Coincidências revelam tendências… ou ausência de alternativas. Uma rápida
visita à banca de jornal e pelo menos três capas de revistas insistem em temas
como sucesso, idéias geniais, vencer na vida, ser criativo, promover inovação,
estimular o potencial inovador…
A revista Você s/a (ed. 125, nov. 2008) não poderia fazer diferente. É
o seu default. O rapaz da foto, terno impecável, posição de triunfo,
sorriso aberto, é o retrato daquela frase ambígua que servia de título para um
livro de Roberto Shinyashiki – ‘O sucesso é ser feliz’. Sucesso: ’39 idéias
indispensáveis para você’.
Que seja este o principal produto de uma publicação com tal perfil, nada de
mais. O que chama a atenção é ver a palavra ‘sucesso’ também em destaque na
revista Época (n° 549, 24/11/2008) desta semana. A fórmula da felicidade,
baseada no livro Outliers, de Malcolm Gladwell, já traduzido pela Editora
Sextante com o título Fora de série, baseia-se em ter amigos influentes,
ser obstinado, ser um gênio e ter muita sorte. Só isso!
No alto da capa, três notícias dialogam com o sucesso de Pelé, de Barack
Obama e Chaplin. O sucesso do ‘brasileiro que chegou mais longe nas mesas de
pôquer’. O sucesso de José Serra após a venda da Nossa Caixa. E o insucesso de
um ganhador da mega-sena… que teve muito azar com tanta sorte.
Tábuas de salvação
Malcolm Gladwell, o ‘doutor sucesso’, como é chamado pela Época,
‘entendeu os mecanismos do sucesso’. O sucesso de Einstein, Madonna, Bill Gates,
Machado de Assis e Lula. Agora, basta comprar a revista, depois o livro, e pôr
em prática todas essas dicas, a favor das quais, devemos reconhecer, inclui-se o
trabalho persistente, que dá sentido à sorte, orientação ao talento e ânimo aos
amigos.
Que a revista Época reduza sua capa ao tema do sucesso é sinal dos
tempos. As notícias desanimadoras sobre a chegada inevitável da crise
despertaram a necessidade de motivar um pouco o leitor.
E como se fosse jogada ensaiada, a revista IstoÉ (nº 2038, 26/11/2008)
oferece, no melhor estilo das revistas auto-ajuda, ’14 orientações para
estimular seu potencial inovador’: esvaziar a cabeça, ter tempo livre,
desbloquear idéias aparentemente absurdas, ser curioso, estudar, questionar-se,
aceitar o lado lúdico da vida são formas de ser mais criativo.
Em meio à sensação de fracasso e naufrágio, nada como tábuas de salvação.
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Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br