Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

O Globo

MEMÓRIA / ACM
Lydia Medeiros

Com a imprensa, relações tumultuadas

‘‘Há três tipos de repórteres: o que quer dinheiro, o que quer notícia e o que quer emprego. O correto é não dar dinheiro a quem quer notícia; notícia a quem quer emprego e emprego a quem quer dinheiro. O político não pode é errar’. A definição do senador Antonio Carlos Magalhães está transcrita no livro ‘Política e paixão’ (Editora Revan), uma longa entrevista aos jornalistas Ancelmo Gois, Miriam Leitão, Marcelo Pontes, Maurício Dias e Rui Xavier, em janeiro de 1995, em que ele fala sobre História, política e políticos, economia, imprensa, Bahia e baianos, amigos e inimigos.

As relações do senador com a imprensa não escaparam a seu estilo inflamado de fazer política. Alternava afagos com truculências. O jornalismo foi sua primeira atividade profissional. Durante toda a vida, foi um leitor voraz e atento dos jornais. Dedicava boa parte do dia a conversas com repórteres e colunistas. Cultivava as notícias positivas, mas dizia que gostava dos ataques — e eles foram muitos ao longo de 50 anos: ‘Faz parte, sinto falta quando não leio um de manhã’, disse ele no livro-entrevista.

No entanto, quando se considerava atingido, não hesitava em responder com telefonemas — muitos deles impublicáveis. Ou faxes duros, inclusive com xingamentos, que colecionava com a intenção de um dia reuni-los em livro.

ACM conta, na mesma entrevista, que diariamente fornecia três ou quatro notícias exclusivas aos colunistas. Mas ressalva: ‘Falo com aqueles de que gosto’. E o que fazia o senador gostar ou não de um jornalista? ‘Há muitos que não gostam de mim, e não gosto deles. Agora, não tem por que eu estar fornecendo notícias para quem não gosta de mim’.

Ele segue: ‘Há pessoas com quem tenho uma certa intimidade, e então fico com as vantagens e desvantagens dessa amizade’. Entre esses, o senador cita o jornalista Elio Gaspari. ‘Houve um tempo em que para ser amigo do Elio pagava-se um alto preço. Ele deve dizer a mesma coisa: ‘Para ser amigo do Antonio Carlos, paga-se um alto preço’. Só que os inimigos dele, todos, acabam virando meus inimigos. Mas os meus inimigos vejo todo dia almoçando com ele’.

Perguntado sobre a receita para uma boa relação entre político e imprensa, ele explica: ‘Falar a verdade. Eu desafio qualquer um de vocês: ou não falo, ou falo somente a verdade’.

Durante a entrevista, o estilo agressivo ficou explícito numa discussão com Míriam Leitão. Ela o questionava sobre seu rompimento com o regime militar e a adesão à candidatura de Tancredo Neves, em 1984. ACM sustentou que não ‘abandonou o barco afundando’, disse que seria político também na oposição — o que, à época, nunca havia acontecido no plano nacional —, e partiu para o enfrentamento: ‘Quero que fique registrado nesse livro que eu exerço minha função com mais dignidade do que você (exerce) a sua profissão’. O clima esquenta: ‘ O senhor é quem está sendo entrevistado. E ACM devolve: ‘Eu respondo o que quero’.’

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O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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