Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Entre pesos e medidas

Veritá effettuale, ou verdade efetiva, é um conceito utilizado por Maquiavel, em O príncipe, para justificar as ações de dominação de um chefe sobre sua nação. Segundo o autor, devemos examinar a realidade como ela é, e não como gostaríamos que fosse, razão pela qual, explica, seria lícito um líder valer-se de quaisquer métodos, inclusive escusos, para manter a ordem e garantir sua soberania. Em resumo, ter ‘sabedoria para agir conforme as circunstâncias’. Apesar de vastamente criticada, a máxima ainda anda em voga na maioria dos governos. E das mídias, claro.

A pressão exercida por parte da imprensa (atente para a palavra parte) em alguns casos – como, por exemplo, a operação Satiagraha – quase nos faz crer que determinados profissionais estejam de fato sequiosos de justiça. Não se iluda, leitor. Trata-se, no mais das vezes, de tapas de luvas (em certos embates, outros objetos menos delicados) entre girondinos e jacobinos do chamado quarto poder – o que, se não é sempre saudável, ao menos serve para esclarecer, quando cuidamos de peneirar as informações. Questão de pesos e medidas. É melhor julgar o excesso que a falta, não?

Indicações e troca de cargos

Um aparte, pelo visto, é o da PRP 92/07, lei complementar que se ocupa da criação da Fundação Estatal do Direito Privado para áreas estratégicas como saúde, assistência social e meio ambiente, entre outros. Amor e ódio, sim, mas apenas entre os principais interessados. Se pesquisarmos sobre o assunto, encontraremos vários vestígios do duelo entre funcionalismo público e publicações governamentais, contra e a favor, respectivamente, de sua aprovação. Os veículos ditos imparciais, entretanto, optaram por transcrever os fatos sem muitos detalhes, ou, mais especificamente, como habitual, sem apresentar de modo satisfatório suas implicações, o que não deixa de ser uma tomada de posição. Foram matérias como essa do Globo (ver aqui) que expuseram o tema de forma genérica e disfarçadamente – ou não tanto assim – partidária.

Mantendo ao largo a emblemática discussão Estado x capitalismo (enfraquecimento do aparato estatal, ‘privatização’ de setores-chave etc.), se a publicação era eqüitativa, peca por não apresentar algumas das principais contradições entre os argumentos: se, por um lado, findam-se as regalias do funcionalismo público, que passaria a ter seu desempenho constantemente avaliado e cumpriria metas como qualquer classe de trabalhadores regidos pela CLT, por outro essa flexibilização na contratação acarretaria a criação de ambiente propício às indicações e trocas de cargos entre aliados políticos, em negociações de apoio. Ainda que fosse ‘desburocratizado’ o atendimento nos hospitais universitários, vagas gratuitas diminuiriam em função da necessidade de leitos particulares.

A difícil elucidação da população

Temática de tal monta, aliás, deveria ser incitada a tornar-se discussão popular, quiçá definida através de plebiscito, onde pudesse prevalecer a opinião da maioria (uma forma de a sociedade exercitar o direito de decidir sobre o que lhe diz respeito), sob a batuta de analistas atuantes, mesmo que declaradamente a seu favor, ou contra. E o povo que fizesse seu dever de casa e tratasse de pesquisar para escolher a opção conveniente.

Trabalhoso e injusto? Talvez. Mais simples, no entanto, que esperar que comunicadores auto-intitulados neutros atuem genuinamente como auxiliares na articulação de idéias que objetivam pura e simplesmente a elucidação da população. Afinal, em se tratando de certos meios, ‘todos vêem aquilo que pareces, (mas infelizmente) pouco sentem o que és’.

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Estudante de Jornalismo, Rio de Janeiro, RJ