Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Apresentadora que rasgou roteiro vira sucesso

Irritada com o amplo destaque dado pela mídia a Paris Hilton, a jornalista televisiva Mika Brzezinski acabou virando notícia, há duas semanas, ao tentar destruir um roteiro que trazia justamente a prisão da socialite como manchete do dia. Co-apresentadora do programa matutino Morning Joe, do canal a cabo americano MSNBC, Mika perdeu a compostura e tentou atear fogo ao roteiro em protesto à escolha da notícia principal. Não conseguiu, e se dirigiu a um triturador de papel para destruir as páginas.

O resultado? A jornalista virou sucesso absoluto. Mais de dois milhões de pessoas já assistiram ao vídeo do incidente na internet – cerca de 10 vezes o número de telespectadores que viram o programa na TV. Apenas três dias após o protesto, a emissora – coincidência ou não – informou que ela ganhará uma hora regular para apresentar as notícias pela manhã – antes sua presença era esporádica. Mika recebeu ainda mais de mil e-mails, e foi nomeada ‘a mulher da semana’ por um sítio de internet britânico. Ela foi convidada a discursar em um simpósio na Escócia e elogiada por um jornal da Nova Zelândia.

Não somos idiotas

Aparentemente, ela não é a única cansada da cobertura excessiva sobre a jovem e loira socialite americana. ‘Entre jornalistas, um nervo foi atingido. Eu acho que estamos cansados de fingir que isto é importante’, diz Mika. ‘Nós também sabemos, bem lá no fundo, que nossos telespectadores sabem que não acreditamos que isso seja notícia. Eles não podem achar que somos tão idiotas’.

Mas a dúvida ainda perseguia a jornalista. Teria sido armação o momento de fúria anti-Paris Hilton? Mika diz que não. Ela conta que, no dia em que Paris foi libertada da cadeia – a patricinha praticamente desfilou no caminho entre a penitenciária e o carro –, havia em pauta uma notícia muito mais relevante: o discurso do influente senador republicano Richard Lugar criticando a política do presidente George W. Bush no Iraque. Quando pegou o roteiro para ler o resumo das notícias do dia, a jornalista não acreditou ao notar que Paris Hilton era a primeira história da lista. ‘Eu não conseguia dizer as três primeiras palavras. Minha pele começou a formigar. Este era o nosso lead? Num dia como aquele?’, lembra. ‘Nós tínhamos ido muito longe e tínhamos que parar. Foi tudo verdade. Não havia nada planejado’.

Mika diz, entretanto, que depois de sua irritação inicial, ela e Joe Scarborough, principal apresentador do programa, passaram a zombar de si mesmos. Mas se isso fez com que as pessoas refletissem sobre a cobertura de Paris Hilton, então foi ótimo, diz ela. ‘Isso não quer dizer que eu nunca mais cobrirei uma matéria sobre Paris Hilton ou que eu nunca mais vou ouvir meu produtor. Mas, naquele dia, aquela história como lead era simplesmente algo absurdo. Fez com que eu me sentisse burra’, resume.

Engolindo sapos

O caso Paris Hilton levou outros jornalistas americanos – em ações mais discretas que a de Mika – a deixar claro sua insatisfação com o destaque dado à história. As opiniões contrárias parecem, entretanto, ter aumentado a febre de atenção pela patricinha. A apresentadora Katie Couric, da CBS, afirmou diante de uma platéia em Boston, em maio, que ‘nós temos um tempo precioso no CBS Evening News e não acredito que alguma vez tenhamos a necessidade de pronunciar o nome Paris Hilton’. Ela foi aplaudida na ocasião, mas um mês depois apareceu noticiando a ida da socialite para a cadeia.

Brian Williams, da NBC, afirmou em seu blog, quando Paris foi presa, que ‘ninguém mencionou Paris Hilton em nossa reunião editorial esta tarde’. Ele escreveu que a notícia sobre ela poderia ser abordada caso houvesse alguma questão mais relevante sobre o sistema judiciário. A abordagem veio no dia seguinte, quando a matéria sobre a patricinha foi a segunda mais importante no noticiário Nightly News.

Finalmente, Anderson Cooper, da CNN, não resistiu quando seu noticiário foi exibido logo após a entrevista de Paris no programa de Larry King. ‘Eu acho que ouvimos alguns de vocês gritando com a tela da TV’, brincou o apresentador, para depois passar uma hora falando da jovem recém saída da prisão. Valeu a pena: Cooper teve 1,89 milhão de telespectadores aquela noite, segundo o Nielsen Media Research. O número é mais que o dobro da audiência média do programa, de 790 mil pessoas. Larry King também teve seu público triplicado com a entrevista. Irritações à parte, Paris Hilton dá ibope. Informações de David Bauder [AP, 8/7/07].