Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Folha de S. Paulo

REQUIÃO vs. MÍDIA
Dimitri do Valle

Requião critica ‘mídia paga’ e Judiciário

‘Após ser proibido pela Justiça de usar a TV Educativa do Paraná para promoção pessoal, ofensas à imprensa, a adversários e instituições, o governador Roberto Requião (PMDB) disse, em entrevista à Folha, que não pode ficar ‘ao sabor da opinião da mídia paga, da mídia subsidiada pelo capital’.

A entrevista foi feita na sexta-feira, horas antes de ele ser multado em R$ 50 mil por desrespeitar a decisão -terça passada, em seu programa semanal ‘Escola de Governo’, Requião cortou o som da própria voz e colocou um carimbo de ‘censurado’ sobre a imagem.

Durante os 50 minutos de conversa em seu gabinete, ele ficou irritado (‘Você não existe, rapaz, como jornalista’). Antes de iniciar, apontou para um gravador. Depois, disse que colocaria a gravação na íntegra na TV Educativa se a publicação não fosse fiel a suas palavras. Até ameaçou suspender a entrevista. Mas continuou para dizer que trabalha para ser ‘o melhor governador da história do Paraná’. O ranking de avaliação dos governadores do Datafolha, do final de novembro, apontou Requião como 5º mais bem avaliado entre dez pesquisados.

FOLHA – A Justiça proibiu o sr. de usar a TV Educativa para promoção pessoal e ofensas. A decisão será cumprida?

ROBERTO REQUIÃO – Nunca fiz propaganda pessoal. Quando vou à ‘Escola de Governo’, coloco uma idéia e estou me expondo. Não vou lá dizer que sou rei da cocada preta.

FOLHA – O sr. diz que é vítima de censura, mas já processou meios de comunicação e jornalistas que publicaram algo que o desagradou.

REQUIÃO – Se alguém não gostar do que eu digo, me processe. Posso provar que o que eu disse era exatamente o que acontecia. Censura prévia é um crime contra a Constituição.

FOLHA – Mas como o sr. lida com a situação antagônica?

REQUIÃO – Não há situação antagônica. [Só] na sua cabeça. E me perdoe a franqueza: está funcionando mal sua cabeça. Se você me difama, eu te processo, eu não te censuro. Não difamei ninguém. Tudo o que eu disse na ‘Escola de Governo’ eu posso provar. E não tem nenhuma ação contra mim.

FOLHA – Como o sr. avalia a programação da estatal do Paraná?

REQUIÃO – É a comunicação do governo com a população. Não posso ficar com o governo inteiro ao sabor da opinião da mídia paga, subsidiada pelo capital e pelos interesses. Não é o fato de eu ter me elegido governador que me tira o direito de opinião. Esperava que a censura contra a liberdade de opinião tivesse acabado no Brasil. Parece que não acabou. Só houve esse raio dessa ação [da Procuradoria] no dia em que expus os salários do Ministério Público.

FOLHA – Há ainda a questão do nepotismo no seu governo.

REQUIÃO – Quando eu me candidatei, eu disse na televisão, no horário do PMDB, que nomearia meu irmão Maurício como secretário da Educação. E não existe impedimento constitucional para se nomear pessoas competentes, sejam quais forem. Você não pode cercear uma pessoa pelo fato de ser seu parente. O nepotismo é uma coisa mais ampla: é nomear [pessoa] inadequada por um protecionismo de qualquer sentido em um lugar importante onde ela prejudica a administração pública.

FOLHA – O vínculo familiar não atrapalha as cobranças?

REQUIÃO – Não. Ajuda. Ele é meu parceiro político mais do que parente. O Maurício é o melhor secretário da Educação do Brasil. E outro irmão meu [Eduardo Requião], que está no porto de Paranaguá, transformou um porto falido no primeiro porto do país.

FOLHA – O sr. se recusa a conceder reajustes nos pedágios, que acabam sempre determinados pela Justiça. Vai continuar com essa oposição?

REQUIÃO – Evidente que vou continuar. A Justiça assumiu a administração do pedágio no Paraná. Agora, depois da licitação em que o governo federal licitou o pedágio 10, 11 vezes abaixo do preço do Paraná, você nem devia me fazer essa pergunta. Você devia me perguntar se eu acho que a Justiça vai continuar dando esse absurdo de aumentos absolutamente indevidos. Reverta a pergunta que fica melhor.

FOLHA – Governador, os contratos estão registrados.

REQUIÃO – Que maravilha. Acho que eu vou interromper essa conversa. Esse tipo de cabeça não existe. Você não existe, rapaz, como jornalista. Contratos estão registrados. Um governo corrupto faz um contrato absurdo, o povo é roubado, eu sou o governador do Paraná, eu tenho que dizer que o governo fez o contrato absurdo e o povo tem que continuar pagando. Não, tem que contestar isso.

FOLHA – Qual é o seu projeto político para o futuro?

REQUIÃO – Gostei da palavra. Eu trabalho por projeto. O meu projeto é fazer o melhor governo da história do Paraná outra vez porque eu já fiz na legislação passada. Eu não vou dizer a você que o Ministério Público Federal e o Judiciário não estejam me lançando nacionalmente e me obrigando a fazer uma campanha nacional contra a censura prévia e que isso não me promova no Brasil. Mas, ao mesmo tempo, dizer que ao lado dessa promoção quem está sendo agredido é o país, a democracia, a liberdade de expressão.’

 

EDUCAÇÃO
Folha de S. Paulo

Canudo de papel

‘HÁ ALGO DE esdrúxulo e preocupante no ensino superior brasileiro. O censo oficial do setor, divulgado em dezembro, registra aberrações curiosas. Existem, por exemplo, dez vezes mais estudantes matriculados em cursos para a formação de professores de literatura do que para o ensino de física e química, áreas didáticas de importância que deveria ser equivalente. São 175 mil os que cursam jornalismo, cifra cinco vezes maior do que a de jornalistas que hoje trabalham com carteira assinada em todo o país (35 mil).

Não há tampouco critério racional que explique o motivo de os estudantes de medicina (74 mil) serem pouco mais numerosos do que os de turismo (66 mil), carreira necessária, embora inflada de forma artificial por um modismo. Igualmente grave é haver 589 mil matriculados em direito, número que supera os 571 mil advogados da ativa registrados pela OAB, como informou Rogério Gentile em texto publicado segunda-feira nesta Folha.

Não pode e não deve ser dado como normal que estudantes encarem os cursos em áreas específicas como se fossem polivalentes. Um exemplo: poucos dos 680 mil matriculados em administração previsivelmente seguirão a carreira. Mas o curso lhes dará alguma forma de segurança ou ascensão no plano de seus projetos pessoais.

O fato é que não existe um modelo que defina com razoável antecedência quais as carreiras que serão objeto de ampla -ou quase nenhuma- demanda. Mesmo assim, é lamentável que inexistam mecanismos que desestimulem a abertura de novos cursos em áreas francamente inchadas. A saturação das matrículas gera um inequívoco mercado de ilusões, presente, em 2005 (últimos dados oficiais), nas 1.578 faculdades de administração, 1.524 de pedagogia, 861 de direito e 497 de jornalismo.

Esses dados não se referem apenas às universidades públicas ou confessionais. Cabe lembrar que 72% dos 4,7 milhões de estudantes estão matriculados na rede particular. Foi sobretudo ela que permitiu, com a expansão de vagas nos anos 90, que hoje 10,4% dos jovens entre 18 e 24 anos estejam cursando o terceiro grau. E isso ainda é pouco. A meta do governo federal é chegar a 30% em 2011.

De modo sumário, essas informações demonstram uma estrepitosa inadequação entre, de um lado, a formatação do ensino superior e, na outra ponta, as expectativas de um mercado com carência no recrutamento de profissionais qualificados.

O problema, no entanto, não é apenas quantitativo. A questão da qualidade também se coloca de forma dramática. E, nesse ponto, o Brasil está engatinhando. É bastante positivo o fato de o terceiro grau ter deixado de ser um destino quase exclusivo das elites, mas a qualidade oferecida pela média dos cursos ainda deixa muito a desejar, em parte por deficiências históricas do ensino fundamental e médio. O diploma, que deveria ser uma ferramenta para a abertura de portas, em muitos casos não passa de um objeto de decoração pendurado na parede de desempregados ou subempregados.’

 

LULA & FIDEL
Carlos Heitor Cony

Uma foto e um fato

‘RIO DE JANEIRO – Acho que não deveria escrever esta crônica. Mas como resistir à foto de Lula fotografando Fidel Castro e Fidel Castro fotografando Lula? Taí: sempre ouvi dizer que uma imagem vale dez mil palavras, pode valer muito mais e muito menos. Refiro-me ao ditado latino ‘asinus asinum fricat’. Um burro coça outro burro.

Peraí. Se há dois caras que podem ser tudo, menos burros, tanto Fidel como Lula estão acima de qualquer suspeita. Embora não admire suas idéias e os métodos políticos que praticam, tenho uma admiração pela pessoa física de ambos, não apenas por suas qualidades pessoais mas por seus defeitos.

Estava em Cuba quando, num momento de crise, dos muitos que atravessava, Fidel parou tudo e foi torcer pelo seu time de beisebol. Que perdeu feio para um adversário tradicional. Fidel entrou em depressão, cancelou compromissos e foi curtir a cara inchada como qualquer torcedor, ninguém podia se aproximar dele. Lula até que tem mais qualidades do que Fidel no aspecto humano. É um ótimo sujeito para se bater um papo sobre futebol, mulheres, comidas e bebidas, músicas de churrascaria, fofocas genéricas sobre a vida alheia.

Pena que os dois tenham se dedicado à salvação não da lavoura, mas da pátria. Neste particular, não contam com a minha bênção, que, aliás, não faz falta a ninguém, muito menos a eles, que terão um lugar garantido na história da humanidade, que também não conta com a minha inútil e desmoralizada bênção.

Gostei de ver a foto dos dois se fotografando. Com um pouco de treino, Lula poderá se tornar um razoável paparazzo. Gosta do ofício, sempre que pode pede uma máquina emprestada para fotografar alguma coisa.

Fidel tem idade e já não tem mais saúde para mudar de profissão.’

 

MATHEUS NACHTERGAELE
Laura Mattos

Radical livre

‘Matheus Nachtergaele, 39, não tem celular. Motivo: ‘Não aceito ser roubado sistematicamente pelas operadoras’.

Nisso, acredita, se parece com Tito, jornalista radical de esquerda que interpretará na minissérie ‘Queridos Amigos’, da Globo, a partir de 18 de fevereiro. Ex-exilado político, ele se depara com um país em grave crise econômica e tem de afogar, em uma revista pornográfica, todo o talento que pretendia usar para mudar o mundo.

A história, de Maria Adelaide Amaral, se passa em novembro de 1989, fim da campanha Lula x Collor. Tito, é claro, votou em Lula, apesar de não considerar, já naquele tempo, o petista tão de esquerda assim. Esse foi também o voto de Nachtergaele, mais esperançoso que seu personagem, triste por ver a família inteira ajudar a eleger Collor. Em 1989, o ator morava na França, mas voltou ‘a tempo de ver o debate final’ entre os candidatos e ‘assistir de camarote ao governo Collor’.

Hoje, Nachtergaele se decepciona por Lula não ter o hábito de aparecer na TV e dizer claramente: ‘Olha, gente, o que está acontecendo é o seguinte: eu queria fazer isso, mas não estou conseguindo porque a empresa tal está dificultando etc. etc.’.

Nachtergaele confessa ter dificuldades para ‘perceber o que se passa na política’. E acredita que Amaral acertou em dar ‘essa ré pequena para entender um passado dolorido que a gente, que era jovem, não consegue compreender bem’. Dos anos 80, diz se lembrar ‘da morte de Elis, da Aids e da sensação clara de que o capitalismo tinha vencido no mundo’.

‘Queridos Amigos’, na sua opinião, ‘vai ser uma minissérie como há muito tempo não se via, com uma coragem que desapareceu da TV, de muito culhão, para ser vulgar’.

‘Depois de ‘Os Maias’ [Maria Adelaide Amaral, 2001, com Nachtergaele, boa de crítica e ruim de ibope], houve um certo pânico, e as minisséries viraram novelas de época. A TV ficou com medo’, analisa. ‘Queridos Amigos’, diz, vai ‘colocar o dedo na ferida’ ao citar ‘Lula, Collor, Sarney, Ulysses Guimarães’ e mais figurões.

Menina morta

Se, na TV, Nachtergaele será um radical com quem guarda certa semelhança, no cinema promete radicalizar de vez.

Neste ano, estréia como diretor com ‘A Festa da Menina Morta’, protagonizado por Daniel de Oliveira. Para se ter uma idéia da obra, vale contar o que Cláudio Assis, diretor dos nada convencionais ‘Amarelo Manga’ e ‘Baixio das Bestas’, disse a Nachtergaele após uma sessão privada: ‘O filme deve passar por dificuldades no Brasil’. Segundo o ator, o longa-metragem ‘é livre, de autoria, não se encaixa em um modo de narrativa que seja facilitador e vai causar estranheza’.

Ele teve a idéia da história quando filmava a minissérie ‘O Auto da Compadecida’ (1999).

‘Estava perto de Cabaceiras [PB] e saí para ir a um forró. Acabei caindo em uma cerimônia religiosa na qual o povoado rezava para restos do vestido de uma menina morta que havia sido encontrada por uma família muito católica. As pessoas pediam coisas para os trapos. Eu mesmo rezei’, conta.

Em ‘A Festa…’, Daniel de Oliveira é quem encontra o vestido e se torna o santinho de uma seita. O filme começa a rodar festivais internacionais a partir de abril, e o lançamento no Brasil é previsto para o final do ano. Fora isso, Nachtergaele deve participar da série ‘Os Amadores’, da Globo, no segundo semestre.’

 

Sérgio Salvia Coelho

Ator representa todos os tipos brasileiros

‘O que há em comum entre um mártir bíblico e um homossexual de novela, um soldado expressionista alemão e uma mosca? Um ator, é claro, mas um que atenda pelo nome de Matheus Nachtergaele.

Rara unanimidade entre críticos e platéias de teatro, cinema e televisão, escolhido pelo exigente Ariano Suassuna como o melhor intérprete de João Grilo, do ‘Auto da Compadecida’, levou a crítica Aurora Miranda Leão a escrever: ‘Ver Matheus Nachtergaele interpretando é ter a certeza da existência de Deus’.

Talvez tenha sido essa mesmo a sua função em ‘O Livro de Jó’ (1995), do Teatro da Vertigem, de Antônio Araújo. Já havia tido sua vocação atiçada por Antunes Filho -e sua formação na Escola de Arte Dramática o havia feito entrar na companhia uma montagem antes, em ‘Paraíso Perdido’-, mas foi em ‘Jó’ que se consagrou. Nu, banhado em sangue, Nachtergaele passou a espantar pela força, um atleta afetivo artaudiano que nunca se poupa, seja enquanto ‘Woyzeck, o Brasileiro’ (2003), o soldado anti-herói do expressionista Büchner na releitura de Cybele Forjaz, seja no frágil Treplev da ‘Gaivota’ de Tchekhov, na montagem de Daniela Thomas (1998).

Contracenando com Fernanda Montenegro, nesta montagem de elenco ‘all-star’, ou único profissional em ‘Cidade de Deus’ (2002), filme de Fernando Meirelles, sempre se destacou pela seriedade com que se aprofunda nos papéis. Fez o Rato em ‘Castelo Rá-Tim-Bum – O Filme’ (2000), de Cao Hamburger, e dublou uma mosca no filme americano ‘Deu Zebra’ (2005), com auto-exigência enorme, observando os ritmos dos animais.

Entrou na casa do grande público como Cintura Fina, da minissérie ‘Hilda Furacão’, renovando estereótipos da televisão. E agora pode tudo.

Nachtergaele representa todos os brasileiros.’

 

Silvana Arantes

Em filme de Assis, ator dá ‘tudo de ruim’

‘O apaixonado (por Chico Diaz) cozinheiro Dunga de ‘Amarelo Manga’ (2003), primeiro longa do cineasta Cláudio Assis, é uma das mais elevadas performances de Matheus Nachtergaele no cinema.

Para seu segundo longa, ‘Baixio das Bestas’ (2007), Assis voltou a convidar o ator, que disse não. O convite veio no Réveil- lon de um ano que terminava mal para Nachtergaele. ‘Estou numa fase ruim. Não tenho nada de bom para te oferecer’, foi sua resposta a Assis. ‘Então me dê tudo de ruim que você tem’, replicou o diretor. O DVD de ‘Baixio das Bestas’, que acaba de sair, mostra que, ‘ruim’, Nachtergaele é ótimo.’

 

ENTRETENIMENTO
Pedro Soares

Cinema e teatro sobem mais que inflação

‘Aquele cinema no domingo à tarde ou a peça de teatro à qual você planejava ir há tempos ficaram mais caros em 2007 -e, pior, subiram mais do que a inflação média do período. A boa notícia é que, por outro lado, os shows ficaram mais baratos.

A pedido da Folha, a FGV (Fundação Getúlio Vargas) selecionou as variações de preço de serviços culturais pesquisados mensalmente pela equipe de coleta do IPC-DI (Índice de Preços ao Consumidor – Disponibilidade Interna). Os dados mostram que o teatro subiu 7,67%, mais do que os 2,95% de 2006. O cinema teve alta de 5,92%, também acima da variação do ano retrasado (3,43%).

Já os shows caíram 8,12% no ano passado, devolvendo parte do forte aumento de 17,48% registrado em 2006.

Os shows, cujos preços são relativamente maiores do que os de teatro e cinema, seguraram a média dos preços das salas de espetáculos. Houve recuo de 0,52%. Em 2006, a alta havia sido de 9,75%.

Segundo a FGV, a inflação medida pelo IPC-DI ficou em 4,6% em 2007 -havia sido de 2,06% em 2006. O índice oficial de inflação ao consumidor, adotado pelo governo e apurado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ficou em 4,46% em 2007.

André Bráz, coordenador do índice de preço da FGV, diz que os aumentos desses preços estão diretamente relacionados à expansão da renda e do emprego -ou seja, da massa salarial.

‘Quando a economia está aquecida e os salários tendem a subir, os preços dos serviços também sobem’, afirma. Com os ‘serviços culturais’ não foi diferente.

Segundo Bráz, os espetáculos seguem historicamente a evolução dos preços dos serviços em geral (cabeleireiro, manicure, chaveiro etc), que sobem quando a inflação é mais alta ou a renda aumenta.

O conjunto de todos os serviços avançou, em média, 4,16% no ano passado. Em 2006, a alta havia ficado no mesmo patamar: 4,22%.

Dentre as maiores fontes de custo dos espetáculos, estão o aluguel das salas, as contas de luz (que pesam mais para os cinemas e shows) e o pagamento da equipe (que no teatro costuma ter um impacto maior no custo total, em razão da remuneração do elenco).Causas

As causas dos reajustes são variadas, mas produtores de cinema e teatro são unânimes em apontar o principal motivo para os aumentos: a meia-entrada. Dizem que ela os obriga a cobrar um valor mais alto do ingresso inteiro, inflando o preço para compensar uma platéia cada vez maior de pessoas que pagam metade. De 70% a 80% do público, estimam, utiliza-se do benefício.

‘Instituir a meia-entrada é fazer caridade com o chapéu alheio. Hoje, todo mundo paga meia, o que prejudica a classe média que freqüenta teatro, pois a obriga a pagar o dobro. Com a meia-entrada, os produtores são obrigados a dobrar o valor do ingresso. Mais de 70% da bilheteria é de meia-entrada’, diz Analy Alvarez, presidente da Associação dos Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo.

O produtor de cinema Bruno Wainer, responsável pelo líder em bilheteria ‘Meu Nome Não É Johnny’, concorda: ‘A meia-entrada é um absurdo. É uma clara interferência do poder público numa atividade privada. O exibidor é obrigado a manter o preço alto pois 70% do público paga meia. É algo hipócrita’.

Antes menos afetados pela meia-entrada, muitos shows também já cobram metade do ingresso. Um exemplo é a casa de espetáculos Circo Voador, localizada na Lapa (centro do Rio), onde todas as apresentações têm a opção do ingresso promocional para estudantes.Lazer

Não apenas os ‘serviços culturais’ subiram mais do que a inflação: itens de lazer e turismo também tiveram altas significativas, segundo a FGV. Foi o caso das passagens aéreas, cujas tarifas cresceram 11,22% em 2007, após uma queda de 21,67% em 2006.

Na contramão das passagens, as excursões e os pacotes de turismo sofreram um aumento médio de 1,51%, abaixo da variação registrada em 2006 (4,6%). O hotel, por sua vez, subiu 4,71%, pouco acima da alta de 2006 (4,1%).

Freqüentado pela classe média no final de semana, o clube de recreação teve alta de 6,86% em 2007, mais do que os 5,29% de 2006.’

 

Sofisticação e tecnologia também pressionam preços

‘A meia-entrada é a principal causa dos aumentos apontada por produtores, mas não é a única. Salas de cinema mais sofisticadas -e que demandam investimento maior-, profissionalização crescente dos espetáculos e uma alegada expansão de custos também pressionaram os preços ao consumidor nos últimos anos.

‘Todos os custos subiram. Ficou mais caro produzir uma peça’, diz Eduardo Barata, produtor e presidente da APTR (Associação dos Produtores de Teatro do Rio de Janeiro).

Segundo os produtores e exibidores ouvidos pela Folha, os fornecedores corrigiram -e muito- suas tabelas.

Barata afirma que, em 2006, pagava R$ 6.000 semanais de piso pelo aluguel de um teatro. De acordo com ele, o preço subiu para R$ 8.000 neste ano. As locações de equipamentos também ficaram mais caras, diz o produtor.

A produtora Vera Setta, do colegiado da APTR, diz que, nos anos 70, ‘todo mundo fazia tudo’. Ou seja, o teatro era mais ‘amador’, diz ela. A realidade hoje mudou, o que encareceu as montagens, que passaram a demandar mais profissionais e se sofisticaram, segundo a produtora que encenará a peça ‘Monólogos da Vagina’ no próximo mês, em São Paulo.

Mais sofisticados também se tornaram os cinemas, resultando num valor maior do ingresso, opina Marcelo França Mendes, do Grupo Estação.

‘O ingresso subiu dessa maneira muito provavelmente porque os cinemas inaugurados nos últimos anos têm características muito mais dispendiosas do que no passado, como o fato de serem em shoppings, com muitas salas, com equipamentos importados de última geração’, afirma.

Segundo ele, há uma competição ‘muito grande no setor’. ‘Cada exibidor busca um diferencial para o seu projeto, o que na maioria das vezes o torna mais caro.’

O modelo multiplex, diz, demanda mais investimento e, com os altos juros no Brasil, ‘é natural que essas empresas procurem recuperar o investimento o mais rápido possível’ -leia-se, num prazo de cinco a oito anos.

Sobre a meia-entrada, Mendes afirma que ‘certamente’ ela ‘encarece o preço do ingresso’ e dá ‘a ilusão que cinema é mais caro’. Em algumas salas, o Estação cobra R$ 20 a inteira no final de semana, mas ele diz que o preço médio do ingresso recebido fica em cerca de R$ 12.

‘A meia-entrada é um tiro no pé. Temos de cobrar mais caro para compensar. Por isso, as peças chegam a custar R$ 100’, diz Barata, que atualmente produz uma peça no Rio com direção de Marília Pêra.’

 

TV NA INTERNET
Laura Mattos

Ex-’Chiquititas’ vira galã do elevador

‘‘Para se dar bem nessa profissão de ator tem que ficar enchendo o saco de muita gente, fazendo lobby e um socialzinho. Eu não curto isso.’

Com um currículo que não ia muito além de um papel como vilão da extinta novelinha ‘Chiquititas’, exibida pelo SBT de 1997 a 2001, Felipe Reis, 25, achava que a carreira não ia dar pé. Em 2006, deixou de lado a busca por uma vaga entre as estrelas e foi viajar com a namorada. Foi quando comprou uma câmera de vídeo no Paraguai, e tudo começou a mudar.

Certo dia, em 2007, estava com o irmão no apartamento onde moram com os pais, perto da av. Paulista, e o chamou para ‘fazer umas coisas’ com a câmera. O caçula teve a idéia: ‘Vamos filmar no elevador?’.

Assim começou uma das mais bem-sucedidas séries caseiras da internet do país. ‘Conversas de Elevador’ já tem 35 episódios, é uma das mais vistas no Fiz TV (site e canal de TV com vídeos de computador), e Reis, um dos primeiros a ser remunerado pelo trabalho. O Fiz paga R$ 50 por minuto -os 35 capítulos de ‘Conversas’ somam uns R$ 5.000.

Tudo é feito no prédio de classe média alta onde mora. Fora o cenário principal, o elevador, com pouco mais de 1 m2, aparecem o hall de alguns andares e o da entrada. Cícero, o zelador, faz pontas como ele mesmo. Para não ouvir reclamação de vizinhos, Reis grava na madrugada.

São vídeos de humor com cerca de três minutos cada um, que contam encontros do protagonista Edgar (Reis), representante de indústria farmacêutica, com vizinhos, funcionários e visitantes do fictício edifício Barão de Salameira. Reis, que estudou rádio e TV, cria os roteiros, produz as cenas com roupas e objetos seus e dos chegados, grava as imagens e as edita em um computador em seu quarto. Quando Edgar aparece em cena, a câmera está fixa em um tripé.

No ‘set’, que a Folha acompanhou, ele corre de um lado para o outro e se aperta com a câmera, o tripé e outros atores no elevador, mas se diverte.

O garoto já colocou na roda, ou melhor, no elevador, a namorada (a gostosa da cobertura), o pai (um âncora de TV sabe-tudo), a mãe (a cri-cri do 22), o irmão (o moleque do 12), o avô e a tia de um amigo. Certa vez, bolou um roteiro que envolvia um anão, que achou pelo Orkut e participou, como os outros ‘astros’ da série, por nenhum tostão. ‘Barracos’ reais do condomínio inspiram episódios, e Reis torce para que os vizinhos não virem seus espectadores. Com o sucesso, quer convencer famosos a visitar o Barão de Salameira. Rita Lee é seu alvo principal. ‘Seria a mãe malucona do Edgar’.’

 

TELEVISÃO
Barbara Gancia

De onde tiraram a idéia de que Jack Bauer glorifica a tortura?

‘Com exceção de George W. Bush e dos poucos admiradores que ainda lhe restam, ninguém discute que Guantánamo e os episódios de tortura ocorridos na prisão de Abu Ghraib tiraram dos EUA o privilégio de se considerar uma liderança moral neste mundão de meu Deus. O que eu gostaria de entender é de onde a imprensa tapuia extraiu a noção de que a prática da tortura e a detenção ilegal são glorificadas em um seriado de TV.

No domingo passado, o excelente Fernando Bonassi escreveu nesta Ilustrada um texto fictício centrado em cima de Jack Bauer, o personagem principal de ‘24 Horas’, em que deduzia que Bauer só pode ser republicano. Como será que Bonassi chegou a essa conclusão? Que eu saiba, ao longo dos seis anos da série, o maior aliado de Jack Bauer sempre foi o presidente David Palmer, um negro, democrata, com pinta de Barack Obama.

E, por acaso, democratas, quando estão na presidência, são menos belicosos do que republicanos? Basta lembrar dos ataques realizados na gestão Clinton contra uma fábrica de produtos farmacêuticos no Sudão para saber que não.

Não é de hoje que meus colegas (muitos dos quais admitem nunca ter assistido a nenhum ano completo da série) insistem em dizer que ‘24 Horas’ defende as ações do governo americano na chamada ‘guerra contra o terror’.

Pois, na minha modestíssima opinião, é justamente o contrário. A série coloca em pauta uma questão da hora: posto que hoje existem armas químicas, terroristas suicidas e que armas nucleares podem ter saído da antiga União Soviética e caído nas mãos de criminosos, é legítimo que um país que esteja sob ataque use métodos que contrariam a Convenção de Genebra para se defender?

Jack Bauer é um cruzamento entre o capitão Nascimento, de ‘Tropa de Elite’, e o James Bond de Daniel Craig. À medida que a série avança, ele vai se tornando uma figura trágica e tem de arcar com as conseqüências dos métodos que usou contra inimigos de Estado. No último ano da série, esses inimigos eram todos empresários de ultradireita.

Na sexta temporada, descobrimos que os árabes detidos em um campo de prisioneiros são todos inocentes e que a prisão deles foi ilegal. Estranho isso numa série que promove os ideais de Bush, não?

Diziam também que ‘24 Horas’ incitava jovens soldados americanos no Iraque a imitar os métodos de Jack Bauer. Ora, que bobagem! O chamado ‘atirador de Washington’, Lee Boyd Malvo, que participou do assassinato de dez pessoas em 2002, não afirmou que estava vivendo dentro de ‘Matrix’?

Esse pessoal que fala mal de ‘24 Horas’ sem assistir tem a mesma atitude da Marilena Chauí quando ela nega a existência do mensalão. Jack Bauer é republicano na mesma medida em que o PT é forçosamente um partido de gente impoluta. E a realidade que se exploda.

Um conselho aos meus colegas ‘marilenistas’: se querem mesmo pegar no pé de Bauer, que tal falar do ator que o interpreta, Kiefer Sutherland, preso por dirigir embriagado pela quarta vez, enquanto o comercial em que ele dirige um Citroën continua a ser veiculado como se nada fosse?’

 

Bia Abramo

O ‘BBB’ como balão de ensaio

‘ALÉM DE principal fonte de receita publicitária da TV Globo nesse período meio morto que antecede o Carnaval, o ‘Big Brother’ deve estar se constituindo como um importante balão de ensaio para a emissora testar a recepção do público ao que se chama de baixaria.

‘Baixaria’ é daqueles vocábulos muito flexíveis da linguagem coloquial brasileira que são, ao mesmo tempo, genéricos e específicos. A generalidade se dá pela variedade de situações em que se aplica -fala-se de baixaria em relação a costumes sexuais, a comportamentos sociais, a conflitos entre pessoas. Basicamente, qualquer situação de interação humana está sujeita à baixaria. Ao mesmo tempo, quando se fala em baixaria, há uma sinalização clara de que algum limite do socialmente aceitável foi ultrapassado. Assistir à degradação alheia excita a curiosidade -e boa parte da lógica do espetáculo é regida por essa curiosidade humana sobre as formas da decadência. Quando tudo o mais se mostra ineficiente, nada como uma dose extra de baixaria e miséria para reconectar o público (e não só o da TV, diga-se). Só que o tamanho, a regularidade e a composição exata da dose não são fáceis de definir -se de menos, não fazem efeito, se em excesso, assustam e afastam.

O ‘Big Brother’ versão brasileira, a partir das últimas edições, é um campo privilegiado para se testar quantidades, freqüências e elementos. Desde que a escolha dos participantes excluiu gente mais velha, mais pobre e mais mestiça, de maneira que os 14 eleitos pertençam ao plantel genético e social aceito como ‘bonito e atraente’, o programa induz à formação quase automática de ficantes, paqueras e até mesmo casais ‘apaixonados’ até a página dois.

Com isso, testa-se a tolerância ao sexo total ou parcialmente não romântico. Mais: na mesma tacada, investiga-se o quanto da armação romântica parece verossímil o suficiente para justificar os agarros e a exibição de erotismo.

Nem se pode mais falar em ‘personagens’ ou em alguma espécie de narrativa, uma vez que todas as fichas foram jogadas na ambientação para que aflorem as ‘escorregadelas’ etílicas, sexuais e éticas.

Nesta oitava edição, parece haver um alerta. Em apenas pouco mais de uma semana, já houve meio de tudo: porre, mão na bunda, pegação no chuveiro, saída (e volta, e saída de novo) do armário, ‘cachorra’ preterida, paixão automática e muita, mas muita, conversa mole e burra. Nem com uma dancinha protagonizada por moças com seios cobertos por espuma a audiência reagiu.

Talvez queira dizer que só baixaria é muito pouco.’

 

MODA
Nina Lemos

Medo de desfile no rio Tietê se dissemina entre fashionistas

‘‘E se eu pegar alguma doença?’ ‘Será que eu levo repelente?’ As frases, ditas em tom de apreensão, estavam na boca de convidados da Cavalera para o desfile da grife, previsto para acontecer na manhã de hoje em um barco no meio do rio Tietê.

O temor está ligado ao medo de ser ‘atingido’ pela poluição do rio, que recebe cerca de três bilhões de litros de esgoto por dia. A grife escolheu o local para fazer ao mesmo tempo um protesto contra a poluição no rio.

‘Ainda não sei se vou. Estava animada, mas muitos amigos disseram que eu correria um grande risco de pegar doenças’, disse a consultora de moda Costanza Pascolato, dois dias antes do desfile.

‘Sou uma hipocondríaca fanática. Não faço idéia de que doença possa pegar, mas sei que existem várias’, afirma.

Costanza lembra que ouviu a história de um ator que foi parar no hospital depois de cair no rio durante a apresentação, em 2006, da peça ‘BR-3’, do grupo Teatro da Vertigem, realizada no mesmo barco que levará os fashionistas pelo rio.

Por precaução, a marca distribuiu com o convite um kit que inclui uma capa de plástico e uma máscara tipo cirúrgica. Mas os convidados mais temerosos se preparavam para redobrar os cuidados. ‘Vou me encher de repelente’, diz o apresentador Max Fivelinha.

‘Tenho muito medo de ir, e além disso o perfume não é nada agradável’, diz a editora de moda Regina Guerreiro, que não pretende colocar seus pés no local.

Alguns fashionistas, porém, acham a ida a um ‘local perigoso’ uma espécie de ‘esporte radical’. ‘Não é divertido pensar que você vai a um lugar onde, se cair, pode morrer afogado no meio do esgoto?’, pergunta, entre risos, a designer e editora de moda Jussara Romão.

De acordo com o médico Vicente Amato Neto, um dos principais infectologistas do país, ‘nada de grave pode acontecer se a pessoa ficar quieta no barco, sem se molhar’.

Mas se ela tomar contato com a água do rio Tietê corre, sim, o risco de contrair doenças graves. ‘Nessas águas existem muitos, mas muitos vírus e bactérias que podem causar infecções e viroses sérias’, alerta.

De acordo com ele, o contato com a água na pele pode causar abcessos, micoses e vários tipos de infecções cutâneas.

O risco de ser picado por mosquitos, como o da dengue, tão temido entre os fashionistas, não é preocupante, segundo o especialista.

‘A quantidade de mosquitos que existe no rio Tietê é a mesma que existe na sua casa’, informa Neto.

Os mais hipocondríacos também não devem temer a febre amarela. ‘O risco de pegar essas doenças está em áreas silvestres e matas’, explica o médico.’

 

Paulo Sampaio

‘Mercado’ é culpado por escassez de modelos negros no mundo da moda

‘Ninguém na SPFW é racista. A média de modelos negros por desfile é dois, para cerca de 40, mas a culpa é do mercado. ‘Mercado’, aqui, é sujeito indeterminado.

Os agentes de modelo dizem que ‘o mercado não pede’ negro. ‘Cabelo liso é sempre mais requisitado’, afirma o coordenador de ‘new faces’ da Elite Models, Marcos Cunha.

Ele diz que apresenta sem distinção as modelos para os estilistas, mas, de cada cinco oferecidas, em geral apenas uma escolhida é negra.

Cunha cita o exemplo de Rojane, vencedora do último concurso nacional da agência. ‘Ela é negra, concorreu com 34 mil inscritas e ganhou, mas, se eu te disser que ela é tão requisitada quanto as vencedoras brancas de outros anos, vou estar mentindo. A proporção é 70% a 30%’, conta Cunha.

Os estilistas dizem o contrário: o problema é a carência de oferta nas agências. ‘Eles oferecem poucos negros. Eu sou o primeiro a fazer homenagens: no meu desfile coloquei a rosa negra, que é a mais rara de todas’, diz Tufi Duek, em cujo desfile havia uma negra.

Waldemar Iódice afirma que, graças a ele e a sua idéia de colocar Rojane (a vencedora do concurso da Elite), vestida apenas com colares, ela foi capa de todos os jornais. ‘Sempre coloquei os negros em destaque no meu desfile, mas as agências nos dão bem menos opções’, diz Iódice, que nesta temporada chamou dois negros.

Boa parte dos estilistas da semana de moda prefere não dar entrevista sobre o assunto.

Para Laura Vieira, da agência de modelos Ten, ‘o número de negros que aparecem querendo ser modelo é bem menor’. ‘Eles não procuram tanto a carreira’, diz Vieira.

O diretor de planejamento da agência de publicidade F/Naszca, Fernan Alphen, afirma que ‘no fundo, é preconceito puro e simples’. ‘Usa-se a palavra ‘mercado’ para justificar essa força oculta. Na verdade, o preconceito não é racial, é social: isola por medo do outro. O negro é supostamente mais pobre e, por isso, não tem acesso à informação, não tem gosto. E, como a moda tem essa pretensão de divulgar tendência, ela quer fazê-lo entre a elite branca’, acusa Alphen.

Marco Aurélio Casal de Rey, da Ford, agência de modelos, explica que, nos desfiles de inverno, a situação fica ainda pior. ‘Em geral os negros estão associados a verão.’

Ele conta que, mesmo as morenas, o ‘tipo brasileiro’, muitas vezes precisam estourar fora do Brasil para então fazer sucesso aqui.

‘Sou sincero: a gente oferece negras, mas maioria dos estilistas prefere a beleza nórdica, européia’, diz, sem citar nomes. Ele explica que apenas 10% de seu ‘casting’ é composto por negros. O mesmo acontece com os orientais.

Entre as tops negras da Ford estão Samira Carvalho, Carmelita Mendes e Patrícia de Jesus.

O empresário Helder Dias, dono da HDA, agência especializada em modelos negros, reivindica para si a ‘descoberta’ de Samira. ‘O pessoal da Ford a viu em um desfile da Pacco Rabane, no hotel Unique, e levou’, queixa-se Dias, ele próprio negro.

Para ele, além do racismo com os negros, existe uma panelinha de agências, e algumas modelos só se tornam tops quando vão para as grandes.

Mas aí já é outra briga…’

 

SUPLEMENTO LITERÁRIO
Carlos Eduardo Lins da Silva

Para gostar de ler

‘Meio século e um ano atrás, ‘O Estado de S. Paulo’ resolveu pagar bem a um grupo de intelectuais de primeira linha para produzir uma ‘apensa’ ao jornal: seis páginas semanais dedicadas à literatura, sob o título de ‘Suplemento Literário’.

Basta mencionar os nomes dos editores e colaboradores para ter certeza da qualidade do produto: Antonio Candido, Décio de Almeida Prado, Paulo Emílio Salles Gomes, Lourival Gomes Machado, Leyla Perrone-Moisés, Nilo Scalzo, entre diversos outros.

Quem ilustrava os textos dessa gente eram artistas como Aldemir Martins, Clóvis Graciano, Marcelo Grassman, Di Cavalcanti, Maria Bonomi, Hilde Weber, Renina Katz, Wesley Duke Lee, Livio Abramo. A história deste marco da cultura brasileira, que viveu de 1956 a 1974, está relatada em ‘Que Falta Ele Faz!’, de Elizabeth Lorenzotti. Trata-se de documento inestimável para a história do jornalismo e da vida intelectual do país.

Dentre os registros que ele traz, de incalculável valor para os profissionais e estudiosos da comunicação atuais, está a reprodução fac-similada do projeto que Antonio Candido apresentou a Júlio de Mesquita Neto e Ruy Mesquita para o suplemento e foi integralmente aceito pelos diretores do jornal. Em toda a sua existência, o ‘Suplemento Literário’ não sofreu censura nem pressões.

O plano original foi cumprido à risca, independentemente das tensões ideológicas e econômicas que o país viveu, como relatam seus sobreviventes. Mas a sociedade mudou, o jornalismo também e o suplemento acabou. Lorenzotti diz que ele faz falta. Mas o fato é que aqueles seus objetivos de ‘servir como instrumento de trabalho e pesquisa aos profissionais da inteligência’ e ‘nunca transigir com a preguiça mental, com a incapacidade de pensar’ talvez tenham deixado de fazer sentido no mundo contemporâneo.

Sem pessimismo saudosista, é difícil fugir à realidade de que hoje em dia lê-se cada vez menos. Não só aqui no Brasil; no mundo todo.

Sete minutos por dia

O National Endowment for the Arts (entidade pública independente nos EUA) divulgou no ano passado pesquisa segundo a qual os jovens americanos entre 15 e 24 anos gastam em média sete minutos por dia de semana em leitura voluntária (ou seja, não como tarefa escolar obrigatória). A venda de livros nos EUA caiu de 8,21 por habitante/ano em 2001 para 7,93 em 2006. A despesa com livros por domicílio americano em 2007 foi a mais baixa em 20 anos, e o preço médio cresceu substancialmente -ou seja, as pessoas estão consumindo menos livros.

No Brasil, embora as livrarias estejam comemorando um crescimento de 15% em seu faturamento em 2007 em relação ao ano anterior no bojo da onda do aumento generalizado do consumo, não há nenhum sinal de que o número de leitores ou que o tempo gasto em leitura estejam também subindo.

Neste cenário, será que o ‘Suplemento Literário’ ou algo do seu gênero teria como existir? Provavelmente não se o jornalismo se mantiver no mesmo rumo que tem seguido nas últimas décadas.

No último quarto do século 20, o jornalismo impresso resolveu enfrentar o avanço dos meios eletrônicos sobre o consumidor de informação mimetizando os adversários. A fórmula mais apurada desse processo foi o diário ‘USA Today’, que tentava aparentar-se a uma TV no papel. A estratégia deu certo por uns tempos. Mas, depois de cerca de 20 anos, o próprio ‘USA Today’ resolveu editar textos mais longos e aprofundados, aparentemente convencido de que o público dos veículos impressos nunca mais irá crescer e exige material de qualidade superior.

Na edição de 24 de dezembro da revista ‘The New Yorker’, o escritor Caleb Crain especula sobre a possibilidade de que ‘a leitura de livros por prazer um dia se tornará o domínio de uma ‘classe de leitores’ especial, à semelhança da que existiu até a segunda metade do século 19, quando chegou a leitura de massa’.

Ler ficção poderá se tornar um hábito arcano de uns poucos, que poderão desfrutar de prestígio social ou não. Se e quando isso acontecer, talvez os jornais impressos venham a ser o veículo preferencial dessa casta, e aí, então, produtos como o ‘Suplemento Literário’ realmente farão falta e poderão voltar a existir.

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA é livre-docente e doutor em comunicação pela USP e diretor de relações institucionais da Patri Políticas Públicas.

SUPLEMENTO LITERÁRIO – QUE FALTA ELE FAZ!

Autora: Elizabeth Lorenzotti

Editora: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo (tel. 0/xx/11/ 6099-9800)

Quanto: R$ 40 (208 págs.)’

 

 

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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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