Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Um farol no mar de intrigas

Após uma semana em que o leitor foi arremessado de um lado a outro pelo noticiário a respeito da Operação Satiagraha, os jornais finalmente convergem para um ponto de onde se pode observar melhor o roteiro da novela de intrigas em que se transformou a investigação sobre as atividades do banqueiro Daniel Dantas.


Na terça-feira (18/11) os jornais noticiam a manutenção do juiz Fausto de Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, à frente do processo contra Dantas. Além de ver seu inimigo mantido na condução do caso, Dantas perdeu em dois outros pedidos de habeas-corpus com os quais tentava anular o processo.


Aos poucos, a imprensa reorganiza os elementos da história e dá uma oportunidade para o leitor entender como a investigação sobre os métodos dos investigadores se sobrepôs, durante muitos dias, à questão central do escândalo – a suposta rede de corrupção que protegia o banqueiro nas atividades criminosas de que é acusado.


Nas edições de terça-feira, todos os jornais de circulação nacional e os principais jornais de liderança regional noticiam a realização de um congresso da Polícia Federal em São Paulo, no qual representantes da categoria declararam explicitamente que o crime organizado está infiltrado em certos poderes da República.


Com isso, fica declarado, por fonte oficial, que os defensores de Dantas no Judiciário, no Ministério Público, no Executivo e no Congresso estão sob suspeita.


Apuração responsável


E sobra também para a imprensa. Segundo um dos delegados responsáveis pelo inquérito que resultou na breve detenção do banqueiro, documentos apreendidos durante a investigação apontam a existência de um ‘caixa’ de 18 milhões de reais destinado a propinas para políticos, juízes e jornalistas.


Um dos citados, segundo o Globo, é o atual ministro da Secretaria de Ações de Longo Prazo, Roberto Mangabeira Unger, que, de acordo com a Polícia Federal, seria o responsável por defender os interesses de Daniel Dantas junto à imprensa.


Depois de se perder durante vários dias em especulações sobre um possível surto paranóico do delegado Protógenes Queiroz, que é acusado de haver abusado do uso de interceptações telefônicas durante a Operação Satiagraha, os jornais têm agora novas fontes para se informar sobre a suposta rede de influências que teria sido montada pelo banqueiro dentro das instituições da República.


Agora é hora de a imprensa sair a campo para fazer suas próprias investigações, em vez de simplesmente dar voz à profusão de informantes que, por interesses variados, estão sempre disponíveis para oferecer a manchete do dia.


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Perguntas sem resposta


A complexidade dos processos contra Daniel Dantas é correspondente ao seu estilo como homem de negócios: suas iniciativas sempre estiveram envolvidas em polêmicas, especialmente desde que foi escolhido para animar o projeto de privatizações no setor de telecomunicações, há dez anos.


Hoje, um de seus empreendimentos mais controversos está estabelecido na Amazônia, onde explora a pecuária extensiva, atividade apontada como uma das principais ameaças à integridade do patrimônio ambiental na maior floresta tropical do mundo. Mas mesmo ali ele é suspeito de falcatruas. A Polícia Federal afirma que as fazendas de Dantas na Amazônia são usadas para lavagem de dinheiro com bois de papel.


Dantas sempre seduziu certos jornalistas. Como um rei Midas ao contrário, tudo que ele toca se transforma em suspeita de espertezas e negócios mal iluminados. Ainda assim, é capaz de despertar admiração entre profissionais da imprensa, talvez por sua ousadia ilimitada e pela sensação de poder que emana.


Agora a Polícia Federal se diz muito próxima de revelar a natureza desse poder. Mas nada garante que os jornais e revistas estejam dispostos a destrinchar a tal rede de influências. Mesmo porque, até aqui, a imprensa aceitou sem questionamentos dar trânsito a todo tipo de material que lhe chega, mesmo aquelas informações sigilosas obtidas por meios suspeitos.