A matéria ‘Cultura da pedofilia’, da edição corrente de Veja (nº 2.121, de 15/7/2009), sobre o juiz do Trabalho de Tefé (Amazonas) que promovia orgias com crianças dentro do seu gabinete, deverá ter um papel didático: o de trazer o assunto ao grande público, que parece só tomar conhecimento de alguns fatos quando divulgados no Fantástico ou na Veja.
Não só o grande público. Veja talvez sirva de pauta para as televisões e jornais, que até agora registraram o fato sem grande destaque, talvez por considerarem um assunto muito regional. Ocasionalmente, os jornais fazem matérias falando da prostituição infantil – e aí não se pode dizer que isso ocorre apenas nos estados do Norte e Nordeste.O assunto repercute entre os leitores, mas nada além disso.
Parece que, como diz Veja…
‘Tio Branquinho, como é chamado pelas alunas da Escola Estadual Frei André da Costa, comunga de uma mentalidade tristemente comum nos estados do Norte e do Nordeste, a qual tolera, quando não incita, a iniciação sexual de meninas, sejam crianças ou adolescentes, por homens mais velhos. Todo mundo em Tefé conhece há anos os hábitos sexuais de Tio Branquinho’.
Tão chocante quanto o abuso cometido é a documentação encontrada provando o crime:
‘Nas buscas feitas na casa de Branquinho e no local de trabalho do magistrado, os procuradores encontraram muito mais do que esperavam. Ao todo foram apreendidos 23 HDs de computador, quase todos repletos de arquivos com as orgias do juiz – nas quais também havia mulheres mais velhas. Descobriram câmeras de vídeo para gravações secretas e álbuns com fotos de meninas da cidade, quase sempre completamente nuas, algumas fazendo sexo com adultos. No fundo de um armário na residência oficial do magistrado os investigadores encontraram 101 fitas de vídeo lacradas contendo cenas de sexo, todas devidamente organizadas por data e nome das meninas.’
Corporativismo e omissão
A matéria termina com uma denúncia – tão importante quanto a do próprio crime: a da omissão da justiça local:
‘A desembargadora Luiza Maria Veiga, presidente do TRT do Amazonas, recebeu as fotos em abril – e nada fez. Não encaminhou as evidências à Polícia Federal nem ao Ministério Público, como determina a lei. Tampouco pediu explicações a Branquinho. Sua única decisão consistiu em convocar os demais desembargadores do tribunal, para discutir o assunto numa reunião extraordinária de `caráter reservado´. Neste encontro, os desembargadores limitaram-se a abrir um procedimento interno para investigar o caso.’
Agora que o crime foi divulgado e a Polícia Federal entrou na história, vamos esperar para ver se a imprensa, sensibilizada, entra no assunto. Se o assunto é regional demais, o abuso contra crianças não é. E se nada disso sensibilizar a imprensa, há dois pontos que com toda a certeza podem render matérias: o corporativismo dos colegas de Branquinho, que, segundo Veja, já solicitou aposentadoria, e a atitude da juíza que, como mulher, deveria ao menos ter fica indignada com o abuso praticado contra as meninas. Ou será que a juíza considera pedofilia apenas os casos em que o abuso é cometido contra meninos?
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Jornalista