FUTURO DOS JORNAIS
Sérgio Dávila
Jornal passa por transformação ‘histórica’
‘Em sua edição de 24 de agosto, a revista ‘The Economist’ se perguntava quem matou o jornal. No livro ‘The Vanishing Newspaper – Saving Journalism in The Information Age’ (O Jornal Evanescente – Salvando o Jornalismo na Era da Informação, 2006), Philip Meyer chega a dar o ano do óbito: o último exemplar em papel do último jornal norte-americano seria lido em algum momento do primeiro trimestre de 2043.
A notícia da morte do jornal é um exagero, para parafrasear o que escreveu com humor Mark Twain, pseudônimo de Samuel Langhorne Clemens (1835-1910), depois de saber que um repórter havia saído a campo para descobrir se o autor tinha morrido. Ao menos é o que se conclui da leitura de três levantamentos recentes, o mais importante deles ‘O Estado da Mídia’ (‘State of the News Media 2007’), recém-divulgado.
O relatório afirma que o modelo no qual as empresas de comunicação se firmaram nas últimas décadas nos EUA está sendo revisto -e que o ritmo da mudança se acelerou no ano passado: ‘A transformação pela qual o jornalismo passa é histórica, tão importante quanto a invenção da televisão ou do telégrafo, talvez tanto quanto a invenção do processo de impressão em si’, afirma o estudo, o mais amplo do tipo, feito anualmente por entidade ligada à Universidade Columbia, em Nova York.
Diz ainda que os jornais começam a se mexer mais rapidamente, embora não saibam ainda exatamente o caminho a seguir. Nesse sentido, ganham importância iniciativas como a integração de Redações das versões em papel e on-line do mesmo veículo, o uso maior dos recursos multimídia, a disseminação dos blogs e até a utilização do chamado ‘jornalismo cidadão’, em que o leitor contribui com notícias ou imagens.
Na área de conteúdo, são citados o que o texto chama de ‘hiper-localismo’ -cobertura exaustiva da comunidade local-; a ‘valorização de marcas’, ou seja, maior exposição das ‘grifes’ jornalísticas; e a existência de público e lugar tanto para artigos que aprofundem e organizem assuntos do dia anterior como para textos superficiais, curtos ou sobre celebridades. ‘É como se a empresa de comunicação fosse um shopping center, e o jornal, sua loja-âncora’, escreve Tom Rosenstiel, um dos autores.
A amparar a tese da precocidade da morte anunciada, estão os números. O estudo lista diversos índices negativos da indústria local -queda na circulação média de 2,8% de segunda a sábado nos seis meses terminados em setembro passado, em comparação com mesmo período de 2005; faturamento sem crescimento num ano sem recessão- e outros tantos positivos, para concluir: ‘Neste momento, achamos muito cedo para concordar seja com os otimistas, seja com os alarmistas’.
De qualquer maneira, o ‘Estado da Mídia’ calcula que, por dia, ‘cerca de 51 milhões de pessoas ainda comprem’ um exemplar ‘e no total 124 milhões leiam um jornal’, recorde histórico. Esse número representa 41% da população norte-americana. Para efeito de comparação, há 110,4 milhões de lares com TV nos EUA, segundo o instituto Nielsen, e 205 milhões de usuários da internet, segundo o ‘World Factbook’ da CIA.
Circulação e publicidade
Os dados batem com levantamento mais amplo feito anualmente pela indústria mundial, patrocinado pela World Association of Newspapers (WAN). Segundo o estudo, a circulação paga mundial dos jornais cresceu 6% nos últimos cinco anos, e a publicidade, 11,7%. O aumento foi alavancado pela América do Sul e pela Ásia, principalmente Índia e China -sete dos dez jornais pagos mais lidos do mundo hoje estão naquele continente (veja quadro nessa página).
Paradoxalmente, as notícias sobre a imprensa publicadas pela imprensa são mais negativas do que o próprio estado de ânimo dos que as editam. É o que concluiu o primeiro ‘Barômetro da Redação’, realizado pelo instituto de pesquisas Zogby a pedido da agência de notícias Reuters e do World Editors Forum, ligado à WAN, divulgado na última semana. Dos 435 editores ouvidos no mundo, 85% vêem com otimismo o futuro do jornalismo.
Previsões prematuras
Para John Zogby, embora a circulação de 62% dos veículos em que os pesquisados trabalham tenha estacionado ou caído nos últimos cinco anos, ‘previsões da morte dos jornais são tão prematuras quanto a noção de que a televisão mataria o rádio’. O motivo, disse ele ao ‘Financial Times’, é que ‘editores de jornais vêem a internet e seus novos componentes jornalísticos como a próxima onda dos próprios negócios e estão se preparando para ela, em vez de lutar contra’.
No Fórum Econômico de Davos, na Suíça, Arthur Sulzberger Jr. declarou que ‘não sabia’ se o ‘New York Times’ ainda terá uma versão impressa daqui a cinco anos. ‘Quer saber?’, completou o empresário norte-americano, ‘não importa.’ No mesmo evento, Sergey Brin, bilionário fundador do Google, diria que vê ‘bom futuro’ para os jornais: ‘Recebo o ‘NYT’ aos domingos e é legal’.
Qualidade
Ambos elaborariam suas respostas. Para o editor do ‘Times’, não importa o meio em que as notícias produzidas por sua equipe serão entregues, desde que o jornal continue líder e zelando pela qualidade do que faz. Já para o jovem do Vale do Silício, para ser mais do que ‘legais’ os jornais devem se concentrar em criar um conteúdo verdadeiramente único.
De alguma maneira, o momento atual de transformação da indústria citado pelo relatório passa pela justaposição das duas frases -e a interdependência de seus autores. Um dos sites noticiosos mais freqüentados na internet nos EUA é justamente o Google News, um agregador de notícias que traz, entre outros, o conteúdo do ‘NYT’. O primeiro não existiria sem o segundo, e o segundo aproveita o primeiro para alavancar a sua audiência.’
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‘Leitores terão conexão direta’, afirma autora
‘A imprensa poderia usar uma personalidade revolucionária, como foi Ted Turner ao criar a CNN nos anos 80, para encontrar seu novo modelo, e um dos pré-requisitos é que tal pessoa tenha formação no jornalismo clássico, mais que na internet.
Nesse novo modelo, os leitores terão conexão mais direta com o conteúdo, uma habilidade maior de julgar o valor dele e de expressar esse julgamento. Serão também um dos fornecedores desse conteúdo. É o que disse à Folha Amy Mitchell, vice-diretora do Project for Excellence in Journalism.
Inicialmente ligado à faculdade de jornalismo da Universidade Columbia, em NY, o PEJ ganhou vida própria e assumiu a responsabilidade da quarta versão anual do relatório ‘O Estado da Mídia’. Agora associado ao Pew Research Center, de Washington, o PEJ colocou no ar suas conclusões. São 160 mil palavras, em www.stateofthemedia.com. Mitchell supervisionou o trabalho e é co-autora do estudo. Leia entrevista.
FOLHA – A revista ‘The Economist’ se pergunta quem matou o jornal. Conforme seu relatório, ninguém -ainda. Quem está com razão?
AMY MITCHELL – Os jornais não estão mortos ainda. Estão batalhando para descobrir como podem prosperar nos próximos anos e qual será a forma que a notícia vai tomar. Mesmo agora, agregadores como o Google e o Yahoo! dependem primeiro do conteúdo de jornais para exibir seus resultados.
FOLHA – O ‘Estado da Mídia’ declara que o negócio da comunicação entra numa nova fase. Mas diz que a indústria tem poucas respostas sobre como mudar o modelo. Não é contraditório?
MITCHELL – Não, o negócio está entrando numa nova fase. Os velhos modelos estão desmoronando. Mas os novos modelos e sua eficácia ainda não são claros. Temos visto todo tipo de experiência, mas neste momento não há um modelo claro que possa substituir o velho.
FOLHA – Um dos pontos destacados é a parceria entre jornais impressos e sites de classificados online. É um dos caminhos?
MITCHELL – Talvez. É muito cedo para qualificar o resultado das novas parcerias. Mas abre possibilidades.
FOLHA – ‘A transformação pela qual o jornalismo passa é histórica, tão importante quanto a invenção da televisão ou do telégrafo’, segundo o relatório. Onde isso vai dar?
MITCHELL – Uma de nossas certezas é que os cidadãos estarão muito mais envolvidos. Os leitores terão conexão mais direta com o conteúdo, habilidade maior de julgar o valor dele e de expressar esse julgamento. Eles serão também em alguma medida fornecedores desse conteúdo.
FOLHA – O estudo duvida que as empresas de capital aberto sejam o modelo mais apropriado para o jornal na fase de transição. Mas afirma que as empresas fechadas ainda não provaram ser a melhor saída. Qual é a solução?
MITCHELL – O que estamos tentando dizer é que a tendência atual é favorável ao modelo da empresa privada. Há uma vantagem: muitos jornais que teriam fechado de outra maneira estão ganhando nova chance [com novos compradores]. O que não está claro é o tipo de investimento que os novos proprietários farão. Investirão no conteúdo só pelo valor do jornalismo ou será investimento movido a lucros e faturamento?
FOLHA – Segundo o relatório, a indústria devia achar um líder visionário, com o papel que Ted Turner e sua CNN nos anos 80. De onde é mais provável que saia esse ‘novo líder’, do Vale do Silício ou de Manhattan? Uma pessoa com formação pontocom ou vinda da mídia tradicional?
MITCHELL – Isso é difícil de responder! Um dos pré-requisitos necessários é que seja alguém com algum conhecimento de jornalismo.
FOLHA – O estudo prevê que os órgãos de mídia tentarão atingir mais efetivamente seu público se voltando mais para região geográfica [hiper-localismo] ou valorizando as próprias personalidades [‘grifes’ jornalísticas]. O segundo caso não levará a um noticiário mais opinativo?
MITCHELL – Pode levar. Depende do público-alvo. Um nicho geográfico provavelmente pedirá cobertura mais neutra, enquanto uma baseada em colunistas pode ser mais tendenciosa.
FOLHA – Como avalia a pesquisa que aponta otimismo em 85% dos entrevistados quanto ao futuro do jornalismo?
MITCHELL – O resultado mostra que eles vêem um lugar para eles nos novos modelos, e acho que eles estão certos.’
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Novidades já integram dia-a-dia das Redações
‘Em setembro, o ‘New York Times’ anunciou em suas páginas a contratação de um executivo. Nenhuma novidade, é prática do jornal mais influente do mundo publicar textos sobre a movimentação interna da empresa que o edita. Não fosse o cargo do recém-contratado: ‘futurólogo-residente’.
O ocupante é Michael Rogers, ex-diretor de novas mídias da empresa que edita o ‘Washington Post’ e ex-gerente-geral do site da revista semanal ‘Newsweek’. Mas foi a empresa Practical Futurist (futurólogo prático), criada por ele em 2004, e a coluna semanal homônima que assina no site MSNBC que chamaram a atenção de Arthur Sulzberger Jr., o editor do ‘NYT’.
A função de Rogers é desenvolver novas estratégias para o site do jornal e pensar em inovações para outros produtos da empresa -o jornal à frente, é claro. É um dos exemplos nítidos do que o relatório ‘O Estado da Mídia’ fala quando se refere a busca por inovações.
No ‘Los Angeles Times’, foi criada uma editoria de jornalistas investigativos para investigar o futuro do jornalismo, comandada pelo ‘Innovation Editor’ (editor de inovação).
A primeira conclusão e recomendação do time -fruto de estudo batizado de ‘Spring Street Project’ e apelidado pelos detratores de ‘Manhattan Project’, alusão aos cientistas reunidos pelos EUA que desenvolveriam a bomba atômica- é que o jornal devia unificar urgentemente as Redações da versão em papel e on-line.
O ‘L.A. Times’ pretende fazer até o final do ano a integração total, uma Redação que funcione 24 horas com lema ‘Dê o furo na internet, faça a análise no papel’ (‘Break it on the web, expand it on the print’). Outra recomendação é um uso maior dos recursos multimídia, como os blogs e a produção de vídeos.
O último é a menina-dos-olhos de Sulzberger, do ‘New York Times’. A seu pedido, repórteres levam câmeras de vídeo digitais ou pequenas equipes que as operam em pautas especiais, com objetivo de fazer a reportagem impressa ser acompanhada de um vídeo na versão on-line da mesma.
Hoje, o site põe no ar 25 vídeos desse tipo por semana, mas a produção cresce. Há um curso de treinamento para uso da câmera, que todos os jornalistas da Redação farão até 2008; novos usos são testados, como vídeos-declarações que acompanham as tradicionais foto-reportagens de casamento no caderno ‘Sunday Styles’.
A idéia vem pegando também nas revistas. Nos últimos dias, a Time Inc., que edita 130 títulos, anunciou inauguração de um estúdio para que seus jornalistas produzam conteúdo para os sites de suas publicações, revistas como ‘Time’, ‘Fortune’, ‘Sports Illustrated’ e ‘Entertainment Weekly’.
Outra novidade envolve o chamado ‘jornalismo-cidadão’: a participação de leitores na produção de notícias ou de imagens noticiosas. Em San Francisco, na Califórnia, o site de notícias Topix anunciou na segunda que será editado por leitores-voluntários.
Iniciativa semelhante vem do Assignment Zero, colaboração entre a revista ‘Wired’ e um site experimental de jornalismo dirigido por um professor da Universidade de NY. Além disso, o conglomerado Gannett, que edita 90 jornais, como o ‘USA Today’, quer transformar Redações em ‘centros de informação’ 24 h, receptores de todos os leitores.
Se o entusiasmo pelo leitor participativo é grande, as críticas também o são. No mesmo ‘Los Angeles Times’, uma ação do tipo na editoria de opinião foi abortada após semanas pela falta de qualidade em geral dos textos e pelo predomínio de artigos insultosos.
Andrew Keen, um dos mais ferrenhos críticos da internet, escreve no inédito ‘The Cult of the Amateur – How Today’s Internet is Killing our Culture’ (‘Culto ao Amador -Como a Internet de Hoje Está Matando nossa Cultura’, a sair em junho), que ‘jornalismo-cidadão’ e ações parecidas estimulam a ‘ditadura dos idiotas’.
Em entrevista ao site I Want Media, Michael Rogers, do ‘NYT’, revelou: ‘Parece banal, mas o básico ainda vale. Tudo começa com repórteres, redatores e editores que sabem reconhecer e contar uma boa história. Sem eles, não faz diferença quão incríveis são as novidades tecnológicas’.’
O MAIOR BRASILEIRO
Na internet, ‘o povo’ é eleito maior brasileiro
‘Os leitores da Folha Online escolheram ‘o povo’ como o ‘Maior Brasileiro de Todos os Tempos’ em enquete realizada entre os dias 1º e 7 de abril. Participaram da votação on-line 66.303 pessoas.
Para 32% dos internautas que participaram da votação, ‘o povo’ merece o título de o ‘Maior Brasileiro de Todos os Tempos’. Com 18%, Santos Dumont, inventor do avião, ficou em segundo.
As opções da enquete foram tiradas do resultado da votação feita pela Folha com 200 intelectuais, políticos, artistas, religiosos, empresários, publicitários, jornalistas, esportistas e militares.
O escolhido como o ‘Maior brasileiro de todos os tempos’ foi o presidente Getúlio Vargas, com 16 votos. Na internet, Getúlio ficou em quarto, com 8%.’
TELEVISÃO
No baile do Casseta
‘O galã Guilherme Berenguer chega eufórico. ‘Cadê as meninas?’, pergunta. Ele está no corredor que dá acesso ao Estúdio G do Projac, a central de produção da Globo, onde logo mais será gravado um quadro comemorativo dos 15 anos do ‘Casseta & Planeta’, o ‘Debutando pra Quebrar’. As ‘meninas’ pelas quais procura são os humoristas do programa.
No quadro, cinco galãs da Globo (além de Berenguer, Marcelo Farias, Henri Castelli, Iran Malfitano e Alexandre Slaviero) e um convidado (Paulo Zulu) dançam valsa com os cassetas (respectivamente, Beto Silva, Claudio Manoel, Hubert, Reinaldo, Marcelo Madureira e Hélio de la Peña). Vai ao ar nesta terça, no primeiro episódio da temporada 2007.
Na sala de caracterização, Claudio Manoel corta os poucos cabelos que possui. ‘Você tem pêlo no peito?’, quer saber Neuma Caldas, supervisora de caracterização. ‘Amanhã [terça passada] a gente vai ter que cortar’, sentencia. O humorista não gosta da idéia. Diz que vai consultar a mulher. A depilação, explicou, era para fazer uma paródia de Rodrigo Santoro no filme ‘300’. ‘Me acham parecido com ele’, brincou.
No corredor, o modelo Paulo Zulu conversa indignado com o Hélio de la Peña. Na véspera, Zulu fora jurado do quadro de dança do ‘Domingão do Faustão’. ‘Ontem foi esquisito. Teve gente que achou que era pessoal’, diz Zulu, referindo-se à reação, atrás das câmeras, da atriz Fernanda Vasconcelos. ‘Ela brigou comigo porque eu dei 9 pra ela e 10 pra Fafá de Belém. Falou comigo de um jeito que nem minha mulher fala.’
Numa sala, os cassetas conferem os figurinos que usarão: longos vestidos em tons claros com anáguas de tule aramadas por baixo e sapatos mocassins. Hubert reclama que os cassetas deveriam usar salto alto. ‘Tinha que ser comme il faut [como deve ser, a rigor]’, brinca.
A poucos metros dali, num corredor maior, onde funcionários da Globo improvisam um balcão de aeroporto para gravações de ‘A Grande Família’, que ocupa o estúdio ao lado, seis figurantes aguardam desde as 9h. Já são quase 16h e alguns, cansados, sentam-se no chão, vestidos à black tie. Vão trabalhar de fato menos de duas horas, ‘interpretando’ músicos de orquestra. Só irão embora pouco depois das 18h. Receberão cachê de R$ 50, cada um.
Cenário gigante
Para gravar o baile de debutantes do ‘Casseta’, que para o telespectador durará cerca de cinco minutos, a Globo construiu um cenário gigante exclusivo, em estilo romano, bem cafona, com cortinas e rosas vermelhas e uma escada com um grande relógio no meio.
Maria Paula e os galãs são os primeiros a gravarem. Ao som de ‘Danúbio Azul’ (ou ‘Delúbio Azul’, segundo um casseta), ela rodopia no centro do salão, dançando com os seis galãs.
Os ensaios duram quase uma hora, mas a gravação para valer é rápida. Maria Paula acerta o texto e a marcação na primeira, mas o diretor-geral, José Lavigne, repete a gravação.
Encerrada a cena, Maria Paula corre para um canto e pede para alguém fotografá-la com a mãe, Gilka Fidalgo, que diz ter ido ao estúdio só para conferir o ‘début’, que ela pronuncia ‘debiu’, com beicinho.
‘Foi para entrar na personagem que eu trouxe minha mãe, para me sentir mais debutante. Porque debutante sem a mãe por perto não é nada’, diz Maria Paula, tirando onda com um clichê comum nos bastidores televisivos -o ‘entrar no personagem’.
O bom humor predomina na gravação. Lavigne deu um único piti. A vítima foi um produtor de engenharia. Motivo: os fones de ouvido não funcionaram. ‘Você tinha que ter visto isso antes. Agora já são quase cinco horas’, disse, irado, o diretor. O produtor argumentou que estava almoçando. ‘Estava almoçando na hora errada’, rebateu Lavigne.
Valsa
Os cassetas chegam para gravar. Todos vestidos de debutantes, mas sem maquiagem de mulher. Alguém oferece uma cadeira para Hélio de la Peña. ‘É só se vestir de mulher que neguinho te trata diferente’, diz. ‘Isso aqui é bom pra peidar’, confere Claudio Manoel, mostrando a saia rodada. ‘Mas é ruim pra coçar o saco.’
‘Depois você tem que olhar debaixo dessas saias. Tem uns [cassetas] que usam salto dizendo que é para receber o personagem, mas não é, não’, sugere Rubens Camello, um dos diretores do ‘Casseta’.
Os seis cassetas vão com seus respectivos galãs para o centro do salão. Dançam valsa desajeitadamente. Madureira praticamente arrasta seu par, Alexandre Slaviero. ‘Cara, estamos pagando um puta mico’, diz um galã. ‘Isso é tango? Festa junina?’, protesta Hubert.
Cada casseta tem uma cena, com piadas ‘típicas’ do programa. Hélio de la Peña, por exemplo, diz para Zulu, enquanto baila: ‘Nossa, Zulu, você dança divinamente… Dá pra sentir que você é um tremendo pé de valsa!’. Zulu responde: ‘Não, você está enganado. Isso que você está sentindo aí não é o pé de valsa, não. É o de mesa!’.
Algumas cenas são gravadas de primeira. Outras, repetidas até cinco vezes. No final, com o relógio marcando meia-noite, os cassetas saem correndo, antes que o encanto acabe. Entra em cena um enorme sapato de cristal (na verdade, de plástico). ‘É o sapato da Ângela Rô Rô’, dispara Hélio de la Peña.
Acaba a gravação. Em minutos, cassetas e galãs já se livraram dos vestidos e smokings. Do lado de fora do estúdio, Marcelo Madureira se despede de uma repórter: ‘Me tira daqui! Me leva pra Record!’.’
***
Programa terá novos quadros e vinhetas
‘O programa ‘Casseta & Planeta, Urgente!’ volta ao ar nesta terça com um visual novo. Todas as vinhetas gráficas e musicais estão sendo trocadas. O humorístico, oitavo programa mais visto no país em 2006, terá novos quadros. Um deles será o desenho animado ‘Lula Esponja Cabeça Quadrada’, uma sátira de ‘Bob Esponja’, com referências aos supostos hábitos etílicos do presidente.
Dois ‘seriados’ vão entrar no ar: ‘High Schoolacho Musical’ (de ‘High School Musical’, da Disney) e ‘MC Ferrow e MC Deumal’, sobre dois DJs cariocas buscando o sucesso.
Outra aposta é o quadro ‘Casseta Brasil Adentro’, que percorrerá o país de van, uma ‘apropriação’ da ‘Caravana JN’, em que Pedro Bial rodou o país, nas eleições de 2006, em um ônibus.
Organização
Depois da morte de Bussunda, o mais carismático, no ano passado, os cassetas passaram a focar suas atenções no programa de TV, conta o empresário do grupo, Manfredo Barreto. ‘Este ano será muito importante para o programa. Será completamente sem o Bussunda’, diz Barreto.
A Toviassu (empresa dos humoristas) já faturou bem mais. Atualmente, as receitas do grupo basicamente se resumem aos salários que recebem da Globo, com a qual tem contrato até 2011. Todos ganham a mesma coisa. Quem faz publicidade tem de destinar 40% do cachê para a Toviassu. Com a morte de Bussunda, que fazia muitas campanhas, essa fonte de receitas minguou.
O grupo já não faz mais esquetes de rádio nem escreve livros de piadas. A Toviassu, que já teve mais de 25 funcionários, hoje possui a metade disso.’
Bia Abramo
MTV faz versão pop de ‘reality show’
‘É CURIOSO que, no mundo do hiperconsumo, as pessoas se sintam tão desamparadas para decidir o que e como consumir. Curioso, mas num certo sentido, compreensível: uma vez que o consumo joga um papel decisivo na definição das identidades (diga-me o que compras e te direi quem és), errar nesse terreno é muito arriscado.
É nessa espécie de imaturidade -no sentido de que a constituição de uma identidade pessoal e autônoma é, ou era, uma das tarefas do crescimento psíquico- que se baseiam os ‘realitys’ do tipo ‘resolvemos sua vida’. São um sucesso: a televisão, como uma mãe generosa, solícita e de bolsa aberta, está aí para ajudar, qualquer que seja o tamanho de seu problema.
A MTV acaba de estrear uma versão pop desse tipo de ‘reality show’. Chama-se ‘Quebra-Galho’ e ajuda seus participantes a realizarem pequenos desejos – ‘quero acampar’, ‘quero fazer um book’, ‘quero ir a uma balada com o Nxzero’ e por aí vai. A MTV designa um ‘especialista -os há para qualquer galho, acreditem se quiser- e uma verba de R$ 50 para gastar.
A modéstia dos problemas e exigüidade de dinheiro, além da extrema juventude de seus participantes, dão um tom mais leve e divertido ao ‘reality show’ da MTV. Mas também é tudo de uma bobagem que resvala o non – sense: por que será que essa meninada não consegue fazer o que quer? Por que será que o mundo é tão complicado? De onde vem tanta insegurança e dependência?
A juventude, tal como a conhecíamos no passado, era o momento de correr riscos existenciais de várias espécies como uma forma de celebrar a independência e autonomia. Pelo jeito não é mais.
Esses meninos e meninas que aparecem na MTV querem risco zero.
Boninho, o diretor do ‘BBB’ entrevistado por Laura Mattos domingo passado, acha que a crítica ‘insiste em desacreditar’ o programa. Não é o que esta coluna observa: desde que o programa estreou, em 2002, não há edição que não receba pelo menos um comentário das colunas de TV, esta inclusive.
O problema é que a Globo, criada com a expectativa de monopólio eterno e na fantasia delirante da audiência de 100%, não entende que considerar o fenômeno relevante e, portanto, digno de atenção e reflexão, não é mesma coisa que ‘falar bem’ ou ‘achar bom’.
É típico: diante de qualquer observação crítica, as emissoras brandem números de audiência e o assunto está encerrado.’
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