Algum estranho aconteceu na semana passada [retrasada]: colonos israelenses e judeus extremistas pareciam humanos na TV árabe. Isto não quer dizer que os árabes de repente ficaram delicados com seus inimigos históricos. Mas, horas e horas assistindo – em todas as estações, inclusive na al-Jazira – close-ups de mães e bebês, moças e velhos, visivelmente angustiados enquanto eram retirados a força de suas casa, tiveram um efeito emocional.
Claro, os palestinos não perderam o contexto. Conversas em nossas salas de estar ou tomando um café turco no escritório se misturavam: ‘Você acha que eles estão fingindo?’ ; ‘Ainda assim, eles estavam na nossa terra ilegalmente’; ‘Imagine o que os refugiados palestinos sentiram quando foram forçados a sair há anos’; ‘E quanto às 120 casas em Rafah que foram demolidas há poucos meses?’; ‘Onde estava a imprensa internacional quando palestinos eram mortos, muitas vezes por esses mesmos colonos?’
Surpreendentemente, a cobertura em redes árabes de notícias refletiu essas contradições. Um repórter árabe no local perguntou ao vivo ao seu âncora que estava em Dubai: ‘Você viu os soldados chorando?’. Outra rede contrastou essas imagens com uma entrevista com os pais de Muhammad al-Dura, o garoto de 12 anos que foi fotografado morrendo nos braços do seu pai, em 2000, e cuja imagem se tornou um símbolo da intifada. Mas na maior parte, a linguagem das transmissões foi acurada e esclarecedora.
Mesmo o maior jornal palestino, al-Quds, teve que tratar do aspecto emocional das evacuações. Ele publicou na quinta-feira [18/8] um editorial sobre os efeitos das imagens dos colonos chorando e dos soldados israelenses os abraçando. Concluiu que tais cenas poderiam ter sido evitadas se Israel não tivesse antes se apossado de terras palestinas. O al-Quds estava correto em apontar o óbvio contexto – mas isso não enfraqueceu a forma com que as imagens afetaram o palestino médio.
As evacuações de Gaza também produziram muitas comparações interessantes. Muitos palestinos compararam o tratamento com luva de pelica dado aos colonos que protestavam (que serão muito bem compensados) com as respostas violentas a protestos palestinos, mesmo que pacíficos.
E o muitas vezes exibido clip de um pai israelense, erguendo sua pequena filha na cara de soldados sem emoção, lembrava muitas das mães palestinas levantando no ar seus pequenos filhos e os conclamando publicamente a vingar as mortes de um irmão ou do pai.
Apoio internacional
As imagens comparativas de religião também foram evidentes. O fanatismo islâmico era contraposto ao fanatismo judaico. Um repórter da CNN até deu uma escorregada, dizendo que os colonos encastelados numa sinagoga estavam numa ‘mesquita’.
E havia uma dinâmica comum das facções minoritárias monopolizando o discurso político. Com o mesmo exagerado poder político que os grupos armados palestinos têm, ficava claro que uns poucos fanáticos judeus estavam seqüestrando a causa anti-evacuação – note que os últimos manifestantes a serem removidos foram não-residentes arrancados de sinagogas nas quais eles provavelmente nunca tinham rezado.
Palestinos e árabes admitindo ou não, as fortes imagens dos últimos dias não podem ser ignoradas. Independentemente do fato de os assentamentos judeus serem ilegais e de o problema dos refugiados palestinos ter sido criado pela força militar israelense, o custo humano para os dois lados do conflito é enorme.
Mesmo não concordando nem com os colonos nem com as ações de militantes palestinos, o resto de nós precisa começar a entender e respeitá-los como humanos. E ajudaria se a mídia internacional começasse a retratar os palestinos comuns, também, com um toque de humanidade.
Qualquer pessoa, que esteja sã, deve imaginar que qualquer solução de longo prazo só pode ser alcançada por líderes que possam fazer compromissos e concessões mútuas. Isto significa que se o unilateralismo israelense continuar, fará pouco para levar o processo de paz pós-Gaza adiante. Apenas conversações bilaterais palestino-israelenses, com a ajuda da comunidade internacional, podem trazer um acordo duradouro.
As dramáticas cenas de Gaza devem levar-nos a todos a redobrar nossos esforços para assegurar que os palestinos possam ser livres num Estado independente, ao lado de um Israel protegido e seguro.
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Diretor do Instituto de Mídia Moderna da Universidade Palestina de Al-Quds