Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Ex-editor da Time revela bastidores em livro

Para Norman Pearlstine, autor do livro Off the Record: The Press, the Government, and the War Over Anonymous Sources (Em Off: A Imprensa, o Governo e a Guerra sobre Fontes Confidenciais, tradução livre), recém-lançado nos EUA, o verão de 2005 não foi lá muito agradável. Na época, Pearlstine era editor-chefe da revista Time e estava em batalha judicial com Patrick Fitzgerald, promotor que investigava o caso de vazamento da identidade da ex-agente da CIA Valerie Plame. Fitzgerald havia emitido intimações para diversos repórteres, incluindo Matthew Cooper, da Time, e Judith Miller, do jornal New York Times, a fim de obter informações sobre fontes que pudessem ter revelado o nome da agente secreta à imprensa. Caso se recusasse a cooperar, Cooper poderia ser condenado a até 120 dias de prisão e a Time, a pagar multa diária mínima de US$ 1 mil.

Pearlstine levou o caso à Suprema Corte, que se recusou a revê-lo. Tendo esgotado todas as possibilidades jurídicas, o editor só tinha duas opções: desistir ou continuar resistindo. Em uma decisão que foi, segundo ele, ‘a mais difícil tomada em seus 36 anos de profissão’, Pearlstine optou por entregar à justiça as notas de Cooper, contra a vontade do repórter. A classe jornalística ficou surpresa e indignada por ele não ter seguido um dos valores mais sagrados da profissão – a proteção de fontes, custe o que custar. Alguns jornalistas chegaram a acusá-lo publicamente de covarde e de ter agido sob pressão da empresa. O New York Times e a própria Time publicaram artigos críticos à atitude do editor-chefe. Judith Miller se recusou a colaborar com a justiça e passou três meses na cadeia.

Desabafo

O livro é uma tentativa de Pearlstine em defender sua escolha de colaborar com a justiça. Ele nega que tenha agido por pressão da revista. Criado em uma família de advogados, Pearlstine alegou que entregou as notas de Cooper baseado em um princípio jurídico. No caso da Time e de Cooper, a revista também foi intimada, ao contrário do NYTimes, onde a intimação dizia respeito somente a Judith. Enquanto Cooper publicou uma matéria sobre a agente secreta, Judith chegou a reunir material, mas nunca escreveu sobre o tema.

Apesar de Cooper querer proteger suas fontes – Karl Rove, principal assessor político e amigo do presidente Bush, e I. Lewis Libby, então chefe de gabinete do vice-presidente americano Dick Cheney –, Pearlstine alegava que elas não podiam ser qualificadas como verdadeiras fontes confidenciais. Em parte porque, acreditava o editor, Libby e Rove pareciam envolvidos em uma espécie de plano para desacreditar o ex-embaixador Joseph Wilson, marido de Valerie. Wilson teria enfurecido a administração Bush ao assinar um artigo no New York Times em que questionava a alegação do governo de que o Iraque teria comprado urânio enriquecido do Níger para fazer armas atômicas – uma das justificativas de Bush para dar início à guerra do Iraque. Além disso, Cooper tinha trocado e-mails com membros da organização Time, discutindo o fato e citando o nome de Rove e Libby – o que, segundo o ex-editor, já havia comprometido a confidencialidade das fontes.

Em Off the Record, o argumento central de Pearlstine é que, quando uma empresa de mídia vai até a Suprema Corte e perde, a decisão de continuar resistindo deve ser mantida apenas em casos verdadeiramente extraordinários. ‘Ninguém está acima da lei, e isto inclui empresas de mídia’, diz Pearlstine.

Relembrando o caso

O nome da agente da CIA Valerie Plame apareceu na imprensa pela primeira vez em julho de 2003, em artigo do colunista sindicalizado Robert Novak, reproduzido em diversos jornais. Nos EUA, o vazamento da identidade de um agente secreto pode ser considerado crime. Por esta razão, deu-se início a uma longa investigação para determinar o culpado por passar a informação à imprensa.

Ao sair da prisão, a repórter Judith Miller identificou I. Lewis Libby, na época chefe de gabinete de Dick Cheney e uma das figuras mais poderosas do governo Bush, como a pessoa que informou a ela sobre Valerie Plame. Libby renunciou ao cargo em outubro de 2005, após ser indiciado por perjúrio, falso testemunho e obstrução à justiça. No mês passado, ele foi condenado a 30 meses de prisão e a multa no valor de US$ 250 mil.

Karl Rove foi apontado como fonte de Novak, mas, até hoje, não foi indiciado. Valerie Plame e seu marido, Joseph Wilson, entraram com ação contra Cheney, Libby e Rove, alegando que eles teriam conspirado para violar seus direitos constitucionais. Informações de William Powers [The New York Times, 28/6/07].