‘Se uma causa ou um efeito não for imediatamente aparente, lembre-se de que ambos existem – basta buscá-los.’ (Reflexão sobre o Princípio da Razão Suficiente, de Leibnitz)
Na segunda-feira (3/11), quase todos nós fomos surpreendidos por uma notícia-bomba: a fusão entre dois dos maiores bancos privados brasileiros. Eu soube através da Elemídia – uma empresa que transmite notícias e propaganda dentro de elevadores; depois ouvi a história com mais detalhes pelo rádio. E, claro, à tarde o assunto já estava em todos os sites noticiosos da internet.
Escrevi ‘quase todos’ porque não posso imaginar que nossos líderes financeiros Mantega e Meirelles já não soubessem – há alguns dias – o que ia acontecer; assim como o Roberto Setúbal, o Pedro Moreira Salles e uma porção de outras pessoas ligadas aos dois bancos e às repartições e autarquias do governo, que precisam apor carimbos e assinaturas aos documentos que autorizam os casamentos desse tipo de instituições. Nosso presidente, Lula, talvez tenha sabido, também.
E os jornalistas?
Na surdina e nos bastidores
Naquela tarde, tendo que fazer passar o tempo de espera num consultório médico, aproveitei para escrutinar de cabo a rabo, como se diz (de fato, foi da capa à última página), o jornal do dia, em busca de uma pequena notícia, uma frase – ou, pelo menos, uma insinuação – que pudesse sugerir a megaoperação financeira que estava para acontecer. Nada.
Eles não sabiam?
Como citei Leibnitz, ali na abertura, recorro – de novo – a um processo mais ou menos filosófico de raciocínio: evidentemente, muitos não sabiam; digamos que a maioria não sabia. Mas não é plausível que ninguém soubesse. Logo, alguns sabiam. Os que sabiam não disseram nem escreveram o que sabiam. Vai daí, fizeram-no (ou deixaram de fazê-lo) porque não quiseram ou não puderam. A conclusão do raciocínio é: os jornalistas que sabiam que haveria a fusão entre os dois grandes bancos brasileiros não informaram isso aos seus leitores, ouvintes ou espectadores.
Este fato pode até ser deontologicamente defensável. Se houvesse especulações ou boatos divulgados antes da operação – especialmente se tivesse sido muito antes – as conseqüências poderiam ter sido devastadoras, diante da terrível crise econômica e financeira internacional. Neste caso, foi ‘bom’ que tudo se passasse na surdina e nos bastidores.
De que coisas saberão?
Mas… no mesmo dia da fusão, um profissional peso-pesado – Carlos Alberto di Franco – escrevia, no Estado de S.Paulo: a imprensa honesta e desengajada tem um compromisso com a verdade. É isso que conta.
Até onde vai este compromisso? Ele incluirá, talvez, a escolha individual de também silenciar sobre a verdade, se o profissional – ou seus superiores – forem de opinião que ela não deve ser conhecida dos clientes/consumidores dos seus veículos?
Admito que é uma questão espinhosa. Foi bom, repito, que não houvesse (mais) pânico no setor econômico brasileiro. Mas de que outras coisas saberão – e preferirão silenciar sobre elas – aqueles que têm, como dever, informar?
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Jornalista