médicos, físicos ou engenheiros eletrônicos.


Suicídio 1: para preservar o faturamento publicitário, nossa mídia foge ostensivamente da sua obrigação elementar – alertar e esclarecer.


Suicídio 2: antes que se esclareça a questão com pesquisas científicas confiáveis, a mídia resolveu apostar no celular como jornal-de-bolso, substituto da mídia impressa.


Papel impresso pode sujar as mãos, mas jamais foi denunciado como causador de doenças.