Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Afronta à inteligência

José Eduardo, conhecido como Bocão, recebe tal alcunha por espernear aos quatro cantos do estado as agruras decorrentes da pobreza e das desigualdades existentes. Apesar do evidente baixo nível cultural que demonstra, certamente o apresentador seria reconhecido positivamente por seu trabalho profissional e social – caso não mergulhasse de cabeça nas profundezas da apelação.

Muito bem relacionado com o meio musical local – como todo profissional de rádio e televisão precisa ser –, José Eduardo é hábil em criar uma polêmica estúpida envolvendo uma ex-professora demitida por sua atividade informal de dançarina de banda de pagode. Umas reboladas no estúdio do programa do Bocão e alguns percentuais de audiência a mais e a professorinha obteve êxito em se formalizar como dançarina.

No programa de televisão, utiliza a velha fórmula de expor dinheiro ao vivo e em cores para fazer as pessoas ligarem e concorrerem ao cobiçado montante – uma forma eficiente de ganhar audiência num estado extremamente pobre econômica e intelectualmente como a Bahia. Sem competência alguma como jornalista e com um nível de cultura baixo, o Bocão acredita piamente que matéria de cunho jornalístico é levar seus repórteres para as ‘bocas de fumo’ para registrar as ações dos policiais nessas localidades. Entre um cadáver aqui e outro acolá, ensangüentados ou decapitados, o apresentador alterna suas medíocres reportagens com brigas de vizinhos por pedaços de terra. Aos porcos, os farelos.

Terra do pagode vulgar

Na rádio, o cenário de horror continua na mesma marcha: cria personagens favoráveis ao time A ou B para criar conflitos com os torcedores que ligam para a emissora. As ofensas trocadas são impublicáveis e tudo isso com o aval do apresentador que se acaba de rir durante as discussões. Com um ego imenso, Bocão não pode ser contrariado em nada que ameaça largar a rádio e a televisão. Que bom seria se o mesmo cumprisse a promessa. Apesar de raramente freqüentar um estádio de futebol, se coloca numa posição de opinar sobre a saída desse ou daquele técnico – geralmente reclama a demissão daqueles que o criticam em outras emissoras. Se não fosse pela qualidade da equipe, os comentários futebolísticos desse cidadão não seriam ouvidos por ninguém.

Revolta, mas não surpreende: a Bahia tem um nível educacional e cultural bastante baixo e, dessa forma, com a bolsa esmola todos os dias oferecida pelo supramencionado é evidente que audiência não faltará. Além disso, por trabalhar numa emissora de rádio que aborda futebol, algo que mexe profundamente com os brios dos torcedores fanáticos de Bahia e Vitória, o apresentador consegue uma penetração impressionante na população. Sem contar que amigo próximo dos profissionais da indústria do axé, há sempre um convite aqui, outro acolá, para seus ouvintes para as principais festas da cidade. Por fim, na terra onde nasce o pagode rasteiro e vulgar, tipo ‘É o tchan’ e ‘Todo enfiado’, não é de surpreender que um jornalismo hemoglobina faça tanto sucesso, principalmente quando rolando a roleta o telespectador pode ganhar muito dinheiro sem fazer esforço algum. Esforço? Para que?

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Jornalista, Salvador, BA