Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Paulo Machado

‘O leitor Fernando Carneiro* escreveu para a Ouvidoria dizendo que a cobertura sobre o 5º Congresso do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra realizada pela Agência Brasil foi honesta e interessante. ‘A cobertura da mídia brasileira do 5º Congresso do MST me fez lembrar a canção Construção de Chico Buarque’. O verso lembrado foi: ‘Morreu na contramão atrapalhando o tráfego’.

O leitor também questiona, em seu texto, a falta de espaço reservado pelos veículos de comunicação aos debates que ocorreram no encontro de Brasília e lembra como a mídia local noticiou a marcha dos sem-terra. Cita, especificamente, um jornal local que publicou a manchete: ‘Caos no trânsito de Brasília’. No final da carta, Carneiro pergunta a este ouvidor: ‘Quando teremos uma mídia realmente democrática?’

Para saber se a cobertura da Agência Brasil foi, de fato, ‘honesta e interessante’, fizemos uma leitura das 33 matérias publicadas sobre o assunto entre os dias 8 e 17 de junho.

Posição e contraposição

Nesse quesito as matérias estão balanceadas. Sempre que os sem-terra trataram de assuntos polêmicos, a reportagem procurou ouvir o outro lado. Esse foi o tratamento dado à questão do agronegócio, trazendo a contraposição da Confederação Nacional da Agricultura (CNA); à questão da lei que regulamenta o plantio de eucalipto no estado do Rio de Janeiro, trazendo a contraposição da Secretaria Estadual de Agricultura; à do milho transgênico, ouvindo a empresa alemã Bayer; e à própria questão da reforma agrária, ouvindo a posição do governo em entrevista com o ministro do Desenvolvimento Agrário Guilherme Cassel.

Contextualização

A maioria dos assuntos tratados foi explicada nas matérias e contextualizados a partir do processo histórico que envolve a questão. Frases grifadas, permitem ao leitor navegar pelo assunto lendo sobre acontecimentos que antecederam os fatos citados e facilitando a compreensão. Salvo exceções, como na matéria publicada no dia do encerramento do congresso, que trata da ‘discussão de um modelo econômico que substitua o neoliberalismo’, mas cujo link aponta para uma matéria baseada em uma entrevista com o sociólogo belga François Houtart, diretor do Centro Tricontinental, que não explica a proposta apresentada pelos sem-terra para a superação do neoliberalismo. Outra omissão ocorreu na matéria que tratava da carta final elaborada pelo MST, mas que não apresentava aos leitores a íntegra do texto. Segundo a redação da Agência Brasil, o link para a carta não foi feito porque ela não estava disponível na internet no momento em que a matéria foi publicada. Depois de avisada, a redação acrescentou o link à matéria.

Abrangência da cobertura

Em sua cobertura a Agência conseguiu dar uma mostra abrangente da diversidade de assuntos tratados, refletindo os debates sobre as propostas do MST para a reforma agrária, a educação, a comunicação, a política externa e a relação com outros movimentos sociais e com a sociedade. Mas foi no final de semana, dias 16 e 17 de junho, que as matérias conseguiram dar vida aos congressistas, ao narrar histórias de personagens como uma ex-líder camponesa de 82 anos que viaja pelo país dando palestras, um médico, filho de agricultores, que estudou em Cuba e agora volta para trabalhar em acampamentos, entre outros sólidos personagens.

A avaliação aponta que, com essa cobertura, a Agência Brasil mostrou objetivamente quais são as aspirações dos sem-terra. O cidadão que acompanhou o congresso pela cobertura da Agência Brasil, pôde saber que o maior prazer do MST não é atrapalhar o trânsito da capital. Talvez essa seja uma das respostas possíveis para a última pergunta do leitor: quando teremos uma mídia realmente democrática?

Até a próxima semana

(*) Fernando Ferreira Carneiro é biólogo, autor de uma tese de doutorado, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que mostra que os sem-terra correm menos risco de sofrer fome do que os bóias-frias. Ele foi uma das fontes ouvidas pela Agência Brasil na matéria ‘Dor na coluna, pressão alta e estresse são problemas de saúde dos bóias-frias’, publicada em 3 de Maio de 2007.’