VEJA
Luís Nassif dispara série contra revista Veja, 1/2
‘O jornalista Luís Nassif iniciou em seu blog uma série jornalística, um misto de texto editorial e informativo, contra a Revista Veja, da Editora Abril. Os capítulos referem-se, segundo o jornalista, à crise que a revista estaria atravessando desde os anos 80. ‘A Veja começou a praticar um jornalismo de abuso de poder e falta de clareza em suas intenções’, disse Luís Nassif, em entrevista ao Comunique-se.
O comentarista de Economia do Jornal da Cultura explica: ‘Abuso de poder ao fazer reportagens sob a ótica subjetiva, em vez da objetiva, por meio de fatos. A falta de clareza está nas intenções editoriais da revista, que não se presta nem ao menos a abrir espaço para o outro lado.’ Luís Nassif ressalta que seu blog, pelo contrário, não se presta meramente ao papel de acusar a Veja, mas traz elementos que comprovam a marca ‘panfletária’ da revista.
A série
O jornalista fez quatro capítulos, até o momento. Neles, aborda o que classificou de ‘puro esgoto jornalístico’. Critica o começo de uma prática repleta de ‘cacos’, que seriam os trechos editoriais colocados sem a permissão do repórter na matéria, e ‘pregos sobre o vinil’, um tom agressivo que seria desmedido e escrito a cada reportagem.
Cita ainda situações para fundamentar sua posição: o caso André Esteves, no qual o banqueiro teria sido duramente criticado pela reportagem por tentar levantar uma editora concorrente, a Editora Três; o caso COC, em que a revista teria feito uma reportagem encomendada para desbancar a editora de livros concorrente ao Grupo Abril; o caso da Guerra das Cervejas, na qual a revista teria feito ampla campanha a favor do publicitário Eduardo Fischer e, por fim, um fato de abrangência nacional: a matéria contra a cantora Maria Rita, por ela ter se recusado a dar uma entrevista exclusiva à revista no lançamento de seu primeiro álbum. À época, o Comunique-se realizou ampla cobertura sobre o caso.
Nassif pretende voltar a escrever depois do Carnaval. ‘Qualquer texto, agora, se perderia’, explica o jornalista que, como informa, já tem outros capítulos na manga.
A Revista Veja
Procurados para comentar as acusações de Nassif, o redator-chefe Mário Sabino e o diretor de redação, Eurípedes Alcântara, não foram encontrados na tarde desta sexta-feira (01/02).’
Comunique-se
Jornalista da Veja sai vitorioso em ação movida por José Dirceu, 31/1
‘O ex-deputado federal José Dirceu perdeu em 09/01 uma ação judicial que moveu contra o jornalista da Veja Fábio Portela. Cabe recurso ao ex-ministro da Casa Civil.
A juíza Sirley Claus Prado Tonello, da 1ª Vara Criminal do Fórum de Pinheiros, em São Paulo, considerou legal a reportagem publicada pela revista em 10/05/06, intitulada ‘O Quadrilheiro no Banco Suíço’.
A matéria tratava do caso do mensalão – a compra de votos no Congresso pela aprovação de pautas do governo Lula. O jornalista chamou José Dirceu de ‘quadrilheiro-mor’.
A juíza indeferiu o pedido de incriminação por calúnia porque não entendeu que o repórter estava imputando a Dirceu um crime falso, pois Portela utilizou um documento do Ministério Público Federal para basear as acusações.
Aos pedidos de queixa-crime por difamação ou injúria, Sirley Claus Prado Tonello argumentou que, apesar de haver um tom depreciativo na matéria, o objetivo do repórter não seria o de promover uma ‘campanha de cunho pessoal’ contra o ex-ministro.
(*) Com informações do Consultor Jurídico.’
GOVERNO
Hélio Costa cancela cartão corporativo pessoal, 1/2
‘Em meio à polêmica envolvendo gastos dos ministérios do governo Lula com cartões corporativos – principalmente os gastos dos cartões corporativos pessoais –, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, decidiu acabar com o cartão que utilizou no último ano. A pasta comandada pelo jornalista gastou R$ 281 mil no cartão corporativo. O número alto assusta mas inclui gastos da Agência Nacional de Telecomunicações – de R$ 234 mil. O ministério gastou R$ 47 mil.
Existem dois tipos de cartão. Um pessoal, exclusivo para Hélio Costa – que será cancelado -, e um institucional, para gastos como reformas emergenciais necessárias ao gabinete. No ano passado, o ministro gastou com o primeiro R$ 1.918,40. A assessoria informa que a despesa incluiu diária de hotel, serviço de bordo em jatinhos da FAB e saques.
O Portal da Transparência, da Controladoria-Geral da União, mostra que quatro auxiliares tinham autorização de usar os cartões. Constam os nomes de Francisco Cavalcanti, Francisco Silva, José Flávio Lima e Santiago Guedes.
Uma fonte ligada ao ministro contou que Hélio Costa prefere tirar do próprio bolso para pagar algumas despesas a se chatear com informações sobre os gastos dos cartões. Daí a decisão de acabar com um deles.
Esta semana, o governo anunciou medidas para tornar mais transparentes os gastos com cartões de crédito corporativos. Além de restringir saques em dinheiro, ele reforçou a utilização dos cartões para pagar despesas menores e serviços que não exijam licitação, no valor máximo de R$ 8 mil.
A decisão foi tomada pelas suspeitas envolvendo a ministra da Promoção da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, que gastou com o seu cartão corporativo pessoal R$ 171.500 em 2007, 118 mil deles só em locadoras de automóveis. Matilde pediu demissão nesta sexta-feira (01/02).
A reportagem não conseguiu localizar a Anatel, para comentar os gastos.’
CONTEÚDO NA REDE
A calopsita e o (Paulo) Coelho, 1/2
‘No final do ano passado, dei uma calopsita para o meu filho, o Breno. Para quem não sabe, calopsita é um misto de periquito com papagaio, com um penacho na cabeça. É lindo, simpático e, principalmente, fácil de cuidar – o dos outros, não o que habita a minha casa. Embora eu e minha esposa, Ana, tenhamos tomado todo cuidado, o bichinho, coitado, veio com clamídia, uma espécie de gripe permanente, sem espirros, e transmissível a seres humanos. Já gastamos quase mil reais entre vacinas e exames, e ele ainda não está curado. Como a Ana diz, seria ‘o alimento de um milhão de dólares’ para a nossa gatinha, a Mel, se deixássemos ela se aproximar da gaiola. Pensa que o pesadelo terminou? Breno queria uma calopsita macho, que canta e pode até falar. Fizemos o exame de sexagem na semana passada – o Sol, coitado, é a Sol.
Não tenho rancor da pet shop onde compramos o bichinho. Só desejo que ela seja o epicentro de um terremoto de enormes proporções e raio de ação reduzido, que reavivará um vulcão adormecido e, por fim, provocará um tsunami que engolirá o que sobrar da loja. De resto, desejo tudo de bom para eles.
Mas o que a Sol tem a ver com o Paulo Coelho? Da mesma maneira que a descoberta do real sexo da Sol foi como um soco no estômago, a matéria que saiu esta semana no ‘El País’ me pegou de surpresa e deixou todos aqui em casa de queixo caído, e nada tem a ver com sexo, calopsita ou clamídia. Mas dividirá, para sempre, a opinião do mercado editorial sobre pirataria. Agarre-se na cadeira e cheque alguns trechos do texto, gentilmente traduzido pela Ana:
Paulo Coelho multiplica por dez as vendas graças ao download gratuito
‘Paulo Coelho encontrou a fórmula para converter o inimigo em aliado. Como se fosse um alquimista, o autor brasileiro transformou em ouro um meio detestado por gravadoras e editoras. Na conferência ‘Digital, Life, Design’, realizada em Munique, o autor confessou que há anos vem publicando seus livros na Internet em segredo porque ‘ao final do dia, as pessoas vão comprá-lo, isto os estimula a ler o que, por sua vez, os estimula a comprar’, assegura o autor, que avalizou sua teoria com dados objetivos: ao publicar a tradução para o russo do romance O Alquimista, suas vendas na Rússia subiram de cerca de 1.000 unidades por ano para 100.000 unidades’
Tá bom pra você? Deixando a qualidade literária do autor de lado – eu ficaria a vida inteira escrevendo este texto -, Paulo Coelho é o cara, nosso Pelé, nossa Gisele Büdchen dos livros. ‘Paulo Coelho Rules’; ele manda e sabe disso. Não à toa, hoje em dia, Paulo diz e faz o que quer, como em Munique. Então quer dizer que pirataria multiplica por dez a venda dos livros?
Continuemos a ler a matéria:
‘Coelho, que aparece em um de seus blogs posando como pirata em uma foto, teve que lutar contra algumas travas legais para poder oferecer seus livros na Internet, já que as editoras não são partidárias deste sistema: ‘O problema foi encontrar uma forma de driblar as leis que me obrigam a conseguir a permissão dos tradutores dos meus livros se quiser distribuir cópias em outros idiomas’, afirma Coelho (…)’.
A questão não inclui apenas autor e editoras, coloca tradutores na roda, também? Valha-me Deus. Continuemos:
‘A primeira vez que Coelho fez valer uma das máximas deixadas pelo carteiro de Neruda – ‘A poesia não é de quem a escreve, mas de quem a necessita’ – foi em 2001, quando publicou Historias para pais, filhos e netos. Ele concluiu que o livro teve milhares de downloads, um fato que não é proporcional à leitura, já que as conversas mantidas com diversas pessoas não confirmaram que estas tivessem feito o download. Apesar disso, Coelho é partidário desse sistema que permitiu que ele expandisse a sua obra ao redor do mundo graças às traduções que disponibilizou na Internet’.
Confesso que citar Neruda demonstra que, além de um mestre do marketing, Paulo Coelho tem um humor capaz de botar os britânicos no chinelo.
Sendo eu, também, um autor, esta questão já me foi apresentada em meados do ano passado. Um aluno disse que viu meu segundo livro listado no e-Mule, que para quem não sabe é um programa de compartilhamento de conteúdo. Não dá para dizer que não fiquei incomodado, mas pouco depois li uma entrevista com Cory Doctorow, escritor e colunista da Forbes – que havia acabado que lançar seu ‘Overclocked: Stories of the Future Present’ -, sobre disponibilizar gratuitamente livros em e-books.
Doctorow, ferrenho defensor do movimento Creative Commons, que ‘regulariza’ a distribuição de conteúdo na Rede, dizia que seus livros circulando pela web lhe rendiam outros frutos; o principal seria a divulgação, não da obra, mas de seu nome. Ou seja, a ‘pirataria’ renderia contratos para palestras, conferências, aulas etc.. Em suma, os livros seriam apenas commodities; o melhor viria depois.
Hum… Sabe que é verdade? Que a minha editora não me escute.
Mas vou ficar em silêncio. Já há leitores desta coluna imaginando Paulo Coelho em Laranjeiras, lá perto de casa, entrando em uma pet shop, segundos antes da lojinha ser assolada por fenômenos naturais – tudo observado atentamente por um bando de calopsitas sedentas de vingança e um enorme grupo de autores, editoras e tradutores loucos por sangue.
Credo!
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Para você, duas boas dicas de cursos:
– Quem quiser ficar por dentro dos segredos da redação online e da distribuição da informação na mídia digital, é só entrar em contato pelo e-mail extensao@facha.edu.br ou ligar para 0xx 21 2102-3200 (ramal 4) para obter mais informações sobre meu curso ‘Webwriting & Arquitetura da Informação’. As aulas da próxima turma, que terá início na semana após o Carnaval, em 12/02, serão ministradas no Rio de Janeiro, ao longo de seis terças-feiras à noite, em Botafogo.
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(*) É autor do primeiro livro em português e terceiro no mundo sobre conteúdo online, ‘Webwriting – Pensando o texto para mídia digital’, e de sua continuação, ‘Webwriting – Redação e Informação para a web’. Ministra treinamentos em Webwriting e Arquitetura da Informação no Brasil e no exterior. Em sete anos, seus cursos formaram 1.300 alunos. É Consultor de Informação para a Mídia Digital do website Petrobras, um dos maiores da internet brasileira, e é citado no verbete ‘Webwriting’ do ‘Dicionário de Comunicação’, há três décadas uma das principais referências na área de Comunicação Social no Brasil.’
EXTRA! EXTRA!
Lutar pela igualdade não exige privilégios, 1/2
‘Ferreira Gullar fez, em sua coluna deste domingo (27/01) na Folha*, 23 ‘perguntas que não querem calar. Todas revelam curiosidade superpertinente em relação a este Brasil do século XX, cada vez mais navegando entre realidade, fantasia e equívocos, não só no Big Brother e nas novelas, também nas enfeitadas explicações de ministros, consultores e banqueiros sobre a crise financeira internacional.
Foi a 21ª pergunta do poeta que me instigou ao debate. ‘Designar negros e pardos como afro-brasileiros significa que brasileiros são só os ‘brancos’? E se esses passarem a se chamar de euro-brasileiros ou nipo-brasileiros, o que restará como povo brasileiro, os índios? E se estes disserem que são anteriores à criação do Brasil?’
Aí, três dias depois, quarta (30/01), Cláudio Gonçalves Couto, professor da PUC e colaborador habitual do Valor*, o que ele chama de ‘idéias fora do lugar’ do procurador federal da República Davy Lincoln Rocha; Couto acha que as idéias de Rocha são ‘plausíveis e plenamente defensáveis’, se tivessem surgido da cabeça de um cidadão comum ou de pessoa ligada a atividades político-partidárias, mas não de um membro do Ministério Público.
Rocha deu três argumentos para convencer um juiz de primeira instância a suspender o sistema de cotas na Universidade Federal de Santa Catarina:1. esse sistema não está previsto em lei; 2. a autonomia universitária não dá a essas instituições o direito de legislar; 3. a Constituição garante igualdade de todos os cidadãos e, portanto, as universidades não poderiam tratar os candidatos segundo sua etnia (no Brasil realmente este é um daqueles princípios que só os bicheiros cumprem rigorosamente – com um estilo bem mais simples do que o usado pelos constitucionalistas: ‘vale o que está escrito’).
Depois, quando um repórter do Estadão perguntou o que aconteceria se o Tribunal Regional Federal derrubasse essa liminar, o procurador foi curto e firme: ‘Entrarei com uma ação civil pública pedindo a anulação de um concurso para juiz, em andamento, que não prevê reserva para negros, egressos do ensino público e índios, e um novo concurso com cotas. O tribunal não pode ter uma política para dentro e outra para fora.’ Coutonão gostou desse uso da palavra ‘política’, porque o que está em jogo não é a posição política dos juízes sobre o assunto, mas sim ‘justiça – entendida como legalidade e adequação a normas superiores.’
A pergunta de Gullar, a argumentação do procurador e a bronca de Cláudio Couto – tudo na verdade se liga à renitente desigualdade racial e social em nosso país, que se busca reduzir parcialmente pela vantagem nos
exames vestibulares a grupos de estudantes-candidatos negros, índios e egressos do ensino médio público.
Desde o primeiro instante da discussão fiquei (e continuo) a favor de ações afirmativas – importantes para apressar a redução da desigualdade social – capazes de compensar a diferença de qualidade entre escolas particulares e públicas, que dificulta muito o acesso dos estudantes mais pobres à universidade pública.
Mas será que a autodenominação de ‘afrobrasileiros’ é uma ação afirmativa, favorece a causa da igualdade ou se torna uma forma de autodiscrinação? Para ficarmos todos em pé de igualdade, eu, Gullar, Sílvio Santos. Paulo Totti e a deputada Manuela d´Ávila devemos nos identificar como eurobrasileiros? Ali Kamel e Juca Kfouri se destacariam como árabe-brasileiros ou próximo-oriental-brasileiros, Celso Ming e Luiz Gushiken como extremo-oriental-brasileiros? E que tal Rita Lee passar a se anunciar como norte-americana-brasileira?
Quanto à questão das cotas, não se pode esquecer que os chineses, no auge da Revolução Cultural, davam prioridade a filhos de operários e camponeses para ingresso nas universidades. Em poucos anos, tiveram de voltar ao sistema de seleção unicamente por mérito, para deter o rápido declínio de qualidade do ensino superior.
O procurador federal Davy Rocha talvez tenha pecado por equívocos vocabulares ou jurídicos, mas sua tese central é mais do que defensável. O sistema de cotas pode ser um corretivo justo mas não é republicano e viola o princípio da igualdade de todos perante a lei – o que inclui certamente o igual direito a educação superior paga com dinheiro público. As bolsas do Prouni, a preparação gratuita para o vestibular dos estudantes vindos de escolas públicas, bolsas para os melhores estudantes do ensino público desde a oitava série, e várias outras iniciativas poderiam dar igual (ou pelo menos quase igual) oportunidade a todos, sem ferir os princípios básicos da Constituição republicana e democrática.
E naturalmente não devemos aceitar qualquer qualificativo discriminatório oficial para a condição de brasileiro.
Gullar e o procurador Rocha – e também o Cláudio Couto na defesa da correta separação dos Três Poderes – estão todos no lado do bem. Porque queremos todos viver num país que corrija injustiças do passado sem enfraquecer a luta pela igualdade de todos os brasileiros hoje.
(*) Milton Coelho da Graça, 76, jornalista desde 1959. Foi editor-chefe de O Globo e outros jornais (inclusive os clandestinos Notícias Censuradas e Resistência), das revistas Realidade, IstoÉ, 4 Rodas, Placar, Intervalo e deste Comunique-se.’
JOGO ABERTO
Marcelo Russio
Como inovar?, 29/1
‘Olá, amigos. A cada ano que passa fica mais difícil estruturar uma cobertura de um evento realmente grande, como Olimpíadas ou Copa do Mundo. Inovar é o grande desafio, e todos buscam surpreender seus leitores com recursos novos, tanto tecnológicos quanto relativos a pautas e idéias. Fazer uma cobertura com a mesma estrutura da última edição do evento é sinônimo de críticas vindas de todas as partes.
Para os Jogos Olímpicos de Pequim, em agosto, o que mais se discute é o que poderá ser feito, já que a China, mesmo com toda a abertura anunciada para as Olimpíadas, ainda é um dos países com mais censura declarada em todo o planeta. Filmar, entrevistar e fotografar não será tão fácil quanto em outras edições dos Jogos, e todos sabemos disso. Mas como trazer histórias diferentes em um ambiente aparentemente tão hostil à liberdade de imprensa?
A resposta, acredito, está nos blogs. Celulares com câmeras de boa definição e laptops farão desta cobertura a que mais apontará os holofotes para as páginas pessoais de jornalistas e atletas. Ali, com certeza, haverá o maior número de informações não oficiais de Pequim, assim como, certamente, curiosidades que não terão lugar na cobertura esportiva, ou até mesmo permitida pelas autoridades chinesas.
Ninguém sabe ao certo como será o uso da internet por lá. Hoje, segundo fontes da coluna, a utilização é autorizada, mas sempre com bloqueios a alguns tipos de sites. Durante os Jogos, até onde consta, esses bloqueios serão suspensos. Para os chineses, será uma grande possibilidade de ter acesso a conteúdos proibidos, ou ‘não recomendados’. Mas para os jornalistas e turistas ocidentais, o choque deverá ser muito grande.
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Incrível a repercussão das falhas de arbitragem do clássico entre São Paulo e Corinthians. Muita gente buscou explicações para a anulação do gol de Dariano e para o pênalti não dado sobre Dagoberto em esquemas favoráveis ao Corinthians, ou em perseguição do árbitro ao São Paulo. Por que não se aceita que ele errou por ser deficiente tecnicamente?
(*) Jornalista esportivo, trabalha com internet desde 1995, quando participou da fundação de alguns dos primeiros sites esportivos do Brasil, criando a cobertura ao vivo online de jogos de futebol. Foi fundador e chegou a editor-chefe do Lancenet e editor-assistente de esportes da Globo.com.’
JORNAL DA IMPRENÇA
A língua enxovalhada, 31/1
‘No quarto e em silêncio,
um homem procura
entender o fim das coisas.
(Celso Japiassu in Retorno)
A língua enxovalhada
Em artigo escrito especialmente para o Blogstraquis, o mestre Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal em Brasília, de cujo varandão debruçado sobre a patuscada e a bandarrice é possível ver o ensaio do bloco palaciano Enfia o Dedo e Roda, com a ‘ministra’ da ‘Igualdade Racial’ a rebolar na ala das baianas, pois Roldão assim desabafou:
Nossa língua tem uma riqueza que está sendo esquecida. O pessoal de informática é useiro e vezeiro em aportuguesar termos ingleses desnecessariamente, pois existem equivalentes na nossa língua.
É comum ouvirmos e lermos ‘salvar’ quando o certo é guardar, proteger (God save the Queen = Deus guarde a Rainha); ‘deletar’, quando temos entre outros: apagar, excluir, cancelar, cortar, desmanchar, eliminar, excluir, remover; ‘diretório’, quando temos guia; ‘menu’ quando temos lista, ementa.
Leia aqui a íntegra desse texto indispensável a todos, principalmente aos que vivem de escrever e falar.
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Besteira, não!
Nove entre dez leitores pedem a transcrição no Blogstraquis do editorial da Folha de S. Paulo intitulado Criacionismo, não. Pois visite aquele espaço e leia o texto que abriga frases assim:
Em palestra intitulada ‘Meio Ambiente e Cristianismo’, Marina Silva valeu-se de sua formação evangélica para transpor em chave religiosa o tema da preservação dos recursos do planeta.
Sob uma aparência de equanimidade, a tese faz parte de uma investida anticientífica que, com firmeza, cumpre repudiar.
Que a religião fique onde está, e não se faça de ciência: eis uma exigência, afinal modesta, mas inegociável, da modernidade.
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Fantasia pré-carnavalesca
Sob o assustador título Homens invadem prédio em São Paulo vestindo coletes da polícia, deu na Folha:
Cerca de dez homens vestidos com coletes da Polícia Civil invadiram prédio localizado na Alameda Franca, no Jardim Paulista –bairro nobre da zona oeste de São Paulo– por volta das 22h50 de sexta-feira (25), segundo a Secretaria de Segurança Pública.
Em depoimento, o porteiro contou que os homens solicitaram a entrada no prédio alegando que um traficante morava no 17º andar do edifício. Ao entrarem, conduziram três funcionários até a casa do zelador, onde permaneceram trancados por aproximadamente três horas, até que um dos moradores os libertou.
Mais apreensivo do que o senador Suplicy, aliviado da carteira durante missa na Sé, Janistraquis bradou:
‘Se a polícia aparecer aqui no sítio, vou recebê-la de foice na mão, como fazem os do MST!!!’.
É compreensível; afinal, depois da morte de John Wayne ninguém mais sabe quem é mocinho e quem é bandido.
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Desfocado
O colunista recebeu mensagem via gmail, assim escrita:
SEU NOME FOI MENSIONADO NA REDE YOUTUBE VIDEOS
Eu, mais vaidoso que José Dirceu, já estava de dedo em riste para clicar no link quando Janistraquis alertou:
‘Considerado, acho que não vale a pena ver como você foi ‘mensionado’ no YouTube; se os caras não acertam a palavra, tudo indica que não acertam o foco…’
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Celso Japiassu
Leia aqui a íntegra de novo poema de Celso Japiassu, cujo excerto encima esta coluna. Desse inspirado vate escreveu o crítico Fábio Lucas, referindo-se a O Itinerário dos Emigrantes, livro de 1980: ‘Alguns signos recorrentes constelam a coletânea de poemas: ódio, desejo, esperança, memória. Mas o leitor assiste permanentemente à transformação do ódio em desejo e da memória em esperança.’
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Carnaval animado
Nome de um bloco carnavalesco que reúne velhinhos no Rio de Janeiro: Demora, mas levanta. Por coincidência, Janistraquis fundou aqui na roça uma folia intitulada Levanta, mas não segura.
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Sorte & azar
O considerado Alex Cavalcanti, jornalista no Espírito Santo, envia textinho que recebeu da assessoria de comunicação da Caixa Econômica Federal, cujo primeiro parágrafo dizia, entre outras informações fundamentais:
‘Com os mesmos números ele fez duas apostas para saber onde seria mais sortudo. Pelo visto nos dois municípios!’
Cavalcanti, que não é chegado em jogatinas, achou esquisito:
E haveria de ser diferente? Por acaso os sorteios das loterias são diferentes em cada cidade? Daria para o cara jogar os mesmos números, ser premiado em uma cidade e não o ser na outra?
Eu acho que não, porém Janistraquis foi esmagado por dúvida crudelíssima:
‘Isto aqui é o Brasil, considerado, e a gente nunca sabe…’
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O Vasco e o fim do túnel
O considerado Bolívar Lamounier, maior cientista político do Brasil e sofrido torcedor vascaíno, escreveu ao colunista:
‘(…)Quarenta e sete do segundo tempo, escanteio para o Americano, que jogava com 1 atleta a menos que o Vasco. Nesse momento o Masoca até que se condoeu de mim. Permitiu-me enfiar minha cabeça numa sacola de super-mercado e me esconder debaixo do sofá. O Vasco abala qualquer torcedor, sem nenhuma dúvida, e rogo ao leitor que visite o Blogstraquis e leia a íntegra da, digamos, bolivariana mensagem.
(Goleamos o Resende, ontem à noite em São Januário, mas, convenhamos, o que é o Resende?)
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Aposentadoria
Como poucos ignoram, o jocoso ministro da Previdência, Luiz Marinho, determinou que invasores de terras podem contabilizar o período da ocupação para efeito de aposentadoria rural.
Janistraquis tem certeza absoluta de que a medida vai dar um galho ‘dos seiscentos diabos’, como se diz no sertão, tudo porque o ministro e sua assessoria raciocinam com o mesmo furor com que as alimárias mastigam as espigas:
‘Considerado, é um despotismo de burrice; ora, se querem beneficiar os lavradores, por que não reduzem o tempo de serviço ou a idade para se requerer aposentadoria?’.
É bem pensado.
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Racismo na passarela
A considerada Myrthes Abdalla Borges, comerciante paulistana, ficou indignada com esta já carunchada e amassada matéria da Folha de S. Paulo, na qual se lê, abaixo do título Promotores vão investigar racismo nos desfiles da SPFW:
O Ministério Público abriu um inquérito civil para investigar a eventual prática de racismo nos desfiles da São Paulo Fashion Week.
A apuração cita como ponto de partida os levantamentos publicados pela Folha nos últimos dias 17 e 18. Nesses dias, passaram pelas passarelas 344 modelos, dos quais só oito eram negros -2,3% do total.
A proporção de negros nos 40 desfiles ocorridos durante todo evento não difere muito daquela dos dias citados. Levantamento da Folha aponta que só 28 dos 1.128 modelos eram negros -ou 2,5%.
Myrthes perguntou aos botões do Datena:
‘Qual o objetivo do jornal ao fazer o ‘levantamento’? Desfile de moda não é desfile de escola de samba e se há poucos negros na passarela é porque as grifes não privilegiam a cor da pele, mas o talento; onde estaria o racismo?!’
Janistraquis acha que a Folha também deveria ter feito levantamento sobre a porcentagem de veados na SPFW, deverasmente assustadora a julgar pelas imagens exibidas na TV.
E tem mais: o colunista ficou puto porque não viu nenhum ‘maneco’ baixinho, gordo, careca e velho na passarela, o que constitui intolerável preconceito; ora, se a moda é para outono/inverno, a gente poderia pelo menos desfilar com os cachecóis!!!
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Sem camisinha
Rede Globo, voz de moça na campanha anti-aids para o carnaval — ‘… diga pro seu parceiro: sem camisinha não dá!’.
Janistraquis, que já cantou muito samba-enredo pela vida afora, apontou o erro:
‘Considerado, o tempo do verbo tá errado; a frase deveria ser esta: ‘diga pro seu parceiro – sem camisinha não dou!’.
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Coisa velha
Saiu em tudo quanto é jornal, revista, TVs e emissoras de rádio:
Arqueólogos chineses encontraram na província de Henan um crânio humano que pode ter 100 mil anos.
Janistraquis, que já encontrou muita gente com idéias bem mais antigas, deu de ombros:
‘Considerado, não tenho o menor interesse em saber de onde vim nem pra onde vou; se algum dia souber o que estou fazendo aqui já está bom demais…’.
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Cardápio de pobre
O preço da carne está pela hora da eutanásia e então Janistraquis comprou 1,8 kg de cação, que é peixe ruinzinho mas não custa tanto quanto um pedaço de patinho. E ainda dizem que é bom pra saúde.
Todavia, depois de descongeladas, as postas do desprezível tubarão pesaram exatamente 900 gramas, a metade do que foi pago, pois o resto era apenas água suja. Meu assistente desistiu:
‘Considerado, vamos comer arroz com ovo, agora que a gema foi absolvida do crime de causar infartos.’
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Nota dez
Sob o título Cinema na telinha do celular? Nem pensar, o considerado Sérgio Augusto, de longe o melhor jornalista cultural do país, escreveu no Caderno 2 do Estadão:
(…) Filme em celular, só mesmo em Lilliput, que, como se sabe, apenas Gulliver conheceu. Em Lilliput, um iPhone com filmes baixados via iTunes seria considerado um drive-in. No mundo real, não passa de um rotundo disparate, um desserviço à experiência cinematográfica, aprimorada ao longo de 113 anos, sempre com acréscimos: som, cores, cinemascópio, tridimensionamento, Dolby, etc.
Leia no Blogstraquis a íntegra do artigo de quem entende desse e de outros e muitos e muitos assuntos.
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Errei, sim!
‘PROTOZOÁRIOS – Subtítulo e titulão do Segundo Caderno de O Globo: João Ubaldo Ribeiro revisa no Rio as páginas de O Sorriso do Lagarto, seu mais novo romance – Rei dos Protozoários. Janistraquis, nordestino que não só conhece lagarto mas até jantou alguns nos tempos de seca braba, comentou:
‘Considerado, sempre pensei que protozoário fosse pato’. Intrigado, perguntei: ‘Pato? Mas pato por quê?!?!’. Meu secretário completou: ‘É por causa do jeitão dele…’. E saiu pela sala, num passinho pendular, cantando alegremente qüem qüem.’ (dezembro de 1989)
Colaborem com a coluna, que é atualizada às quintas-feiras: Caixa Postal 067 – CEP 12530-970, Cunha (SP), ou japi.coluna@gmail.com.
(*) Paraibano, 65 anos de idade e 45 de profissão, é jornalista, escritor e torcedor do Vasco. Trabalhou, entre outros, no Correio de Minas, Última Hora, Jornal do Brasil, Pais&Filhos, Jornal da Tarde, Istoé, Veja, Placar, Elle. E foi editor-chefe do Fantástico. Criou os prêmios Líbero Badaró e Claudio Abramo. Também escreveu nove livros (dos quais três romances) e o mais recente é a seleção de crônicas intitulada ‘Carta a Uma Paixão Definitiva’.’
IGREJA
Folha Universal, com 2,3 milhões de exemplares, será reestruturada, 30/1
O maior jornal comercial do País, a Folha de S.Paulo, tem uma tiragem média ligeiramente superior a 300 mil exemplares, conforme dados recentes divulgados pelo IVC, o Instituto Verificador de Circulação, relativo ao ano de 2007.
Há um jornal, no entanto, pouco conhecido por quem não freqüenta a Igreja Universal do Reino de Deus, a Iurd, que detém, de longe, a maior tiragem absoluta do País: 2,3 milhões de exemplares. Uma das diferenças é que a Folha de S.Paulo é diária e a Folha Universal, semanal, mas ambas, no cômputo geral, superam os 2 milhões de exemplares por semana. Outra diferença é que enquanto a primeira Folha, a de S.Paulo, atinge um público predominantemente das classes A e B e formador de opinião, a Universal é lida sobretudo pelos mais humildes, pessoas que freqüentam os cultos da Igreja. E uma terceira é que enquanto a Folha de S.Paulo atinge um público total inferior a 1 milhão de pessoas, se computarmos três leitores por exemplar, a Folha Universal, se a proporção for mantida, é lida por quase 7 milhões de fiéis e familiares.
Certamente pensando nesses números e no excepcional potencial que tem, os dirigentes da Universal decidiram reestruturar o jornal, reorganizando o conteúdo editorial de tal forma que o noticiário geral seja totalmente separado do noticiário religioso, ambos ocupando espaços próprios e de maior visibilidade. Desse modo, a partir já de fevereiro, com um nova equipe, montada em São Paulo e chefiada por Celso Fonseca (ex-Estadão, IstoÉ, portal Terra e revista Brasileiros), o jornal, de 32 páginas, terá um caderno com 24 páginas de noticiário geral e um outro, de oito páginas, com o noticiário religioso. Este circulará como encarte e será produzido, com a supervisão de São Paulo, pela mesma equipe que até aqui respondia pela edição integral da Folha Universal e que fica sediada no Rio de Janeiro. Já o caderno principal abrirá espaço para temas da atualidade, incluindo matérias próprias e também produzidas por correspondentes free-lancers no Brasil e no Exterior.
Como é semanal, a Folha Universal, embora continue a manter o formato de jornal, adotará, no novo projeto, a linguagem de revista, com matérias mais aprofundadas e melhor tratamento de texto. Ao lado de Celso Fonseca, atuando como consultores e orientadores desde o início do projeto, estão o atual diretor de Jornalismo da Rede Record, Douglas Tavolaro, e os executivos Domingos Fraga e Leandro Cipolini, ambos também do staff editorial da emissora, em São Paulo, onde, aliás, está também instalada a redação da Folha Universal (prédio da Barra Funda).
Essa presença de certo modo mostra a coerência desse grupo religioso que tem investido e apostado pesado na profissionalização de seus veículos, entre eles a própria Rede Record, a recém-criada Record News, na freqüência anteriormente ocupada pela Rede Mulher, e agora a transformação da Folha Universal num jornal de melhor qualidade e de maior peso editorial, com capacidade de informar e formar melhor seus fiéis.
O jornal continuará a ser vendido por R$ 1 e seu nome permanecerá Folha Universal, mantendo inclusive a mesma logomarca. Seguirá sendo impresso em Belo Horizonte, em gráfica da própria Igreja, mas por questões de logística terá duas edições, a primeira, fechada às 2ªs.feiras, destinada às regiões mais longínquas do País, e a segunda, concluída às 4ªs.feiras, com noticiário mais quente, distribuída nos estados de São Paulo (que fica com quase 900 mil dos 2,3 milhões de exemplares), Rio de Janeiro, Minas Gerais e Distrito Federal.
Não há, num primeiro momento, intenção de levá-lo para as bancas, mas a hipótese, a médio prazo, não é de toda descartada. A primeira edição desta nova fase chegará às igrejas na primeira semana de fevereiro, tendo entre seus destaques matérias produzidas pelos correspondentes de Washington e de Israel.
A nova redação terá 30 profissionais, entre texto, revisão e arte. Alguns dos nomes já acertados são os dos subeditores Felipe Gil Santos, que era do UOL, e Lygia Rebello, vinda do Diário do Comércio; dos repórteres Daniel Santini (ex-G1), Juliana Vilas (ex-Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro), Andréia Miramontes (ex-sucursal Brasília da Folha de S.Paulo), Guilherme Bryan (ex-revistas Cult e Brasileiros) e Marília Melhado (ex-revistas Cult e Caros Amigos); e do diretor de Arte Wágner Silva.
(*) É jornalista profissional formado pela Fundação Armando Álvares Penteado e co-autor de inúmeros projetos editoriais focados no jornalismo e na comunicação corporativa, entre eles o livro-guia ‘Fontes de Informação’ e o livro ‘Jornalistas Brasileiros – Quem é quem no Jornalismo de Economia’. Integra o Conselho Fiscal da Abracom – Associação Brasileira das Agências de Comunicação e é também colunista do jornal Unidade, do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, além de dirigir e editar o informativo Jornalistas&Cia, da M&A Editora. É também diretor da Mega Brasil Comunicação, empresa responsável pela organização do Congresso Brasileiro de Jornalismo Empresarial, Assessoria de Imprensa e Relações Públicas.’
REESCRITA
O enigma dos sincronismos, 28/1
‘O XIS DA QUESTÃO – Por falta de sincronismo no modem da banda larga que a Net me vendeu, estou à deriva, fora da rede universal. Mas aqui também escrevo de dois casos de inspirado sincronismo, que deram sucesso a ações políticas produzidas para a difusão jornalística.
1. À Espera da Net…
Para todos os efeitos, declaro encerrado o período de entrega ao ócio, isto é, ao direito de nada fazer por obrigação. Assim, ao contrário dos três últimos textos da coluna, este já é escrito sob a noção do dever a cumprir. E porque assim é, submeti-me à sábia norma de olhar o mundo e a mídia antes de decidir sobre o que escrever. Hoje assisti com a devida atenção aos telejornais da manhã. E li a Folha de S. Paulo.
Queria ir além disso, saber mais e melhor sobre o andamento das coisas do mundo. Mas o cenário que encontrei na minha volta ao local de trabalho é desanimador.
Problema mais grave: estou sem Internet. A banda larga que a Net me garantiu que funcionaria às mil maravilhas, em vez de me conectar ao mundo, me isolou. Já não funcionava sexta-feira passada, quando retornei a casa, para a fase de reentrada no mundo real. O problema, dizem os especialistas da Net, está no modem, abatido pela falta de sincronismo. Mesmo sem saber o que isso significa, reclamo atendimento aquele dia. Depois de horas de espera ao telefone, no aguardo de atendentes livres, consegui finalmente agendar a visita de um técnico para amanhã, terça –feira. Mas talvez só à noite…
E aqui estou eu, há dias sem acesso Internet, vítima da falta de sincronismo do modem, símbolo das maravilhas tecnológicas prometidas pela Net.
No embalo da minha insatisfação, e porque de nada adianta queixar-me aos massacrados atendentes da Net, aproveito o meu espaço no Comunique-se para reclamar publicamente.
A Net gastou milhões em campanhas publicitárias para vender o tal ‘pacotão’ TV-banda larga-telefone. Inventou até um coronel fortão e bem humorado, para convencer multidões a fazer a assinatura do ‘maravilhoso pacotão’, do qual faz parte a promessa de assistência técnica eficaz. Vendeu, vendeu, vendeu. Vendeu o que agora não pode oferecer, pois é clara a falta de capacidade de garantir o direito essencial à assistência técnica, serviço incluído no preço que nos cobra.
Qualquer que seja a hora em que se telefone para a assistência técnica da Net, ouve-se a informação gravada de que ‘o tempo de espera está elevado’. E nos pedem para aguardar na linha. No meu caso, esperei tanto que, em boa parte das vezes, a ligação caiu. E recomeçava o martírio de reclamar em vão direitos que o Código do Consumidor nos garante serem líquidos e certos.
Até que a Net se torne eficaz, a solução que me resta é ir à lan-house do hipermercado que freqüento. Aliás, terei de ir lá hoje, e já, não apenas para enviar este texto à redação do Comunique-se, mas também para saber se, depois de três semanas de fuga do mundo, ainda tenho alguns trocados no saldo bancário.
2. A arte do fuzuê…
Mas chega de lamúrias.
Apesar das complicações que a problemática assistência técnica da Net me criou, o mundo está vivo, cada vez mais globalizado, o que significa dizer cada vez mais conectado às redes universais de comunicação – produzindo e difundindo ações discursivas que alteram continuamente a realidade.
Do noticiário de hoje, recorto dois fatos que servem como demonstração.
Um desses fatos, belíssimo tanto na materialidade quanto no conteúdo discursivo, correu mundo pelas infovias no momento em que acontecia. Barcelona, mais especificamente a sua imponente catedral, e as centenas de pessoas que pararam para assistir ao inusitado espetáculo, serviram de cenário simbólico e televisivo para o protesto ecológico de nudismo realizado por pelo menos 150 pessoas. As fotos mostram corpos jovens, repletos de vida. Eles e elas se despiram, pintaram-se de vermelho e se deitaram no chão da praça, em coreografia cuidadosamente estudada, para dar beleza e pureza às imagens universalizadas em tempo real.
Razão do protesto, organizado pela Ong ‘AnimaNaturalis’ contra a indústria de roupas: ‘fazer com que as pessoas tenham consciência do sofrimento e do sangue derramado na fabricação de cada casaco’. Foi o que disse à imprensa a militante organizadora do evento.
Quer se goste ou não das razões do protesto, não há como deixar de elogiar o senso estético e o senso jornalístico de quem bolou o acontecimento. Que foi um sucesso como expressão plástica e ação comunicativa.
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Outro acontecimento na esfera das lutas pelo meio ambiente deu-se aqui no Brasil. Foi um golpe de mestre, aplicado pela ministra Marina Silva. Em jeito de cheque-mate, ela arrancou dos bastidores palacianos a crise do desmatamento das Amazônia e a jogou no debate público, para alegria das editorias de Política, vazias de emoções em tempos de férias e folia.
O fato em si aconteceu dias atrás, quarta-feira passada. Mas a melhor explicação do seu significado está na Folha de hoje, em texto assinado por Claudio Angelo, editor de ciência do jornal. Na inteligente e bem fundamentada interpretação proposta por Claudio Angelo, a ministra do Meio Ambiente criou um fuzuê dos diabos, ao divulgar quarta-feira passada, em solenidade pública recheada de jornalistas, os dados do Inpe sobre o desmatamento na Amazônia – e colocou no colo do Presidente da República e da ministra Dilma Rousseff , que ali estavam como estrelas maiores da cerimônia, a encrenca da briga entre os defensores da floresta, que Marina comanda, e os pecuaristas que derrubam árvores para alongar pastos e rebanhos, sob as bênçãos do ministro da Agricultura e as omissões da Presidência da República, Casa Civil incluída.
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Assim como os manifestantes nudistas de Barcelona, a ministra Marina Silva sabe muito bem que, no mundo de hoje, não há discurso eficaz fora do trem da notícia. Sabe que sem jornalismo e sem jornalistas por perto não se faz fuzuê na cena política. Nem em qualquer cena dos conflitos humanos.
E porque sabem tudo isso, os manifestantes de Barcelona e a ministra das matas provocaram, cada um a seu modo, um fuzuê danado.
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Quanto a mim, terei de ficar mais 24 horas excluído das redes universais. Por falta de sincronismo – no modem e nos serviços da Net.
(*) Manuel Carlos Chaparro é doutor em Ciências da Comunicação e professor livre-docente (aposentado) do Departamento de Jornalismo e Editoração, na Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo, onde continua a orientar teses. É também jornalista, desde 1957. Com trabalhos individuais de reportagem, foi quatro vezes distinguido no Prêmio Esso de Jornalismo. No percurso acadêmico, dedicou-se ao estudo do discurso jornalístico, em projetos de pesquisa sobre gêneros jornalísticos, teoria do acontecimento e ação das fontes. Tem quatro livros publicados, sobre jornalismo. E um livro-reportagem, lançado em 2006 pela Hucitec. Foi presidente da Intercom, entre 1989-1991. É conselheiro da ABI em São Paulo e membro do Conselho de Ética da Abracom.’
TELEVISÃO
Precipitado foi o lançamento da TV Brasil, 28/1
‘Segundo a milenar sabedoria chinesa, ‘toda a jornada começa com um primeiro passo’. Nada como um bom clichê. E me permito acrescentar: ‘a não ser quando os primeiros passos são dados na direção contrária’. Ou seja, nem todos os primeiros passos de uma jornada nos levam necessariamente onde desejamos chegar. E nem todas as críticas deveriam ser consideradas precipitadas ou irrelevantes, simplesmente, por serem…as primeiras.
Esta semana, mais uma vez, fui acusado de muitas coisas. Não é novidade. Já estou acostumado. Vida de crítico é assim mesmo. Tinha resolvido não responder a mais essas questões. Ninguém suporta mais esse velho debate entre as promessas das TVs públicas e a realidade das TVs comerciais no Brasil. No fundo, é tudo a mesma velha TV. E o meio, conforme conhecemos, tende a desaparecer nos próximos anos.
Por outro lado, após mais de meio século assistindo, fazendo (ênfase no fazendo), pesquisando, ensinando e sempre ‘adorando’ televisão, acredito que conquistei o direito de criticar o meio. Feliz ou infelizmente, passei a maior parte, algumas da melhoras horas da minha vida na frente e dentro da telinha. Quando digo que uma programação de TV é muito, muito ruim, devo ter alguma razão.
Deveria merecer pelo menos alguma consideração. Ainda mais quando critico uma rede de TV que é lançada com o grandioso, talvez pretensioso nome de… TV Brasil. Mas, como bem dizia o meu velho pai, pretensão e água benta nunca são demais.
Mas apesar das críticas, aproveito para recomendar um bom exemplo de respeito pela opinião alheia. Em matéria para o Observatório do Direito à Comunicação com o significativo título de ‘Críticas à programação da TV Brasil são precipitadas, diz presidente do Conselho’ (ver aqui) e divulgada nos sites do Fórum Nacional em Defesa da Comunicação e Observatório da Imprensa (ver aqui), fui citado e acusado de fazer criticas consideradas ‘precipitadas’ à TV Brasil. Afinal, a nova rede está no ar há menos de dois meses. Incrível. Tudo isso?
Mas, tudo bem. Afinal, quando as críticas à TV Brasil estarão liberadas pelo presidente do Conselho consultivo da TV Brasil? Quanto tempo será necessário para podermos fazer uma avaliação ‘precisa’ da nova rede? Temos televisão, comercial e pública, no Brasil há mais de 50 anos. Por que devemos acreditar que essa TV será diferente das ‘outras’ TVs brasileiras? Qual é a diferença? Perguntar, também pode ser considerado precipitado, mas não custa nada.
Afinal, quando as críticas à TV Brasil não serão mais consideradas ‘precipitadas’?
Depois das eleições?
Esse debate é muito significativo. Principalmente, quando a principal crítica ao lançamento da TV Brasil é essencialmente o fato de ter sido lançada pelo governo com medida provisória e sem qualquer consulta ao principal interessado: o público. Por que uma rede de TV pública logo agora? Assim como a escolha do sistema de TV digital brasileiro, essa também não teria sido mais uma idéia precipitada do governo? Perguntar não custa.
Então, vamos tentar entender. Colocar uma rede de TV pública no ar, sem maiores pesquisas, consultas à população, importação de equipamentos para praças e outros detalhes não é precipitação. Medida provisória para lançar rede de TV do governo não é precipitação. É necessidade de estratégica ‘política’. Planejamento de altíssimo nível. É clamor do público.
Outra explicação ‘técnica’ seria, ‘TV é assim mesmo’. Ou seja, para aqueles que sempre trabalharam nas TVs comerciais é assim mesmo que deve ser. Não há diferença. Afinal, ‘é desse jeito que nós fazemos as coisas nas TVs onde trabalhamos, é assim que também fazemos aqui em Brasília’. Ou, ‘depois damos um jeitinho de melhorar com a TV no ar e os salários em dia’. Depois organizamos de forma igualmente precipitada ‘aqueles’ concursos públicos que todos nós conhecemos.
Ah, isso em Brasília não é precipitação. Somente as críticas a uma rede de TV com programação velha e despesas pagas pelo contribuinte é que são precipitadas. Essa também deve ser a lógica do pensamento único.
Fim da TV
Colocar no ar uma nova rede de televisão com promessas tão ambiciosas de maneira tão precária e amadora é antes de tudo queimar uma idéia importante. É um passo errado em uma longa jornada a lugar nenhum. Não adianta depois convocar os simpatizantes, os funcionários da TV e os membros do partido para passeatas em Brasília. O público continua ignorando a existência da TV Voz do Brasil. O futuro pertence à Internet.
Televisão é um meio de comunicação de massa centralizador, produto de uma época de guerra fria, muito útil para a proliferação de pensamentos totalitários. Não é à toa que está em decadência. Fica aqui a sugestão: Por que não gastar essa fortuna da TV Brasil em pequenas televisões digitais regionais e comunitárias transmitidas pela Internet?
Hoje, montar uma nova rede de televisão é como tentar reinventar o telégrafo ou a máquina de escrever. Pode ser que dê certo. Mas também pode ser um tremendo desperdício de tempo e recursos. Ainda mais quando esses recursos são públicos, ou seja, são nossos.
Reafirmo que a verdadeira nova televisão, a TV digital na Internet está sendo criada nas pequenas WebTVs e nos sites de participação popular na produção de conteúdos como o YouTube nos EUA ou a AllTV e Fiz TV, aqui mesmo no Brasil.
BBC brasileira?
Ainda no artigo do Observatório, o presidente do conselho acrescenta:
‘Concordo que ainda falta muito para chegar no nível de qualidade desejado, mas é preciso ter calma, não dá pra ser a BBC ainda. O importante agora é compreender que seu caráter é público, não estatal e nem privado’, diz Belluzzo.
Impressionante. Nesta altura da história da TV, montar uma nova rede, ainda mais nos moldes, valha-me Deus, da BBC em um país como o Brasil? Somos países completamente diferentes com povos e histórias diversas. A BBC é exemplo de qualidade para o mundo em um país de tradição colonialista. Os objetivos ‘reais’ da BBC, assim como os objetivos do governo britânico é nos fazer acreditar que o que é bom para a Grã- Bretanha, também é bom para o Brasil e o mundo. A BBC é boa para os britânicos. É insuportável para os americanos. Seria impossível no Brasil.
Muito bem. E já que estamos tentando imitar a BBC, que tal fazer uma pesquisa ou uma votação para saber se os telespectadores brasileiros, assim como os telespectadores britânicos, estariam dispostos a pagar uma taxa anual ou mais impostos para sustentar essa nova TV pública? Perguntar não custa. Afinal, nada seria mais fácil, relevante e democrático. Porém, os simpatizantes do pensamento único sabem tudo que o brasileiro quer e precisa.
Mais promessas
Os responsáveis pelo TV Brasil deveriam primeiro apresentar uma programação pelo menos ‘razoável’. Não esse festival de programas requentados que está no ar. Menos! Da produção da Voz do Brasil para as promessas de uma BBC brasileira é preciso muito mais do que tempo ou boa vontade dos críticos ou do público.
‘A TV Brasil está começando devagar e esperamos que sua qualificação técnica ocorra progressivamente. Nesse sentido, acho que está indo razoavelmente bem. Qual TV comercial tem uma fiscalização tão cuidadosa?’
É preciso muitos anos de investimentos no combate à miséria, na melhoria da saúde e, principalmente, maiores investimentos em educação, esta sim, pública e de qualidade.
Ainda no artigo citado, os responsáveis pela TV Brasil refutam a idéia de que o telejornal tenha um tom demasiadamente institucionalista e que se assemelhe a Voz do Brasil, e garantem que, apesar das questões técnicas e do pouco tempo no ar, o telejornal está indo muito bem:
‘O Repórter Brasil já está sendo transmitido em 18 estados brasileiros, e a recepção das TVs estaduais tem sido muito boa. Queremos fazer um jornal verdadeiramente nacional, as praças locais estão contribuindo bastante, apesar das dificuldades técnicas’.
Truques da mídia
E para não invalidar a polêmica entre o público versus privado e para efeitos comparativos, podemos fazer a mesma pesquisa em relação à necessidade ou prioridade para a segurança, a saúde e a educação e comparar os resultados.
‘Em relação ao formato do telejornal, o modelo adotado é defendido pois acredita-se que ele se aproxima cada vez mais do cidadão. ‘Acho que estamos conseguindo fazer um telejornal para o cidadão, incorporando entrevistas e debates de forma plural e fazendo uma coisa equilibrada. Governo e oposição estiveram presentes’, afirma.’
Onde estão as pesquisas que comprovam a qualidade do telejornal da TV Brasil? Como foram avaliados e medidos os tempos, os formatos e a linguagem das matérias apresentadas no telejornal único, o Repórter Brasil, que comprovam esse equilíbrio na cobertura do governo e da oposição?
TV é coisa séria. Não há mais lugar para achismos duvidosos de sábios das redações. Ainda mais sábios formados em redações de TVs… comerciais. Eles ou elas, sem dúvida, sabem tudo sobre os ‘truques’ do jornalismo de TV.
Mas, para quem não sabe, aproveito para recomendar a leitura de A Mídia e seus Truques, do Prof. Nilton Hernandes, Ed. Contexto (ver aqui). Escrevi um longo artigo sobre essa pesquisa tão importante e relevante para a compreensão dos truques dos nosso telejornais (ver matéria no C-se de 16/01/2007 – Os truques dos telejornais). Como bem sabemos, há muitas maneiras ou truques para que um telejornal pareça equilibrado. Pelo menos, para o grande público. Mas isso ninguém precisa saber, não é?
Quem vai pagar?
E, por último, em mais um trecho do artigo, as palavras que comprovam a pressa – ou seria a precipitação – no lançamento da TV do Brasil pelos seus responsáveis:
‘Em São Paulo, por exemplo, nosso alcance é mínimo, mas já encomendamos um novo transmissor analógico mais potente, além do digital. Em outros lugares chegamos por cabo. Não sabemos ainda qual o nosso real alcance, mas existem investimentos’.
Compra de transmissor analógico em plena época de TV digital para cobrir São Paulo? Isso não denota um certo interesse político partidário nas próximas eleições paulistas? Perdão. Perguntar não custa. Só queria entender. Tantos investimentos na escolha apressada e implantação ‘precipitada’ de um sistema brasileiro de TV digital, o nosso sistema nipo-brasileiro, a versão digital do famigerado padrão Pal-M para TV a cores, e a TV digital despende seus recursos tão ‘limitados’ na compra de máquinas de escrever. Perdão. Quero dizer, transmissores analógicos de televisão.
Por último, uma dica para os eleitos que dirigem os rumos da TV Brasil: É preciso humildade, sabedoria e tolerância para reconhecer os erros, voltar, recomeçar uma longa jornada. Uma televisão pública independente e de qualidade de verdade demanda mais do muitos recursos, boa vontade e aversão a críticas, sejam elas precipitadas ou não. Uma televisão pública de verdade exige a participação do… público. Aguardo ansioso pelo processo e pela votação. Afinal, quem está disposto a pagar uma taxa anual para termos uma TV pública brasileira independente e de qualidade?
(*) É jornalista, professor de jornalismo da UERJ e professor visitante da Rutgers, The State University of New Jersey. Fez mestrado em Antropologia pela London School of Economics, doutorado em Ciência da Informação pela UFRJ e pós-doutorado em Novas Tecnologias na Rutgers University. Trabalhou no escritório da TV Globo em Londres e foi correspondente na América Latina para as agências internacionais de notícias para TV, UPITN e WTN. Autor de diversos livros, a destacar ‘Telejornalismo, Internet e Guerrilha Tecnológica’ e ‘O Poder das Imagens’. É torcedor do Flamengo e não tem vergonha de dizer que adora televisão.’
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