Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A tentação do trocadilho

A campanha e a vitória de Barack Obama produziram, entre muitos que escrevem na mídia, o trocadilho óbvio: um negro na Casa Branca. É uma dessas tentações verbais em que até os mais atentos podem cair. Parece tão criativo, tão oportuno, tão original…

Não é difícil encontrar em jornais, sites e blogs em inglês, antes e depois de 4 de novembro, a frase ‘the first Black in the White House’. No excelente cyberpresse (Canadá), ‘Un Noir à la Maison-Blanche’ é o título de um artigo do cronista e humorista quebequense Stéphane Laporte. Le Point referendou o mesmo título, em forma de pergunta: ‘Un Noir à la Maison-Blanche?‘ A frase ‘un nero alla Casa Bianca’ aparece no l’Unità e no Corriere de la Sera E também no prestigioso Il Messaggero: ‘il primo nero alla Casa Bianca’.

Na mídia hispano-americana, o experiente escritor e historiador venezuelano Manuel Caballero tasca o título ‘Un negro en la Casa Blanca’ no seu artigo para o jornal El Universal. Em outro El Universal, mas este do México, o mesmo título numa crônica. No La Nación (Paraguai), a mesma frase. A mesma antítese no boliviano Los Tiempos. Mais uma vez: ‘el negro en camino a la Casa Blanca‘, no El Nacional (República Dominicana). Atravessando o oceano, encontramos um artigo publicado no jornal/portal espanhol ABC, ‘Mentiras blancas para un candidato negro‘; o autor, correspondente deste jornal em Washington, não contente com o título, insiste, lá no final do texto: ‘un negro en la Casa Blanca’.

E se McCain vencesse?

Os que dominam outros idiomas poderão enriquecer a pesquisa. Um amigo que conhece holandês encontrou ‘Eerste zwarte in Witte Huis‘, sim: ‘o primeiro negro na Casa Branca’.

No Brasil, O Estado do Paraná publicou a charge abaixo, do cartunista Solda:

Ruth de Aquino, da revista Época, abordando o tema diretamente, ‘Obama e a cor da pele‘, aumenta a minha coleção: ‘o primeiro negro na Casa Branca’. No Diário da Amazônia, o cronista de esporte Domingues Júnior repete: ‘O primeiro negro na Casa Branca‘. No Tribuna do Norte, em Natal, de novo: ‘um negro na Casa Branca‘. E no Jornal do Brasil, lá está – ‘um negro na Casa Branca’ –, texto do jornalista e escritor Osmar Freitas Jr.

Repetimos a frase para vencer a nossa incredulidade?

Outra dúvida. Se John McCain tivesse vencido, alguém escreveria ‘mais um branco na Casa Branca’?

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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br